Acórdão nº 668/20.1T8PBL.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 10-01-2023

Data de Julgamento10 Janeiro 2023
Case OutcomeNEGADA
Classe processualREVISTA
Número Acordão668/20.1T8PBL.C1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Relatório.


As Comunidades Locais (Universo de Compartes) dos lugares de Barrocal, Casal Novo, Courã, Caeira, Covão da Silva e Caseirinhos, da freguesia e concelho de Pombal, organizados em Assembleia de Compartes dos Baldios de Barrocal, Casal Novo, Courã, Caeira, Covão da Silva e Caseirinhos, propuseram contra o Município e a Freguesia de Pombal ação declarativa, com processo comum, pedindo a condenação dos últimos a:

a) Reconhecer que os terrenos inscritos nos artigos matriciais rústicos da freguesia e concelho de Pombal identificados no artigo 4.º da P.I., são baldios;

b) Reconhecer que os referidos terrenos são possuídos e geridos pelas comunidades locais das aldeias serranas de Barrocal, Casal Novo, Courã, Caeira, Covão da Silva e Caseirinhos da Freguesia e concelho de Pombal;

c) Reconhecer que os terrenos baldios, identificados no artigo 4.º da p.i, são administrados através de atos de representação, disposição, gestão e fiscalização pelos órgãos daquelas comunidades locais democraticamente eleitos, com exclusão de quem quer que seja;

d) Reconhecer que as inscrições matriciais dos terrenos baldios identificados no artigo 4.º da p.i. em nome do Município de Pombal, foram indevidamente efetuadas;

e) Absterem-se da prática de quaisquer atos materiais ou jurídicos que ofendam a posse das comunidades locais das aldeias serranas de Barrocal, Casal Novo, Courã, Caeira, Covão da Silva e Caseirinhos, da freguesia e concelho de Pombal, sobre os terrenos baldios identificados no artigo 4.º da p.i.

f) Ver ordenado o cancelamento de quaisquer descrições e inscrições na Conservatória do Registo Predial de Pombal, que, entretanto, tenham sido efetuados, bem como os que se vierem a efetuar, e ainda ordenar a inscrição na matriz junto da Autoridade Tributária em nome das comunidades locais Barrocal, Casal Novo, Courã, Caeira, Covão da Silva e Caseirinhos, referente aos terrenos baldios já melhor identificados no artigo 4.º da p.i.

g) Ver declarado a ilegitimidade da gestão exercida sobre os prédios identificados no art.º 4.º desta PI, e, consequentemente, ver invalidados todos e quaisquer contratos, sejam que natureza forem, celebrados sobre aqueles prédios, desde a data da constituição da Autora em 11/06/1995, cfr. Acta n.º 1;

Fundamentou estas pretensões no facto de ter sido constituída através de Comissão ad hoc, em 22 de Janeiro de 1995, com o recenseamento dos compartes, tendo ocorrido a assembleia constituinte e eleitoral dos respetivos órgãos sociais em 11 de Junho de 1995, reconhecida pelo Chefe da Zona Florestal do Pinhal Litoral, de, sob os artigos matriciais rústicos da freguesia de Pombal, se acharem inscritos na titularidade do Município de Pombal, os baldios denominados Vale Mourel, Confraria, Feteira, Eiras de Belém, Vale Pombeiro e Vale Geraz, Vale da Feteira, Murtinheira, Casal Novo, Barrocal de Baixo, Tecedeira, Outeiro, Fonte, Outeiro do Seixo, Lagar, prédios nos quais as comunidades locais aparentaram os seus gados, extraíram lenha, cortaram e recolheram matos para a cama nos currais dos animais, bem como pedras para as suas construções, colheram os frutos das árvores, semearam e colheram tremoços, atos que sempre foram praticados desde tempos que excedem a memória dos homens, ou seja, há mais de 100, 200 anos, à vista de todos, sem oposição de quem quer que seja, de forma conjunta e segundo os usos e costumes e necessidades das comunidades locais e sem interrupção, na convicção de que se trata de propriedade comum, comunitária, de os réus se a arrogarem gestores desses terrenos, invocando essa gestão perante as mais diversas autoridades, de o Município de Pombal celebrar contratos com diversas entidades privadas, tendo dado a exploração de pedra do baldio Vale da Feteira, e de aquele e a Freguesia de Pombal terem vindo a celebrar contratos com empresas de exploração e produção de energia elétrica eólica, em vários terrenos baldios, contratos que estão feridos de nulidade por falta de legitimidade para os subscrever.


Os réus defenderam-se por exceção dilatória, invocando a falta de capacidade judiciária da autora e a irregularidade da sua representação e, por impugnação, negando a veracidade dos factos alegados por aquela e afirmando que o Município de Pombal é o possuidor dos prédios, há mais de 50 anos, com o apoio e colaboração da Freguesia de Pombal. A autora pronunciou-se pela improcedência de todas as exceções.

Por decisão de 12 de Janeiro de 2021,foi a autora convidada a aperfeiçoar petição inicial, esclarecendo no pedido formulado na alínea g) qual concreta consequência que assaca aos contratos alegadamente celebrados pelas Rés, assim como concretizando e identificando cada um desses contratos e suprindo as assinaladas imprecisões na matéria de facto contidas nos artigos 17.º e 18.º da petição inicial, mediante a alegação de factos que ilustrem a celebração pelas Rés de determinados contratos geradores de direitos e obrigações, com indicação especificada dos elementos, objeto e sujeitos de cada um desses contratos.

A autora apresentou nova petição na qual especificou aqueles contratos e modificou o pedido formulado na alínea g), no sentido da condenação dos réus a ver declarada a ilegitimidade da gestão exercida sobre os prédios identificados no art.º 4.º desta PI, e, consequentemente, declarar a nulidade dos contratos melhor identificados nos art.ºs 17. e 18.º desta PI, desde a data da constituição da ora Autora em 11/06/1995, cfr. Acta n.º 1, e/ou em alternativa, caso assim não se entenda, subsidiariamente, seja declarada a sua ineficácia relativamente à Autora.

Por despacho de 18 de maio de 2021, admitiu-se, a pedido da autora, a intervenção principal provocada, como associadas dos réus, de Iberobrita - Produtora de Agregados, S.A., e de Empreendimentos Eólicos da Serra de Sicó, S.A. que ofereceram articulado próprio.

Empreendimentos Eólicos da Serra do Sicó, SA, invocou a falta de capacidade judiciária da autora, a ilegitimidade passiva por preterição de litisconsórcio necessário, dado que o contrato de cessão de exploração de terrenos baldios foi celebrado também com as Juntas de Freguesia de Abiúl, Vila Cã e Redinha, e respeita a parque eólico que só parcialmente se localiza nos baldios reclamados pela autora, pelo que o pedido da sua nulidade nunca poderá proceder totalmente, e a exceção perentória do abuso, pela autora, do direito, e impugnou os factos articulados por aquela.

Em reconvenção pediu que, caso se considere que os baldios de Barrocal, Casal Novo, Courã, Caeira, Covão da Silva e Caseirinhos detêm legitimidade para administrar e ceder a exploração dos terrenos baldios em questão, condenar a autora, em representação daqueles baldios, a celebrar um contrato de cessão de exploração de terrenos baldios com a EESS, com efeitos para o futuro, no que respeita aos aerogeradores 4, 6, 7 e 8, declarando-se cessados os efeitos do Contrato de Cessão de Exploração apenas no que respeita a esses aerogeradores, mantendo-se porém a plena validade desse contrato no que diz respeito ao aerogeradores 1, 2, 3, 5, 9 e 10, e, em alternativa, nesse caso, condenar a Autora e os Réus na celebração de um negócio jurídico tendente à cessão da posição contratual do Município de Pombal e da Junta de Freguesia de Pombal, no âmbito do Contrato de Cessão de Exploração no que respeita aos aerogeradores 4, 6, 7 e 8, mantendo-se, porém, a plena validade do contrato atual no que diz respeito aos aerogeradores 1, 2, 3, 5, 9 e 10, e subsidiariamente, caso se considere que os Baldios de Barrocal, Casal Novo, Courã, Caeira, Covão da Silva e Caseirinhos detêm legitimidade para administrar e ceder a exploração dos terrenos baldios em questão e aqueles pedidos reconvencionais não sejam julgados procedentes – o que por mero dever de raciocínio se concebe sem, todavia, conceder –, condenar o Município de Pombal ao pagamento dos custos de remoção dos aerogeradores que a EESS terá de suportar, bem como dos lucros cessantes decorrentes da perda de produção dos mesmos e quaisquer outras despesas e danos emergentes advenientes da perda do direito de utilização desses terrenos, nos termos do disposto no número 1 da cláusula 6.ª do Contrato de Cessão de Exploração e na alínea f) do número 1 da cláusula 12.ª do Contrato de Atribuição de Licença, relegando-se para execução de sentença a determinação desses montantes.

A interveniente principal Iberobrita, SA, invocou a exceção da incompetência em razão da matéria do Tribunal, dado que o litígio emerge de contratos administrativos, pertencendo a competência aos tribunais administrativos, a sua ilegitimidade e a da autora, por esta pedir a nulidade dos contratos desde a sua constituição, em 11 de Junho de 1995, e o contrato de concessão do direito de exploração de preda no baldio do lugar do Barrocal ter sido celebrado em 3 de janeiro de 1978, a falta de personalidade judiciária da autora e a exceção perentória do abuso, pela última, do direito e, por impugnação, afirmou desconhecer parte dos factos alegados por aquela.


Por despacho de 23 de novembro de 2021 foi declarada a incompetência daquele juízo, em razão do valor, e determinada a remessa do processo para o Juízo Central Cível ....

Por decisão do Juízo Central Cível ..., de 1 de abril de 2022, depois de observar que a causa de pedir dominante consiste na precisamente na celebração pelos Réus dos vários contratos sujeitos a regras de direito administrativo celebrados desde 1971 a 2014, sendo aplicável o regime anterior ao regime previsto na Lei n.º 75/2017 de 17 de agosto, foi declarado serem competentes para apreciar o presente processo os tribunais administrativos e fiscais e não os tribunais comuns e, em consequência, absolveu os Réus e Intervenientes Principais Passivos da instância, sem prejuízo da faculdade prevista no art. 99.º, n.º 2, do CPC


Interposto recurso de...

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