Acórdão nº 5940/16.2T8GMR.G1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça, 05-12-2019

Judgment Date05 December 2019
Case OutcomeCONCEDIDA A REVISTA
Procedure TypeREVISTA
Acordao Number5940/16.2T8GMR.G1.S2
CourtSupremo Tribunal de Justiça
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

2ª SECÇÃO CÍVEL


I - AA, BB e CC instauraram a presente ação declarativa, com processo comum, contra DD e sua mulher, EE, pedindo a sua condenação a pagarem-lhes a quantia de 124.732,14 euros, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efetivo pagamento.

Alegaram, em síntese[1]:

- Serem herdeiras legitimárias de FF;

- Por sentença transitada em julgado, proferida no âmbito do Proc. n.º 2086/12.6T…, que correu termos na Instância Central, … Secção Cível de …, Juiz …, foi declarado nulo, por simulado, o contrato de compra e venda celebrado por escritura pública de 15/04/2005, entre a 1ª autora e o seu falecido marido, FF, e os réus, mediante o qual estes declaravam vender aos primeiros o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 00…6, de …, pelo preço de 80.000,00 euros, e foi ordenado o cancelamento do registo desta aquisição;

- Foi ainda declarado que, dissimuladamente ao referido contrato de compra e venda, foi celebrado entre os aí autores e réus um contrato de mútuo no valor de 40.000,00, com hipoteca, por via do qual os autores entregaram aos réus essa quantia, obrigando-se estes a restituí-la; mais se declarou a ineficácia total desta hipoteca, inclusivamente entre os aí Autores e Réus;

- Pouco tempo após a outorga daquela escritura, a autora AA foi contactada pelo réu marido, que lhe solicitou mais um empréstimo em dinheiro;

- O réu marido argumentou perante a autora que uma vez que a propriedade do prédio objeto da escritura simulada havia sido transmitida para esta e para o seu marido, estes poderiam dar cumprimento às obrigações dos réus, nomeadamente, proceder à liquidação de um empréstimo bancário de cerca de 67.000,00 euros, bem como ao pagamento de outras despesas correntes, e que, após essa liquidação, os réus entregariam à autora e a seu marido esse prédio, livre e devoluto, no prazo máximo de seis meses, ou celebrariam com eles um contrato de arrendamento;

- Confiando nos réus, a autora AA e o seu falecido marido suportaram as despesas destes e pagaram ao Banco GG a quantia de 67.186,23 euros; pagaram ainda à Administração Fiscal a quantia de 2.773,10 euros, em virtude da atualização do valor patrimonial desse prédio;

- Os réus solicitaram à Autora AA e marido o pagamento de outras dívidas suas, o que estes fizeram, entregando-lhes os réus como meio de prova de tal empréstimo um cheque titulando a quantia de 8.067,47 euros;

- Os autores pagaram de IMI relativo àquele prédio, entre 2005 e 2016, a quantia global de 6.705,34 euros;

- Apesar de reconhecerem serem devedores dos autores daquelas quantias, no montante global de 124.732,14 euros (soma das quantias parcelares de € 40.000,00, € 67.186,23 € 2.773,10, € 8.067,47 e € 6.705,34), os Réus nunca apresentaram qualquer proposta para liquidação dessa dívida, vindo protelando com falsas promessas o pagamento;

- Ao não pagarem as quantias peticionadas aos autores, os réus enriqueceram-se à custa do património daqueles.

Os Réus contestaram.

Para além de deduzirem as exceções dilatórias de ilegitimidade ativa das autoras e da ineptidão da petição inicial que foram julgadas improcedentes em sede de despacho saneador, alegaram em síntese que:

- As quantias de 2.773,10 euros e de 6.705,34 euros foram suportadas pela 1ª autora por vontade e interesses próprios.

- A quantia de 8.067,47 euros foi emprestada pela 1ª Autora à sociedade “HH, Lda.”, da qual o 1º Réu era sócio;

E deduziram a exceção perentória da compensação, sustentando que:

- No que à quantia de 67.186,23 euros respeita, a 1ª autora contratou com o 1º réu, verbalmente, as empreitadas de expansão e modernização da farmácia que possuía com o seu falecido marido, tendo-lhe entregue a especialidade de toda a carpintaria;

- O valor dessa empreitada alcançou valor não inferior a 75.000,00 euros;

- Terminada essa empreitada, porque o 1º réu tinha penhoras de contas e não lhe convinha receber em cheque ou através de outro título o respetivo preço e porque a 1ª autora não podia pagar, em dinheiro, tão elevado valor, esta propôs ao 1º réu que este e a mulher simulassem vender-lhe o prédio que possuíam e onde habitavam, pelo preço declarado de 80.000,00 euros, liquidando a autora o valor da empreitada – 70/75.000,00 euros – através do pagamento do valor que os réus tinham em débito ao GG e compensaria o valor que pagasse com o valor da empreitada executada pelo 1º Réu;

- Feitas as contas, subsistindo uma dívida dos réus à 1ª autora de 40.000.00 euros, nunca ficou estabelecido no tempo prazo para o seu pagamento, ficando no entanto tal dívida garantida pela titularidade do direito de propriedade do prédio objeto da escritura de compra e venda;

- Por conta do preço daquela empreitada, o 1º réu apenas recebeu da 1ª autora e do seu falecido marido a quantia de 5.000,00 euros;

- Se as Autoras pretendem receber o valor que a 1ª Autora liquidou ao GG em data posterior à outorga da escritura de compra e venda, então impõe-se compensar nesse valor o valor da empreitada realizada pelo 1º Réu, para o que requerem a realização de perícia.

Concluem que apenas devem à 1ª autora e a esta e às restantes autoras ou à herança que representam a quantia de 40.000,00 euros.

Houve resposta das autoras e realizou-se a perícia requerida pelos réus.

Realizada a audiência final, foi preferida sentença onde foi emitido o seguinte comando decisório:

“Pelo exposto, julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência, condeno os Réus DD e mulher EE a pagar às Autoras a quantia de € 116.664,67 (cento e dezasseis mil, seiscentos e sessenta e quatro euros e sessenta e sete cêntimos), acrescida de juros moratórios, vencidos e vincendos, calculados à taxa legal emergente do disposto no artigo 559º do C. Civil, desde 31 de Outubro de 2016 e até integral pagamento”.

Apelaram os réus, tendo a Relação de Guimarães proferido acórdão que, julgando o recurso improcedente, confirmou a sentença recorrida.

Ainda irresignados quanto à parte do acórdão que, confirmando a sentença, os condenou a pagar às autoras a quantia de € 67.186,23, os réus trouxeram a este STJ a presente revista excecional que foi recebida por acórdão da Formação a que alude o nº 3 do art. 672º do CPC.[2]

Apresentaram alegações onde, pedindo a sua absolvição quanto a esta parte do pedido, formularam as conclusões que, expurgadas das exclusivamente atinentes à admissibilidade do recurso como revista excecional, passamos a transcrever:

1. Com o devido respeito, o Venerando Tribunal recorrido ao decidir da forma como decidiu e está plasmada no seu, douto, Acórdão, fez uma errada interpretação e aplicação do direito;

2. Sindicou positivamente uma, douta, decisão de 1ª Instância, que, a nosso ver e sempre com o devido respeito, conheceu de factos que lhe não competiam conhecer e condenou os recorrentes em objeto diverso do pedido.

3. O Venerando Tribunal recorrido, perfilhou a tese da convolação do instituto do enriquecimento sem causa, trazida aos autos pelas autoras/apeladas, sem que as mesmas tivessem preenchido os requisitos de que o mesmo depende, para o instituto da verificação e efeitos das nulidades, quando os AA. não invocaram um só facto ou requisito de que depende a verificação das mesmas e os seus efeitos, com o argumento, aliás, douto, que tal convolação resultava do mero enquadramento jurídico da pretensão das AA., no pressuposto de o Juiz não está sujeito à qualificação jurídica dos factos dada pelas partes;

4. Com o devido respeito, este, douto, entendimento não estará correcto, porque já se não trata de uma questão adjectiva, mas substantiva;

5. As AA. não alegaram factualidade bastante, nem adequada, que permitisse tal convolação e que se conhecesse de mérito, com base nos efeitos decorrentes da nulidade para que o, douto, Tribunal derivou;

6. Das nulidades declaradas na, douta, sentença proferida no Processo nº 2086/12.6, não se podem extrair efeitos que determine, o êxito da petição das AA., até porque a maior parte do peticionado, não lhes diz respeito;

7- O objecto daquela acção consistia na nulidade de um negócio jurídico de compra e venda simulado, que tinha por dissimulação a mera garantia hipotecária de um contrato de mútuo do valor de 40.000,00 euros e nada mais;

8. A A. AA e seu extinto marido produziram e entregaram aos recorrentes, uma Declaração, que se encontra junta aos autos, em que esta verdade é indesmentível;

9. O contrato de mútuo a que aí se refere e a compra e venda do imóvel, descrito na, respectiva, escritura pública que lhe deu forma, foram declarados nulos, mas daí não se podem oficiosamente retirar efeitos e aplicá-los à resolução de pretensões que nada têm a ver com tais nulidades;

10. Como está provado, essa acção não teve por objecto, directo ou indirecto, qualquer empréstimo efectuado pelas AA. aos recorrentes, que tivesse a ver, ou estivesse relacionado com o, eventual, acordo, feito à posteriori, entre o R. marido e as AA., para o pagamento dos impostos do imóvel e da quantia de 67.186,23 euros;

11. A “Declaração” feita e subscrita pela A. AA e seu extinto marido prova-o, sem qualquer dúvida, pelo que é contraditório o facto dado como provado de que os mesmos, subentenda-se, com base no simulado negócio da compra e venda, confiaram nos RR. e suportaram as despesas destes e pagaram ao Banco GG S.A, a importância de 67.186,53 euros;

12. Ao assim interpretar a 1ª Instância e ao assim perfilhar o Venerando Tribunal da Relação, cometeram um erro de julgamento;

13. Como se vê da “Declaração”, rectro referida, este Acordo, se existisse da forma como as AA. dizem, teve plena autonomia, foi posterior à celebração do simulado negócio, não como objecto deste, e desta conjugação não se pode retirar aquela conclusão;

14. As premissas de um negócio, não foram as premissas do outro! Do primeiro conhecem-se,...

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