Acórdão nº 557/10.8TBVLN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15-01-2015

Data de Julgamento15 Janeiro 2015
Número Acordão557/10.8TBVLN.G1
Ano2015
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães
Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I - RELATÓRIO
Maurício Lda. e MM intentaram acção declarativa de condenação, com processo comum ordinário, contra MSe mulher, RS, pedindo que:
a) Seja declarado nulo e de nenhum efeito, em razão de simulação, o documento denominado “Confissão de Dívida/Declaração”, datado de 08.01.2010, identificado como doc. nº 12.
b) Subsidiariamente, resultando do mencionado documento que a invocada causa de obrigação é um mútuo, no valor de € 850.000,00, deve o mesmo ser declarado nulo e de nenhum efeito;
c) Quando assim não se entenda, deve declarar-se a novação sem efeito e ser lícito à autora recusar o cumprimento dessa obrigação como se ela não existisse.
d) Em qualquer dos casos, deve ser ordenado o cancelamento de todas as inscrições e averbamentos entretanto efectuados, ou a efectuar, sobre os prédios descritos na Conservatória do registo Predial de Valença sob os nºs 3.. e 3... de actos sujeitos a registo que tiverem por fundamento o documento aludido em a), nomeadamente a penhora a favor dos réus, que abrange os dois prédios, feita na Conservatória do Registo Predial de Valença pela Ap. .. de 2010/07/20, no âmbito do processo executivo nº 2../10.3TBVLN do Tribunal Judicial de Valença.
e) Ainda em qualquer dos casos devem os réus indemnizar os autores, em quantia a liquidar em execução de sentença, que restaure todos os prejuízos que lhes ocasionarem, correspondentes a despesas já suportadas, e a suportar com a presente acção, incluindo despesas com advogados e outros mandatários, certidões, emolumentos registrais, deslocações e outras.
Alegaram, em síntese, que a autora sociedade - então representada por Maria... - outorgou um documento particular pelo qual se confessou devedora ao réu marido da quantia de € 850.000,00, referente a diversos mútuos que este lhe foi fazendo ao longo de vários anos, sendo que, todavia, se tratou de uma declaração negocial simulada, tanto mais que a autora jamais recebeu, assim como o réu jamais lhe entregou, os montantes referentes aos mútuos indicados na declaração negocial.
Os réus contestaram, negando a existência de qualquer simulação e concluindo pela improcedência da acção.
Os autores replicaram, concluindo como na petição inicial.
Os autores requereram, após convite do tribunal, a intervenção principal de Maria..., a qual foi admitida.
Saneado, condensado e instruído o processo, foi, após julgamento, proferida sentença, que, na parcial procedência da acção:
a) declarou nula a declaração negocial denominada “Confissão de dívida /Declaração” identificada no ponto 10 do elenco dos factos provados da sentença;
b) condenou o réu MS a pagar ao autor MM a quantia que vier a liquidar-se em momento posterior quanto aos danos indicados no ponto 16 do referido elenco dos factos provados.
Inconformada com o assim decidido, interpôs a autora o presente recurso de apelação cuja motivação culminou com setenta e nove extensas conclusões que não satisfazem a enunciação sintética ou abreviada dos fundamentos do recurso, tal como exige o disposto no art. 639º, nº 1, do CPC, e, por isso, não serão aqui transcritas.
Das mesmas conclusões resulta que a questão essencial colocada à apreciação deste Tribunal da Relação se consubstanciam em saber se deve ser alterada a matéria de facto, com a consequente improcedência da acção.

Os autores contra-alegaram, batendo-se pela confirmação do julgado, sustentando, subsidiariamente, a apreciação dos demais fundamentos invocados na acção.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II - ÂMBITO DO RECURSO
Sendo pelo teor das conclusões das alegações que se delimita o objecto do recurso – afora as questões de conhecimento oficioso – importa saber, como acima já deixou dito, se deve ser alterada a matéria de facto, nomeadamente dando-se como não provada a factualidade constante dos pontos 13 e 14 do elenco dos factos provados da sentença, dos quais resulta o acordo simulatório entre a getente da sociedade autora e o réu marido.

III – FUNDAMENTAÇÃO
A) OS FACTOS
Na sentença foram dados como provados os seguintes factos:
1. A 1ª A. tem por objecto social a “construção e a compra e venda de imóveis” (A);
2. Até ao ano de 2005 o capital social da 1ª A. de € 199.519,16 estava dividido em duas quotas: uma do valor nominal de € 189.543,20 pertencente ao 2º A, e outra do valor nominal de € 9.975,96 pertencente a Ângelo Augusto Rodrigues (B);
3. A 1ª A. era então, tal como hoje, proprietária de dois prédios urbanos, um denominado “Casa do ...”, sito na Calçada..., nºs. 2, 4 e 6, em Valença, onde se mantém sedeada, e outro composto por uma Capela, sito na mesma Calçada..., inscritos na matriz respectiva sob os artigos 1 e 1..., e descritos na Conservatória do Registo Predial de Valença sob os nº 3...e 3... respectivamente (C);
4. No indicado primeiro imóvel, situado no interior da fortaleza de Valença (casa senhorial do século XVII, inteiramente renovada, mobilada, dispondo de 6 quartos e demais dependências, com magnífica vista panorâmica para o rio Minho), o 2º A. vinha prosseguindo, em nome individual, a actividade de “turismo rural” (D);
5. No ano de 2005, duas cidadãs de nacionalidade espanhola chamadas Maria... e Maria de Los..., mãe e filha, ambas empresárias, manifestaram interesse na aquisição dos ditos imóveis e respectivo recheio, para aí se dedicarem à mesma actividade de “turismo rural” (E);
6. Após negociações, em 25.8.2005, na cidade de Vigo, em Espanha, foi celebrado entre as referidas cidadãs espanholas e ambos os sócios da 1ª A. um denominado “Contrato de Compromisso de Compraventa de Participaciones Sociales”. Por esse documento, as mesmas duas cidadãs e o 2º A. (este outorgando também em representação do outro sócio) ajustaram a cessão das quotas representativas da totalidade do capital social pelo preço global de € 1.300.000,00. Atento o valor do negócio, esse preço foi fixado após avaliação da 1ª A, a qual não assentou tanto nos elementos contabilísticos mas sobretudo nos elementos patrimoniais que a compunham (F a H);
7. Celebrada a escritura, em 11.11.2005, as referidas Maria ... e Maria de Los ?..ficaram a ser as únicas sócias detentoras da totalidade do capital social de € 199.519,16 da 1ª A. Nessa data e escritura, nomearam única gerente a sócia Maria ..., que a partir daí assumiu a gestão da 1ª A. e a condução dos seus destinos. Dias depois, a Maria de Los ...apresentou no Serviço de Finanças de Monção a “Declaração de Início da Actividade de Turismo no Espaço Rural”, indicando como sede e local do estabelecimento a “Casa do ...” (I a L e 9);
8. Em 21.7.2008, o 2º A. instaurou neste Tribunal Judicial de Valença, sob o nº 3.../08.6TBVLN, uma Execução para Pagamento de Quantia Certa contra as referidas Maria de ?.. e Maria de Los ?.. com vista à cobrança da quantia de € 441.776,97. No desenvolvimento desse processo executivo, aquelas três quotas do valor nominal de € 69.831,71, € 119.711,49 e € 9.975,96 foram penhoradas em 3.4.2009, tendo sido constituída depositária a Maria .... Mais tarde essas quotas foram adquiridas pelo 2º A, por venda realizada em 15.6.2010, pelos preços de € 143.500,00, € 230.000,00 e € 36.5000,00, respectivamente, num total de € 410.000,00; por efeito dessa venda, as três quotas foram adjudicadas ao 2º A, que registou a aquisição na Conservatória do Registo Comercial de Valença em 14.7.2010 (M a O);
9. Por deliberação tomada em Assembleia Geral da 1ª A, realizada em 6.9.2010, foi deliberado, por unanimidade, proceder à destituição da referida Maria.. do cargo de gerente, e à nomeação do 2º A. como gerente, sendo essas destituição e nomeação inscritas no registo comercial (P);
10. O processo nº 2.../10.3TBVLN é uma Execução Comum para Pagamento de Quantia Certa, instaurada em 9.6.2010, em que é Exequente o ora R. MS e Executada a ora 1ª A, com base em alegada “dívida civil” contraída por esta no valor de € 859,408,00. O título executivo é um “documento particular” datado de 8.1.2010,...

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