Acórdão nº 659/09.3GBAMT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 14-04-2010

Data de Julgamento14 Abril 2010
Número Acordão659/09.3GBAMT.P1
Ano2010
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Recurso n.º 659/09.3GBAMT.P1
Presidente: Baião Papão. Relator: Joaquim Correia Gomes; Adjunta: Paula Guerreiro.

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

I.- RELATÓRIO

1.- No Processo n.º 659/09.3GBAMT.P1 do 1.º Juízo do Tribunal de Amarante, em que são:

Recorrente: Ministério Público.
Recorrido/Arguido: B……………...

foi proferida sentença em 2009/Jul./01, a fls. 19-22, que absolveu o arguido da prática, como autor material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez da previsão do art. 292.º, do Código Penal e determinou a remessa do auto de noticia e dessa mesma sentença ao IMTT.
2. O Ministério Público interpôs recurso em 2009/Jul./07 a fls. 25-34, pugnando pela revogação dessa sentença e subsequente condenação do arguido, concluindo que:
1.º) Nos termos do art. 153,º, n.º 1, do Código da Estrada, o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito;
2.º) A exigência de aprovação do aparelho utilizado para a pesquisa de álcool no ar expirado e as regras de controlo metrológico encontram-se na portaria 1556/2007, de 10/12, a qual passou a acolher a Recomendação da OIML R 126, publicada em 1998;
3.º) Resulta do referido Decreto-Lei que os instrumentos de medição estão sujeitos a controlo, o qual compreende uma de várias operações: a aprovação de modelo; primeira verificação; verificação periódica; e verificação extraordinária;
4.º) Porém, seja qual for a realidade ponderada, envolve necessariamente uma margem de incerteza quanto aos valores finais registados, pelo que se prevê no D.L. de 291/91 de 20/9, «tolerâncias admissíveis» e na portaria 110/91, de 6/02 de «erro máximo admissível, para mais ou para menos, da concentração de álcool etílico», ou EMA;
5.º) Assim, os instrumentos que não ultrapassem a margem de tolerância admissível são aprovados e neles aposto o correspondente símbolo atestador de qualidade e fiabilidade, de acordo com o regulamento geral do controlo metrológico, constante da portaria n.º 962/90, de 09/10;
6.º) Pelo que, quaisquer deduções que a esta TAS sejam feitas carecem de fundamento legal e mesmo de suporte técnico-científico;
7.º) O Tribunal “a quo”, ao não ter atendido à TAS inscrita no talão constante dos autos e, consequentemente, ao ter dado como provado que o arguido conduzia influenciado por uma taxa de 1,15g/1, incorreu em erro notório na apreciação da prova, nos termos do disposto no artigo 410º, nº 2, al. c) do Código de Processo Penal;
8.º) O arguido, embora pudesse ter questionado o resultado do teste, solicitando a realização de contraprova, seja por expiração de ar, seja sanguíneo, não o fez;
9.º) Não tinha, pois o Tribunal “a quo” qualquer fundamento para concluir que a TAS indicado pelo aparelho utilizado na pesquisa de álcool no ar expirado pelo arguido padecia de erro;
10.º) É o Tribunal o competente para conhecer da prática da contra-ordenação, atento o disposto no artigo 77º, n.º 1 do RGCOC, não devendo os autos serem remetidos ao IMTT para procedimento contra-ordenacional.
3. O arguido não respondeu e o Ministério Público emitiu parecer em 2009/Nov./04, no sentido da procedência do recurso.
4. Por despacho proferido em 2009/Dez./21 foi comunicado ao Ministério Público e ao arguido, a eventualidade deste vir a ser condenado, ao abrigo do art. 39.º, 77.º, n.º 1 do Dec.-Lei n.º 433/82, de 27/Out. [RGCOC], pela prática, como autor material, de uma contra-ordenação da previsão do art. 81.º, n.º 1, 2 e 5 al. b), bem como na sanção acessória de inibição de conduzir prevista nos art. 146.º, al. j) e 147.º, do Código da Estrada.
Mais foi concedido à defesa a possibilidade desta pronunciar-se em conformidade e, se assim o entender, requerer a realização da audiência, estando para o efeito presente ou representado pelo seu advogado.
5. Na sequência deste despacho o arguido nada disse, tendo o Ministério Público requerido em 2010/Jan./19, a fls. 55 que se dê este último despacho sem efeito, porquanto não estando estabelecida a possibilidade legal do recorrido requerer a audiência o mesmo é nulo.
6. Colheram-se os vistos legais, nada obstando que se conheça do mérito deste recurso.
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O objecto deste recurso cinge-se à questão da dedução da taxa do erro máximo admissível (EMA) na taxa de álcool no sangue [a)] e, caso se mantenha o sentenciado nesta parte, se devia ter tido ou deve ter lugar a condenação pela contra-ordenação por condução em estado de embriaguez [b)], conhecendo-se aqui da questão suscitada pelo Ministério Público nesta Relação, pese a sua inutilidade já que o recorrido nada requereu.
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II.- FUNDAMENTAÇÃO
1. A sentença recorrida
“1 – Resultou provada a seguinte factualidade:
a) No dia 26.6.09, pelas 2h 43 minutos, o arguido conduzia o veículo de matrícula ..-AC-.., tipo ligeiro na Avenida dos Combatentes do Ultramar, Madalena Amarante.
b) Submetido ao exame de pesquisa de álcool no sangue, o arguido apresentou uma taxa de álcool no sangue de, pelo menos, 1,15 g/l, deduzida já a taxa de erro máximo admissível de 1,24, apresentada no exame de pesquisa do álcool ao ar expirado.
c) O arguido sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas, sabia que estava a conduzir um veículo nessas condições, o que quis.
d) O arguido não tem antecedentes criminais.
e) O arguido é solteiro, tem o 12.° ano de escolaridade, vive com a sua companheira que trabalha, em casa arrendada pela qual paga a quantia de € 230,00 mensais.
2 - Não se provou:
- Que a taxa de álcool no sangue apresentada pelo arguido quando conduzia o veiculo em causa fosse de 1,24 gm/litro de sangue, nem que não fosse.
3 - O Tribunal fundou a sua convicção:
a) No auto de noticia de folhas 3 e 4 e no exame junto aos autos a fls. 10.
O arguido admitiu ter ingerido bebidas alcoólicas, sabendo que não podia conduzir naquelas circunstâncias. Manteve uma postura de colaboração para com o tribunal.
Todavia e compulsados os autos podemos constatar que não foi deduzida a taxa de erro máximo admissível, aplicável aos aparelhos de pesquisa de álcool no sangue através do ar expirado alcoolímetros – por força da recomendação da Organização internacional de Metrologia, e na sequencia da portaria 748/94, e 13.6 ponto 6 al. a) e c) da citada portaria.
Tal taxa de erro situa-se entre os 7,5%, quando o alcoolímetro apresente uma TAS entre 0,92g/l e 2,30 g/l – Norma FX 20 – 701.
Ora deduzida tal percentagem à taxa de 1,24 apresentada pelo arguido no alcoolímetro, “in casu”, temos uma taxa corrigida que se fixa em 1,15 g/, razão porque não se deu como provado que dita taxa se cifrasse em 1,24gm/l.
b) No Certificado do Registo Criminal de fls. 12 e nas declarações do arguido quanto á sua situação pessoal.”
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2. Os fundamentos do recurso
a) A dedução do EMA na taxa de álcool no sangue
A presente questão tem sido por demais controvertida, tendo a jurisprudência desta Relação e não só manifestado posicionamentos distintos.
Segundo um deles, havendo confissão integral e sem reservas, quanto ao objecto da acusação nos casos em que a mesma tem a cominação plena e total, nomeadamente quanto ao quantitativo da taxa de álcool no sangue, não pode o tribunal dar como assente outro valor distinto, em virtude desses factos confessados estarem subtraídos à livre apreciação do julgador [Ac. desta Relação de 2007/Dez./12, 2008/Fev./06 (CJ I/), 2008/Mai./28, 2008/Mai./07, 2008/Abr./23, 2008/Jul./09, 2008/Out./1, 2008/Out./10, 2008/Nov./12 e 2009/Jan./14].[1]
Esta orientação tem sido seguida noutras Relações, designadamente em Coimbra [2007/Dez./12, 2008/Jan./30, 2008/Nov./11, 2008/Dez./08], Lisboa [2007/Out./03 (CJ IV/), 2008/Fev./28] e Évora [2008/Fev./12][2]
Outro posicionamento já sustenta precisamente o contrário, ao decidir que sendo o próprio legislador a admitir que os alcoolímetros estão sujeitos a margens de erro, o juiz deve corrigir esse erro, usando a certeza do erro mínimo, pois se o não fizer, ocorre um erro notório na apreciação da prova [Ac. desta Relação de 2007/Dez./19, 2008/Mai./07, 2008/Abr./02 (CJ II/ ); 2008/Mai./14 (CJ III/), 2008/Out./15, 2008/Out./22, 2008/Nov./26, 2009/Jan./21, 2009/Set./30, 2009/Dez./09].[3]
Também noutras Relações tem sido este o caminho seguido, como sucedeu em Coimbra [2008/Jan./09], Guimarães [2007/Fev./26 (CJ I/] e
...

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