Acórdão nº 5547/21.1T8MTS.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 21-05-2024
Data de Julgamento | 21 Maio 2024 |
Número Acordão | 5547/21.1T8MTS.P1 |
Ano | 2024 |
Órgão | Tribunal da Relação do Porto |
Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim - Juiz 6
Juíza Desembargadora Relatora:
Alexandra Pelayo
Juízes Desembargadores Adjuntos:
Artur Dionísio Oliveira
João Diogo Rodrigues
SUMÁRIO:
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Acordam os Juízes que compõem este Tribunal da Relação do Porto:
I-RELATÓRIO:
AA, residente na cidade do Porto, instaurou ação declarativa com processo comum contra BB, residente em ..., Matosinhos, onde conclui pedindo seja “declarada a indignidade sucessória da Ré (e a consequente incapacidade sucessória) relativamente à herança aberta por óbito de CC, com as legais consequências, designadamente: i) Ser declarado que a devolução da sucessão à Ré é havida como inexistente; ii) Ser declarado que a Ré é, para todos os efeitos, possuidora de má fé de quaisquer bens da herança de CC de que seja detentora”.
Alega, para o efeito e em síntese, que é a única filha de CC, falecido no dia 21 de Agosto de 2021.
Por sentença de Maio de 2021, que transitou em julgado, o seu pai foi sujeito à medida de acompanhamento de representação geral, pela qual foram a aqui Autora e DD, irmão daquele, designados seus acompanhantes. Tal sentença data fixou a data do início da incapacidade no dia 5 de Maio de 2019.
O pai da Autora outorgou quatro testamentos públicos, o último dos quais institui a aqui Ré como única herdeira da sua quota disponível.
Acontece que a Autora, usando do seu ascendente sobre o dito CC, por meio de um conjunto de artifícios, logrou convencê-lo a revogar e alterar os testamentos que este havia outorgado, de forma a mesma fosse instituída como única herdeira da quota disponível daquele e, mais tarde, a reforçar a sua quota hereditária.
Alega, também que, da mesma forma, impediu o testador de alterar o último dos testamentos que outorgou, como era sua intenção de forma a instituir o seu irmão como herdeiros da quota disponível.
Conclui que, por ter usado, para tal desiderato, de dolo e coação moral sobre o testador, a Ré carece de capacidade sucessória, por indignidade, para suceder àquele CC, nos termos preceituados na al. c) do art. 2034º do Código Civil.
A Ré, na sua contestação, impugna a factualidade alegada na contestação, concluindo pela improcedência da ação.
Procedeu-se a julgamento e, no final foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, decide-se julgar a ação totalmente improcedente e, em consequência, absolver a Ré dos pedidos contra ela formulados.
Custas pela Autora.”
Inconformada, a Autora, AA veio interpor o presente recurso de Apelação, tendo apresentado as seguintes conclusões:
“A.O presente recurso vem interposto da sentença que não declarou a indignidade sucessória da Ré (herdeira testamentária do pai da Autora), da qual resulta que o Mmo. Juiz a quo justifica a sua decisão de não valorizar os “factos instrumentais” e “presunções judiciais” com o facto de a relação entre a Autora/Recorrente e o seu pai não ter sido “uma relação normal de pai e filha”, o que é absolutamente irrelevante para o que está em causa nesta ação e configura um erro de julgamento.
B. O Tribunal de 1ª Instância fez, logo no relatório, errado enquadramento da questão, considerando a Ré/Recorrida como “única herdeira” da quota disponível do pai da Autora, o que não corresponde à verdade, porquanto o testador deixou à Recorrida, no último testamento, metade da quota disponível.
C. A Recorrente não impugnou o último testamento (ou os dois últimos testamentos) pelo que será sempre válida a disposição da quota disponível a favor dos outros herdeiros testamentários, a quem o seu pai deixou a outra metade da quota disponível.
D. A Autora/Recorrente entende é que a Ré/Recorrida, pessoa que se aproximou do autor da sucessão quando este tinha 73 anos de idade (e ela 72) e lhe fazia companhia, diariamente, mas com quem este nunca residiu, é inidónea para suceder ao seu Pai como herdeira, devendo ser declarada a sua incapacidade sucessória por motivo de indignidade.
E. Para o caso de se entender que não se verificam os pressupostos para a declaração de indignidade sucessória da Ré, deve ser declarado o abuso do direito da Ré de aceitar a herança de CC, dado que o comportamento da Ré é manifestamente censurável, justificando-se que, por aplicação deste instituto, seja eliminada a sua vocação sucessória.
F. Além disso, resulta dos factos provados que a Ré se aproveitou, conscientemente, da situação de necessidade e dependência que criou no pai da Autora, para obter para si a concessão de benefícios manifestamente excessivos – atento o valor da herança em causa -, sendo anuláveis, por usura, as disposições testamentárias feitas por CC a favor da Ré.
G.E tais disposições testamentárias são ainda anuláveis por dolo ou coação, posto que os factos alegados na P.I. (e demonstrados nos autos) se enquadram, igualmente, na previsão das respetivas normas legais.
H. O presente recurso versa sobre a matéria de facto e a matéria de direito, impugnando a Recorrente nos termos do disposto no artº 640º do C.P.C., a decisão proferida sobre concretos pontos da matéria de facto, que considera incorretamente julgados e que tiveram influência na decisão final de não declarar a indignidade sucessória da Recorrida, uma vez que do processo constam meios probatórios que impunham decisão diversa, designadamente, documentos e os depoimentos prestados na audiência de julgamento que se encontram gravados no sistema H@bilus Media Studio e cujos excertos se transcreveram nas alegações. A Recorrente impugna a decisão proferida sobre os factos nºs 3, 29, 36 e 42 que o Tribunal “a quo” deu como provados, entendendo que deve ser alterada a sua redação nos termos seguintes:
(i) Facto nº 3: “CC tinha começado a apresentar sinais de demência já em 2015, tendo-se verificado, a partir daí, deterioração progressiva das suas condições de saúde física e mental.”
(ii) Facto nº 29: “A Ré insinuou ao mencionado CC, na presença dos empregados deste, EE e FF e do contabilista Dr. GG, que a Autora não era sua filha, com o intuito de o afastar da filha e de intencionalmente lhe criar dúvidas sobre a paternidade.”
(iii) Facto nº 36: “A Ré era a única pessoa que frequentava diariamente a casa e que convivia com o Pai da Autora, estando por dentro de todos os assuntos relacionados com o seu património.”
(iv) Facto nº 42: “O pai da Autora presentava amnésia em especial em relação a factos do passado recente, e várias e frequentes perturbações psíquicas.”
J) A Recorrente requer a retificação do nome do seu pai nos factos nº 2 (“Pelo menos desde Maio de 2019 que o mencionado CC apresentava défice cognitivo moderado compatível com quadro demência;”) e nº 23 (“No ano de 2013, a Ré começou um relacionamento amoroso com o mencionado CC e foi assumindo progressivamente um papel cada vez mais preponderante na vida deste”).
K) A Recorrente considera que foram omitidos no elenco dos factos (provados e não provados) factos alegados na P.I. que são relevantes para a decisão da causa e que devem ser aditados aos factos provados, quer por terem sido aceites pela Ré, quer porque sobre eles foi produzida prova documental e testemunhal: trata-se dos factos constantes dos artºs 10º, 20º, 24º, 31º, 47º, 66º, 68º da P.I. e, bem assim, dos factos atinentes às decisões tomadas pela Ré sobre a saúde do pai da Autora (alegados nos artºs 87º, 89º, 90º, 91º, 94º, 96º, 98º, 99º, 100º, 105º, 106º, 108º, 110º, 111º, 116º, 117º, 119º, 120º, 121º, 129º, 131º 132º, 133º, 134º, 135º e 137º da P.I.) e dos factos atinentes à apresentação de Contestação (segundo informações prestadas pela Ré, supostamente em nome do requerido) na ação de acompanhamento de maior (artºs 205º, 209º e 210º da P.I.).
L) A Recorrente entende, ainda, que os elementos probatórios constantes do processo impõem a alteração da decisão sobre a matéria de facto, julgando-se provados os factos não provados constantes das alíneas b), f), h), i), j) e m), com a seguinte redação:
(i) Por influência da Ré o pai da Autora começou a afastar-se da Autora e do irmão [Alínea b)];
(ii) Em 2019 a Ré convenceu CC a solicitar uma avaliação do património imobiliário dos dois irmãos (CC e DD), tendo sido ela que tratou de reunir os documentos dos prédios [Alínea f)];
(iii) Com as afirmações aludidas em 29), 33) e 38), que sabia serem falsas, a Ré convenceu o mencionado CC a beneficiá-la em testamento [Alínea h)];
(iv) E com as afirmações aludidas em 28), 45) e 46), que sabia serem falsas, a Ré convenceu o mesmo CC a outorgar o testamento referido em 15) conseguindo desta forma, que o pai da Autora revogasse o testamento pelo qual instituíra herdeiro de uma terça parte da quota disponível o Prof. Dr. HH e a instituísse como herdeira de metade da sua quota disponível [Alínea i)];
(v) Após a outorga do último testamento, o mencionado CC confidenciou a, pelo menos, uma pessoa a sua vontade de o alterar (novamente), de forma a instituir herdeiro testamentário o irmão, em vez da Ré ou conjuntamente com esta e os outros amigos beneficiários do testamento, retomando a vontade que expressara no seu primeiro testamento [Alínea j)];
(vi) A Ré apercebeu-se que o mencionado CC estava numa situação de debilidade psicológica já desde 2015 [Alínea m)].
M) O Tribunal a quo decidiu segundo um juízo pré-concebido, como resulta, com evidência, das intervenções do Mmo. Juiz a quo no decurso dos depoimentos das testemunhas, tendo chegado ao ponto de ter demonstrado, inclusivamente, impaciência com a testemunha DD, que era a testemunha mais frágil do processo (atenta a sua idade e deficiência).
N) Nessa linha, ignorou a sentença proferida na ação de acompanhamento de maior de que foi beneficiário o pai da Autora, na qual lhe foi aplicada a medida de representação geral e a factualidade – parte dela a mesma que estava em causa...
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