Acórdão nº 551/09.1YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça, 08-10-2009

Data de Julgamento08 Outubro 2009
Case OutcomeNEGADO PROVIMENTO
Classe processualRECURSO PENAL
Número Acordão551/09.1YFLSB
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça:


AA, identificado nos autos, julgado pelo tribunal de júri, foi, por acórdão de 14/07/2005, condenado no processo nº 173/03.OTASRQ, do Tribunal Judicial da comarca de São Roque do Pico, conjuntamente com BB, CC, DD e EE, como co-autor, em concurso real, de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artºs. 131° e 132°, n°s 1 e 2, alíneas. f), g) e i), de um crime de profanação de cadáver, p. e p. pelo artº 254°, n° 1, alínea a), e cúmplice de um crime de burla informática, p. e p. pelos artºs. 221°, n° 5, alínea a), 27° e 73°, n° 1, alíneas a) e b), todos do Código Penal, nas penas de, respectivamente, 17 anos de prisão, 14 meses de prisão e 2 meses de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena única de 18 anos e 4 meses de prisão.

Essa decisão, no que aqui importa, assentou nos seguintes factos tidos como provados:
«Desde data que não foi possível concretamente apurar mas, pelo menos, desde o início do mês de Julho de 2003, o arguido BB travou conhecimento com FF, conhecido pela alcunha de “Joe Americano”, que também se apresentava e assinava como “Joseph D... M...”, casado, nascido na freguesia de Mosteiros, concelho de Ponta Delgada, em 18 de Setembro de 1949, filho de J... de M... D... e de F... de J... D..., titular do passaporte com o n° ..., emitido em Boston em 01.10.2002.
FF fora emigrante nos Estados Unidos da América mas, pelo menos, desde o final do ano de 2002 que regressara aos Açores.
Tinha residência em local desconhecido da ilha de S. Miguel, onde, ainda no mês de Julho de 2003, o arguido BB o apresentou à sua companheira, a arguida EE.
Entre o FF e o arguido BB estabeleceu-se uma relação de amizade, que incluía o relacionamento homossexual.
No dia 18 de Julho de 2003, o FF e os arguidos BB e EE, acompanhados do GG, filho destes arguidos, deslocaram-se para a ilha do Pico, a fim de ali assistirem às festas anuais de Santa Maria Madalena.
Na ilha do Pico encontraram-se com o arguido CC, irmão do BB, que residia na Madalena, bem como com os arguidos DD e AA.
Os cinco arguidos e o FF formaram um grupo que, por vezes, tomava refeições em conjunto e, durante a noite, saia para locais de diversão.
O FF, os arguidos BB e EE, e o GG, filho destes, pernoitavam numa tenda que montaram na denominada “Mata do Hospital”, sita na na vila da Madalena, na ilha do Pico.
O FF foi assumindo o pagamento da maioria das despesas do grupo com alimentação, custo de entrada nos vários estabelecimentos e consumos aí realizados.
Com excepção do arguido AA, nenhum dos restantes arguidos trabalhava ou tinha dinheiro, pelo que estavam na total dependência dos “financiamentos” do FF, o qual tinha sempre consigo dinheiro e o cartão multibanco com o n° ...., relativo à sua conta com o n° ....., do Banco Comercial dos Açores.
Os arguidos compreenderam que o FF não tinha família e amigos nos Açores e convenceram-se de que teria avultada quantia depositada no banco.
Em 27 de Junho de 2003, a conta apresentava um saldo de € 14.532,31 e, em 25 de Julho de 2003, um saldo de € 5.245,53.
Em dia que não foi possível concretamente apurar mas situado entre os dias 20 e 22 de Julho de 2003, os arguidos BB, CC, DD e AA combinaram entre si matar o FF, tendo em vista apoderarem-se do seu cartão multibanco e assim acederem à conta bancária, a fim de se apropriarem do dinheiro que ali existisse, bem como daquele que na altura o FF tivesse consigo.
Decidiram também esconder o cadáver para que este acto não fosse descoberto.
Desta combinação deram conhecimento à arguida EE, que a ela não se opôs, levando-os a acreditar que a mesma os não denunciaria e, dessa forma, foram fortalecendo a resolução criminosa que haviam tomado.
O arguido BB, por força do seu relacionamento com o FF, tinha conhecimento do número de identificação pessoal (PIN) do referido cartão multibanco.
Na madrugada de 25 de Julho, a hora não concretamente apurada, mas situada entre as 02.00 horas e as 04.00 horas, quando todos se encontravam na “”Mata do Hospital”, junto à tenda, aproveitando a ausência momentânea do FF daquele local, os arguidos BB, CC, DD e AA combinaram entre si concretizar o seu plano, conversa a que a arguida EE assistiu, sem que nada tivesse declarado.
O FF encontrava-se afastado alguns metros da tenda, junto a um amontoado de pedras existente no local.
Enquanto a arguida EE se manteve junto à fogueira que tinham acendido junto da tenda, sem que, por qualquer forma, tivesse manifestado a sua oposição, os arguidos BB, CC, DD e AA dirigiram-se para o local onde se encontrava o FF.
Muniram-se de pedras, aproximaram-se do FF e começaram a atingi-lo com as pedras na cabeça e no peito, tendo-o agredido até que deixou de dar qualquer sinal de vida.
De seguida, o arguido BB retirou-lhe dos bolsos o dinheiro que ali se encontrava, em valor ignorado, bem como o cartão multibanco, após o que cobriram o corpo com pedras.
Em consequência directa e necessária das pancadas que desferiram no FF, provocaram-lhe, para além do mais, fractura da porção anterior esquerda do frontal, com ligeiro afundamento ósseo, que irradia, passando pelo rebordo orbitário e prolongando-se até ao tecto da órbita esquerda; fractura transversal do corpo do esfenóide; fractura total da arcada zigomática direita, com destruição das suas porções temporal e zigomática; fractura total da arcada zigomática esquerda, com destruição da zona de sutura zigomatico-temporal; fractura completa e oblíqua do corpo mandibular, na sua porção direita, antes do ramo mandibular, que levou à separação e perda do ramo mandibular direito; fractura da parte superior do ramo mandibular esquerdo e fracturas transversais nas 1ª, 5ª, 8ª e 9ª costelas do lado esquerdo e nas 4ª, 5ª, 6ª e 7ª costelas do lado direito.
Estas lesões foram causa directa e necessária da morte do FF.
Após terem coberto o corpo com pedras, os arguidos BB, CC, DD e AA dirigiram-se a uma caixa multibanco na Madalena, onde o BB efectuou o levantamento de € 160 da conta de FF, utilizando o referido cartão, tendo repartido o dinheiro com os arguidos CC, DD e AA, enquanto a arguida EE ficou no pátio da escola da Madalena à espera.
Na manhã desse dia 25 de Julho, todos os arguidos, com excepção do AA, abandonaram a ilha do Pico, na primeira ligação marítima para a Horta, na ilha do Faial.
Durante alguns dias, os arguidos BB, CC, DD e EE mantiveram-se na cidade da Horta, onde o arguido BB utilizou, por dezenas de vezes, o cartão multibanco do FF para efectuarem levantamentos de dinheiro e pagamentos de preços em hotéis, restaurantes e outros estabelecimentos comerciais, de bens e serviços de que todos estes arguidos usufruíram.
De seguida, o arguido DD regressou à ilha do Pico e, passados mais alguns dias, os arguidos BB, CC e EE dirigiram-se para a ilha de S. Jorge, onde o arguido BB efectuou levantamentos e pagamentos com o cartão multibanco, em seu proveito e dos arguidos CC e EE, após o que os arguidos BB e EE foram para a ilha de Santa Maria, enquanto o arguido CC voltou para a ilha do Pico.
Desta forma, no dia 04 de Agosto de 2003, o saldo da conta bancária do FF foi reduzido a zero.
No decurso do inquérito destinado a apurar as circunstâncias da morte do FF, no dia 08 de Março de 2004, a arguida EE deslocou-se à Esquadra da Polícia de Segurança Pública da Madalena, onde deu referências sobre o local onde se encontrava o cadáver daquele.
Posteriormente acompanhou a polícia à “Mata do Hospital” e conduziu-a à zona onde se encontrava o cadáver do FF, totalmente oculto por um monte de pedras.
Os arguidos BB, CC, DD e AA sabiam que agindo de forma conjunta e concertada, e atingindo o FF à pedrada em zonas vitais do corpo lhe causavam a morte, o que quiseram e conseguiram, com consciência de serem um grupo de quatro pessoas que planearam antecipadamente a morte da vítima, com o propósito de se apropriarem do dinheiro que tivesse consigo, bem como do seu cartão de débito.
Quiseram ocultar o cadáver do FF, sem a autorização de quem de direito, a fim de assegurarem a sua impunidade.
O arguido BB, ao apoderar-se do cartão multibanco, sabia que o mesmo lhe não pertencia e que actuava contra a vontade do seu dono, bem como tinha perfeito conhecimento de que ao digitar o código de acesso ao sistema informático da rede ATM introduzia dados que lhe permitiam desencadear o acesso à conta bancária a que aquele cartão estava adstrito, o que lhe possibilitava o débito dos levantamentos e pagamentos que efectuou, actos que levou a cabo com o propósito de obter benefícios a que sabia não ter direito, à custa da diminuição das disponibilidades financeiras que estavam depositadas na conta à ordem associada àquele cartão, que sabia não lhe pertencer, sem que para tanto estivesse autorizado.
A arguida EE tinha conhecimento do plano dos restantes arguidos, sabia que tais actos eram aptos a causar a morte do FF e que os mesmos agiam com a intenção de se apropriarem do dinheiro que ele tivesse consigo e do cartão multibanco para, dessa forma, acederem à conta da vítima, ainda assim, nada disse, com consciência de que a não oposição fortalecia aquelas resoluções.
De igual modo, tinha conhecimento de que os restantes arguidos, após a morte do FF,
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