Acórdão nº 658/13.0TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 12-05-2016

Data de Julgamento12 Maio 2016
Case OutcomeNEGADA A REVISTA
Classe processualREVISTA
Número Acordão658/13.0TVLSB.L1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I. Relatório:

O Gabinete Português da Carta Verde instaurou, em 05/04/2013, acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra o Fundo de Garantia Automóvel, pedindo que fosse condenado a pagar-lhe a quantia de 113.743,64 €, acrescida dos juros legais vencidos e vincendos desde a citação até integral pagamento.

Alegou, em síntese, que, em 09/07/2000, ocorreu um acidente de viação em Espanha, no qual foi interveniente o veículo de matrícula portuguesa QH-...-..., veículo que estaria seguro na companhia de seguros AGF, em razão do que a seguradora AA passou a gerir o sinistro e, no âmbito dessa gestão, efectuou transacção judicial com os lesados ocupantes do veículo de matrícula portuguesa e prosseguiu negociações com o proprietário da viatura espanhola. Tendo sido, entretanto, informada pela sua representada AGF de que o veículo QH-...-... não tinha seguro e de que, por tal razão, não assumiria o sinistro, a AA reclamou junto do organismo espanhol congénere, BB, com base na Convenção Multilateral de Garantia. O Gabinete Português da Carta Verde assumiu o sinistro e autorizou a BB a prosseguir com a gestão do processo, do que deu conhecimento ao Réu Fundo de Garantia Automóvel

Em 12/01/2004, Gabinete Português da Carta Verde recebeu o pedido de reembolso da BB, que satisfez pelo montante de 113.743,64 €, recusando-se o Fundo de Garantia Automóvel a reembolsá-lo, por sua vez, dessa quantia.

O réu contestou.

No que agora releva, alegou que, nos termos do artigo 55º do DL 291/2007, de 21/08, o Fundo de Garantia Automóvel reembolsa o Gabinete Português da Carta Verde desde que este demonstre que o acidente ocorreu por responsabilidade do condutor da viatura matriculada ou habitualmente estacionada em Portugal, requisito que se não verifica.

Realizada audiência final, foi proferida sentença que julgou a acção procedente e condenou o réu Fundo de Garantia Automóvel a pagar ao autor Gabinete Português da Carta Verde a quantia de 113.743,64 €, acrescida de juros de mora, à taxa anual de 4%, contados desde 10/04/2014 até integral e efectivo pagamento.

O réu Fundo de Garantia Automóvel apelou, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa julgado, por unanimidade, a apelação improcedente e confirmado a decisão recorrida.

De novo inconformado, veio o réu interpor recurso de revista excepcional com fundamento no disposto no artigo 672º nº 1 al. a) do Código de Processo Civil, recurso que foi admitido pela formação prevista no nº 3 daquele artigo.

Na alegação de recurso aduziu a seguinte síntese conclusiva:

«A) O Tribunal recorrido negou provimento à apelação, confirmando a decisão de la Instância, tendo o ora Rec.te supra fundamentado a excepcionalidade da presente revista;

B) A decisão de 1ª Instância restringiu os temas da prova e o objecto do litígio á mera comprovação da existência de um acidente de viação ocorrido em Espanha em que foi interveniente um veículo Português que não beneficiava de seguro válido e eficaz;

C) Quando deveria ter entendido que a causa de pedir se destina à efectivação de responsabilidade civil decorrente de acidente de viação, devendo para tanto, o Autor efectuar a respectiva prova sobre as circunstâncias do acidente e fundamentar os seus pagamentos, nos termos do disposto no art.º 55° do DL 291/2007 de 21.08.

D) Pois não basta que um veículo circule, sem seguro de responsabilidade civil automóvel válido ou eficaz, para que se lhe possa atribuir a responsabilidade pelo acidente, nem sequer presumi-la, devendo para tanto, ficar demonstrada sua culpa na produção do mesmo, para que possa, no caso em concreto o GPCV reembolsar o Gabinete gestor e consequentemente, ser reembolsado pelo FGA.

E) A douta sentença recorrida violou, assim, os art°s 54°, 55° e 62° nº 1, todos do DL 291/2007 de 21.08».

Finalizou, pedindo a revogação do acórdão recorrido, no âmbito delimitado pelo objecto do presente recurso.

Não houve contra-alegação.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II. Fundamentos:

De facto:

Vêm provados os seguintes factos:

1) No dia 9 de Julho de 2000, em Espanha, o veículo automóvel de matrícula portuguesa QH-...-... embateu num veículo automóvel de matrícula espanhola.

2) Em Novembro de 2000, a seguradora belga “CC” confirmou à seguradora espanhola “AA” a existência de uma carta verde por si emitida que cobria a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo QH-...-....

3) Nesta sequência, a seguradora espanhola “AA” assumiu a gestão do sinistro automóvel enquanto correspondente da seguradora belga.

4) A seguradora espanhola celebrou transacção judicial com os lesados ocupantes do veículo QH-...-... enquanto correspondente da seguradora belga.

5) Em Março de 2001, a seguradora belga comunicou à seguradora espanhola que a carta verde era falsa e recusou assumir a responsabilidade pelo sinistro.

6) À data referida em 5) a seguradora espanhola já tinha despendido determinado montante, a título de indemnização, com a regularização do sinistro.

7) Em virtude deste facto, a seguradora espanhola solicitou a intervenção do organismo congénere do autor, Oficina Española de Aseguradores de Automóviles, expondo-lhe os factos acima referidos.

8) Este organismo pagou à seguradora espanhola o montante indemnizatório suportado por esta, com o que despendeu, incluindo os encargos de gestão do sinistro, a quantia de €113.743,64.

9) O autor reembolsou, a 5 de Maio de 2008, o organismo congénere espanhol, a pedido deste, da importância referida em 8).

10) A responsabilidade civil emergente da circulação do veículo QH-...-... não se encontrava transferida, à data do sinistro, para qualquer companhia de seguros, através de contrato de seguro, válido e eficaz.

De direito:

O objecto do presente recurso, tal como está delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, está centrado na questão de saber se para a procedência do pedido de reembolso deduzido pelo Gabinete Português de Carta Verde (GPCV) contra o Fundo de Garantia Automóvel (FGA) é exigível também a alegação e prova pelo primeiro de que o acidente ocorreu por culpa do condutor do...

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