Acórdão nº 5747/19.5T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16-03-2023

Judgment Date16 March 2023
Year2023
Acordao Number5747/19.5T8VNF.G1
CourtCourt of Appeal of Guimarães (Portugal)

Acordam, em conferência, na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

RELATÓRIO

AA e BB vieram propor contra CC execução para entrega de coisa certa.
Alegaram que, por transação realizada no âmbito do processo de divisão de coisa comum nº 2441/15.... e homologada por sentença, foi adjudicado aos exequentes o imóvel objeto dessa ação, pelo valor de € 15 500, tendo os exequentes procedido ao pagamento da quantia de € 7 750, visto que já eram proprietários de metade desse imóvel.
Não obstante, até à data, o imóvel em questão não foi entregue aos exequentes.

Juntaram cópia da ata de conferência de interessados, realizada no dia 7.11.2017, na ação de divisão de coisa comum nº 2441/15...., na qual consta que são requerentes AA e BB e que são requeridos CC, DD, CC, EE e mulher FF e que na conferência se encontravam presentes o requerente AA, o requerido CC e os respetivos mandatários.
Consta ainda da aludida ata que as partes puseram fim à referida ação nos seguintes termos:

Transação
1ª Cláusula
O Requerente AA e o Requerido CC acordam em que o imóvel identificado nos artigos 1º e 2º da Petição Inicial seja adjudicado aos Requerentes AA e esposa BB, pelo valor de € 15.500,00.
2ª Cláusula
As custas em dívida a juízo serão suportadas partes iguais pelos Requerentes AA e esposa e pelo requerido CC, prescindindo ambos de custas de parte.

A referida transação foi homologada por sentença com o seguinte teor:

“Na presente acção de divisão de coisa comum intentada por AA e BB contra CC, DD, CC e EE e mulher FF, transigiram as partes processuais em relação ao objecto de litígio.
Assim, atenta a qualidade dos intervenientes processuais e o objeto da lide, que se mostra na disponibilidade destes, julgo válida e eficaz a transacção que antecede, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 283º, nº 2, 284º, 289º e 290º, nº 4, todos do Código de Processo Civil.
Pelo exposto, homologo por sentença a mencionada transação e, consequentemente, condeno as partes a cumpri-la nos seus precisos termos.”
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Procedeu-se à citação do executado, por carta registada com A/R, datada de 19.11.2022, para, no prazo de 20 dias, fazer a entrega indicada no requerimento executivo ou opor-se à execução mediante embargos, informando-o ainda da possibilidade de requerer o diferimento da desocupação, nos termos do art. 864º, do CPC, conforme nota de citação de 19.11.2019 (ref. Citius ...79), que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais, carta essa que foi rececionada (cf. requerimento de 4.12.2019, ref. Citius ...78).
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Não foram deduzidos embargos.
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Os exequentes, em 1.2.2021 (requerimento ref. Citius ...51) informaram que o imóvel não lhes foi entregue.
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Em 4.6.2021, o Sr. Agente de Execução (AE) apresentou requerimento (ref. Citius ...56) pedindo autorização para a intervenção da força pública de segurança uma vez que o executado não desocupou o imóvel e recusa-se a fazê-lo.
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Em 7.6.2021 foi proferido despacho (ref. Citius ...44) que deferiu o requerido pelo AE, nos termos do art. 757º, nºs 1 a 7, do CPC.
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Em 21.1.2022, o executado veio apresentar requerimento (ref. Citius ...85) no qual formulou os seguintes pedidos:

A) Deve ser declarada verificada a excepção dilatória de preterição de litisconsórcio necessário com todas as legais consequências;
B) No caso de assim não se entender, deve ser declarada verificada a excepção dilatória de preterição de litisconsórcio necessário relativamente ao CC, não demandado;
C) Deve ser comunicado ao Agente de execução que obste ao prosseguimento de qualquer diligência ilegal, de entrega coerciva de imóvel, nomeadamente o imóvel actual habitação do aqui executado.”

Alegou, em síntese, que a presente execução, para efeitos de legitimidade, deveria ter sido proposta contra todos os herdeiros da herança indivisa de GG, tal como sucedeu na ação de divisão de coisa comum em que o mesmo foi adjudicado, e não apenas contra CC, como aconteceu, ocorrendo desta forma uma ilegitimidade, por preterição de litisconsórcio necessário.
Mesmo que assim não se entendesse, o procedimento executivo teria de ser proposto contra quem usufrui e utiliza o suposto prédio a executar, neste caso, como sua própria habitação, isto é, contra CC e seu filho, CC, o que não ocorreu, pelo que, também por esta via, existe uma situação de ilegitimidade
Por outro lado, o seu filho habita consigo e tem uma deficiência motora que o inabilita de prover às suas necessidades do quotidiano, necessitando de ajuda de terceiros, pelo que a privação da habitação baseada em entrega coerciva seria ilegal.
Acresce que o exequente não sabe qual a localização do prédio do qual exige a entrega ao aqui executado pretendendo, abusivamente, que o executado e seus filhos, aqui não demandados, entreguem um prédio que possui uma área de 817m2, como se fosse o prédio dos presentes autos, com a área de 40m2.

De acordo com a transação realizada, o executado não ficou de proceder à entrega de nada, muito menos do prédio que habita, pois os prédios na propriedade da herança de GG são bem diversos, em todas as suas características, do prédio adjudicado ao aqui exequente, que, por ser muito antigo, e por, ao longo dos anos, terem sido erigidas, demolidas e movidas construções sobre essa parcela de 40m2, atualmente, nem exequente nem executado sabem localizar o prédio em questão.
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Os exequentes exerceram o contraditório por requerimento de 3.2.2022 (ref. Citius ...28) no qual invocam a intempestividade do requerimento apresentado pelo executado, consideram que não existe ilegitimidade e impugnam a veracidade dos factos alegados pelo executado quanto à confusão entre os prédios, alegando que o imóvel está perfeitamente localizado conforme assinalado a azul no documento que juntaram, e quanto às condições pessoais do filho do executado, alegando que o filho do executado vive sozinho, trabalha num estabelecimento comercial e tem uma vida autónoma do seu pai.

Terminam pedindo que:
a) o requerimento apresentado pelo executado não seja recebido por totalmente extemporâneo, intempestivo e sem suporte legal, devendo ser ordenado o seu desentranhamento dos autos;
ou, ao invés, que:
b) sejam declaradas improcedentes as exceções de preterição de litisconsórcio invocadas pelo executado;
c) sejam declaradas improcedentes as alegações do executado e ordenada a entrega imediata do imóvel melhor identificado no requerimento executivo.
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Em 7.10.2022 foi proferido despacho (ref. Citius ...62) que apreciou o requerimento do executado, despacho esse que, depois de descrever atos praticados no processo, os quais também já acima referimos, contém a seguinte fundamentação, que aqui se transcreve:

Cumpre decidir:
Diversamente do que sucede no processo declarativo, em que a legitimidade se afere pela posição das partes e pelo objeto da ação, em processo executivo o conceito é muito mais restrito, podendo dizer-se que é de natureza meramente formal, na medida em que é definido pelo próprio título, como, com toda a clareza, emerge do disposto no n.º 1 do art. 53.º, do C.P.C.: dispõe de legitimidade, como exequente, quem no título figure como credor e, como executado, quem no título tenha a posição de devedor. No caso em apreço, é indiscutível que o executado figura no título executivo. Assim, atento o exposto e por força do disposto no artigo 583.º, n.º, 1, do Código Civil, é nosso entendimento que figurando o ora executado no título executivo apresentado à execução apenas nos resta concluir que o executado é parte legítima nos presentes autos.
Dito isto, é manifesto que a presente exceção terá de improceder.
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Para além da apontada exceção, veio ainda o executado, no mesmo requerimento datado de 21-01-2022, invocar a ilegalidade do procedimento e a “confundibilidade dos prédios”.
Ora, como facilmente se perceciona dos dizeres do título executivo, o prédio em apreço nos autos está perfeitamente identificado.
De todo o modo, não podemos deixar de salientar que está precludido o direito do executado deduzir oposição à execução através do requerimento anómalo agora apresentado, dado o decurso do prazo a que alude o artigo 728.º, do .C.P.C., e pelos fundamentos aí aduzidos, conforme resulta do disposto no artigo 729.º, do C.P.C...
Pelo exposto, julgo improcedente a exceção da ilegitimidade invocada pelo executado e indefere-se o demais peticionando por este no requerimento em apreço.
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O executado não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

“1.º O exequente AA intentou processo executivo para entrega de coisa certa, com base numa transação, homologada por sentença, no âmbito da Ação de Divisão de Coisa Comum, onde foi adjudicado aos exequentes o imóvel composto por casa térrea e quintal, sito no lugar ..., freguesia ..., concelho ....
2.º Embora no processo declarativo figurem como partes outras pessoas além do aqui recorrente, só este é que foi citado no âmbito da presente execução, olvidando os restantes requeridos, DD, CC e EE.
3.º O douto despacho judicial prolatado em 07.06.2021 (ref.ª ...44), não curou de analisar se estava verificado o pressuposto da legitimidade das partes.
4.º O recorrente/executado é pessoa de longínqua idade, de parcos estudos e com dificuldades físicas e mentais, pelo que, recebeu a citação e, em boa verdade, não percebeu o seu conteúdo, nem reagiu juridicamente à demanda.
5.º Só aquando da diligência para entrega da coisa é que o aqui recorrente rebateu a bondade da justificação da entrega daquele imóvel, que é a sua casa de morada e de seu filho, alertando para a confundibilidade existente e a ilegalidade do procedimento.
6.º Tendo comprovado, documentalmente, a propriedade dos prédios, exibindo certidões e cadernetas prediais e por requerimento (ref.ª ...85), arguiu, judicialmente, a ilegitimidade, a nulidade e...

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