Acórdão nº 5168/11.8TCLRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 26-11-2019

Judgment Date26 November 2019
Case OutcomeNEGADA A REVISTA
Procedure TypeREVISTA
Acordao Number5168/11.8TCLRS.L1.S1
CourtSupremo Tribunal de Justiça


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I. Relatório

1. AA intentou contra BB e CC a acção declarativa de condenação pedindo a declaração de resolução do contrato de arrendamento para comércio por vício impeditivo do gozo do locado por culpa exclusiva dos réus e a condenação destes no pagamento de uma indemnização pelos lucros cessantes, correspondente ao valor anual de € 20 542,20, desse a data da propositura da acção até à data em que o autor perfaz 65 anos, no montante de € 184 479,90 (cento e oitenta e quatro mil quatrocentos e setenta e nove euros e noventa cêntimos) e pelos danos não patrimoniais, em valor não inferior a € 5 000,00 (cinco mil euros).

Alegou o seguinte (seguindo-se, o disposto no acórdão recorrido, com ligeiras alterações): o autor é arrendatário de um estabelecimento comercial que adquiriu por trespasse em 16 de Janeiro de 1978, instalado no rés-do-chão de um edifício; em 26 de Abril de 2010, por escritura pública o prédio onde se encontra a funcionar o estabelecimento comercial foi vendido pelas proprietárias a BB e esposa, actuais senhorios, pagando actualmente uma renda de € 24,94; desde há cerca de 10 anos que o locatário pretende fazer adaptações no locado às novas exigências de higieno-sanitárias e de segurança alimentar e dos clientes, sem conseguir consenso seja com as anteriores senhorias, seja com os actuais senhorios; o autor comunicou aos réus a necessidade de efectuar obras urgentes e necessárias para a continuação da laboração do estabelecimento, que neste momento já só funciona em 30% da sua capacidade, sendo que tais obras não podem ser efectuadas sem intervir nos pisos superiores do imóvel; o imóvel ameaça ruína e tal foi comunicado por carta registada em 3 de Fevereiro de 2011 e em 1 de Março de 2011, sem qualquer obtenção de solução; foi concedido ao autor o prazo de 90 dias para a realização das obras necessárias, o que é inviável, pelo que lhe sobra apenas encerrar o estabelecimento; o autor e a sua família dependiam do rendimento adveniente da exploração do estabelecimento, resultando afectados os seus rendimentos com o respectivo encerramento, o que lhe causa prejuízos patrimoniais e não patrimoniais face à desocupação profissional que sofrerá.

Os réus contestaram suscitando incidente de verificação do valor da causa e a excepção de ilegitimidade activa singular, entendendo que o autor se devia fazer acompanhar pela mulher, com quem é casado segundo o regime da comunhão geral de bens, sendo que o local arrendado se destina a loja de venda de frutas, hortaliças e artigos de pastelaria e, na parte adaptável, a habitação do locatário, pelo que se torna necessária a intervenção do cônjuge.

Mais alegaram que a recusa do recebimento das rendas por parte das anteriores senhorias decorre do facto de o trespasse não ter sido comunicado, no prazo, pela forma e para os devidos efeitos legais, pelo que o negócio em causa seria inválido; mais sustentam que, ainda que devesse o autor ser reconhecido como arrendatário, o contrato de arrendamento caducou por perda da coisa locada; o locado passou a ser destinado a café em momento que os réus desconhecem e não reúne condições para tanto; ao momento do trespasse o autor sabia que não poderia realizar quaisquer obras sem a autorização do senhorio, sendo que face ao congelamento das rendas este não tinha condições para as realizar; aos actuais senhorios o autor nunca comunicou a urgência na realização de obras. Sustentam ainda os réus que as obras a realizar seriam obras de recuperação e reconstrução de todo o prédio, logo técnica e economicamente incomportáveis, face ao valor da renda paga, pelo que a sua exigência constitui um abuso de direito. No mais impugnam parcialmente os factos alegados pelo autor referindo que o estabelecimento continua aberto ao público e que nunca incorreram em incumprimento contratual perante aquele, entendendo que não há fundamento para a resolução do contrato de arrendamento, tanto mais que este caducou por perda da coisa locada, para o que os réus em nada contribuíram, para além de o autor ter destinado o locado a fim diverso do previsto no contrato. Pugnam pela procedência das excepções deduzidas e, assim se não entendendo, pela improcedência da acção, pedindo ainda a condenação do autor, como litigante de má-fé, no pagamento de multa adequada e em indemnização à parte contrária não inferior a € 15.000,00.
O autor deduziu réplica em que aceitou a correcção do valor da acção e pretendeu fazer intervir na acção a mulher; mais aduziu que a sua qualidade de inquilino sempre foi reconhecida por DD, até à data do seu óbito, em Agosto de 1995, que emitiu os correspondentes recibos, que passaram depois a ser emitidos pela filha, EE, sendo que apenas em Julho de 1999 passou a depositar as rendas; mais refere que foi autorizado, em 1981, a fazer obras e a vender artigos alimentícios no local, ali fazendo restaurante, com actualização da renda para Esc. 3 000S00.
Em sede de réplica, o autor veio ampliar a causa de pedir e o pedido relativamente ao valor dos lucros cessantes atenta a idade da mulher, que fixam em € 308.133,00 c ainda € 5.000,00 a título de indemnização devida à mulher, por danos não patrimoniais; mais peticionam a condenação dos réus como litigantes de má-fé, no pagamento de uma indemnização não inferior a € 2.500,00.
Os réus apresentaram tréplica pugnando pela inadmissibilidade parcial da réplica, pela improcedência do pedido da sua condenação como litigantes de má-fé, concluindo quanto mais como na contestação.

Em 3-02-2016 foi proferido despacho convidando o autor a suprir a preterição de litisconsórcio necessário (cf. fls. 274 e 275 dos autos), convite a que o autor acedeu vindo deduzir incidente de intervenção principal provocada chamando a intervir nos autos FF, intervenção admitida conforme despacho proferido cm 26 de Abril de 2016 (cf. fls. 188).

A interveniente principal, regularmente citada, veio declarar fazer seus os articulados apresentados pelo autor (cf. fls. 293 dos autos).
Em 15 de Junho de 2016 foi proferida decisão que fixou o valor da causa em € 189.479,90 (cf. fls. 295).
Em 7 de Novembro de 2016 realizou-se audiência prévia em que foi proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento dos articulados (cf. fls. 314 e 315).

Em 14 de Dezembro de 2016, os réus apresentaram articulado em que alegam que o custo das obras necessárias para a recuperação do imóvel seria de € 1.500,00 por metro quadrado de intervenção, ascendendo a um total de € 437.695,50, com IVA, sendo que metade desse valor será para intervenção no locado, dando ainda conta que o estabelecimento foi encerrado há cerca de um ano pela ASAE, sendo que desde há 10 anos o locado não tinha condições para que lá funcionasse o estabelecimento.
Por sua vez, em 21 de Dezembro de 2016, o autor e a interveniente principal apresentaram articulado em que esclareceram que o objecto do arrendamento é o rés-do-chão do prédio identificado, com 158,04 m2 e que serviu de habitação até 1996, mas também como restaurante, marisqueira e actualmente funcionava como café e snack-bar, estabelecimento de bebidas, enunciando o estado de degradação em que este se encontra, as respectivas causas e as obras necessárias para a sua recuperação, cujo custo estimam em € 71.700,00.
A ampliação da causa de pedir e do pedido foi admitida por despacho proferido em 6 de Março de 2017 (cf. fls. 416).

A réplica e a tréplica foram parcialmente admitidas (cf. fls. 417).

2. Fixado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova foi realizada a audiência final vindo a ser proferida sentença, em 19 de Janeiro de 2018, que julgou a acção parcialmente procedente e determinou o seguinte:
a) Declarar a resolução do contrato de arrendamento referido nos autos e a restituição do arrendado aos réus;
b) Condenar os réus a pagar aos autores a título e indemnização a quantia a liquidar em execução de sentença correspondente à perda líquida de rendimento mensal que os demandantes sofreram em virtude do encerramento do estabelecimento comercial referido nos autos, entre 17.1.2013 e a data em que cada um complete 66 anos e 3 meses, no limite da indemnização já peticionada;

c) Absolver os réus do mais peticionado.

d) Não condenar qualquer das partes por litigância de má-fé;

e) Condenar as partes no pagamento das custas na medida do respectivo decaimento, que provisoriamente se fixa em 50% para cada uma."


3. Os réus recorreram da sentença, recurso de apelação que foi conhecido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, tendo sido proferido acórdão com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, acordam as juízas desta 7.a Secção do Tribunal de Relação de Lisboa, em:

a) Julgar parcialmente procedente a apelação dos réus BB e CC e, consequentemente, revogar a decisão recorrida na parte atinente ao vertido na alínea b) do seu dispositivo (condenação dos réus no pagamento aos autores, a título de indemnização, de quantia a liquidar posteriormente, correspondente à perda líquida de rendimento mensal decorrente do encerramento do estabelecimento, até cada um deles perfazer a idade da reforma, tendo por limite o valor peticionado), mantendo, no mais, o decidido pelo Tribunal de Ia instância.
As custas ficam a cargo dos apelantes e dos apelados, na proporção de metade.”

4. Os AA., inconformados com a decisão, apresentaram recurso de revista do acórdão, admitido por despacho de fls..
Nas conclusões do recurso diz-se (transcrição):

“A) A douta sentença proferida em 1ª instância, perante a qual foi produzida a prova é inatacável e funda-se em jurisprudência pacífica deste mais alto e sábio Tribunal;

B) Está em causa neste recurso de revista, as consequências da resolução de arrendamento que as instâncias declararam, a primeira reconhecendo o direito à indemnização, a Relação subtraindo-o, revogando nesta parte, a douta sentença de 1ª instância;

C) Os AA. encerraram...

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