Acórdão nº 569/04.0TBLRA-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 28-04-2015

Judgment Date28 April 2015
Acordao Number569/04.0TBLRA-A.C1
Year2015
CourtCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

“A..., S.A.” intentou o presente recurso de revisão de sentença contra os réus B... e C..., Massa Insolvente de “D..., S.A.” e “E...s, Lda.”, todos identificados nos autos, pedindo se declarasse a nulidade da transacção e da sentença homologatória proferida na sequência daquela nos autos principais ou, se assim se não entender, se declare a mesma ineficaz relativamente às segunda e terceira rés enquanto as mesmas não a ratificarem.

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A recorrente não é parte nos autos principais, nos quais foi proferida a aludida sentença homologatória de transacção, mas fundamenta o seu interesse processual, entre outros, nos seguintes factos:

- Em 22 de Julho de 2009, adquiriu, com todas as suas componentes e de forma integral, o crédito que a sociedade “I... , Lda.” detinha sobre H... , que foi notificado da cessão operada em 23 de Março de 2012.

- É credora de H... na quantia de € 27.627,30, tendo instaurado contra o devedor, por intermédio da cedente, em 26 de Outubro de 1998, execução sumária para pagamento dessa quantia, que corre termos por estes Tribunal e Juízo sob o n.º 680/1998.

- Aí se concretizou a penhora de metade indivisa de que o devedor é proprietário em 17 fracções autónomas do prédio urbano, da freguesia de Leiria, descrito na Conservatória do Registo Predial de Leiria sob o n.º 03(...) – com as letras F, G, H, I, AS, AZ, BB, BC, BE, BG, BH, BI, BJ, BK, BL e BM e BP.

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Pronunciaram-se os recorridos B... e C... , pedindo fosse negado provimento ao recurso interposto porquanto, em resumo, a recorrente é parte ilegítima, dado que os prédios sobre que recai a penhora da “Madeileina, L.da” nunca foram propriedade do devedor da reclamante, H... e a transacção foi devidamente ratificada pelos mandantes, sem que lhe fosse apontado qualquer vício, do que decorre não ter a ora recorrente qualquer interesse, directo ou indirecto, no desfecho da acção.

Findos os articulados, a M.ma Juiz a quo, proferiu a decisão de fl.s 403 a 407, na qual se decidiu o seguinte:

“Julgo verificada a excepção dilatória de falta de interesse processual da recorrente.

Absolvo os recorridos da presente instância.

Condeno o recorrente no pagamento das custas.”.

Inconformada com a mesma, interpôs recurso a autora, “ A... , SA”, recurso, esse, admitido, como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 448), finalizando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

1. A aqui apelante não se conforma com a Douta Decisão proferida nos presentes autos, a qual, por Despacho Saneador de 02.07.2014, julgou verificada a excepção dilatória de falta de interesse processual da recorrente e, consequentemente, absolveu os recorridos da instância.

2. Como veremos, a decisão do Tribunal “a quo” proferida pelo Mma. Juiz (cuja pessoa nunca fica em causa nas presentes Alegações, mas apenas e tão-somente a decisão) faz, no entendimento da recorrente, uma errónea interpretação das disposições legais aplicáveis o que sempre determinaria a não prolacção do Despacho nos termos em que o mesmo se operou.

3. A questão a que importa dar resposta e que fundamenta o presente Recurso, reportando-se os autos a Recurso de Revisão, prende-se com o facto de saber se, mesmo que se entenda que a aqui recorrente não possui interesse processual para prosseguimento dos autos, se os mesmos, por a nulidade suscitada e invocada se tratar de vício de conhecimento oficioso, não deverão os autos prosseguir para prolacção de decisão.

4. A factualidade fixada na Douta Decisão em crise peca por defeito, devendo ser ainda fixado, como provado, o constante em 6. a 28.º das alegações.

5. Conceptualmente, o interesse em agir relaciona-se com a “necessidade de usar o processo”, de instaurar ou de fazer prosseguir a acção, ou, de forma mais expressiva, da necessidade de tutela judiciária. Existe esse interesse processual, se para afirmação do direito a que alguém se arroga, seja necessária a intervenção dos tribunais.

6. Entende-se que tal necessidade não tem de ser absoluta, mas carece de ser sempre justificada, ter fundamento, ser razoável, afirmativa e com carência tal que exija a tutela judiciária.

7. O interesse em agir é um interesse processual, secundário e instrumental em relação ao interesse substancial primário e tem por objecto a providência solicitada ao tribunal, através do qual se procura ver satisfeito aquele interesse primário, lesado pelo comportamento da contraparte, ou, mais genericamente, pela situação de facto objectivamente existente.

8. O interesse em agir surge, pois, da necessidade em obter do processo, a protecção do interesse substancial, pelo que pressupõe a lesão de tal interesse e a idoneidade da providência requerida para a sua reintegração ou tanto quanto possível, integral satisfação. Temos portanto, que esse pressuposto não se destina a assegurar a eficácia à sentença; o que está em jogo é antes a sua utilidade: - não fora exigido o interesse e a actividade jurisdicional exercer-se-ia em vão”

9. Contrariamente ao decidido, a A/Recorrente tem interesse no presente pleito, pois que, na verdade, com o de prosseguimento dos presentes autos e, para o caso de vir a ser declarada – como se impõe – a nulidade da transacção efectuada nos autos de que os presentes se encontram apensos, não obstante o trânsito em julgado da decisão proferida nos autos que com o n.º 680-D/1998 correram seus termos pelo 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Leiria, teremos que assistirá à, nesses autos, embargada (entenda-se a aqui recorrente face à cessão de créditos operada) direito a Recurso de Revisão face à verificação – aí sim – de manifesta falta de interesse em agir dos embargantes B... e C... , pois não seriam os mesmos titulares de qualquer direito ou interesse relativamente aos imóveis em questão.

10. Sem prejuízo ainda do vertido em 26.º n.º 3 do CPC na redacção à data aplicável.

11. A transacção é um negócio jurídico (contrato) que pode ser celebrado judicial ou extrajudicialmente e, quando celebrada judicialmente, carece de intervenção do juiz que, proferindo a sentença homologatória (arts. 300º, nºs 3 e 4 do CPC na redacção à data), confere ao acto os efeitos processuais dele decorrentes, passando a coexistir duas realidades: a transacção - que, enquanto contrato, produz os efeitos negociais que lhe são próprios - e a sentença que a homologa – que produz os efeitos processuais que lhe estão associados.

12. E, como resulta do disposto no art. 301º (na redacção à data), quer a transacção, quer a sentença que a homologou, podem ser atacadas.

13. A transacção, enquanto negócio jurídico, pode ser atacada através de acção judicial, que, por via da declaração da respectiva nulidade ou anulabilidade, visa a destruição dos seus efeitos negociais; a sentença pode ser atacada por via de recurso extraordinário de revisão que visa a destruição dos seus efeitos processuais.

14. A declaração de nulidade ou a anulação da transacção, destruindo os seus efeitos negociais, têm efeito retroactivo, em conformidade com o disposto no art. 289º do Código Civil, e produzem os demais efeitos previstos nesta disposição legal, determinando, por isso, a restituição de tudo o que tiver sido prestado.

15. Certo é que a declaração de nulidade ou a anulação da transacção não são idóneas para destruir a sentença que a homologou, já que este efeito...

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