Acórdão nº 558/11.9TBCBR.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 28-11-2018
Judgment Date | 28 November 2018 |
Acordao Number | 558/11.9TBCBR.C1 |
Year | 2018 |
Court | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1]
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1 – RELATÓRIO
AÇÃO DECLARATIVA DE CONDENAÇÃO SOB A FORMA DE PROCESSO ORDINÁRIO
AUTOR
A (…) casado, (…), residente (…) (...)
RÉUS
G (…), S.A., NIPC (...) , com sede na (...) [englobada por fusão na COMPANHIA DE SEGUROS (…) S.A., a qual foi depois integrada por fusão na COMPANHIA DE SEGUROS (…) S.A., sendo que esta última alterou a sua denominação social para S (…), S.A.];
P (…), (…) (...) ;
J (…), médico ortopedista, (…) (...) ;
C (…), (…) (...) .
INTERVENIENTE
I (…), S.A.:
O A. conclui a sua petição inicial pedindo a condenação dos RR. solidariamente no pagamento da quantia de 150.000€ a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescidos de juros de mora à taxa legal, a contar da data de citação e até efetivo e integral pagamento.
Para tanto alega, em síntese:
- Em 04 de Outubro de 2005 o A. foi vítima de acidente que foi considerado como acidente de trabalho pela 1ª Ré, Seguradora, que assumiu a respetiva responsabilidade infortunística.
- A 2.ª R., é uma sociedade de prestação de serviços médicos, em regime de ambulatório e foi incumbida pela 1.ª R. de prestar acompanhamento e tratamento médicos aos beneficiários desta como era o caso do A..
- O 3.º R. é sócio da 2.ª R. e presta serviços médicos por conta daquela.
- A 4.ª R. explora um estabelecimento de saúde, denominado C (…) onde presta a terceiros serviços médicos em regime de ambulatório e em regime de internamento, sendo contratada pela 1.ª R. para, mediante retribuição, prestar serviços médicos, de enfermagem, de diagnóstico e terapêutica, nomeadamente os que se consubstanciam em intervenções cirúrgicas, com ou sem internamento, aos beneficiários dos seguros.
- O A. foi observado pela primeira vez nas instalações da 2.ª R. em 10 de Outubro de 2005, pelo 3.º R., que a 2.ª R. designou como responsável pelo acompanhamento médico do A. e desde esta data até 21 de Agosto de 2006, o A. foi sujeito a diversos tratamentos.
- Logo em 11 de Outubro de 2005, no dia seguinte à primeira consulta, foi constatada “fractura de L4”, impondo as legis artis que o A. fosse de imediato submetido a cirurgia.
- Só em 21 de Agosto de 2006, ou seja quase um ano depois, é que foi decidido pelos serviços clínicos da 2.ª R. e pelo 3.º R. efetuar a cirurgia.
- Tal omissão agravou as lesões e prolongou desnecessariamente o quadro de sofrimento e incapacidade do A. e contribuiu decisivamente para todo o quadro patológico de incapacidade funcional, dor física, e sofrimento psíquico que descreve.
- A fistulação sucessiva e continuada da zona da incisão cirúrgica, com criação de abcessos purulentos deveu-se a má prática cirúrgica e a violação das legis artis.
- Em análises requisitadas aos HUC, pelo 3.º R., realizadas em 1 de Outubro de 2006, foi detetada no exsudado da ferida cirúrgica a presença da bactéria staphylococcus aureus.
- A infeção bacteriana ocorreu seguramente aquando da intervenção cirúrgica a que o A. foi sujeito em 12 de Julho nas instalações cirúrgicas da 4.ª R. e só ocorreu porque a 4.ª R. omitiu as práticas de controlo e higienização que visam impedir e/ou debelar as infeções bacterianas hospitalares.
- O A. está totalmente incapaz para o exercício de qualquer atividade profissional, em consequência das lesões físicas e psíquicas sofridas em consequência do tratamento, sendo o A. credor da quantia de 100.000,00 € a título de indemnização por danos patrimoniais, para além da pensão que lhe foi atribuída.
- Alega ainda que sofreu um quadro de sofrimento moral, dor física e psíquica para justificar a indemnização por danos não patrimoniais que computa em 50.000€.
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Devidamente citada a R(…) contestou excecionando a sua ilegitimidade passiva e alegando que celebrou protocolos de colaboração e contratos de prestação de serviços com diversas empresas e profissionais de saúde, devidamente habilitados para o efeito sem que esses prestadores se lhe encontrem subordinados não tendo qualquer poder de direção, fiscalização ou coordenação sobre tais prestadores, sendo completamente alheia à contestante a definição dos procedimentos médicos a adotar.
Quanto à demais factualidade alegada pelo Autor, nomeadamente no que respeita a todo o processo de reabilitação física e psíquica, procedimentos adotados, técnicas médicas utilizadas, exames complementares de diagnóstico, tratamentos e medicamentos prescritos e, em suma, tudo quanto é alegado pelo Autor relativamente à atuação/omissão dos Co-Réus, a Contestante dá por integralmente reproduzido o teor da defesa que venha a ser apresentada por todos os Co-Réus. E conclui pela improcedência da ação e consequente absolvição do pedido.
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Contestou igualmente a C (…), exceciona a prescrição do direito de indemnização. Impugnando no essencial os factos alegados pelo autor, alega ainda em síntese que entre si e os clínicos, designadamente o 3º Réu, que, no âmbito do convénio que invoca, nos episódios cirúrgicos e de internamento em causa, realizaram a assistência clínica e cirúrgica durante tais internamentos, não existe qualquer vínculo contratual, como não existe qualquer vínculo contratual entre a 4ª e a 2ª RR., pois que nenhuma das intervenções cirúrgicas a que o A. foi submetido nas instalações daquela ocorreu por conta da 2ª Ré. Mais alega que observa escrupulosamente, e observava à data dos factos, todas as práticas e procedimentos tidos como adequados para a eficaz higiene e desinfeção dos doentes e das pessoas que lhes prestam assistência e, bem assim, limpeza, lavagem, desinfeção e esterilização das instalações, equipamentos, instrumentos e materiais postos à disposição das equipas médicas e cirúrgicas. Conclui pela improcedência da ação e correspondente absolvição do pedido e deduziu ainda o incidente de intervenção principal da I (…) S.A. para quem transferiu a responsabilidade civil por danos causados a terceiros no decurso da sua atividade.
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O R. J (…) contestou, impugnando no essencial a factualidade invocada pelo autor e alegando, em síntese, que por serem “estáveis”, as leges artis caracterizam este tipo de fracturas como “não cirúrgicas”, sendo assim correto o procedimento do 3º Réu de continuar com a terapêutica. Mais alega que os serviços médicos prestados ao A. em todas as intervenções cirúrgicas decorreram de forma regular, correta e sem incidentes. No que toca à infeção bacteriana que se acredita ter-se iniciado aquando da intervenção cirúrgica, tal como tantas vezes acontece nestas ocasiões, mas que não se pode evitar completamente, existindo também como outra causa plausível de contração daquela infeção a obesidade do ora A., acrescendo que as particularidades físicas do A. o fazem ainda mais atreito à infeção e lenta cicatrização quando sujeito a traumatismo cirúrgico. Conclui pela improcedência da ação, deduzindo ainda o incidente de intervenção acessória da I (...) alegando que para esta transferiu a responsabilidade civil pelo pagamento de indemnizações a terceiros emergentes do exercício da sua atividade profissional.
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Admitida a intervenção principal da I (…), conforme despacho de fls. 308 e 309, veio esta apresentar a sua contestação, invoca a prescrição do direito invocado pelo autor, adere às defesas dos RR. (…) e invoca ainda que, tendo o autor sofrido um acidente de trabalho, a responsabilidade pelos tratamentos é da responsabilidade da seguradora de acidentes do trabalho, na qualidade de comitentes pelos atos dos seus comissários e que a responsabilidade dos médicos e dos serviços clínicos, a existir, será interna.
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O autor replicou pugnando pela improcedência das exceções.
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Foi proferido despacho saneador, logo julgadas improcedentes as exceções de ilegitimidade e prescrição, foram elencados os factos assentes e elaborada a base instrutória, objeto de reclamações, oportunamente indeferidas por despacho de fls. 482 a fls. 485.
Em sede de instrução dos autos, para além de ter sido requerido pelo Autor uma perícia médico-legal, requereu aquele igualmente «ao abrigo do disposto no artigo 528.º do CPC, e para prova (ou contraprova) dos factos 2.º, 9.º a 74.º, 81.º e 82.º, 90.º, 99.º a 124.º, 130.º, 133.º, 134.º, 142.º, 146.º a 158.º, 165.º a 202.º, 204.º, 207.º a 215.º, 223.º a 228.º, 230.º a 244.º,248.º a 251.º da base instrutória, sejam 2.ª e 4.ª RR notificadas para juntarem aos autos todos os processos clínicos ou outros contendo registos referentes aos diagnósticos, internamentos, intervenções e cuidados prestados ao A.».
Na oportuna sequência, o Exmo. Perito médico do INML a quem havia sido cometida a realização da “Consulta técnico-científica”, enviou o Relatório da mesma para os autos, dando nota de que a efetivação da mesma havia sido limitada e condicionada, uma vez que «(…) não lhe foram disponibilizados estudos imagiológicos obtidos durante a evolução da doença nem relatórios cirúrgicos que seriam indispensáveis para entender a evolução da situação clínica do A.»
Notificado o Autor desse Relatório, veio ele reclamar do mesmo (em 06.03.2014, por requerimento com a referência Citius 16141223), nomeadamente requerendo que
«5.º
Não resulta do relatório pericial que o Senhor Perito ou o INML tenham requerido às partes, designadamente às que detém instalações clínicas e/ou hospitalares ou ao Tribunal, os esclarecimentos ou os documentos de que carecia para elaborar perícia rigorosa.
6.º
Assim sendo, deve o Senhor Perito esclarecer se requereu e a quem os esclarecimentos e os documentos de que carecia e, em caso positivo, quem não cumpriu o dever de colaboração, para que se apurem as devidas responsabilidades.
7.º
Em caso negativo, deve o Senhor Perito ser notificado, nos termos do disposto no artigo 485.º, n.ºs 2 e 3, do CPC, para fundamentar e completar o seu relatório pericial após consulta a todos os elementos de que careça para cumprir a...
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