Acórdão nº 513/08.6PBMTS.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 11-05-2011

Data de Julgamento11 Maio 2011
Número Acordão513/08.6PBMTS.P1
Ano2011
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Recurso Penal 513/08.6PBMTS.P1

Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto

1. Relatório
No 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Matosinhos, foi julgada em processo comum (nº 513/08.6PBMTS) e perante tribunal singular, a arguida B…, devidamente identificada nos autos, tendo a final sido proferida sentença que decidiu
“a) Condenar a arguida B… da prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo art. 148º, nº1 do Cód. Penal, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 6,00;
b) Condenar a arguida no pagamento de 2 UC de taxa de justiça;
c) Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado e, em consequência:
- condenar a demandada a pagar aos demandantes C… e D… a quantia de € 1.779,00 correspondente a danos patrimoniais, quantia essa acrescida de juros desde a citação até integral pagamento à taxa de 4% -portaria 291/2003 de 08.04.;
- condenar a demandada a pagar aos demandantes C… e D… a quantia de €1.500,00 a cada um correspondente a danos não patrimoniais, quantia essa acrescida de juros desde a presente data até integral pagamento à taxa de 4% -portaria 291/2003 de 08.04.;
- condenar a demandada a pagar ao demandante E… a quantia de € 11.000,00 correspondente a danos patrimoniais, quantia essa acrescida de juros desde a citação até integral pagamento à taxa de 4% -portaria 291/2003 de 08.04.;
- condenar a demandada a pagar ao demandante E… a quantia de €7.000,00 correspondente a danos não patrimoniais, quantia essa acrescida de juros desde a presente data até integral pagamento à taxa de 4% -portaria 291/2003 de 08.04.;
- condenar a demandada a pagar ao demandante E… todas as despesas futuras que este suportará com acompanhamento psicológico especializado, resultante do acidente sofrido;
d) Condenar demandantes e demandada nas custas do pedido cível, na proporção do respectivo decaimento”.

Inconformados com tal decisão, apenas na parte relativa à determinação do montante indemnizatório, os demandantes civis C… e D…, por si e na qualidade de pais e representantes do menor E…, recorreram para esta Relação, formulando as seguintes conclusões (transcrição):
1.° O presente recurso, restrito à parte cível, fundamenta-se apenas na determinação do montante indemnizatório obtido pelo Tribunal a quo ao nível dos danos patrimoniais e não patrimoniais atribuídos ao menor E…, considerando a matéria de fado provada, uma vez que no apuramento da responsabilidade pela eclosão do sinistro a sentença recorrida não merece qualquer tipo de censura.

2.° Veja-se que o menor E… sofreu danos consideráveis, considerando o exame médico-legal realizado nos presentes autos, conjugado com toda a matéria de facto apurada que aqui se deve considerar integralmente transcrita.

3.° Ora, não restam dúvidas que as dores sofridas aquando do embate que se prolongaram por mais de um ano, o desgosto pelas sequelas com que ficou, os longos períodos de tratamento, as sequelas que se prolongam no futuro e determinantes de uma IPP de 5%, e tendo em conto o disposto no art. 494° e 496° C.C entendemos ser equitativo o valor de mais € 15.000,00. em vez dos € 7.000,00 fixados no sentença recorrido.

4.° No caso dos presentes autos, o "quantum doloris" é elevado e não menos o é o “prejuízo de afirmação social”, considerando que se trata de uma pessoa, ainda jovem, sinistrado, ainda em pleno período de afirmação da sua personalidade, sendo aqui particularmente relevante a quebra na alegria de viver que integra aquele prejuízo

5.° Ora, considerando designadamente a ausência de culpa do menor, a culpa grave do condutor do veículo seguro na recorrida, a dimensão, multiplicidade e gravidade das lesões sofridas, o intensidade, extensão e localização das dores que suportou e naturalmente suportará de futuro, a diminuição física, tristeza, incerteza e angustia próprias do estado que vivenciou e ainda conserva, as intervenções cirúrgicas o que foi sujeito, o longo período de tratamentos que passou e que passará no futuro sem olvidar o sofrimento que o molestou, temos como equitativo a compensação de € 15.000,00.

6.° A sentença recorrida violou, neste particular, designado mente, o art.º 562º, o n.º2 do art. 566° e o nº 3 do art. 496°, todos do Código Civil.

7.° Na fixação do montante indemnizatório a fixar ao menor E… e no que respeita à IPP que ficou a padecer há que ponderar que à data do acidente, a vítima tinha 13 anos de idade, idade ainda longe da vida activa, cujo esperança se considera nos 70 anos, não esquecendo a esperança média de vida que se deve situar nos 78 anos, a sua I.P.G. é de 5 pontos e um salário médio de € 800 o partir dos 22 anos;

8.° Deve ter-se em conta os prejuízos que, com grande probabilidade, ocorrerão e que se prendem com impedimento de progressão ou com dificuldades na progressão na carreira profissional, ou conduzindo mesmo a reforma antecipada, com as inerentes quebras de rendimento no futuro, não deixando de se reconhecer em geral a extrema dificuldade em calendarizar a previsível progressão profissional e determinar a sua quantificação.

9.° Atendendo às circunstâncias supra referidas e aplicando a equidade, considera-se adequado atribuir ao lesado E… pelo dano aqui tratado, um montante de € 20.000,00.

10.° A decisão recorrido violou o disposto nos artigos 483°, 562° e 564°, n. ° 2, todos do Código Civil.

11.° Às quantias acima descritas, acrescem juros de mora, calculados à taxa legal para operações civis, desde a data da citação, face ao preceituado no art. 805° nº.3 do Código Civil e até efectivo e integral pagamento.

A demandada civil “Companhia de Seguros F…, SA” respondeu à motivação do recurso, defendendo a sua improcedência e a manutenção integral da sentença recorrida.

Nesta Relação, a Ex.ª Procuradora-geral-adjunta apôs o seu visto.

Colhidos os vistos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

2. Fundamentação
2.1. Matéria de facto

A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos:

1. No dia 2 de Abril de 2008, cerca das 08:20 horas, na Rua …, em …, Matosinhos, a arguida conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-ZD, no sentido nascente/poente, a velocidade não concretamente apurada.
2. Após passar o cruzamento existente antes do número de polícia …., a arguida manteve a velocidade a que circulava, não a reduzindo, apesar de se aproximar de uma passadeira destinada à travessia de peões.
3. Por tal motivo, a arguida não conseguiu imobilizar o veículo dentro do espaço livre e visível à sua frente e foi embater no corpo do peão E…, que nesse momento atravessava a faixa de rodagem na aludida passadeira para peões, da direita para a esquerda, atento o sentido de marcha do veículo.
4. No momento em que foi embatido, o peão encontrava-se sensivelmente a meio da travessia da via, com a largura total de 6,3 metros.
5. Em consequência do embate, E… sofreu traumatismo craniano, equimose da face externa do joelho direito, cervico-dorsalgias e artralgias no tornozelo direito.
6. Tais lesões determinaram, directa e necessariamente, a E…:
- 2 dias de incapacidade temporária geral total;
- 319 dias de incapacidade temporária geral parcial;
- 29 dias de incapacidade temporária profissional total;
- 292 dias de incapacidade temporária profissional parcial;
- quantum doloris de grau 3;
- incapacidade permanente geral fixável em 5 pontos,
Sendo a data da consolidação médico-legal das lesões, fixável em 16/02/2009.
7. A arguida actuou da forma descrita, não circulando por forma a permitir-lhe a paragem em segurança, no espaço livre e visível à sua frente e sem o cuidado a que estava obrigada perante a aproximação de uma passagem para a travessia de peões.
8. Podia e devia ter previsto que, com a sua conduta, que sabia não ser permitida, poderia vir a causar lesões físicas graves em qualquer pessoa ou a causar perigo de vida a qualquer pessoa, e assim, ter adoptado o comportamento adequado a evitar as lesões que provocou.
9. À data dos factos, as condições atmosféricas eram boas.
Condições pessoais da arguida
10. A arguida é esteticista de profissão, encontrando-se porém a exercer as funções de formadora no G…, auferindo um rendimento mensal líquido de cerca de € 500,00.
11. É divorciada e tem um filho de 16 anos, estudante, a seu cargo.
12. Vive em casa dos seus pais.
13. Despende mensalmente cerca de € 319,00 com a escola frequentada pelo filho.
14. Tem como habilitações literárias o 12º ano de escolaridade.
15. Não tem antecedentes criminais.
Pedido de indemnização civil
16. A faixa de rodagem no local do acidente tem a largura aproximada de 6,30 metros e é constituída por dois corredores de circulação, cada um afecto ao seu sentido de marcha.
17. O piso da faixa de rodagem era como é em asfalto e encontrava-se seco e em bom estado de conservação.
18. Atento o sentido de marcha do RN, a faixa de rodagem descreve-se numa recta com boa visibilidade, avistando-se numa extensão superior a 50 metros.
19. O local é uma localidade, pois situa-se numa Rua principal da localidade de Matosinhos, sendo que o mesmo é ladeado de casas de habitação, de comércio, e da Escola, constituindo um aglomerado urbano.
20. Sendo também um local de muito tráfego e de muita passagem de peões.
21. O peão iniciou o atravessamento depois de se ter certificado de que o poderia fazer sem perigo de acidente.
22. O proprietário do veículo de matrícula ..-..-ZD, H…, através de contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel titulado pela apólice n.º ………, transferiu a sua responsabilidade civil emergente da circulação do referido veículo para a ora Requerida, encontrando-se tal seguro válido e eficaz no momento do acidente.
23. O menor apresentava, de forma visível, escoriações ao nível do peito e da face.
24. Apresentava, também, traumatismo craniano, tendo
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT