Acórdão nº 5373/21.9T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 05-12-2024

Data de Julgamento05 Dezembro 2024
Número Acordão5373/21.9T8STB.E1
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Apelação n.º 5373/21.9T8STB.E1

(1ª Secção)

Relatora: Sónia Moura

1ª Adjunta: Ana Pessoa

2º Adjunto: Fernando Marques da Silva


***

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:

I – Relatório

1. EMP01... – Unipessoal, Lda., intentou a presente ação de processo comum, contra AA peticionando:

a) que seja o R. condenado ao pagamento da quantia de 42.229,36€, a título de enriquecimento sem causa, acrescida dos respetivos juros legais na quantia de 8.219,11€, acrescida das demais quantias vincendas;

b) subsidiariamente, que seja o R. condenado no pagamento da quantia de 42.229,36€, a título de falta de pagamento de obrigação contratual, acrescida dos respetivos juros à taxa legal e que na presente data totalizam a quantia de 8.219,11€, bem como todos os que se vencerem.

Para tanto, alega, em suma, que o R. prestou junto da A. funções de vendedor e em contrapartida do seu trabalho recebia um salário mensal, a que acrescia mensalmente, a título de comissão, 2,5% do valor das vendas efetuadas, tendo sido pago ao R., por erro informático que duplicou o valor devido a título de comissões, o montante de € 55.941,04 a mais.

Mais alegou que tendo o R. posteriormente denunciado o seu contrato sem ter recebido as comissões das vendas que ainda não haviam sido pagas pelos clientes, ficou acordado que esse valor seria descontado no crédito que a A. detinha sobre o R., tendo assim sido apurado como valor em dívida o montante de € 42.229,36, que o R. não pagou até ao momento, apesar de interpelado pela A. para o efeito, o que constitui um enriquecimento sem causa.

2. O R. apresentou contestação, invocando a prescrição do alegado crédito e a consequente absolvição do pedido e, à cautela, impugnando a matéria alegada pela A., referindo que não houve qualquer acordo entre A. e R. em que se tenha obrigado a restituir quaisquer valores à A., acrescentando que, após a cessação do contrato, em 19.10.2020, a A. e o R. celebraram um acordo referente às comissões a pagar, relativas às vendas efetuadas pelo R. que fossem recebidas pela A. após essa data, não tendo a A. pago ao R. tais valores.

O R. requereu ainda a condenação da A. como litigante de má fé em indemnização e multa.

3. A A. pronunciou-se pela improcedência da prescrição e bem assim da litigância de má fé, tendo, por sua vez, requerido a condenação do R. como litigante de má fé em indemnização e multa.

4. Procedeu-se ao saneamento da causa, tendo sido relegado para final o conhecimento da exceção da prescrição, e fixaram-se o objeto do litígio e os temas da prova.

Após realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:

“Pelo exposto, decide-se julgar a acção procedente e, consequentemente, condena-se o R. no pagamento da quantia de € 42.229,36 a titulo de enriquecimento sem causa, acrescida dos respectivos juros legais vencidos e vincendos calculados desde a citação e até integral pagamento.

Custas da acção a cargo do R.


*

Declaram-se improcedentes os pedidos de litigância de má fé deduzidos pela A. e pelo R..

Custas do incidente de litigância de má fé a cargo das partes.


*

Registe e notifique.”

5. Inconformado com a Sentença, dela veio o R. interpor recurso de apelação, que concluiu nos seguintes termos:


“Conclusões

Quanto à matéria de facto


1. Impõe-se considerar não provados os pontos 16), 17) a 23) e 26) da matéria de facto provada pelo Tribunal “a quo” e provados os factos constantes dos § 3 e § da matéria dada como não provada pelo Tribunal “a quo”.

2. Não corresponde à verdade que o Réu tenha recebido 55.941,04 € a mais de comissões, uma vez que nem sequer é possível apurar qual o valor que o Recorrente teria alegadamente recebido em excesso, pois esse valor nunca foi objeto de comunicação e acordo, conforme foi declarado pelo Recorrente (Diligencia_5373-21.9T8STB_2023-09-19_09-37-17, minuto 04:00), nem o valor que constava do Documento 2 junto à PI, que pretensamente determinaria o valor, passa de uma mera projeção efetuada pelas duas técnicas ao serviço da Recorrida, que não quiseram apurar esse valor com rigor, pois dava muito trabalho, tendo efetuado uma projeção que não atendia ao valor que este entregou a mais a título de impostos e de contribuições para a Segurança Social, pelo que foi objetivamente efetuada em prejuízo do Recorrente, conforme depoimentos das testemunhas BB e CC (Diligencia_5373-21.9T8STB_2023-09-19_14-16-53.mp3, minuto 20:10 e ss.; Diligencia_5373-21.9T8STB_2023-09-19_14-43-52, minuto 15:21 e ss.).

3. Pelo contrário, resulta provado que o legal representante da Recorrida, que sabia da existência de processamentos erróneos e alegadamente em excesso, pelo menos, desde Agosto de 2016, comunicou ao Recorrente o seu perdão desses eventuais valores atentos os bons resultados comerciais do Recorrente (Diligencia_5373-21.9T8STB_2023-09-19_09-37-17, minuto 04:00), o que é coerente com as projeções constantes dos documentos juntos pela Recorrida, dos quais é possível descortinar a enormíssima importância do Recorrente e dos seus resultados enquanto comercial (Docs. 1 e 2 juntos à PI), escalpelizados supra nas alegações, tal como, embora a contragosto, a Recorrida admite através das declarações do seu sócio único e legal representante (Diligencia_5373-21.9T8STB_2023-09-19_10-23-29, minuto 20:00), e da sua filha e diretora comercial (Diligencia_5373-21.9T8STB_2023-09-19_11-48-10, minuto 07:25).

4. A inexistência de qualquer acordo foi confirmada pelas declarações claras, serenas e objetivas do Recorrente (Diligencia_5373-21.9T8STB_2023-09-19_09-37-17, minuto 04:00), que foram completamente ignoradas por parte do Tribunal “a quo”, por contraponto às declarações do sócio único e legal representante da Recorrida, que de forma nervosa, tíbia e atrapalhada, não conseguiu concretizar o que quer que fosse, limitando-se a remeter para o documento 2 junto à PI, que, como já vimos, não passavam de meras projeções (Diligencia_5373-21.9T8STB_2023-09-19_10-23-29, minuto 02:15 e ss).

5. As declarações do Recorrente são também coerentes com o depoimento da testemunha DD, antiga funcionária da Recorrida que nunca teve conhecimento de qualquer dívida e muito menos de qualquer acordo de pagamento (Diligencia_5373-21.9T8STB_2023-09-19_15-33-50).

6. Não se vislumbra qualquer prova objetiva da existência do alegado acordo de pagamento, nem das supostas interpelações, nem das pretensas desculpas do Recorrente para não efetuar o alegado pagamento, desde logo porque nem sequer foi alegado que o Recorrente ameaçasse cessar o seu contrato de trabalho, nem que tivesse necessidades extraordinárias de dinheiro; aliás, nesse aspeto, a versão da Recorrida foi totalmente desmentida, pois o seu sócio único e legal representante alegou que o Recorrente teria pedido para adiar o pagamento desse montante desconhecido, pois teria problemas judiciais e dívidas com uma empresa familiar, a “EMP02...”, ações essas que supostamente teriam levado o Recorrente a faltar ao trabalho para se deslocar a Tribunal, como constaria de um documento que a Recorrida tardiamente juntou aos autos (Doc. junto pela Recorrida em 26/09/2023), tendo a falsidade dessa alegação ficado bem patente em face da certidão permanente da sociedade “EMP02... Lda.”, junta a 19/09/2023 (ref. ...01), onde se constata que as únicas ações judiciais desta empresa nada têm a ver com o Recorrido, pois foram propostas pela irmã do Recorrente e apenas contra a referida empresa (vd. Insc. 4 AP. ...04, Insc. 5 Ap. ...16, Insc. 7 Ap. ...04 e Insc. 8 Ap. ...26), o que constando de certidão de teor, nos termos previstos no artigo 383.º, n.º 1, do Código Civil, tem a força probatória do original e desmente o alegado pela Recorrida e aquilo que, lamentavelmente e decerto por mais um lapso, foi tido em conta pelo Tribunal “a quo”.

7. Por outro lado ainda, não existiam quaisquer razões legais para a não realização de um acordo no decurso do contrato de trabalho, pois o mesmo poderia ter sido efetuado ao abrigo do disposto nas alíneas d) e/ou f) do n.º 2 do artigo 279.º do Código do Trabalho, mas sobretudo porque, a ser verdade a existência de um pretenso acordo, não haveria qualquer razão para que o documento 4 junto à PI, efetuado aquando do final do contrato de trabalho, contemplasse apenas a obrigação da Recorrida pagar ao Recorrente as comissões que lhe devia e que este se viu obrigado a reclamar, nomeadamente por correio eletrónico em 17/12/2020 e 17/01/2021 (Docs. 7 e 8 juntos à Contestação), por carta registada com aviso de receção remetida em 01/10/2021, recebida pela Recorrida em 11/10/2021 (Docs. 9 a 11 junto à Contestação), sempre sem resposta cabal e que, a final, se viu obrigado a reclamar e ver reconhecidas por via judicial (ponto 32 da matéria de facto provada), o que demonstra à saciedade a inverosimilhança e até o absurdo do alegado pela Recorrida, mas que foi dado como provado pelo Tribunal “a quo” em 26.º, quando se diz que “os valores de comissões de venda que teria a receber relativos à sua saída, lhe seriam descontados no valor a pagar pelo R. à A.”.


Quanto à matéria de Direito

8. Em face do apurado em sede de matéria de facto, com as alterações introduzidas pelas Conclusões que antecedem, a ter existido algum valor a pagar, o mesmo foi remido, nos termos dos artigos 863.º e seguintes do Código Civil, que resulta violado pela Sentença do Tribunal “a quo”, pois esta norma deveria ter sido interpretada no sentido de declarar a inexistência da dívida.

9. Mas ainda que ficcionássemos a existência de uma qualquer dívida, decorrente de alegados processamentos e pagamentos em excesso de retribuições laborais em montante que, rigorosamente, não se conseguiu apurar, mas das quais, confessadamente, a Recorrida teve conhecimento desde Agosto de 2016 (artigos 7.º e 8.º da P.I.), uma vez que o Recorrente apenas foi citado a 2 de Novembro de dois mil e...

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