Acórdão nº 6132/18.1T8ALM.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 16-12-2021

Data de Julgamento16 Dezembro 2021
Case OutcomeCONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA.
Classe processualREVISTA
Número Acordão6132/18.1T8ALM.L1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Processo n.º 6132/18.1T8ALM.L1.S1
Revista: Tribunal recorrido – Relação ..., ... Secção



Acordam na 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça



I) RELATÓRIO

1. AA intentou ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra «Condomínio do Prédio sito na Rua ..., ...», representado por «ADGlobal – Administração de condomínios de Fernando Ramalho, Unipessoal, Lda.», pedindo a sua condenação a: “a) Realizar as necessárias obras de reparação e impermeabilização do terraço, num prazo não superior a 30 dias após a decisão da presente ação, se compreendido em tempo seco, designadamente, entre 21 de Junho e 15 de Outubro, suportando a totalidade dos custos das obras, atentos os prejuízos sofridos pela A. b) A pagar à A. a quantia de 32.620,00, bem como os juros de mora que se vencerem desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.”
Alegou, em síntese, que é proprietária de uma fracção autónoma no prédio em questão e existem infiltrações provenientes do terraço de cobertura para a sua fracção desde, pelo menos, 2009, entrando água em todas as divisões. A Autora ainda arrendou a fracção, mas os inquilinos recusaram-se a pagar as rendas, devido às infiltrações. Foram efectuados diversos contactos junto da administração do condomínio com vista a que esta diligenciasse pela reparação do terraço e sua impermeabilização; contudo, a assembleia dos condóminos tem dado prioridade a outras obras. A autora tem sofrido diversos danos nas paredes, tectos, com queda de estuque, nos soalhos. Acresce que está impossibilitada de arrendar o locado por causa das infiltrações, tendo perdido 8 meses de rendas que os seus inquilinos não pagaram, além das que auferiria se tivesse arrendado subsequentemente a fracção, por 300,00€. Invocou ainda a existência de danos não patrimoniais.

2. O Réu apresentou Contestação. Invocou a prescrição do invocado direito da Autora, uma vez que tem conhecimento do mesmo há mais de três anos. Defendeu-se por impugnação: alegou que a Autora não pode pedir qualquer indemnização por perda de rendas desde que foi viver para a fracção com a sua mãe, uma vez que isso a impede de proceder ao seu arrendamento; também que apenas em 2014 a Autora contactou a administração do condomínio; como não eram pagas prestações do condomínio relativamente a fracção desde 2009, demandou a Autora no Julgado de paz, tendo celebrado um acordo de mediação, pelo qual acordaram na realização de assembleia de condóminos, com vista à aprovação de obras no terraço e simultaneamente para se acertar a compensação de créditos com a aqui Autora; nessa assembleia foram rejeitados os orçamentos para obras propostas, ficando por deliberar a compensação de créditos, consequentemente; desde então, a Autora não voltou a comparecer às assembleias e foi deliberado dar prioridade a outras obras de que o prédio também necessita; foi instaurada execução contra a Autora, para pagamento das quotas do condomínio; não obstante, foi convocada assembleia para a realização das obras no terraço, mas será necessário reunir fundos monetários para as realizar, o que demorará alguns meses. Concluiu pela absolvição do peticionado pela Autora.

3. A Autora apresentou Resposta em contraditório relativo à matéria de excepção; nomeadamente, alegou que deduziu pedido reconvencional na acção que correu termos no Julgado de Paz, o que interrompeu a prescrição, tal como o reconhecimento do direito efetuado pelo réu; defendeu que o facto ilícito gerador de responsabilidade civil também constitui crime, pelo que o prazo prescricional é mais longo, de 5 ou 10 anos.

4. A Autora requereu a ampliação do pedido (art. 265º, 2, CPC), peticionando a condenação do Réu no pagamento de mais 2 400,00€, a título de rendas perdidas pela Autora. Esta ampliação foi admitida por despacho proferido na segunda sessão da audiência de discussão e julgamento.

5. O Juiz ... do Juízo Local Cível ... proferiu sentença na qual, apurada a matéria de facto provada e não provada, submeteu a decisão as questões identificadas –
a saber: “Se se verifica a prescrição de eventual indemnização a que a autora tenha direito; Não estando prescrito, na totalidade ou parcialmente, se se verifica responsabilidade civil do condomínio por danos verificados; Existindo responsabilidade, a quantificação da indemnização devida”
e julgou a acção improcedente e, consequentemente, determinou a absolvição do Réu do pedido.

6. A Autor, sem se conformar, interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação ... (TR..).
Identificadas as questões –

“- Deveria ter sido considerado não provado que, desde Maio de 2009, não tinha sido paga qualquer quotização ao condomínio, e que a sua dívida, em singelo, fosse de 4 517,00 €, no terceiro trimestre de 2018?
- Deveria ter constado dos factos dados como provados a pintura do quarto e da janela, com base na decisão que correu termos no Julgado de Paz?
- Os problemas respiratórios e esqueléticos da recorrente, que se agravaram com a humidade, podem ser feitos, não só com base na experiência comum, mas, também, com base nos documentos de fls. 56 e 57?
- A douta decisão impugnada é nula posto que não se pronunciou quanto à pretensão do apelado ser condenado a realizar as obras necessárias com vista à eliminação da origem dos danos sofridos pela ora recorrente no interior do imóvel noticiado nos autos, nem quanto respeitante à perda de rendas, pela impossibilidade de arrendar o imóvel, consequência das infiltrações?
- Provando-se que houve infiltrações, durante o Inverno de 2010/2011, no imóvel da recorrente, nunca tendo sido o mesmo intervencionado com obras de impermeabilização, desde então até à presente data (30 de Setembro de 2019), existe um facto ilícito continuado gerador do dever de indemnizar. Estão reunidos todos os pressupostos da responsabilidade civil que obrigam o recorrido a indemnizar a apelante (art. 483º do C. Civil)?” –,

foi proferida Decisão Sumária (art. 656º CPC), que rejeitou a impugnação da matéria de facto, aceitando os factos fixados em 1.ª instância, e julgou improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Suscitada Reclamação para a Conferência, foi proferido acórdão que confirmou a decisão reclamada.

7. Novamente inconformada, a Autora veio interpor recurso de revista para o STJ: normal, a título principal (invocando a falta de “dupla conformidade”, seja para a sindicação dos poderes atribuídos pelo art. 662º do CPC, seja para a apreciação do mérito na medida de fundamentação distinta das instâncias); excepcional, a título subsidiário, com fundamento no art. 672º, 1, c), do CPC, tendo em conta alegada “oposição jurisprudencial” com o Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido em 10/1/2019, processo n.º 2049/17.5T8GMR.G1, juntando certidão respectiva com nota de trânsito em julgado.
A rematar, apresentou as seguintes Conclusões:

“A – Em termos de admissibilidade do presente recurso como revista normal, encontram-se preenchidos os respectivos requisitos, previstos no art. 671º Nos 1 e 3 do CPC, uma vez que, encontrando-se preenchidos os requisitos gerais de recorribilidade da decisão pela sua natureza, em termos de alçada e sucumbência, de legitimidade da recorrente e oportunidade, não se verifica a chamada dupla conforme que poderia obstar à admissibilidade da revista em termos gerais.

B – De facto, não estamos perante uma dupla conforme, uma vez que, em primeiro lugar, o Tribunal recorrido fez um uso deficiente dos poderes que lhe são conferidos nos termos do art. 662º Nº1 e 2 b) do CPC, não reapreciando a matéria de facto impugnada pela recorrente nos devidos termos e não se pronunciando ou atribuindo qualquer valor ou desvalor aos documentos juntos pela recorrente com as alegações de recurso, à excepção dos documentos nos 56 e 57.

C – Com efeito, a recorrente impugnou, em sede de recurso de apelação, a decisão da 1ª instância sobre os factos vertidos nos pontos Nos 8, 19, 21, 22, 24 e 26 dos factos provados e nas alíneas a), k), l), n), o), p), q), r), s), t), u, v), y), z), aa), bb), cc), dd), ee), ff), gg) e hh), pedindo a sua reapreciação, o que aliás, fundamentou, nos termos do art. 640º do CPC.

D – Porém, face ao pedido da recorrente para o Tribunal recorrido reapreciar tais pontos concretos da matéria de facto, juntando, ao abrigo do disposto nos arts. 651º e 662º nº 2 b) do CPC e dos princípios do inquisitório e da verdade material, 57 documentos com a sua alegação de recurso e uma certidão do processo de execução Nº 9037/13.... (requerida conforme o documento nº 1 junta àquela alegação), por requerimento datado de 13/01/2020 de fls… dos autos do apenso do recurso, o Tribunal a quo limitou-se, relativamente à generalidade desses pontos a reproduzir a fundamentação de facto da sentença da 1ª instância, não se pronunciando sobre o valor probatório dos documentos nºs 1 a 55 juntos com a alegação do recurso de apelação, nem sobre a certidão do processo de execução junta aos autos do apenso de recurso em 13/01/2020, assentando, pelo menos aparentemente, a sua decisão da matéria de facto apenas na prova produzida em 1ª instância, como se não tivesse sido requerido qualquer outro meio de prova.

E – Embora não existam dúvidas de que o Tribunal recorrido aceitou a junção dos documentos em causa, uma vez que se pronunciou sobre o valor dos relatórios juntos como documentos nos 56 e 57 e que a junção da certidão do processo nº 9037/13.... por requerimento de 13/01/2020 nem sequer mereceu a oposição do recorrido que aliás, no que respeita aos documentos nos 1 a 57 se limitou a sustentar a sua inadmissibilidade, não os impugnando, propriamente.

F – Pelas omissões em causa, o Tribunal recorrido fez um mau uso dos poderes-deveres previstos no art. 662º Nº1 e Nº2 do CPC, sendo esta uma das situações em que fica afastada a verificação da chamada dupla
...

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