Acórdão nº 51/24.0BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 07-08-2024

Data de Julgamento07 Agosto 2024
Número Acordão51/24.0BCLSB
Ano2024
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam no Coletivo constituído para o presente Turno, no âmbito de Reclamação para a Conferência apresentada pela reclamante Federação Portuguesa de Futebol:


I – RELATÓRIO

FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL interpõe recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Arbitral do Desporto que concedeu provimento ao recurso interposto pelo SPORTING CLUBE FARENSE – ALGARVE FUTEBOL, SAD, anulando a decisão proferida pelo Conselho de Disciplina, ao abrigo do artigo 8.º/1, 2 e 5 da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto, que aplicou a sanção de multa no valor de € 33.470,00 e 2 dias de jogo à porta fechada, por alegado comportamento racista por parte dos adeptos da recorrida.
Inconformado, o recorrente interpôs recurso desta decisão junto deste Tribunal, que decidiu em “DECISÃO SINGULAR”, julgando a sanção aplicada amnistiada, pois que estando em causa a aplicação de sanções disciplinares não superiores a suspensão, não constituindo a infração disciplinar, simultaneamente, ilícito penal não amnistiado pela Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto, e sido praticada em data anterior a 19/06/2022, conforme estatui o artigo 2.º, n.º 1, e 6.º deste diploma legal.
Em todo o caso, inconformado com a “Decisão Sumária”, reclama para a conferência, alegando, em síntese:
A) A decisão sumária aponta a inexistência de recurso da matéria de facto, mas houve alegações de recurso quanto à matéria de facto dada como provada;
B) A decisão do TAD não aplicou a lei da amnistia porquanto entendeu que a sanção referente à realização de 2 jogos à porta fechada levantaria dificuldades interpretativas para se saber se se deve considerar este tipo de sanção superior à suspensão, já que este tipo de sanção está talhado para pessoas singulares e a realização do jogo “à porta fechada” está talhado para pessoas coletivas; e, por outro lado, sendo a demandante reincidente estaria fora da aplicação da lei da amnistia.
Defende que deve ser revogada a “Decisão Sumária”, pugnando que deve o Tribunal ad quem decidir o mérito da causa, por não estar amnistiada a sanção em causa.
***
E quanto às suas conclusões de recurso propriamente dito, o que baliza a pronúncia deste Tribunal, foi alegado, em síntese, que:
“...
1. É entendimento do Recorrente que a decisão proferida padece de vícios, quer no apuramento da matéria de facto, quer na solução de direito que propugnou, razão pela qual este Recurso versa matéria de facto e matéria de direito.
2. É entendimento do Recorrente que deveria ter sido dada como provada a seguinte matéria de facto:
a) O Campo Gémeos Castro, em Candoso, Guimarães não possuía sistema de som para anúncios ao público espectador, nem estava regularmente obrigado a possui-lo!
b) O diretor de segurança da Demandante, A........, presente no recinto de jogo identificou a pessoa que proferiu observações de natureza racista, dirigidas ao jogador, J........, tratando-se de um adepto idoso;
c) O Senhor A........ mandou um reforço de ARD's para o local antes de ter identificado o adepto, circunstância que serenou os ânimos;
d) O Comandante do Policiamento da PSP, L........, presente no recinto de jogo, foi informado pelo Senhor A........ de quem era o adepto, tendo aquele decidido que o mesmo não seria expulso, para não acicatar os ânimos e, para além disso, porque era idoso, ia ter o apoio do público, pelo que seria apenas identificado no final do jogo num auto a ser elaborado para o efeito;
e) O Senhor A........ acatou a referida ordem policial;
f) O delegado da FPF apareceu no local após o Senhor A........ ter identificado o adepto;
g) A Demandante tem implementadas as seguintes medidas destinadas à prevenção e combate a comportamentos racistas: (i) o equipamento é branco e preto: (ii) a decoração no estádio com frases contra comportamentos racistas, como sucedeu, por exemplo, aquando da realização de jogos da Liga das Nações; (iv) a existência de murais com antigos jogadores do VSC de raça negra; (v) o Relações Públicas é de raça negra – N…; (vi) a realização de ações nas escolas contra a violência e o racismo; (vii) a divulgação de vídeos e de mensagens por parte do speaker antes e depois dos jogos: (viii) a realização de ações de sensibilização e de formação dos adeptos, designadamente através do OLA:
h) A identificação do adepto permitiu que a Autoridade de Prevenção e Combate à Violência no Desporto instaurasse um processo de contraordenação nos termos do qual o mesmo foi admoestado e lhe foi aplicada uma sanção assessória de interdição de acesso a recintos desportivos pelo período de 9meses;
4) Para formação da convicção quanto a estes fatos que deveriam ter sido dados como provados, resulta o depoimento da testemunha A........, em nada posto em causa nos autos, bem como a demais prova documental dada nos autos, tudo conforme resulta do corpo das alegações.
5) Desde sempre ressaltou à saciedade dos autos, vertida no relatório do delgado da FPF e do relatório do Chefe da Força policial, que terá sido apenas uma pessoa aquela que alegadamente dirigiu palavras de cariz racista ao Jogador J......... Resulta, também de forma abundante, que os elementos do Staff do VSC tentaram acalmar os ânimos da bancada única existente no recinto, partilhada por adeptos visitados e visitantes, ânimos esses que, na sua globalidade não tinham qualquer teor racista ou xenófobo (feita exceção daquele único adepto).
6) Foi precisamente por os elementos do VSC e os elementos da força policial, terem tentado ir acalmar os ânimos que foi possível ouvir, dentro daqueles ânimos exaltados, que havia uma única pessoa singular que estaria a dirigir palavras de cariz racista.
7) Apenas ao chefe da força policial cabia autoridade para remover aquele adepto da bancada, mas, no entanto, este esclareceu nos autos que: fls. 111, que «o infrator não foi expulso do recinto desportivo porque, os ânimos estavam exaltados por parte dos adeptos da equipa visitada e eram em número considerável, para que não houvesse uma reação violenta por parte desses adeptos que eram em número significativo», aditando que «uma intervenção musculada por parte da PSP poderia desencadear uma alteração da ordem pública, podendo por em risco terceiros, que nada tinham a ver com a situação», terminando concluindo que «por tal motivo entendeu-se intercetar e identificar o infrator apenas no final do jogo, tendo sido informado do motivo da identificação e dos trâmites legais a seguir»;
8) Realça-se, agora, que conforme expos a testemunha A........, Coordenador de Segurança do VSC SAD, esta decisão do Comande policial foi-lhe também a ele comunicada, pelo que, o que existiu por parte do VSC, foi um total acatamento da ordem da P.S.P, mas é também importante realçar que, conforme também expos a testemunha A........, este colaborou e foi preponderante para que ambos (i.e, o coordenador de segurança e o comandante de policiamento) conseguissem detetar aquele único individuo que tomou as lamentáveis condutas relatadas nos autos.
9) Entende o recorrente que a procedência do recurso da matéria de facto demonstra, desde logo, a existência dos factos que impõe a sua absolvição, mas, no entanto, ainda que o recurso da matéria de facto seja julgado improcedente, a correta interpretação da norma jurídica impõe a absolvição do arguido.
10) É entendimento do recorrente que a norma do artigo 62° do RDFPF, não contém, nos seus elementos objetivos, a tipificação de uma conduta omissiva de um clube no sentido de aquela conter uma obrigação de, em momento posterior aos factos, o clube punir os adeptos que pratiquem atos racistas, sob pena de, na sua ausência, se ter como assente que o clube consentiu ou tolerou o ato racista anteriormente sucedido.
11) Na verdade, nos termos do artigo 62° do RDFPF, a ação ou omissão do clube, tem que ser tida como causal na produção do resultado, o que excluiu desde logo a interpretação da decisão recorrida no sentido de que a produção desse resultado tenha ocorrido pela omissão de um ato a praticar posteriormente ao resultado!
12) Fácil está de compreender, assim, a incoerência lógica em que incorre a decisão recorrida, cuja interpretação não encontra qualquer amparo na norma punitiva, pelo que cumpre absolver o recorrente!
13) Por outro lado, nos termos do artigo 66° do RDFPF a Recorrente tem a obrigação de punir aquele seu adepto, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 8° alínea c) e artigo 39-A, n.º 1, alínea b) da lei de combate á violência, racismo, xenofobia no desporto, aprovado pela lei 39/2009 de 30 de Julho na sua atual redação, doravante LCVD.
14) Assim, o incumprimento da arguida deste seu dever legal previsto nos termos das disposições conjugadas dos artigos 8° alínea c) e artigo 39-A, n.º 1 alínea b) da LCVD faria a arguida incorrer numa violação ao sobredito artigo 66° do RDPFP.
15) Aqui chegados, conclui-se que o entendimento que a decisão recorrida faz da norma do artigo 62° do RD entra em conflito com a norma do artigo 66° do RD, na medida em que ambas as normas exigiriam ao VSC a punição do seu adepto, sob pena de incorrer em infração disciplinar, pelo que, a vingar o entendimento que a decisão recorrida faz do artigo 62°, n.º 1, do RD, deparamo-nos íamos, assim, com a existência de um verdadeiro e efetivo concurso de normas punitivas, uma vez que o artigo 62° e o artigo 66°, ambos do RD, disputariam, entre si, a autoridade punitiva sobre a conduta típicas in casu, a falta de punição do adepto.
16) É, assim, premente, concluir-se que a norma típica do artigo 62° do RD não contém, nos seus elementos objetivos, a tipificação de uma conduta omissiva de um clube no sentido de aquela conter uma obrigação de, em momento posterior aos factos, o clube punir os adeptos que pratiquem atos racistas, sob pena de, na sua ausência, se ter como assente que o clube consentiu ou tolerou o ato racista anteriormente sucedido.
17) A decisão do Conselho de Disciplina,...

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