Acórdão nº 566/08.7TVLSB.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 08-10-2009

Data de Julgamento08 Outubro 2009
Número Acordão566/08.7TVLSB.L1-2
Ano2009
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção Cível (2ª Secção) do Tribunal da Relação de Lisboa:
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I - «Av..., Lda.» e B... intentaram a presente acção declarativa com processo ordinário contra C... e D....
Alegaram as AA., em resumo:
Até ao dia 15 de Fevereiro de 2008 os RR. foram os únicos sócios da sociedade por quotas «CM..., Lda.». Em 12-7-2007 as AA. e os RR. celebraram um contrato-promessa de cessão de quotas, nos termos do qual os RR. prometeram ceder e as AA. prometeram comprar as quotas de que os RR. eram titulares nesta sociedade, correspondentes a 80% do capital social e pelo preço de € 200.000,00, tendo as A. pago então € 10.000,00.
A escritura deveria ter sido realizada até ao dia 31-12-2007.
Em 22 de Agosto de 2007 o R., na qualidade de gerente da sociedade, outorgou procuração constituindo as AA. procuradoras da sociedade «CM..., Lda.», tendo-se, desde então, estas comportado como gerentes da sociedade.
A escritura de cessão de quotas veio a ser agendada para dia 18-2-2008, mas, nesta data, foi recebida pela A. «Av..., Lda.» uma carta enviada pelos RR. comunicando que haviam, entretanto, procedido à cessão de quotas, que enviavam um cheque no montante de € 5.000,00 e que se consideravam desvinculados do contrato-promessa, bem como que haviam procedido à revogação da procuração.
As AA. mantêm interesse na celebração do contrato, mesmo com redução do seu objecto.
As AA. desde Julho de 2007 têm exercido o cargo de gerentes da sociedade, sem qualquer remuneração, tendo os RR. beneficiado do tempo, esforço e dinheiro por elas despendido, por isso tendo direito a receber uma indemnização por prejuízos patrimoniais e não patrimoniais que tiveram como decorrência do não cumprimento do contrato-promessa por parte dos RR..
De qualquer modo as AA. sempre teriam direito a receber € 20.000,00 correspondentes ao dobro da quantia por elas paga a título de sinal, acrescida de juros de mora sobre € 10.000,00, uma vez que os RR. já devolveram a quantia de € 10.000,00.
Formularam as AA. o seguinte pedido:
Deve a presente acção ser julgada provada e procedente e, em consequência,
(i) O Tribunal, para o efeito, proferir sentença que produza os efeitos da declaração negocial dos RR., nos termos do nº 1 do art° 830° do Código Civil, cancelando-se a inscrição das quotas a favor dos RR. na sociedade CM..., Lda., com o NIPC ..., averbando a titularidade dessas mesmas quotas a favor das AA. na proporção de 50% cada.
(ii) Devem os RR. ser condenados a adquirir quotas sociais representativas de 60% do capital social da sociedade CM..., Lda., com o NIPC ... e ceder as mesmas às AA., mais condenando os RR. no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória diária no valor de 250 € desde a sentença e até à outorga da escritura pública.
Caso os RR. não adquiram a totalidade das quotas,
(iii) Devem os RR. ser condenados ao pagamento de uma indemnização por perdas e danos a liquidar em execução de sentença.
Subsidiariamente,
Caso não sejam considerados procedentes os pedidos acima formulados
(iv) Os RR. condenados a pagar às RR uma indemnização de valor a liquidar em execução de sentença pelo esforço e tempo que as AA. emprestaram ao desempenho das funções de gerentes da sociedade desde Julho de 2007 até 18 de Fevereiro de 2008.
Caso assim não se entenda,
(v) a quantia de 20.000,00 acrescida de juros de mora a contar da data do incumprimento 18 de Fevereiro de 2008 e, bem assim,
De qualquer forma,
(vi) A R. condenada no pagamento de custas e procuradoria condigna.
Os RR. contestaram invocando que o contrato-promessa havia cessado, uma vez que ultrapassado o prazo até ao termo do qual qualquer das partes poderia tomar a iniciativa de proceder ao agendamento do contrato definitivo, e impugnaram matéria de facto alegada pelas AA., vindo a concluir pela procedência da excepção e pela improcedência da acção.
As AA. replicaram e, na sequência, veio a ser proferido saneador-sentença em que a acção foi julgada parcialmente procedente, sendo os RR. condenados a pagar às AA. a quantia de € 15.000, acrescida de juros de mora e absolvidos dos pedidos formulados pelas AA. «sob (i) a (iv) de fls. 11 a 12».
Da sentença apelaram as AA., concluindo nos seguintes termos a respectiva alegação de recurso:
1 - Os RR. recorridos ainda são detentores de quotas representativas de 20% do capital social, estando assim em mora quanto ao cumprimento do contrato promessa celebrado com as AA. recorrentes e não numa situação de incumprimento definitivo de todo o contrato promessa..
2 - A compra e venda mercantil de bens alheios é válida, pelo que o prometido contrato de cessão de quotas pelos RR. é válido, mesmo que estes já não sejam titulares de quotas que lhes permitam cumprir integralmente o contrato promessa.
3 - Importa assim a condenação dos RR. na obrigação de convalidar o negócio, sob pena de responder por perdas e danos.
4 - AA. e RR. celebraram um contrato misto, que consubstanciava uma promessa de cessão de quotas e um contrato inominado de gestão imediata da sociedade.
5 - As AA. peticionaram o pagamento dos serviços prestados na qualidade de gerentes/procuradoras da sociedade e das despesas em que incorreram e não o pagamento de uma indemnização subsumível ao estatuído no nº 4 do artigo 442 do C. Civil.
6 - Esses serviços foram prestados no âmbito do contrato inominado celebrado com os RR. recorridos pelo que são estes responsáveis por aquele pagamento independentemente do beneficiário dos mesmos.
7 - A condenação em custas na proporção de 4/5 para as AA não tem correspondência com as disposições legais aplicáveis na medida em que aquelas formularam pedidos subsidiários, sendo que um dos pedidos foi considerado procedente, o qual representa uma proporção diferente tendo em conta o valor da acção.
14 - Com a decisão de considerar apenas parcialmente procedente a acção, a sentença do Meritíssimo Juiz "a quo" violou o artigo 442º, 292º, 2 e 892º do Código Civil e o artigo 467° do Código Comercial, fazendo uma errada interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis, devendo em consequência aquela ser revogada
Os RR. contra-alegaram nos termos de fls. 201 e seguintes.
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II - O Tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos:
1 — Por acordo reduzido a escrito datado de 12 de Julho de 2007 os Réus declararam ser os únicos sócios da sociedade por quotas Sociedade CM..., Lda. e que prometiam ceder às Autoras ou a quem as mesmas indicassem, parte das quotas de que na mesma eram titulares, quotas essas representativas de 80% do capital social da mesma sociedade (por acordo e por documento constante de fls. 31 a 32 dos autos).
2 - Nos termos do acordo referido em 1) o preço da cessão referida em 1) cifrava-se em 200.000 Euros e seria pago pela seguinte forma:
- na data referida em 1) as Autoras pagavam aos Réus a quantia de 10.000 Euros a título de sinal e
- o remanescente, de 190.000 Euros, seria pago na escritura de cessão de quotas (por acordo e por documento constante de fls. 31 a 32 dos autos).
3 - Nos termos do acordo aludido em 1) a escritura seria realizada até ao final do ano de 2007, em notário de Lisboa, a indicar oportunamente (por acordo e por documento constante de fls. 31 a 32 dos autos).
4 - Nos termos do mesmo acordo, a gerência actual à data do mesmo mantinha-se após a realização da escritura, com a remuneração então vigente naquela data, acrescida do valor mensal de 1825 Euros para despesas diversas, incluindo as de representação (por acordo e por documento constante de fls. 31 a 32 dos autos).
5 - Nos termos do acordo referido em 1) a partir da data aludida em 1) e até à escritura, a gerência só praticaria actos de gestão corrente, passando a intervir uma das cessionárias nos actos da gerência (por acordo e por documento constante de fls. 31 a 32 dos autos).
6 - Na data referida em 1) as Autoras pagaram aos Réus a quantia de 10.000 Euros a título de sinal (por acordo).
7 - No dia 22 de Agosto de 2007 o Réu declarou, perante o notário do Cartório Notarial sito na Rua ...., em Lisboa que, na qualidade de gerente da Sociedade CM..., Lda. constituía procurador da mesma sociedade a Drª B.... e a Drª E...., a quem conferia os necessários poderes para movimentarem quaisquer contas bancárias que a sociedade mandante possuísse em qualquer instituição bancária, podendo para o efeito depositar, levantar, movimentar capitais em bancos ou instituições de crédito, requisitando e passando cheques, recibos ou quaisquer outros documentos que se mostrassem necessários ao indicado fim e representar a sociedade em actos e contratos no âmbito da sua actividade, podendo negociar com fornecedores bem como com clientes, públicos ou privados, nas condições que melhor entendessem, conduzindo também todos os procedimentos com vista a licenciamentos legais (por acordo e por documento constante de fls. 34 a 36 dos autos).
8 - A escritura de cessão de quotas ficou agendada para o dia 18 de Fevereiro de 2008, pelas 13.30 horas, a realizar no Cartório Notarial da F... (por acordo).
9 - Os Réus foram, até 15 de Fevereiro de 2008, os únicos sócios da Sociedade CM..., Lda., com um capital social de 8.978,36 Euros, sendo o Réu titular de uma quota de 7.232,57 Euros e a Ré de uma quota de 1.745,79 Euros (por acordo e por documento constante de fls. 28 a 30 dos autos cujo teor, no mais, se dá por reproduzido).
10 - No dia 18 de Fevereiro de 2008 a primeira Autora recebeu uma carta enviada pelos Réus, datada de 15 de Fevereiro de 2008, com o seguinte teor:
"Comunicamos que procedemos, entretanto, à cessão de quotas de que éramos titulares na Sociedade CM..., Lda.. Junto anexamos cheque n° ...., no valor de 5.000 Euros, sacado sobre o Banco, pelo que nos consideramos desvinculados do contrato promessa de 11 de Julho de 2007.
Mais comunicamos que procedemos, também, à revogação da procuração que lhe foi outorgada em Outubro de 2007 pelo que a partir
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