Acórdão nº 5148/20.2JAPRT-K.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Case OutcomeIMPROCEDÊNCIA / NÃO DECRETAMENTO
Classe processualHABEAS CORPUS
Número Acordão5148/20.2JAPRT-K.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Acordam na 3.ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça



I. Relatório

1. AA, arguido sujeito à medida de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica (OPHVE) desde o dia 22/12/2020, propôs, por intermédio da sua ilustre advogada, a presente providência de Habeas corpus, ao abrigo do disposto nos arts. 222.º e ss., do C.P.P., apresentando as seguintes Conclusões, que passamos a transcrever:

I – A presente Providência de HABEAS CORPUS, tem por objeto a omissão do Juízo Central Criminal de Gaia – Juiz 2 do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, ao não libertar o arguido, por excesso de Prisão Preventiva.

II - Refere o art.º 222º do C.P.P. no seu n.º 1 que... «a qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus.

III - Mais avança o n.º 2 ... «A petição é formulada …e deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de…Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite.»

IV - O arguido encontra-se preso preventivamente à ordem do Proc. n.º 5148/20.2JA PRT.

V - O requerente está preso ininterruptamente desde 21 de Dezembro de 2020.

VI - O que se discute essencialmente é o facto de ter já sido ultrapassado o limite do artº 215º n.º 1 al. d) do CPP.

VII - Com efeito refere o n.º 1 do art.º 215º do CPP: A prisão preventiva extingue-se quando, desde o seu início tiverem decorrido…um ano e seis meses sem que tenha havido condenação com trânsito em julgado…;

VIII - O prazo máximo de prisão preventiva, neste caso ocorreu a 21.06.2022.

IX - Ora, não se pode considerar que a Decisão tenha transitado em julgado, até porque o arguido ainda tem pendente Recurso no Tribunal da Relação do Porto.

X - Assim o arguido encontra-se já em excesso de prisão preventiva, devendo ser libertado de imediato.

XI- Desta forma está o arguido ilegalmente preso desde 22.06.2022, por facto pelo qual a lei não permite, o que é fundamento da providência de habeas corpus, de acordo com os art.s 222º n.º 2 b) do CPP e 65º do C.P..

XII - O art.º 33º n.º 1 da CRP dispõe que «haverá habeas corpus contra abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente».

XIII - De acordo com o Ac. Do STJ de 03.07.2001 – Proc. n.º 2521/01-3, o habeas corpus «constitui uma providência a decretar apenas nos casos de atentado ilegítimo à liberdade individual – grave e em princípio grosseiro e rapidamente verificável – que integrem as hipóteses de ilegalidade da detenção ou da prisão taxativamente indicadas nas disposições legais que devolvem o preceito constitucional.»

XIV - Ora, entendemos que no caso em apreço há uma situação de abuso de poder.

XV - Deve-se assim proceder à reparação do erro judicial de forma a assegurar uma justiça material.

XV – O erro judiciário que se pretende seja corrigido é aquele que se liga à matéria de direito.

XVI - Entendemos, salvo melhor opinião que o arguido deveria ter sido libertado no dia de hoje, 22.06.2022, estando em prisão ilegal desde essa data, pelo que deve ser ordenada a restituição imediata do arguido à liberdade.


2. O Senhor Juiz do Juízo Central Criminal de Vila Nova de Gaia -J2, da comarca do Porto, prestou a informação a que se refere o art. 223.º n.º 1, do C.P.P., que passamos a reproduzir:

Nestes autos, o arguido requerente AA foi condenado, por acórdão proferido no pretérito dia 25/02/2022, pela prática, em co-autoria material, de:

- um crime de roubo agravado, p. e pelos arts. 26.º, 210.º, n.º 1 e 2, al. b), por referência ao art. 204.º, n.º 2, als. f) e g) do Código Penal – ponto I (absolvendo-se da qualificativa prevista na al. h), do nº 1, do art. 204º), na pena parcelar de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão;

- um crime de roubo agravado, p. e pelos arts. 26.º, 210.º, n.º 1 e 2, al. b), por referência ao art. 204.º, n.º 1, al. a), e 2, als. f) e g) do Código Penal – ponto II (absolvendo-se da qualificativa prevista na al. h), do nº 1, do art. 204º), na pena parcelar de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão;

- dois crimes de roubo agravado, p. e pelos arts. 26.º, 210.º, n.º 1 e 2, al. b), por referência ao art. 204.º, n.º 2, als. f) e g) do Código Penal – ponto V (absolvendo-se da qualificativa prevista na al. h), do nº 1, do art. 204º), na pena parcelar de 3 (três) anos e 2 (dois) meses, por cada crime;

- um crime de coacção agravada, p. e p. pelos arts. 26.º, 154.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a) do Código Penal – ponto V (quanto à ofendida BB), na pena parcelar de 8 (oito) meses de prisão;

- um crime de detenção de arma proibida e crime cometido com arma, p. e p. pelos arts. 26.º do Código Penal, 86.º, n.º 1, al. c) da Lei n.º 5/2006, de 23/02, na pena parcelar de 2 (dois) anos de prisão;

- um crime de falsificação de documentos agravada, p. e p. pelos arts. 26.º, 256.º, n.º 1, al. e) e n.º 3 do Código Penal – ponto V, na pena parcelar de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão.

Em cúmulo jurídico, nos termos do disposto no nº 1, do art. 77º do Código Penal, foi o arguido AA condenado na pena única de 7 (sete) anos de prisão.

No acórdão final foi reapreciada a medida de coacção aplicada ao arguido, em 1º interrogatório judicial, de obrigação de permanência na habitação, com vigilância electrónica, o que se fez nos termos seguintes, que se passam a transcrever:

«Medidas de coacção:

Compulsando devidamente os autos, com especial incidência o tramitado após o douto despacho proferido no âmbito do 1º interrogatório judicial – vd. refªs ...17, ...20 e ...23, de 22/12/2020, que aplicou aos arguidos CC, DD e AA, a medida de coacção de obrigação de permanência na habitação com V.E., sendo certo que a medida de coacção aplicada veio a ser alterada, pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto, para a prisão preventiva, quanto ao arguido CC, concluímos que se mantêm todos os pressupostos de facto e de direito que fundamentaram a aplicação destas medidas, as quais se revelam necessárias e adequadas para os arguidos que a elas estão submetidos, sendo certo que não se afiguram necessárias as suas audições nesta fase.

Portanto, os arguidos DD e AA estão em permanência na habitação com V.E. desde 22/12/2020 e o arguido CC também esteve sob tal medida desde esta mesma data, com alteração para prisão preventiva, após decisão nesse sentido pelo Tribunal da Relação do Porto, datado de 10/03/2021.

Estas medidas de coacção foram reexaminadas e mantidas, por douto despacho datado de 12/03/2021, pela Mmª JIC – refª ...22.

Após a dedução da acusação, foram reexaminadas as medidas de coacção aplicadas aos arguidos, por despacho proferido pela Mmª JIC, datado de 17/06/2021, o qual manteve as mesmas, por considerar não ter ocorrido qualquer alteração dos pressupostos, de facto e de direito, que pudessem justificar a mesma.

Por despacho proferido pela Mmª JIC, datado de 14/09/2021, foi reapreciada a situação coactiva do arguido AA, por requerimento deste, no sentido da alteração daquela, tendo sido mantido o seu estatuto coactivo.

Em sede de recebimento de pronúncia, por despacho datado de 09/11/2021, considerou-se também que se mantinham os pressupostos de facto e de direito que estiveram na origem da aplicação das medidas de coação de O.P.H. com VE e de Prisão Preventiva, aos arguidos, nos termos acima expendidos.

Sucede que, como se viu, realizado o julgamento, os arguidos foram condenados nos moldes acima expostos.

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