Acórdão nº 5245/20.4T8SNT-A.L1-1 de Tribunal da Relação de Lisboa, 26-05-2020

Judgment Date26 May 2020
Acordao Number5245/20.4T8SNT-A.L1-1
Year2020
CourtCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)
Acordam na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO
A…, residente em …, instaurou contra O…, Lda, com sede …, e I…, Lda, com sede …, procedimento cautelar de arresto, requerendo o decretamento de arresto dos seguintes bens móveis constantes do imobilizado da segunda requerida: - Caldeira …; - Máquina de Trocos …; - Máquina de Secar …; - Máquina de Secar …; - Máquina de Secar …; - 3 (três) Máquinas de Lavar; - Máquina de Trocos … e - Tv.
Alegou, em síntese, que:
A 1ª requerida é uma sociedade comercial por quotas, a qual foi constituída em … e tem por objeto comercial dedicar-se à exploração de lavandarias self- service e comércio automático.
A 1ª requerida tem um capital social de € … dividido em 3 (três) quotas iguais de € …, distribuída de forma igual modo por 3 (três) sócios, designadamente, J…P…, J…M… e o requerente.
A 1.ª requerida explorava um estabelecimento comercial, o qual está arrendado a terceiros, onde detém a sua atividade comercial de lavandaria numa loja sita …
Em …, o requerente, por incompatibilidade com os outros sócios-gerentes, uma vez que estes não davam satisfações, renunciou à gerência.
A partir da data supra identificada, os sócios-gerentes não mais prestaram qualquer informação ao requerente na qualidade de sócio da sociedade, bem como, entre o ano de 2016 e a presente data não foi convocada qualquer Assembleia Geral por parte dos sócios-gerentes.
Por diversas vezes o requerente instou pessoalmente a 1.ª requerida, na pessoa dos sócios, a fim de esta prestar esclarecimentos e informações acerca da sociedade e não obteve qualquer, resposta.
Teve conhecimento que foram alocados saldos de caixa aos sócios J… P… e ao Sr. J… M…, todavia, ao primeiro – ao ora requerente - não lhe foi pago qualquer valor e, bem assim, não lhe foi prestado, também, qualquer esclarecimento ou deliberado em Assembleia Geral.
A requerida detinha a título de património e inventariado/imobilizado várias máquinas para exercício da sua actividade, nomeadamente as acima referidas.
Era o único património da sociedade, da ora 1.ª requerida e, maxime, tinha sido adquirido com o capital entregue pelos sócios aquando estes prestaram os suprimentos para esse mesmo fim.
O valor a título de imobilizado da 1.ª requerida ascendia à quantia de, pelo menos, € 50.000,00 (cinquenta mil euros), ao que acrescem os valores da atividade comercial, os quais ascendem, no mínimo, a € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros).
O requerente, em virtude da total ausência de qualquer resposta ou/e informação, por parte da 1.ª requerida, instaurou ação judicial – Inquérito Judicial à Sociedade -, a qual corre termos no Juiz … do Tribunal …, sob o Proc. nº …
Em 22 de Março de 2019, o requerente instaurou procedimento cautelar contra a 1.ª requerida, o qual correu termos no Juiz … sob o Proc. n.º …
Em 2018 a 1ª requerida vendeu os bens móveis acima referidos à 2ª requerida.
Os pagamentos efetuados pela 2.ª requerida não foram feitos à 1.ª requerida mas sim a J… M…, à sociedade … e a J…
A 2.ª requerida sabia quando efetuou esses pagamentos que eram realizados para contas estranhas à sociedade.
O dinheiro pago pela 2.ª requerida não entrou na caixa da 1.ª requerida.
Nunca foram distribuídos dividendos ao requerente.
Tomou conhecimento de que a 2.ª requerida colocou à venda – ‘trespasse’ - a loja e o imobilizado e o mediador do negócio jurídico é o socio da 1.ª requerida J… A…
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Foi proferido despacho de aperfeiçoamento, convidando o requerente a esclarecer o concreto crédito que pretendia ver acautelado com a providência requerida e ainda os factos que tornassem provável a procedência da impugnação do negócio celebrado entre a 1ª e 2ª requeridas.
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O requerente respondeu, invocando que o valor que pretende acautelar corresponde aos suprimentos e os direitos sociais do mesmo no valor de € 31.996,50 – capital e juros “(lucros/dividendos nunca obtidos)”.
Sustentou ainda que a 2.ª requerida teve acesso à documentação contabilística da 1.ª .antes da aquisição da mesma e da qual resulta que existem prejuízos de mais de € 60.000,00 – a fornecedores -, bem como despesas de representação superiores a € 30.000,00 (trinta mil euros). A mesma 2ª requerida sabia que existiam suprimentos a favor do Autor, bem como que as máquinas eram o único imobilizado da sociedade e como tal, que o negócio importaria a alineação da sociedade in totum.
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Foi proferido despacho de indeferimento liminar do procedimento, com fundamento na não verificação do 1º pressuposto para que haja lugar ao decretamento do arresto – a existência de um crédito -, despacho esse do qual recorre o requerente, apresentando as seguintes CONCLUSÕES:
1ª- O Recorrente não pode aceitar a decisão e nem os fundamentos por parte do
Tribunal “a quo”, não obstante o respeito e mérito que lhe reconhece, que determinaram o indeferimento liminar do procedimento cautelar de arresto;
Isto porque,
2ª- Os elementos probatórios carreados e os factos elencados são de per si suficientes para que o Tribunal “a quo” pudesse decretar o arresto, uma vez que, o que está em causa é, ab initio saber se o crédito existe, para depois saber, também, se o negócio é valido e se existe conluio ou não – bonus fumus iuris;
Senão vejamos.
3ª- Prima facie, alega o Tribunal “a quo” que in casu não se verifica o crédito do Recorrente fundando a sua posição com base na decisão proferida no âmbito Proc. n.º …-A;
Ora,
4ª- Atenta a decisão proferida nesse processo, há que dizer que a razão – cerne - para a qual foi indeferida a pretensão do recorrente, se devia, por um lado, maxime, a que ação principal – inquérito judicial - não admitia por efeito da relação entre os objetos o arresto dos bens e, não tanto a contrario do alegado pelo Tribunal “a quo”, a questão do crédito;
De todo o modo,
5ª- No que concerne aos créditos detidos pelo recorrente na sociedade, com o devido respeito, estes não se limitam aos créditos monetários e físicos, ou seja, como sócio tem a natural expetativa e o Direito a que a sociedade, da qual faz parte, tenha capacidade de desenvolver a sua atividade comercial e dessa forma obter o desejado escopo lucrativo;
Nessa conformidade,
6ª- Os bens em causa não são lucros, rectius, créditos tout court, no entanto são garantia da atividade comercial e o eventual lucro do Requerente, na certeza, porém, de
que, no caso de não haver bens e serem alienados, esvaziasse numa relação de conditio
sine qua non o Direito da eventual satisfação do crédito deste e outros;
7ª- Note-se que a venda em termos materiais e substantivos nada mais é e foi do
que a ‘liquidação’ da sociedade a favor dos sócios que não o Recorrente e para prejuízo
da sociedade, portanto, em simulação e abuso de Direito;
8ª- A existência de bens, património da sociedade e, maxime, a garantia da sua actividade comercial é um crédito lato sensu do sócio, uma vez que é suscetível de avaliação económica;
Por sua vez,
9ª- Com a venda total do imobilizado visou-se sim esvaziar a sociedade de património e, nessa conformidade liquidar a mesma, de modo a que o Recorrente nada
recebesse, uma vez que não existiu qualquer Assembleia para o deliberar, bem como, o
dinheiro não entrou na conta bancaria da sociedade;
10ª- Saliente-se que, estamos diante um negócio entre duas sociedades – Recorridas – e, nessa conformidade duvida-se da legalidade e da boa-fé de uma empresa que adquire o total do imobilizado de outra, todavia o pagamento não é efetuado à
sociedade mas sim aos sócios;
Por outro lado,
11ª- Atentos os contratos entre as recorridas, os mesmos apresentam-se-nos, salvo melhor douta opinião contrária, como nulos por falta de forma, atentos os sujeitos e o valor;
Por conseguinte,
12ª- Conforme supra se referiu e em face da informação e documentos facultados aos autos, bem como, ainda a exposição ora vertida, é difícil de crer que uma sociedade que adquira outra ou bens de outras não encete previamente as diligências (necessárias) no sentido de aferir a validade do negócio e operação que vai realizar, ou seja, saber e munir-se de documentos, nomeadamente de Actas de Assembleia e documentos contabilísticos que lhe
...

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