Acórdão Nº 660/22 de Tribunal Constitucional, 18-10-2022

Número Acordão660/22
Número do processo507/22
Data18 Outubro 2022
Classe processualRecurso

ACÓRDÃO Nº 660/2022

Processo n.º 507/2022

1.ª Secção

Relatora: Conselheira Maria Benedita Urbano

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – RELATÓRIO

1. A., S.A., e B., embargantes e recorrentes nos presentes autos, na sequência da dedução de embargos de executados contra o exequente C., S.A. (atualmente C1, S.A.) – que foram julgados parcialmente procedentes na primeira instância –, interpuseram, junto do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), recurso de apelação da sentença do Juízo de Execução de Lisboa do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, concluindo as suas alegações pela seguinte forma:

“a) O contrato de consolidação de crédito, parte integrante do título executivo composto, não se encontra assinado pelo banco embargado.

b) A falta de assinatura do contrato referido na conclusão a), redunda na insuficiência do título executivo.

c) O requerimento executivo deve ser liminarmente indeferido, atento a insuficiência do título, nos termos da alín. b), n.º 2 do artigo 726 do CPC.

d) O banco exequente, só em sede de contestação aos embargos juntou o contrato de consolidação firmado por ambas as partes, conforme se impunha ab initio.

e) A decisão recorrida aceitou o suprimento da irregularidade, sustentada no disposto do artigo 146, n.º 2, do CPC.

f) O suprimento de irregularidades do requerimento executivo tem regime próprio – artigo 726, n.º 4, do CPC.

g) Como tal, excluída está a aplicação do regime adotado pelo tribunal a quo – artigo 146, n.º 2, do CPC.

h) Acresce que, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 726 do CPC, não é admissível o suprimento do referido vício.

i) O princípio da preclusão deixa assente que os atos das partes devem ser praticados nas fases próprias.

j) Sob pena de constranger o direito de defesa da parte contrária – artigo 573 do CPC.

k) A junção do contrato assinado pelas partes, em sede de contestação aos embargos, viola o princípio da preclusão, pelo que;

l) Não deve ser admitida o suprimento da insuficiência do título, devendo o requerimento executivo ser liminarmente indeferido.

m) Violou a douta decisão recorrida os artigos 726, n.º 2, alín. b) e n.º 4 do CPC.

n) A decisão recorrida entendeu que a alegação do artigo 42 da petição de embargos era genérica e conclusiva.

o) Ao abrigo do artigo 5, n.º 2, alín. b), do CPC, estava ao alcance do tribunal apurar os factos que seriam ou não concretização da matéria alegada pelos recorrentes naquele artigo 42.

p) Deve a decisão proferida ser anulada parcialmente, por ser indispensável a ampliação da matéria de facto, devendo a 1ª instância apurar se o contrato era ou não complexo, tal como se estava ou não ao alcance da compreensão dos recorrentes.

q) Revelam-se os factos do artigo 42 dos embargos essenciais para apurar qual a matéria que se justificava ou não aclarar aos recorrentes pelo banco recorrido, ao abrigo do dever de informação – art.º 6º do DL 446/85.

r) Violou a douta decisão recorrida os artigos 5, nº 2, alínea b); 6º nº 2 in fine; 411; 590, nº 4, todos do CPC e art.º 236 do CC.

s) Com a produção de prova testemunhal, designadamente com o depoimento das testemunhas da embargante, D., E. e F., teve o tribunal conhecimento de factos pessoais da recorrente, B..

t) Nomeadamente, que é pessoa de idade avançada, sem instrução e desprendida da vida das sociedades nas quais ocupa cargos de administração, apenas pelo facto de ser a cônjuge sobreviva do fundador do grupo.

u) Acresce que, em declarações de parte, G., corroborou o depoimento das testemunhas.

v) Nos autos, em parte, discute-se a complexidade das cláusulas do contrato, que é de adesão, bem como se foram cumpridos os deveres da predisponente, ao abrigo das Cláusulas Contratuais Gerais.

w) Para a boa decisão da causa, é de sobremaneira importante que o tribunal conheça da dita factualidade, da qual a parte contrária teve direito ao contraditório.

x) É dever do tribunal, ao abrigo do princípio do inquisitório e da aquisição processual, conhecer dos factos trazidos à colação, pelos depoimentos das aludidas testemunhas.

y) Não o fazendo, violou o tribunal recorrido os princípios do contraditório – artigo 411 do CPC; da aquisição processual e o dever de gestão processual – artigo 6 do CPC, que se impunha para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa.

z) O contrato, oferecido enquanto título executivo, configura um contrato de adesão.

aa) No contrato, apenas mereceram negociação as cláusulas referentes ao capital; objeto do contrato; prazo de pagamento; taxas de juros; spreads e garantias.

bb) O contrato foi colocado à disposição das recorrentes "com a antecipação de pelo menos um dia em relação ao dia em que os assinaram, sendo que no caso do contrato de consolidação celebrado a 25.06.2012, uma segunda-feira, a minuta foi disponibilizada na sexta-feira anterior", conforme se retira do ponto 8 da matéria de facto dado como provada.

cc) A sociedade executada estava em situação económica difícil e o contrato de consolidação foi posto à disposição dos recorrentes no sábado ou domingo imediatamente anterior à 2ª feira - 25/06/2012, em que as partes assinaram o contrato;

dd) Tendo em conta a importância do contrato de consolidação, a extensão e complexidade das suas cláusulas, a antecedência de um ou dois dias não tornava possível aos recorrentes ter um conhecimento completo e efetivo do conteúdo das cláusulas contratuais, tanto mais que esses dias de reflexão calharam ao fim de semana;

ee) O banco recorrido violou o dever de comunicação previsto no artº 5º do DL 446/85, devendo o clausulado de todo o contrato ser considerado nulo, artº 286, do CC, e por contágio a livrança dada à execução.

ff) A decisão recorrida, entendendo que o dever de comunicação foi observado, violou os artigos 5º e 8º, alínea a), ambos do DL 446/85 e o artigo 280, nº 1, do Código Civil;

gg) O banco recorrido utilizou cláusulas contratuais gerais no contrato de consolidação de fls e não as comunicou aos recorrentes;

hh) Perante as circunstâncias do acordo supra – valor do contrato; situação económica difícil da sociedade executada; extensão e complexidade do contrato e nível de conhecimentos jurídico-bancários das contrapartes, exigia-se que o banco esclarecesse os recorrentes, com antecedência necessária, do teor de várias cláusulas compreendidas no contrato – vg Compensação de Créditos; Novação; Anatocismo; incumprimento e consequências;

ii) O banco recorrido não cumpriu com o dever de informação, artigo 6º, nº 1 do DL 446/85, devido aos recorrentes relativamente a aspetos essenciais do contrato de consolidação de fls.

jj) A decisão recorrida, entendendo que o dever de informação foi observado, violou os artigos 6º e 8º, alínea a), ambos do DL 446/85 e o artigo 280, nº 1, do Código Civil;

kk) O negócio jurídico deve ser considerado totalmente nulo, porquanto as cláusulas não explicadas aos recorrentes, do ponto de vista estrutural do contrato, tinham carácter essencial – artº 9º, nº 2, do DL 446/85, e, por contágio nula, deve ser declarada a livrança dada à execução.

ll) O banco embargado não estavam devidamente representados, para interpelar os executados.

mm) A procuração junta aos autos é forense e destina-se, somente, à representação judicial.

nn) Teria, a procuração, que compreender poderes especiais extrajudiciais, para o banco ter legitimidade para interpelar os executados.

oo) Face ao exposto, as interpelações são ineficazes.

pp) Assim, os executados estão em mora desde a data da citação judicial.

qq) A interpelação prévia dos recorrentes pelo banco recorrido estava incompleta, ao não indicar forma de cálculo do valor aposto na livrança dada à execução, sendo nula;

rr) O prazo concedido pelo banco recorrido aos recorrentes para pagarem o valor aposto na livrança oferecida à execução é irrazoável, devendo a resolução do contrato de consolidação, com o consequente vencimento de todas as prestações, ser declarada ineficaz, para todos os efeitos legais.

ss) A decisão recorrida ao considerar que a comunicação supra preenchia os requisitos legais, incluindo todos os elementos necessários comunicar à contraparte e que o prazo concedido é razoável, violou os artºs 280, nºs 1 e 2; 808/1 e artº 781, ambos do CC, tal como o artº artº 726, nº 2, al. c), do CPC, não rejeitando liminarmente a execução.

tt) Deve a comunicação em causa ser considerada nula, oficiosamente, nos termos do artº 286, do CC”.

2. No TRL foi proferido acórdão em que se decidiu, além do mais, negar “provimento ao recurso e, consequentemente, confirma-se a douta decisão recorrida”, aí se escrevendo, inter alia, o que segue:

“Da arguida nulidade do título executivo, a livrança, por falta de data da mesma e por não constar da mesma o carimbo da Apelante sociedade nem a assinatura dos administradores, pronunciou-se o tribunal no despacho saneador de que não foi interposto recurso, pelo que tal decisão transitou.

Entendem as Apelante que existe insuficiência/nulidade do título executivo, por o contrato de consolidação de 25/6/2012, subjacente à livrança não se encontrar assinado pelo Apelado/Embargado.

Com efeito, o Apelado juntou uma cópia do contrato só com as assinaturas das Apelantes, mas logo que a falha foi apontada o Apelado veio juntar aos autos a cópia com a assinatura das Apelantes...

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