Acórdão nº 478/09.7TBCBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 15-12-2011

Judgment Date15 December 2011
Case OutcomeNEGADA A REVISTA
Procedure TypeREVISTA
Acordao Number478/09.7TBCBR.C1.S1
CourtSupremo Tribunal de Justiça



Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



I-Relatório

Dental Care – Centro de Medicina Dentária Ldª intentou em 13/04/2009 com fundamento no disposto nos arts. 239º nº 1 al. e) 266º, 317º alíneas a) e c) do Código da Propriedade Industrial (CPI), acção declarativa soba forma ordinária contra “ Dental Link Consultoria de Gestão Ldª pedindo que:
Os registos das marcas nacionais respectivamente, nº 392.025 e nº 415.182 fossem anulados, nos termos do disposto no art. 266º do CPI;
A R fosse condenada a abster-se de usar a expressão “ DENTALCARE” na composição da marca que viesse a adoptar em substituição das que actualmente usa, bem como nos serviços por si prestados e nos produtos que comercializa;
A R fosse condenada a pagar à A indemnização de valor correspondente aos honorários dos mandatários desta presente acção, a fixar em sede de liquidação /execução de sentença.

A A fundamenta o seu pedido no facto das aludidas marcas da Ré serem susceptíveis de induzir em erro ou confusão o público consumidor dos serviços de medicina dentária com a firma da autora, titular das marcas registadas anteriormente aquelas da Ré.

A R contestou, sustentando a inexistência de susceptibilidade de confusão, concluindo pela improcedência da acção.

Foi proferido despacho saneador, seleccionou-se a matéria de facto assente e a controversa que integrou a base instrutória.

Procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a Ré do pedido.

A A não se conformou e apelou para a Relação, mas sem êxito, porquanto este Tribunal negou provimento ao recurso e confirmou por unanimidade a sentença da 1ª instância.

Deste Acórdão da Relação interpôs a autora revista excepcional ao abrigo da al. b) do art. 721-A do CPC, por entender que a questão que no recurso suscita implica que estejam em causa interesses de particular relevância social, na medida em que não pode ser decidido à luz das estreitas vicissitudes do caso concreto, antes, devendo ser apreciada de forma ampla no sentido da potencial concorrência desleal entre a firma social da recorrente e as marcas da recorrida.

Para o efeito a autora formulou as seguintes conclusões:

O presente recurso deve ser admitido como revista excepcional, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do número 1 do artigo 721°-A do CPC, porquanto por força das questões que nele se suscitam se dever concluir estarem em causa interesses de particular relevância social;
2. Considerou esse Venerando Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de 2 de Fevereiro de 2011, citando Miguel Angelo Oliveira Crespo, que na apreciação da relevância social devem ter-se em atenção "... dois tópicos determinantes na verificação do não preenchimento do conceito indeterminado da relevância social da questão de importância fundamental: a não projecção de efeitos para além da esfera jurídica do recorrente, o mesmo é dizer, a evidência da redução da questão aos estreitos limite do caso individual, e a não realização de interesses comunitários de grande relevo ou de largo alcance. Acabando por se reencontrar um no outro, a questão que se restrinja ao recorrente tenderá a não envolver interesses comunitários de relevo." ("O recurso de revista no contencioso administrativo", pág. 255);
3. Estão em causa no caso sub judice direitos privativos com fundamental e perene incidência no mercado nacional, na sã concorrência e, acima de tudo, na adequada protecção do consumidor relativamente à confusão que lhe pode ser suscitada pelo facto de estar em causa uma firma social exactamente igual à componente nominativa de duas marcas registadas;
4. As Instâncias escolheram apreciar exclusivamente a questão à luz da prova produzida acerca do grau concreto e casuístico de concorrência existente entre Recorrente e Recorrida, conforme comprovado nos presentes autos, portanto em termos geograficamente circunscritos e à luz dos factos conhecidos entre a data do registo das marcas - 31 de Julho de 2006 e 10 de Setembro de 2007 - e a presente data, desconsiderando totalmente o facto da firma social e das marcas registada permanecerem válidas e passíveis de livre utilização pelos seus legítimos titulares, os quais podem, portanto, a qualquer momento entrar em concorrência directa, num mesmo mercado e / ou área geográfica, em termos obviamente susceptíveis de causar total confusão no mercado e nos consumidores;
5. Conforme regista o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 5 de Dezembro de 2002 (Colectânea de Jurisprudência, 2002, Tomo V, pág. 86) "A concorrência desleal, sendo reverso do pretendo direito à lealdade da concorrência de todos os empresários, é regulada no CPI como meio de tutela específico daqueles direitos, mas não se confunde com eles, nem se esgota neles. Como refere Carlos Olavo, "a propriedade industrial corresponde à necessidade de ordenar a concorrência, feita essencialmente por duas formas: por um lado, pela atribuição da faculdade de utilizar, deforma exclusiva ou não, certas realidades imateriais, e, por outro lado, pela imposição de determinados deveres no sentido de os vários agentes económicos que operam no mercado procederem honestamente.
6. No caso subjudice não estão apenas em causa Recorrente e Recorrida, antes sendo visado o mercado e a sã concorrência, no seu conjunto, bem como portanto o universo potencial global de consumidores que podem ser afectados pela concorrência desleal, estando portanto em causa interesse da maior relevância social;
7. Assim sendo, importa que este Venerando Supremo Tribunal de Justiça se debruce e se pronuncie sobre as questões suscitadas nestes autos, em sede de recurso de revista excepcional, em defesa de interesses de particular relevância social, no seguinte duplo sentido: (i) para conferir adequada protecção ao mercado, à sã concorrência e aos consumidores relativamente a potenciais situações futuras de concorrência concreta entre a firma social da Recorrente e as marcas da Recorrida, que certamente motivarão situações de concorrência desleal que a Lei pretende evitar, e (ii) através da produção de adequada jurisprudência sobre o tema tornar claro que a efectiva protecção ao mercado, à sã concorrência e aos consumidores que a Lei pretende garantir, relativamente a todas e quaisquer situações de confundibilidade entre firmas sociais e marcadas registadas, susceptíveis de motivar situações de concorrência desleal, devem ser resolvidas pelos Tribunais em termos abrangentes, que equivalham à efectiva amplitude daqueles direitos privativos, não se fixando portanto em enquadramentos geográficos e temporais meramente casuísticos e circunstanciais.
8. Os registos das marcas da Recorrida deverão ser anulados ao abrigo do disposto nos artigos 266°, 239°, alínea f), e 317° do CPI, uma vez que tais registos podem originar situações de concorrência desleal, independentemente até da sua intenção;
9. As marcas da Recorrida contêm a firma ou denominação da Recorrente;
10. A Recorrente dedica-se à actividade de prestação de serviços de medicina dentária, tendo adoptado a firma "DENTAL CARE - Centro de Medicina Dentária, Lda", com registo desde Setembro de 2001, firma essa que continua a usar
11. A Recorrente exerce a sua actividade de prestação de serviços de medicina dentária ininterruptamente, desde 10 de Outubro de 2001 até à presente data;
12. A Recorrente usa também a expressão "DENTAL CARE" na sua facturação e nos seus recibos;
13. A Recorrida, por sua vez, é titular das marcas nacionais mistas n° 392025 "DENTALCARE cuidamos do seu sorriso" e n° 415182 "DENTALCARE" registadas para assinalar serviços médicos;
14. Os registos das marcas da Recorrida foram concedidos, respectivamente, em 31 de Julho de 2006 e 10 de Setembro de 2007, sendo, pois, posteriores ao registo da firma da Recorrente "DENTAL CARE";
15. Existe uma parcial coincidência entre a firma da Recorrente "DENTAL CARE" e as marcas da Recorrida, uma vez que todas coincidem na expressão "DENTAL CARE" ou "Dentalcare";
16. As marcas da Recorrida e a firma da Recorrente são sinais usados no mesmo ramo de actividade de prestação de serviços de medicina dentária;
17. As marcas da Recorrida e a firma da Recorrente são sinais usados para os mesmos consumidores;
18. A concorrência desleal pode verificar-se independentemente da existência de um qualquer direito privativo contemplado no CPI, por ser aquela um instituto autónomo através do qual se disciplinam comportamentos que não incidem primacialmente sobre os interesses económicos dos concorrentes, mas sobre a concorrência em si considerada, como quadro fundamental da vida colectiva. Ou seja, a concorrência desleal é subsidiária em relação à violação de direitos privativos, constituindo causa autónoma da recusa do registo;
19. A Recorrente entende que, pela factualidade provada, deverá reconhecer-se que existe a possibilidade de haver concorrência desleal independentemente da intenção da Recorrida, nos termos previstos na alínea b) do citado artigo 266° do CPI;
20. A alínea b) do artigo 266° do CPI remete o fundamento da anulabilidade da marca para a ideia de concorrência desleal, nos termos previstos no artigo 317° do CPI e no que ao caso interessa, o que está previsto na sua alínea a), ou seja os actos de confusão: "os actos susceptíveis de criar confusão com o estabelecimento, os produtos ou serviços dos concorrentes, qualquer que seja o meio utilizado";
21. A lei exige apenas a susceptibilidade de confusão ou a confundibilidade e não a efectiva confusão;
22. Não é necessário que ocorra, efectivamente, confusão, mas apenas que haja o perigo de ela se verificar pois o que qualifica o acto como desleal é precisamente a sua aptidão ou idoneidade para criar confusão;
23. Os critérios para apreciar o risco de confusão, para efeitos de concorrência desleal, são idênticos aos previstos para efeitos
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