Acórdão nº 4957/18.7T8SNT-B.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 14-03-2019

Data de Julgamento14 Março 2019
Número Acordão4957/18.7T8SNT-B.L1-6
Ano2019
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

I-Relatório.
1-Massa Insolvente de G,SA, representada pela respectiva Administradora da Insolvência, instaurou execução para pagamento de quantia certa contra Informática, Lda, visando o pagamento coercivo de 85 000€ de rendas vencidas e 19 533,70€ de juros de mora vencidos.
Apresentou como título executivo, o contrato de arrendamento celebrado entre a, SA, como senhoria e, a Informática, Lda, enquanto inquilina, a notificação judicial avulsa da inquilina pela qual lhe comunica a resolução do contrato por falta de pagamento de rendas e a intenção de exercer os seus direitos relativos à cobrança das rendas em dívida.
Nesse contrato intervieram, na qualidade de fiadores, JS, PL e, FL, com renúncia ao benefício de excussão prévia, assumindo a obrigação solidária de cumprimento do contrato, seus aditamentos e renovações até efectiva restituição do locado (cláusula 8ª do contrato).
2- Notificada de não terem sido identificados quaisquer bens penhoráveis à executada Informática, Lda, a exequente requereu intervenção principal (provocada) de JS, de PL e de FL, que no contrato de arrendamento haviam intervindo na qualidade de fiadores, com vista a deles obter o pagamento da quantia exequenda (rendas em dívida e juros).
3- Por despacho de 20/09/2018, a 1ª instância indeferiu o incidente de intervenção de terceiros (os fiadores), argumentando “…que a sua intervenção na acção executiva é legalmente inadmissível …”.
4- Inconformada, a exequente interpôs o presente recurso, apresentando as seguintes
CONCLUSÕES:
A-Notificada do facto de não se terem identificado quaisquer bens penhoráveis à executada Informática, Lda, a ora recorrente veio, ao abrigo do artº 316º do CPC, requerer a intervenção provocada, a título principal, como executados, de JS, PL e FL, fiadores da arrendatária executada, a fim de deles obter o pagamento das rendas em dívida.
B. Por despacho de 20/09/2018, o Tribunal decidiu indeferir tal incidente de intervenção, por carecer “a exequente de título executivo quanto aos chamados, os quais não se encontram legitimados pelo título executivo que serve de base á execução”, ou seja, na óptica do Tribunal, não há título executivo contra os fiadores, mas só contra a arrendatária.
C. O documento particular que formaliza o contrato de arrendamento é, nos termos do artº 14º nº 1 do NRAU, o núcleo do título executivo para a cobrança das rendas: constitui um título negocial a que é atribuída força executiva contra o arrendatário, nele obrigado a título principal ao pagamento da renda, e contra o fiador, se o houver, nele obrigado ao mesmo pagamento a título subsidiário.
D. Compreende-se que a lei exija que o título executivo seja completado com a comunicação ao arrendatário do montante em dívida, a fim de salvaguardar esses seus direitos, conducentes à manutenção do contrato, no seu interesse. Trata-se, como se diz no ac. do STJ de 26/11/2014, citado nas alegações, de um mero “complemento do contrato de arrendamento”.
E. Diferentemente se coloca a questão quanto ao fiador, cuja obrigação de garantia tem conteúdo idêntico ao da obrigação que garante.
F. A contracção da obrigação do fiador no título constitutivo do contrato de arrendamento, por ele assinado, constitui, com a condição de ser feita a notificação ao devedor, requisito suficiente do título executivo, entendimento que tem sido sufragado pela jurisprudência dos tribunais superiores, como decorre de alguns excertos de arestos transcritos nas alegações.
G. Sem prejuízo do pleno direito do fiador a discutir, embargos de executado, a existência e o conteúdo da dívida, quer no plano da obrigação principal, que da obrigação acessória, não faria sentido que só pudesse ser movida execução contra o arrendatário e contra o fiador houvesse que propor previamente acção declarativa, quando ambos contraíram as suas obrigações no mesmo documento particular que a lei especial considera título executivo.
H. Quando muito, a entender-se que a equiparação das situações dos dois devedores levaria a exigir a notificação do fiador, esta considerar-se-ia feita com a sua citação para ação executiva com o valor de interpelação.
I.À cautela, e caso assim não se entenda, perfilhamos o entendimento que tem vindo a ser adoptado pela jurisprudência, no sentido de que, não tendo sido requerida, quanto aos fiadores, a sua notificação judicial avulsa, é suficiente que lhes tenha sido comunicado o montante em dívida, uma vez que tomaram conhecimento de que o arrendatário deixou de cumprir, nos termos de alguns excertos de arestos transcritos nas alegações.
J. A notificação judicial avulsa foi, in casu, requerida contra a arrendatária, tendo sido assinada por JS, sócio-gerente da executada e fiador do contrato em causa nos autos – cfr. docs. 5 e 6 juntos com o requerimento executivo.
K. Assim, poder-se-ia colocar a questão quanto aos outros fiadores de tal contrato de arrendamento, PL e sua mulher, F L – cfr. doc. 1 junto com o requerimento executivo.
L. Mas, a verdade é que PL e FL, marido e mulher, ficaram, em 19/10/2016, na qualidade de fiadores, cientes do montante de capital em dívida à data, nos termos de carta registada com aviso de recepção enviada para o endereço constante do contrato de arrendamento e por eles recebida – cfr. docs. 1 e 2 que ora se juntam, por tal se mostrar necessário em virtude do julgamento proferido pelo tribunal recorrido (artº 651º, nº 1, do CPC).
M. Por todas estas razões, entende a recorrente que existe título executivo contra os fiadores.
***
5- A SPJ, executada, apresentou contra-alegações, formulando as seguintes
CONCLUSÕES:
1.Por despacho de 20 de Setembro de 2018, o tribunal a quo, decidiu indeferir o incidente de intervenção de terceiros deduzido pela ora recorrente, considerando que a intervenção dos fiadores na acção executiva é legalmente inadmissível.
2.No douto despacho proferido lê-se “…carece a exequente de título executivo quanto aos chamados, os quais não se encontram legitimados pelo título executivo que serve de base à execução
3.Tal raciocínio, considerou o estipulado no art.º 316, n.º 2 do CPC, no que tange ao litisconsórcio voluntário, o estipulado no art.º 10.º, n.º 5 do CPC quanto aos limites da acção executiva, e, ainda o estipulado art.º 53.º n.º 1 do CPC quando à legitimidade activa e passiva das partes.
4.Considerou, ainda, o art.º 703.º do CPC conjugado com o art.º 14.º-A da lei n.º 6/2006.
5.E, na sequência de tal análise, decidiu indeferir o pedido da ora Recorrente.
6.A executada, ora recorrida no requerimento junto aos autos, em 25 de junho de 2018, com a ref.ª 29528535 apresentou a sua oposição à pretendida intervenção provocada, defendendo, com o devido respeito por posição diversa, que não há formação de título executivo, quanto aos fiadores, mas tão somente quanto ao arrendatário.
7.Desde logo, por falta de notificação dos fiadores.
8.Defende a ora recorrida que o fiador garante a satisfação do direito de crédito, ficando pessoalmente obrigado perante o credor, o que poderia levar a concluir que o credor pode exercer perante o fiador os mesmos direitos que tem perante o devedor.
9.Emergindo do próprio contrato de arrendamento, a dívida exequenda, poderia ter como sujeito passivo quem nele se obrigou a pagar as rendas em dívida, no caso concreto, não só a arrendatária Informática e Ldª, mas também os seus fiadores, que naquele contrato se vincularam perante o senhorio.
10.Sucede que, a vontade de prestar fiança tem de ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal.
11.Na verdade, o título executivo exigido pelo artigo 14º A do NRAU, trata-se de um título executivo complexo, cuja possibilidade de formação passou a ser maior com a actual redacção do artigo 14º-A em contraponto com o anterior 15º, n.º 2 do mesmo diploma legal, antes da alteração introduzida pela Lei 31/2012 de 14 de agosto.
12.Uma vez que também constitui título executivo o conjunto formado pelo contrato de arrendamento e pelo comprovativo da comunicação ao arrendatário quando referido a rendas, a encargos e as despesas que corram por conta do arrendatário.
13.Mais uma vez, com o devido respeito por entendimento contrário, entende a ora recorrente que a razão está do lado de quem defende a inexistência da possibilidade de formação de título executivo quanto aos fiadores, ainda que se prove a existência de notificação dos mesmos do montante em dívida, o que no caso em apreço nem se verifica, uma vez que os fiadores nunca foram notificados da dívida exequenda.
14.Vale isto dizer que, na presente execução, não existe título executivo contra os fiadores da arrendatária, o que, e bem, no entender do Tribunal a quo importou o indeferimento do incidente de intervenção de terceiros, os fiadores, a título principal, para ocuparem também a posição de executados.
15.No caso concreto dos presentes autos, no aludido contrato de arrendamento, subscrito pelos fiadores, na sua clausula 8ª alegada para peticionar a pretensa intervenção provocada, dela não constando a declaração expressa dos intitulados fiadores, da sua constituição como fiadores da inquilina, com ou sem benefício de excussão prévia, no sentido de se responsabilizarem pessoalmente perante a senhoria “pelo exacto, integral e pontual cumprimento das obrigações que para aquela resultem do contrato de arrendamento, durante o prazo da sua vigência e eventuais renovações”,
16.Ora, como resulta do disposto no art. 628.º, n.º 1, do Cód. Civil, ‘a vontade de prestar fiança deve ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal’.
17.Como tal, exigindo-se que a declaração, para além de ser reduzida a escrito, seja expressa, considera-se não ser aplicável o n.º 2 do art. 217.º, do Cód. Civil.
18.Acresce a tudo o que já se alegou, nos termos do artigo 318º do CPC, o chamamento para a
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT