Acórdão nº 6652/18.8T8VNG-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 17-02-2020
Data de Julgamento | 17 Fevereiro 2020 |
Número Acordão | 6652/18.8T8VNG-A.P1 |
Ano | 2020 |
Órgão | Tribunal da Relação do Porto |
Procº nº 6652/18.8T8VNG-A.P1
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1147)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Jerónimo Freitas
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
I. Relatório
Na acção declarativa de condenação, com processo especial emergente de acidente de trabalho, participado alegado acidente de trabalho ocorrido aos 23.05.2018 de que terá sido vítima B… e de que lhe resultou a morte aos 29.07.2018, as AA., C… e D…, nas qualidades de, respectivamente, viúva e filha daquele, apresentaram, aos 11.06.2019, petição inicial demandando E…, Unipessoal, Ldª e F…, tendo formulado os seguintes pedidos:
“A) Deve ser judicialmente declarado que entre o malogrado B… e a sociedade Ré existiu um contrato de trabalho por tempo indeterminado, com a remuneração mensal ilíquida de 950,00€, paga catorze vezes ao ano e que se extinguiu com a morte do sinistrado B…;
B) Ser judicialmente declarado e os RR condenados a reconhecer que o acidente de que foi vítima o trabalhador B… foi acidente de trabalho;
C) Ser judicialmente declarado e os RR condenados a reconhecer que o acidente infortunístico ocorreu com grave violação das regras de segurança por parte da entidade empregadora;
D) Serem os RR solidariamente condenados a pagar:
a) À Autora C… (viúva) a quantia de 85.447,63€, assim descriminada:
i. 50.000,00€ de danos não patrimoniais pela perda do direito à vida do seu falecido marido;
ii. 25.000,00€ de danos não patrimoniais sofridos pela própria em consequência da morte do marido;
iii. 1.709,17€ devida pelo período da incapacidade temporária e absoluta do malogrado B…;
iv. 2.830,74€ a título de subsídio de morte do marido;
v. 3.990,00€ a título de pensão anual e vitalícia, atualizável a partir da idade da reforma;
vi. 1.887,72€ a título de despesas com o funeral e trasladação;
vii. 30,00€ com as despesas que suportou com deslocações feitas por causa do sinistro em questão, incluindo a realizada à diligência de conciliação.
b) À Autora D… (filha) a quantia de 80.490,74 €, como se descrimina:
i. 50.000,00€ de danos não patrimoniais pela perda do direito à vida do seu falecido pai;
ii. 25.000,00€ de danos não patrimoniais sofridos pela própria em consequência da morte do pai;
iii. 2.830,74€ a título de subsídio por morte do pai;
iv. 2.660,00€ a título de pensão anual e temporária;
E) Serem os RR ainda solidariamente condenados a pagar às Autoras os juros vincendos sobre cada uma das quantias e até efetivo pagamento a calcular à taxa de juros civil atualmente de 4% ao ano.”
Para tanto, alegaram, para além do mais, que:
- Aquando do acidente em causa, no dia 23 de Maio de 2018 pelas 10,30h, o sinistrado trabalhava para a 1ª Ré, ao serviço de quem havia sido admitido mediante contrato de trabalho, exercendo as funções de servente de construção civil e auferindo a retribuição mensal de €950,00;
- A 1ª Ré dedica-se à atividade de construção civil e obras públicas, havendo ela e a sociedade comercial G…, Lda sido celebrado contrato de subempreitada, figurando esta como empreiteiro geral da obra referente ao restauro do edifício em causa e aquela como subempreiteira, respeitando os trabalhos subcontratados da responsabilidade da Ré a trabalhos de execução de demolições e pedreiro;
- À data do sinistro decorriam trabalhos de limpeza de escombros do telhado do edifício, tendo o sinistrado, no dia do sinistro, 23.05.2018, deslocando-se para o local onde decorriam os trabalhos acompanhado de um outro trabalhador desta, com funções de chefe de equipa.
- Aquando do acidente o sinistrado encontrava-se a realizar trabalhos de limpeza de escombros no telhado, usando para o efeito uma mangueira e uma vassoura, sendo que, no momento em que se encontrava na cornija a efetuar tais trabalhos, apoiado numa pedra, esta cedeu ou partiu, tendo-se estatelado no chão, caindo de mais de 4 ou 5 metros de altura.
- A Ré empregadora não tinha a sua responsabilidade infortunística transferida para qualquer entidade Seguradora;
- No que se refere à responsabilidade da Ré empregadora, invoca ainda a sua responsabilidade, nos termos do disposto no art. 18º da Lei 98/2009, por haver o acidente decorrido da violação de normas de segurança por parte da Ré empregadora, referindo para tanto o seguinte: “34º. Na obra não existia quaisquer elementos coletivos ou singulares de prevenção de acidentes. 35º Não havia andaimes. 36º Não havia guarda corpos. 37º Não havia arneses nem capacetes, que não haviam sido colocados à disposição dos trabalhadores. 38º À Ré enquanto entidade empregadora competia assegurar todos os meios de segurança pessoais e coletivos de prevenção de acidentes de trabalho, assim como fazer cumprir aos sues subordinados as regras de segurança em vigor. [Cfr. artº 281º do C do Trabalho] 39º Com efeito, a Ré: a. Não planificou nem dispunha de documento dessa planificação destinada à prevenção de sinistros laborais considerando a evolução técnica, a organização do trabalho e condições de trabalho; b. Não tinha identificado os riscos previsíveis em todas as atividades da empresa na conceção ou construção de instalações, de locais e processos de trabalho, nem na selecção de equipamentos destinados a evitar a sinistralidade no trabalho; c. Não tomou em consideração a necessidade de adaptar o tipo de trabalho ao trabalhador em causa; d. Não priorizou as medidas de segurança coletiva em relação às individuais; e. Não elaborou ou divulgou, dando-as a conhecer ao trabalhador sinistrado, instruções compreensíveis e adequadas à atividade desenvolvida pelo trabalhador. 40º A Ré não cumpriu com tais obrigações que para si decorrem do disposto no artº 281º do C do Trabalho e nas diversas alíneas do artº 15º do Dec. Lei nº 102/2009, de 10/09, com referência ao disposto no artº 5º, nº 1 do mesmo diploma. 41º O acidente só ocorreu por falta de elementos coletivos de segurança da obra, mormente por falta de guarda corpos. 42º Tal deveu-se a culpa, que se presume, da Ré empregadora. 43º Como consequência direta e necessária dessa falta de elementos de segurança, o trabalhador caiu de mais de 4 metros de altura, estatelando-se no chão da via pública, vindo a falecer dias depois na sequência das diversas e graves sequelas que sofreu em virtude do grave acidente de que foi vítima. (…) 45º E decorreu por atuação culposa da Ré empregadora por inobservância grosseira das mais elementares regras de segurança no trabalho para a execução das tarefas do trabalhador sinistrado, como resulta claro do disposto no artº 18º deste último diploma. 46º Como consequência de tal atuação culposa da empregadora, esta responde pelos prejuízos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, quer pelo sinistrado, como pelos familiares nos termos gerais – cfr. artº 18º, nº 1 do indicado diploma, assim como artº 283º do C. do Trabalho.”.
- No que toca à responsabilidade do 2º Réu, sob a epígrafe “DA RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO RÉU”, referiu o seguinte: “76º Pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelas AA é solidariamente responsável o Réu, enquanto sócio e gerente da Ré. Com efeito, 77º Ao Réu incumbia, como gerente, o governo da sociedade empregando a diligência de um gestor criterioso e ordenado e zelar pelos interesses da sociedade, dos sócios e de terceiros numa perspetiva de longo prazo, precavendo todos os interesses incluindo o dos trabalhadores, clientes e credores, cabendo-lhe observar deveres de cuidado, empregando para o efeito elevados padrões de diligência profissional e deveres de lealdade, no interesse da sociedade. 78º De entre esses deveres, incumbia ao Réu, nos termos da legislação aplicável, celebrar e manter em vigor com a totalidade dos salários transferidos, contrato de acidentes de trabalho onde incluísse todos os trabalhadores ao seu serviço e por virtude do qual para a seguradora ficasse transferida o risco de indemnizar pelos danos sofridos pelos trabalhadores por acidentes de trabalho. 79º Como incumbia ao Réu, por imperativo legal, diligenciar pela implementação em obra dos...
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1147)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Jerónimo Freitas
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
I. Relatório
Na acção declarativa de condenação, com processo especial emergente de acidente de trabalho, participado alegado acidente de trabalho ocorrido aos 23.05.2018 de que terá sido vítima B… e de que lhe resultou a morte aos 29.07.2018, as AA., C… e D…, nas qualidades de, respectivamente, viúva e filha daquele, apresentaram, aos 11.06.2019, petição inicial demandando E…, Unipessoal, Ldª e F…, tendo formulado os seguintes pedidos:
“A) Deve ser judicialmente declarado que entre o malogrado B… e a sociedade Ré existiu um contrato de trabalho por tempo indeterminado, com a remuneração mensal ilíquida de 950,00€, paga catorze vezes ao ano e que se extinguiu com a morte do sinistrado B…;
B) Ser judicialmente declarado e os RR condenados a reconhecer que o acidente de que foi vítima o trabalhador B… foi acidente de trabalho;
C) Ser judicialmente declarado e os RR condenados a reconhecer que o acidente infortunístico ocorreu com grave violação das regras de segurança por parte da entidade empregadora;
D) Serem os RR solidariamente condenados a pagar:
a) À Autora C… (viúva) a quantia de 85.447,63€, assim descriminada:
i. 50.000,00€ de danos não patrimoniais pela perda do direito à vida do seu falecido marido;
ii. 25.000,00€ de danos não patrimoniais sofridos pela própria em consequência da morte do marido;
iii. 1.709,17€ devida pelo período da incapacidade temporária e absoluta do malogrado B…;
iv. 2.830,74€ a título de subsídio de morte do marido;
v. 3.990,00€ a título de pensão anual e vitalícia, atualizável a partir da idade da reforma;
vi. 1.887,72€ a título de despesas com o funeral e trasladação;
vii. 30,00€ com as despesas que suportou com deslocações feitas por causa do sinistro em questão, incluindo a realizada à diligência de conciliação.
b) À Autora D… (filha) a quantia de 80.490,74 €, como se descrimina:
i. 50.000,00€ de danos não patrimoniais pela perda do direito à vida do seu falecido pai;
ii. 25.000,00€ de danos não patrimoniais sofridos pela própria em consequência da morte do pai;
iii. 2.830,74€ a título de subsídio por morte do pai;
iv. 2.660,00€ a título de pensão anual e temporária;
E) Serem os RR ainda solidariamente condenados a pagar às Autoras os juros vincendos sobre cada uma das quantias e até efetivo pagamento a calcular à taxa de juros civil atualmente de 4% ao ano.”
Para tanto, alegaram, para além do mais, que:
- Aquando do acidente em causa, no dia 23 de Maio de 2018 pelas 10,30h, o sinistrado trabalhava para a 1ª Ré, ao serviço de quem havia sido admitido mediante contrato de trabalho, exercendo as funções de servente de construção civil e auferindo a retribuição mensal de €950,00;
- A 1ª Ré dedica-se à atividade de construção civil e obras públicas, havendo ela e a sociedade comercial G…, Lda sido celebrado contrato de subempreitada, figurando esta como empreiteiro geral da obra referente ao restauro do edifício em causa e aquela como subempreiteira, respeitando os trabalhos subcontratados da responsabilidade da Ré a trabalhos de execução de demolições e pedreiro;
- À data do sinistro decorriam trabalhos de limpeza de escombros do telhado do edifício, tendo o sinistrado, no dia do sinistro, 23.05.2018, deslocando-se para o local onde decorriam os trabalhos acompanhado de um outro trabalhador desta, com funções de chefe de equipa.
- Aquando do acidente o sinistrado encontrava-se a realizar trabalhos de limpeza de escombros no telhado, usando para o efeito uma mangueira e uma vassoura, sendo que, no momento em que se encontrava na cornija a efetuar tais trabalhos, apoiado numa pedra, esta cedeu ou partiu, tendo-se estatelado no chão, caindo de mais de 4 ou 5 metros de altura.
- A Ré empregadora não tinha a sua responsabilidade infortunística transferida para qualquer entidade Seguradora;
- No que se refere à responsabilidade da Ré empregadora, invoca ainda a sua responsabilidade, nos termos do disposto no art. 18º da Lei 98/2009, por haver o acidente decorrido da violação de normas de segurança por parte da Ré empregadora, referindo para tanto o seguinte: “34º. Na obra não existia quaisquer elementos coletivos ou singulares de prevenção de acidentes. 35º Não havia andaimes. 36º Não havia guarda corpos. 37º Não havia arneses nem capacetes, que não haviam sido colocados à disposição dos trabalhadores. 38º À Ré enquanto entidade empregadora competia assegurar todos os meios de segurança pessoais e coletivos de prevenção de acidentes de trabalho, assim como fazer cumprir aos sues subordinados as regras de segurança em vigor. [Cfr. artº 281º do C do Trabalho] 39º Com efeito, a Ré: a. Não planificou nem dispunha de documento dessa planificação destinada à prevenção de sinistros laborais considerando a evolução técnica, a organização do trabalho e condições de trabalho; b. Não tinha identificado os riscos previsíveis em todas as atividades da empresa na conceção ou construção de instalações, de locais e processos de trabalho, nem na selecção de equipamentos destinados a evitar a sinistralidade no trabalho; c. Não tomou em consideração a necessidade de adaptar o tipo de trabalho ao trabalhador em causa; d. Não priorizou as medidas de segurança coletiva em relação às individuais; e. Não elaborou ou divulgou, dando-as a conhecer ao trabalhador sinistrado, instruções compreensíveis e adequadas à atividade desenvolvida pelo trabalhador. 40º A Ré não cumpriu com tais obrigações que para si decorrem do disposto no artº 281º do C do Trabalho e nas diversas alíneas do artº 15º do Dec. Lei nº 102/2009, de 10/09, com referência ao disposto no artº 5º, nº 1 do mesmo diploma. 41º O acidente só ocorreu por falta de elementos coletivos de segurança da obra, mormente por falta de guarda corpos. 42º Tal deveu-se a culpa, que se presume, da Ré empregadora. 43º Como consequência direta e necessária dessa falta de elementos de segurança, o trabalhador caiu de mais de 4 metros de altura, estatelando-se no chão da via pública, vindo a falecer dias depois na sequência das diversas e graves sequelas que sofreu em virtude do grave acidente de que foi vítima. (…) 45º E decorreu por atuação culposa da Ré empregadora por inobservância grosseira das mais elementares regras de segurança no trabalho para a execução das tarefas do trabalhador sinistrado, como resulta claro do disposto no artº 18º deste último diploma. 46º Como consequência de tal atuação culposa da empregadora, esta responde pelos prejuízos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, quer pelo sinistrado, como pelos familiares nos termos gerais – cfr. artº 18º, nº 1 do indicado diploma, assim como artº 283º do C. do Trabalho.”.
- No que toca à responsabilidade do 2º Réu, sob a epígrafe “DA RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO RÉU”, referiu o seguinte: “76º Pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelas AA é solidariamente responsável o Réu, enquanto sócio e gerente da Ré. Com efeito, 77º Ao Réu incumbia, como gerente, o governo da sociedade empregando a diligência de um gestor criterioso e ordenado e zelar pelos interesses da sociedade, dos sócios e de terceiros numa perspetiva de longo prazo, precavendo todos os interesses incluindo o dos trabalhadores, clientes e credores, cabendo-lhe observar deveres de cuidado, empregando para o efeito elevados padrões de diligência profissional e deveres de lealdade, no interesse da sociedade. 78º De entre esses deveres, incumbia ao Réu, nos termos da legislação aplicável, celebrar e manter em vigor com a totalidade dos salários transferidos, contrato de acidentes de trabalho onde incluísse todos os trabalhadores ao seu serviço e por virtude do qual para a seguradora ficasse transferida o risco de indemnizar pelos danos sofridos pelos trabalhadores por acidentes de trabalho. 79º Como incumbia ao Réu, por imperativo legal, diligenciar pela implementação em obra dos...
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