Acórdão nº 5076/22.7T8MAI.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 20-05-2024

Data de Julgamento20 Maio 2024
Número Acordão5076/22.7T8MAI.P1
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 5076/22.7T8MAI.P1

Sumário do acórdão proferido no processo nº 5076/22.7T8MAI.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil:

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Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:

1. Relatório[1]

Em 04 de outubro de 2022, com referência ao Juízo Local Cível da Maia, Comarca do Porto, A... Lda., intentou a presente ação de processo comum, contra Companhia de Seguros B..., S.A., na qualidade de representante em Portugal da B... – Compañia de Seguros y Reaseguros, S.A., pedindo a condenação desta a pagar-lhe as seguintes quantias:

- € 17.077,45, a título de privação do uso do reboque LE-....;

- € 7.872,00 a título de despesas de serviço de reboque do trator MAN e do semirreboque LE;

- juros legais, contabilizados desde a data da citação, até integral pagamento da indemnização.

Para fundamentar as suas pretensões, alegou, em síntese, que no dia 13 de novembro de 2019, pelas 13 horas, na autoestrada nº ..., em ..., França, ocorreu um acidente no qual foram intervenientes o camião pesado, de marca MAN, trator de matrícula ..-PE-.., atrelado com o semirreboque de matrícula LE-...., tudo propriedade da autora e conduzido por AA, o camião pesado, de marca DAF, de matrícula espanhola ....-HMX, propriedade de C... e ainda o camião de matrícula ..-UM-..; o DAF embateu na traseira do semirreboque LE-...., projetando-o, juntamente com o MAN, para a sua frente, indo este embater no semirreboque GD-..., que não sofreu danos; com o embate, o MAN e respetivo semirreboque LE-.... sofreram danos de que resultou a “perda total” de ambos; o embate ocorreu exclusivamente por culpa do condutor do DAF, que seguia desatento; entre a dona do camião DAF e a B... – Compañia de Seguros y Reaseguros, S.A., à data dos factos, vigorava o contrato de seguro titulado pela apólice nº ....

Citada, a ré contestou pugnando pela competência internacional dos Tribunais portugueses para o litígio objeto de autos e à aplicação da lei material francesa ao caso; alegou que de acordo com a lei material aplicável, no caso de perda total, o dano da privação do uso limita-se a dez dias, à razão diária de € 134,86, tendo a ré, em representação da B..., ES pagado à autora a quantia de € 2 697,20, sendo € 1 348,60 a título de privação do uso do semirreboque LE e outro tanto a título de privação do uso do trator MAN, em ambos os casos tendo em consideração uma privação do uso por dez dias, importância que a autora aceitou sem qualquer reserva; alegou ainda que o reboque para Portugal do semirreboque LE e do trator MAN para Portugal, dados os danos que sofreram e que determinaram a sua perda total constitui uma despesa desnecessária, excessiva e injustificada, tanto mais que os salvados do LE têm o valor de € 105,00 e a perda total do trator implicou o reembolso à seguradora do mesmo por danos próprios da quantia de € 19 668,90; mais alegou que a autora apenas ofereceu faturas para comprovar os dispêndios que alegou ter feito, não oferecendo qualquer recibo e que na eventualidade de ter procedido ao pagamento de tais faturas, deduziu o IVA liquidado nas mesmas, concluindo por que a ação seja julgada em conformidade com a prova produzida em audiência final.

Depois de notificada para o efeito, a autora respondeu à contestação pugnando pela competência internacional dos tribunais portugueses, em consonância com o que foi sustentado pela ré na sua contestação.

A audiência prévia foi dispensada, fixou-se o valor da causa no montante de € 24.949,45, proferiu-se despacho saneador tabelar, identificou-se o objeto do litígio, enunciaram-se os temas da prova, admitiram-se as provas oferecidas pelas partes e designou-se dia para realização da audiência final.

A audiência final realizou-se em duas sessões e em 20 de julho de 2023 foi proferida sentença[2] que terminou com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, e ao abrigo das referidas disposições legais julgo parcialmente procedente a presente acção e em consequência:

i) Condeno a Ré a pagar à Autora a quantia a quantia de €7.282,44, a título de privação do uso do reboque LE-...., acrescida de juros a contar desde a data de citação, à taxa legal.

ii) Absolvo da Ré do demais peticionado na presente acção;

iii) Custas pela Autora e Ré na proporção do decaimento (art. 527.º, nº1, do CPC).

Em 09 de outubro de 2023, inconformada com a sentença cujo dispositivo se reproduziu, A..., Lda. interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1. A recorrente não concorda com da absolvição da R. a Título de despesas de repatriamento, uma vez que a decisão do tribunal aquo, impunha em face da prova produzida, uma decisão completamente diferente.

Senão vejamos

2. A recorrida B... Compania de Seguros Y Reaseguros a assumiu a responsabilidade civil inerente ao veículo de matrícula ....-HMX, através [sic]

3. Impõe a lei aplicável que em sede de responsabilidade civil extracontratual seja aferida à luz do regulamento (CE) nº 864/2007 do parlamento europeu e do conselho de 11 de Julho de 2007. O referido revela-se decisivo em sede de aplicação da lei aplicável pois que o artigo 45º do CC, opta pela escolha como regra geral, e em sede de responsabilidade extracontratual, da lex loci delicti commsi, já o artigo 4º, nº 1, do regulamento (CE) nº 864/2007 sob a epigrafe de “regra geral” e inserido no respectivo, elege a invés a lex damini, como sendo aplicável, como regra geral, o que revela é o pais onde ocorreram os danos (dano patrimonial e/ou moral, não dano real, independentemente do país onde tenha ocorrido o facto que deu origem ao dano e independentemente do país ou países onde ocorram as consequências indirectas do facto desencadeador da obrigação de indemnizar.

4. No mesmo sentido já se pronunciou, o tribunal da relação do porto de 09-05-2013, relativamente a um litígio que opunha o lesado residente em Portugal, vítima de um acidente ocorrido em Espanha, a ré seguradora sedeada na frança, com representação em Portugal, e o acórdão do STJ, de 28-10-2009, relativamente a um litígio em que uma empresa portuguesa demanda companhia de seguros pelos danos emergentes de acidente de viação ocorrido em França, com veículo segurado nesta última.

SEM PRISCINDIR,

5. O A. entende em síntese, que nas acções de responsabilidade civil extracontratual – como é o caso da presente acção – “a causa de pedir é complexa envolvendo o evento, a culpa, e os danos – vide Ac. do STJ de 15-10-71, BMJ 210 pág-116 e no AC STJ de 27-10-1969, BMJ, 19 V -285”; e “para que o Tribunal Português seja internacionalmente competente a Lei não exige que todos esses items constitutivos da causa de pedir sejam praticados em Tribunais ,”bastando apenas que algum desses factos sejam praticados em território nacional – crf. Artº 62 al) b) do CPC ss; Ora, como “nos presentes autos, um dos elementos que integra a causa de pedir é, precisamente, os danos sofridos pelo A. e como resulta nos artigos 19º a 22º e 35º a 38º da PI [….] alguns dos danos sofridos ocorreram, desenvolveram-se ou agravaram-se em Portugal”. Decorre claramente, dos artigos 10º e segs. do regulamento que neste diploma é assumido que em matéria de seguros, existe um desequilibro entre as partes, pelo que as regras dos artigos 10º e seg. visam conferir à parte mais fraca: o tomador de seguro, o segurado, o beneficiário ou o lesado (assim,

afirma-se no considerando o artigo 18 do regulamento: “respeitante aos contratos de seguro e de trabalho, é conveniente proteger a parte mais fraca por meio e regras de competência mais favoráveis aos seus interesses do que a regra geral. Cfr. Também, Merco Carvalho Goncalves, est. cit, pp.433-435, nomeadamente, p.435).

6. O acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo nº 20953/17.9T8LSB.L1-6, cuja relatora é a Exma. Sra. Desembargadora a Dra. Ana Paula Carvalho, disponível no site da DGSI, onde se refere: “Por aplicação das disposições especiais dos artigos 11º, nº, al) b) e artigo 13º, nº2, do regulamento (EU) nº 1215/2012, o tribunal português é internacionalmente competente para julgar o litígio em que a autora, residente em Portugal demanda a ré, companhia de seguros francesa (com representação em Portugal), pelos danos emergentes de acidente ocorrido em França, com veículo segurado nesta última, por aplicação do princípio da protecção da parte mais fraca e por ser possível a acção directa em matéria de seguro de ao abrigo do artigo 62º nº 2, al) b) do CPC, é forçoso concluir que o Tribunal é internacionalmente competente. Existe competência internacional dos Tribunais Portugueses “uma vez que a propositura da acção no estrangeiro irá e iria acarretar dificuldades acrescidas ao autor, ainda porque um elemento de conexão pessoal poderoso entre o objecto do litígio e a ordem jurídica Portuguesa –crf. Artigo 62º al) c) do CPC”.

DO REPATRIAMENTO:

7. Ora, resultou provado no ponto 15 dos factos dados como provados da sentença “A. despendeu a quantia de €4.797,00 (quatro mil setecentos e noventa e sete euros) e no ponto 16 “A A. despendeu o valor €3.075,00 (três mil e setenta e cinco euros).Para além disso, como refere o ponto 8 dos factos provados da sentença “ Com o violento embate, o Man e respectivo atrelado (galera) LE-.... sofreram avultados danos, resultando, entre outros, “perda total” para ambos”. Trata – se de um acidente de viação em que todos os intervenientes são veículos de transporte Internacional e ocorreram numa auto-estrada em frança, conforme artigos 1 e 2 da matéria de facto dada como provada.

8. Conforme as regras da experiência comum se o Man e LE foram considerados perda total, os mesmos não tendo “asas” para regressarem a Portugal e é por, demais evidente, que os mesmos fossem transportados para Portugal através de serviço de...

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