Acórdão nº 510/21.6T8ALB.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-12-14

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Ano2022
Número Acordão510/21.6T8ALB.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Apelação nº 510/21.6T8ALB.P1


ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I – Resenha histórica do processo
1. AA instaurou ação contra “L..., SA”, pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia global de €15.972,33, acrescida de juros desde a citação até integral pagamento.
Fundamentou este seu pedido na responsabilidade civil por factos ilícitos, decorrente de acidente de viação causado pelo segurado na Ré, do qual lhe advieram os danos patrimoniais especificados na petição inicial.
Em contestação, a Ré impugnou a factualidade alegada e considerou que a culpa do acidente se ficou a dever ao Autor; invocou ainda a culpa do Autor no avolumar do dano de privação do uso do veículo.
Realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia global de €12.627,33, acrescida de juros moratórios vencidos e vincendos, desde a citação até integral pagamento.

2. Inconformada com tal decisão, dela apelou a Ré, formulando as seguintes CONCLUSÕES:
«1.º - Nos termos do disposto nos artigos 627.º, 629.º, n.º 1, 631.º, n.º 1 637.º, n.º 1 e 2, 638.º e 639.º do CPC, vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida a fls., no âmbito do processo supra identificado, a qual julgou parcialmente procedente a ação judicial proposta pelo Autor AA, condenando, em consequência, a Ré, ora Recorrente, em parte dos pedidos formulados nos autos, com a qual a Ré, agora Recorrente, salvo o devido respeito, não se poderá conformar.
2.º - Com efeito, a ora Recorrente não se conforma com a sentença ora recorrida, nos termos da qual foi condenada a pagar ao ora Recorrido, além do valor necessário à reparação do veículo DV, o valor de €6.540,00 a título de privação do uso do referido veículo.
3.º - Assim, sem estar em causa a configuração do acidente de viação ou a distribuição da culpa, a ora Recorrente vem insurgir-se contra os montantes indemnizatórios arbitrados na douta sentença recorrida a título de indemnização pela privação do uso do veículo DV, uma vez que, entende que, tais montantes afiguram-se manifestamente desajustados, por excessivos, atenta a factualidade julgada provada nos autos e, bem assim, os critérios jurisprudenciais atualmente seguidos pela nossa jurisprudência, encontrando-se, nessa medida, incorretamente interpretadas e/ou aplicadas as normas legais previstas nos artigos 483.º, 562.º, 563.º, 566.º, n.º 3 e 570.º, n.º 1 do CC.
4.º - Ora, não obstantes as diversas teses em torno do tema da privação do uso, no entendimento da ora Recorrente, e na esteira de grande parte da Jurisprudência dos Tribunais Superiores, a privação do uso de um veículo não basta, só por si, para fundar uma obrigação de indemnizar, incumbindo ao lesado uma obrigação de efetiva prova da existência de prejuízos de ordem patrimonial ou não patrimonial decorrentes da não utilização do bem.
5.º - Sendo certo que, da matéria considerada como provada nos presentes autos e supra transcrita, não resultou, de forma clara e inequívoca, que o ora Recorrido tenha sofrido danos decorrentes da privação do uso do veículo DV e em que medida.
6.º - Efetivamente, da matéria de facto considerada como provada apenas resultou que o Autor, ora Recorrido, na sequência da privação do uso do veículo DV, sofreu incómodos, pois viu-se obrigado a recorrer a terceiros para realizar as suas deslocações, nomeadamente, à mãe e à namorada.
7.º - Ora, como pode ler-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 04/07/2013, “a privação do uso de um veículo automóvel não é suficiente para nela fundar a obrigação de indemnizar, a não serem alegados e provados danos emergentes e (ou) lucros cessantes por aquela causados”, disponível em www.dgsi.pt.
8.º - Repita-se que, da parte do ora Recorrido, não houve qualquer alegação, e muito menos prova, de que, de facto, a privação do uso do veículo DV provocava na sua esfera jurídica um dano emergente ou um lucro cessante, conforme, de resto, facilmente se constata da matéria considerada como provada nos presentes autos e supra transcrita.
9.º - Neste sentido, e face a tudo o que antecede, entende a ora Recorrente que nenhuma indemnização deverá ser arbitrada ao ora Recorrido a título de privação do uso do veículo DV, porquanto o mesmo não logrou provar a existência de prejuízos verificados na sua esfera jurídica em consequência da privação do uso do referido veículo, devendo, assim, a douta sentença ser revogada, e em consequência, a Ré, ora Recorrente, ser absolvida do pagamento da indemnização arbitrada pelo Tribunal a quo a título de privação do uso do veículo, sob pena de violação do disposto nos artigos 483.º, 562.º e 563.º todos do CC.
10.º - Não obstante, considerando-se não ser necessária a prova dos danos concretos causados pela privação do uso do veículo em causa, sempre se dirá que, não sendo possível quantificar o dano em valores certos face aos factos provados, o tribunal deverá recorrer à equidade para fixar a indemnização, nos termos previstos no artigo 566.º, n.º 3, do CC – conforme defendido no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 06/02/2018, proferido no âmbito do processo 189/16.7T8CDN.C1.
11.º - Com efeito, no caso vertente, nenhum sentido faz que a ora Recorrente tenha sido condenada a pagar ao Recorrido o valor de €10,00 diários por referência à privação do uso do veículo DV quando não resultou provado que o Recorrido tenha, efetivamente, sofrido esse prejuízo diário, na sequência da impossibilidade de utilizar o veículo DV. In casu, nem sequer resultou provado que o Recorrido tenha sofrido danos patrimoniais decorrentes da utilização de um transporte alternativo (como, por exemplo, transportes públicos).
12.º - Neste sentido, e face a tudo o que antecede, entende a ora Recorrente que, considerando-se não ser necessária a prova dos danos concretos causados pela privação do uso do veículo em causa, a ser atribuída qualquer indemnização ao ora Recorrido a este título, sempre deverá a referida indemnização ser fixada com recurso a critérios de equidade e não com base numa quantia diária, a funcionar como “taxímetro”, devendo, assim, a douta sentença ser revogada e alterada nos termos ora requeridos, sob pena de violação do disposto nos artigos 483.º, 562.º, 563.º e 566.º, n.º 3 todos do CC.
13.º - Além da questão da inexistência de prova dos danos causados pela privação do uso e da indemnização diária fixada pela douta sentença ora recorrida, a ora Recorrente não poderá, igualmente, concordar com o período de tempo considerado pela douta sentença ora recorrida para efeitos de privação do uso (654 dias).
14.º - Afigura-se manifestamente desproporcional condenar a ora Recorrente a indemnizar o Recorrido pela privação do uso do veículo DV desde a data do acidente até à data da propositura da ação, porquanto, apenas com a prolação da sentença ora recorrida a ora Recorrente tomou conhecimento de que seria a responsável pela regularização dos danos em apreço na presente ação.
15.º - Assim, entende a ora Recorrente que apenas deveria ter sido condenada a pagar uma indemnização pela privação do uso pelo período de cinco dias, correspondente ao período estritamente necessário à reparação do veículo DV.
16.º - Desde logo porque, a ora Recorrente em nada contribuiu para o prolongamento da privação do uso do veículo DV no tempo. Bem pelo contrário! Foi o próprio Recorrido que deu azo ao prolongamento no tempo da privação do uso. Veja-se que, a ora Recorrente informou o Recorrido de que não aceitava a responsabilidade pela eclosão do acidente e foi o Recorrido que decidiu, por sua conta e risco, não reparar o
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