Acórdão nº 6646/04.0TBCSC.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça, 16-05-2019

Data de Julgamento16 Maio 2019
Case OutcomeNEGADA A REVISTA
Classe processualREVISTA
Número Acordão6646/04.0TBCSC.L1.S2
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA



I. RELATÓRIO



AA instaurou acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra BB e mulher, CC, DD e mulher, EE, pedindo:

a) que se declare a Execução Específica do Contrato Promessa de Compra e Venda invocado, emitindo o Tribunal a competente Declaração Judicial que substitua a Escritura Pública de Compra e Venda, em cumprimento do acordado no contrato-promessa celebrado em 14 de Outubro de 1986 relativamente à fracção “O”, correspondente à loja direita do prédio designado por Lote B, sito na Rua …, n° 197, em …, Freguesia do …, descrita na 2ª Conservatória do Registo Predial de … sob a ficha 03...8 da freguesia do …, anteriormente sob o n° 4...9, a folhas 164 v° do Livro B-13 (1.ª), e inscrito na respectiva Matriz sob o artigo 5279;

b) em alternativa, caso não seja possível o Tribunal emitir uma Declaração Judicial (sentença) que produza os efeitos da Declaração negocial em substituição do comportamento faltoso dos RR., serem estes condenados a ver declarada a resolução, por seu incumprimento, do Contrato Promessa atrás descrito, e condenados ainda, a pagar ao A. a quantia 348.625,00 Euros (Pte. 69.893.037$00), e a restituir-lhe a quantia de 29.927,87 Euros (Pte. 6.000.000$00), entregue a título de sinal e reforço de sinal, sendo ambas as quantias acrescidas de juros legais, a partir da citação, até total pagamento, tudo com as legais consequências.

Para o efeito, o A. alegou, em súmula, que celebrou com os RR. um contrato-promessa relativo a uma fracção autónoma no ano de 1986, pelo preço de sete milhões e quinhentos mil escudos (37.409,84 €) dos quais entregou seis milhões de escudos (29.927.87 €). Referiu que não foi ainda possível celebrar a escritura de compra e venda, pro culpa exclusiva dos RR., que invocam, para tanto, que não terem ainda logrado constituir a propriedade horizontal do imóvel onde se situa a fracção.

Competindo aos RR. a marcação do local para a realização da escritura pública – uma vez que a data estava já pré-fixada pelos RR. para o dia 30 de Abril de 1987 -, e não o tendo feito, o A. interpelou os mesmos várias vezes para cumprirem, tendo procedido à marcação da respectiva data para a escritura pública junto do Cartório Notarial, sendo que os RR. nunca compareceram. Passados anos tomou conhecimento que não era possível outorgar a escritura pública por não se encontrar constituída a propriedade horizontal do Bloco onde se situava a loja prometida vender, situação que ainda hoje se mantém.

Perante os graves prejuízos causados por essa situação, o A. comunicou aos RR., em 06 de Junho de 2000, uma proposta de resolução extrajudicial desta situação, propondo-lhes que adquirissem aquela fracção pelo valor de Pte. 40.000.000$00 que, mesmo entendendo que estava muito abaixo do seu valor real, era uma forma de ultrapassar a questão. Dessa proposta nunca recebeu qualquer resposta dos RR.

Perante esta realidade, conclui pela execução do contrato. No caso de a mesma não ser possível pede, em alternativa, que seja declarado o respectivo incumprimento por culpa dos RR., que o devem indemnizar de todos os prejuízos sofridos, nomeadamente, com as despesas com as benfeitorias realizadas na loja, cuja tradição foi realizada com a celebração do contrato promessa, no que despendeu Pte. 15.000.000$00 (€ 75.000,00).

Optando pela indemnização correspondente ao valor do imóvel, ao tempo do incumprimento definitivo do contrato que, segundo defende, ocorreu a 18.10.2001 sendo o seu valor, àquela data, de pelo menos € 273.625,00 o A. conclui pela indemnização global de € 348.625,00 devendo, ainda, serem-lhe restituídas as quantias que entregou a título de sinal e reforço de sinal, no montante de € 29.927,87 sendo que a todas as quantias devem acrescer os juros de mora desde a citação e até integral pagamento.

Com a instalação na fracção prometida vender despendeu a quantia de 75.000,00 Euros, pelo que é manifesto que a simples restituição do sinal prestado em dobro, nem sequer cobriria os prejuízos efectivos sofridos pelo A., mercê da desvalorização monetária ocorrida, desde a data da celebração do contrato, até à data do incumprimento.

Por isso, o A. opta pela indemnização correspondente ao valor, ao tempo do incumprimento (artigo 442º, nº 2 do Código Civil, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 379/86, de 11 de Novembro).

À data do incumprimento definitivo do contrato que se afigura ser a 18.10.2001, data em que foi lavrado o Instrumento Notarial de protesto por falta de comparência dos RR. promitentes vendedores, a fracção em causa prometida vender, valia pelo menos 273.625,00 Euros.

Conclui, assim, que a indemnização a ser-lhe concedida deve, pois, ser computada em 348.625,00 Euros (Esc. 69.893.037$00), devendo ainda serem-lhe restituídas as quantias que entregou, a título de sinal e reforço de sinal, no montante total de 29.927,87 Euros (Esc. 6.000.000$00).

Citados, os Réus contestaram, por impugnação e por excepção, invocando, em súmula:

- a ilegitimidade das Rés mulheres por não terem celebrado o contrato-promessa;

- a ilegitimidade do A., por estar desacompanhado do seu cônjuge;

Defenderam ainda que o que foi prometido vender foi uma fracção autónoma não autonomizada. O A. sabia que o prédio não estava constituído em propriedade horizontal, ficando a data da escritura dependente da constituição da propriedade horizontal.

Os RR. maridos sempre diligenciaram para a constituição da propriedade horizontal, tudo fazendo para cumprir o contrato: inscreveram o mesmo na matriz, solicitaram emissão de licença de habitação, a qual foi concedida, contrataram solicitador para celebrar a escritura da constituição da propriedade horizontal, procederam ao destaque do terreno onde construíram prédio; convocaram reuniões do condomínio entre 1995 e 1997 para autorização da alteração da propriedade horizontal do bloco A, obtendo só a de alguns dos condóminos, contrataram advogado para tal alteração, apresentado acção para suprimento da vontade e encontrando-se a correr termos outra acção para a constituição da propriedade horizontal por usucapião, na qual apresentaram por duas vezes requerimentos a pedir celeridade invocando a dependência da realização das compra e venda relativamente a tal processo.

Defenderam, também, que mesmo que não seja possível a constituição da propriedade horizontal não incumpriram o contrato, ocorrendo, sim, impossibilidade superveniente desse cumprimento.

Referiram ainda que o artigo 442º do Código Civil não é aplicável à simples mora e, no caso, não se verifica o incumprimento definitivo. Só não foi possível outorgar a escritura porque tal implicaria uma alteração à propriedade horizontal do bloco A) e os seus condóminos não a autorizaram.

Propuseram a venda de uma quota do prédio ao A., o que este não aceitou. O A. enviou aos RR. mais duas cartas para além das por aquele juntas informando do estado do processo e vontade de celebrar a escritura.

Referiram que é legítimo que os AA., atento o tempo decorrido, tenham perdido interesse na manutenção do contrato-promessa mas, na acção, certo é que deduziram pedidos incompatíveis uma vez que não é viável a execução específica do contrato-promessa e, em simultâneo, referem que não têm já interesse na sua manutenção.

Defendem ainda que o contrato definitivo não pode ser celebrado enquanto não for constituída a propriedade horizontal – facto que não lhes é imputável -, e que o valor do imóvel era de 150.000,00 €. Em reconvenção, sustentam que os AA. com a instauração desta acção demonstram ter pedido interesse no contrato, pelo que deve ser considerado que o contrato foi incumprido por estes, perdendo o sinal e devendo indemnizar os RR. pelo seu uso ao longo destes anos.

Concluem, assim, pedindo que:

a) sejam declaradas como procedentes por provadas as invocadas excepções de ilegitimidade, absolvendo-se as RR. da instância;

Assim não se entendendo, pedem:

b) que seja a acção declarada improcedente, por não provada, e os RR. absolvidos do pedido;

Em qualquer dos casos:

c) Seja declarada procedente por provada a reconvenção, condenando-se os AA. no pagamento de uma indemnização, nos termos do artigo 473.º do Código Civil, no montante de € 218.500,00 acrescida de juros moratórios desde 14 de Outubro de 1986 até efectivo e integral pagamento, a título de indemnização pela utilização/detenção do imóvel, desde essa data;

d) declarando-se o contrato sub judice como incumprido, por parte do A., atenta a posição tomada nos autos, com a consequente perda do sinal entregue;

e) Assim não se entendendo, deverá vir a reconhecer-se como legítimo, atenta a duração do prazo de cumprimento do contrato, o direito à resolução contratual por parte A., do contrato celebrado, uma vez que este alegou ter falta de interesse na manutenção do contrato promessa, devendo o Tribunal vir a decretar o contrato resolvido, com esse fundamento, com a consequente obrigação de entrega do imóvel aos RR., por parte do AA. e a obrigação de estes procederem à devolução do sinal em singelo, sem mais.

O A. replicou, pugnando pela improcedência das excepções de ilegitimidade e pedindo, à cautela, o chamamento do seu cônjuge, e impugnando o teor da contestação e reconvenção.

Foi suspenso o processo até trânsito em julgado da sentença que viesse a ser proferida no processo em que foi peticionada, pelos aqui RR., a constituição da propriedade horizontal por usucapião – Proc. 380/00, daquela mesmo Tribunal de Cascais.

Tendo o A. falecido no decurso da acção, vieram a ser habilitados, para em seu lugar prosseguirem a acção, FF, GG, HH e II.

Tendo também o Réu BB falecido no decurso da acção, vieram a ser habilitados, para em seu lugar prosseguirem a acção, JJ, KK, LL e a Ré mulher, CC, cônjuge que foi deste primitivo Réu.

Falecida ainda a primitiva Ré EE, vieram a ser habilitados, para no seu lugar prosseguirem a acção,...

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