Acórdão nº 471/07.4TBPTL-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02-11-2017

Data de Julgamento02 Novembro 2017
Número Acordão471/07.4TBPTL-B.G1
Ano2017
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório

M. V. veio por apenso ao processo de divórcio litigioso convertido em divórcio por mútuo consentimento, requerer contra B. S., processo de inventário para partilha de bens comuns.
Por ser o interessado mais velho, foi o interessado B. S. nomeado para exercer as funções de cabeça de casal.
A fls 48 veio o cabeça de casal apresentar a relação de bens constituída por 5 verbas.
A fls 68 veio a interessada M. V. reclamar da relação de bens, acusando a falta de relação de bens e arrolando testemunhas e requerendo a realização de diversas diligências junto das sociedades relativamente às quais o requerido deteria participações no seu capital social e junto de diversas instituições bancárias, solicitando designadamente que o Banco X em Valença fosse notificado para informar quais os movimentos efectuados pelo cabeça de casal nas várias contas de que era titular no mês de Setembro de 2005.
Foram juntos diversos documentos.
A fls 240 o cabeça de casal respondeu à reclamação da interessada M. V. e a fls 258 apresentou nova relação de bens.
A fls 262 a interessada M. V. veio aceitar as verbas 4 e 5 da nova relação de bens e reiterar a reclamação que tinha apresentado a fls 68.
A fls 356 a requerente veio indicar quais as verbas relativamente às quais havia acordo entre as partes, juntar documentos e requerer a notificação do cabeça de casal para juntar aos autos documentos que certificassem o registo completo das sociedades que identificou, requerendo ainda a sua condenação como litigante de má fé e por ter sonegado bens e informações à partilha e ao processo.
Procedeu-se à inquirição de testemunhas.
A fls 614-635 foi proferido despacho pelo Mmo. Juiz a quo então titular do processo, conhecendo da reclamação deduzida pela interessada que julgou parcialmente procedente, determinando que fossem introduzidas na relação de bens as alterações decididas, condenou o cabeça de casal como litigante de má fé na multa de 10 Ucs, procedeu à remoção do requerido do cargo de cabeça de casal e, em sua substituição, nomeou a interessada M. V., ordenando que a nova cabeça de casal, no prazo de 15 dias, juntasse aos autos nova relação de bens que contemplasse as alterações determinadas.
A fls 648 veio a nova cabeça de casal solicitar a realização de diversas diligências bancárias junto do Banco X.
A fls 657 veio requerer a realização das diligências que já tinha solicitado junto do Banco X e ainda a realização de outras diligências junto do mesmo Banco, o que foi indeferido quanto à conta 018566300… (fls 657) por a requerente ser co- titular da mesma, podendo obter as informações pretendidas e foi deferida a realização de diligências quanto à conta titulada pelo requerido, a nº 024040300… (fls 674).
A fls 713 a 727 a cabeça de casal juntou nova relação de bens.
Foi designado dia para a conferência de interessados, na qual foi ordenada a avaliação do bem constante da verba 6 – moradia construída em terreno do requerido – na sequência de requerimento deste.
Foi junta a avaliação e a fls 789 veio o requerido reclamar da avaliação. A fls 819 a requerente respondeu e a fls 844 foi indeferida a reclamação.
A fls 833-842 o requerido veio reclamar da nova relação de bens apresentada pela cabeça de casal a fls 717 a 727, a qual foi parcialmente deferida (fls 846 e 847).
Procedeu-se à conferência de interessados. Foi dada a forma à partilha e proferida sentença homologatória da partilha.
Ambas as partes interpuseram recurso de apelação.

A cabeça de casal concluiu as suas alegações do seguinte modo:

No âmbito do processo de divórcio, a que estes autos seguem apensados, arrolaram-se vários bens comuns do casal, os quais têm de ser relacionados. O que não se pode é, em sede de inventário, discutir-se a propriedade dos bens arrolados, uma vez que o auto de arrolamento serve de descrição no inventário (Ac. TRP de 20-01-2001, Proc. 0021692) e tal situação já ficou assente.
In casu, a 22 de Outubro de 2013, e após várias reclamações apresentadas pela Interessada M. V. face às singelas relações de bens apresentadas pelo Interessado B. S. – que nem sequer relacionou os bens arrolados – , o M. Juiz do processo: i) declarou « que o cabeça-decasal, deliberadamente, omitiu o relacionamento de inúmeros bens que se impunham relacionar »; ii) condenou-o « como litigante de má fé em multa processual » que fixou « em 10 UC »; iii) e, pelas mesmas razões e ao abrigo do disposto no artigo 2086.º, n.º 1, al. a), do Código Civil – isto é, por ter dolosamente ocultado a existência de bens – determinou « a remoção do cargo de cabeça-de-casal, investindo a interessada M. V. em tais funções » (cf. D. Despacho de fls. 614 a 635, transitado em julgado).
Em 16 de Março de 2015 (refª 368136) a Interessada M. V., apresentou a relação de bens, devidamente corrigida e atualizada, começando por esclarecer o que entendia conveniente a respeito das várias verbas e juntando os documentos que comprovam tais explicações.
Nessa mesma data de 16 de Março de 2015 o Interessado B. S. foi notificado da relação de bens e dos documentos com ela juntos, e, dispondo do prazo de 10 dias, para acusar a falta de bens que devam ser relacionados, requerer a exclusão de bens indevidamente relacionados, por não fazerem parte do acervo a dividir, ou arguir qualquer inexactidão na descrição dos bens, que releve para a partilha (art.º 1348.º n.º 1 do CPC) bem como para impugnar os documentos (art.º 153.º n.º 1 do anterior CPC e art.º 149.º do NCPC), nada disse ou fez. Uma vez que não existiam questões susceptíveis de influir na partilha, nem haviam sido deduzidas quaisquer reclamações sobre o valor atribuído aos bens relacionados e estavam determinados os bens a partilhar, foi designado dia para a realização de uma conferência de interessados (art. 1352º nº 1 CPC), com a expressa advertência de que a mesma se destinava aos fins aludidos no artigo 1353.º do Cód. de Processo Civil.
Em 3 de Junho de 2015 realizou-se a Conferência de Interessados, não tendo, então, o Interessado B. S. apresentado qualquer reclamação à relação de bens, ao valor atribuído aos bens relacionados ou sequer aos documentos juntos aos autos e muito menos levantado alguma questão cuja resolução pudesse influir na partilha, limitando-se aquele Interessado a requerer, nesse dia, a avaliação da verba nº 6, tendo sido suspensa essa diligência tão-somente por essa razão.
Em 1 de Outubro de 2015 – quase 4 meses depois de se ter iniciado a Conferência de Interessados e 7 meses após ter sido notificado da relação de bens e dos documentos juntos – o Interessado B. S. veio apresentar uma reclamação à relação de bens, pedindo a eliminação de verbas da relação de bens e a apresentação de uma nova relação de bens, sem, porém, indicar qualquer prova.
A Interessada M. V., em resposta, disse que tal reclamação era extemporânea e uma manobra manifestamente dilatória e requereu que fosse negado provimento ao requerido. Contudo, a M. Juiz a quo acabou por aceitar e atender, parcialmente, a tal reclamação, proferindo o seguinte despacho « da análise da sentença proferida a fls. 614 e ss e dos documentos depois dela juntos, podemos decidir o seguinte: 1. as verbas 3 e 4 da relação de bens de fls. 719 e ss resultam dos documentos de fls. 680 a 685, não impugnados, superando, nessa parte, a decisão proferida pelo que devem manter-se. 2. Já a verba 5 deve ser reduzida ao valor de €50.000, como ordenado na sentença a fls. 616. 3. Deverá ser eliminada a verba 17., não admitida na decisão a fls. 629 parte final ».
De acordo com o princípio da estabilidade da instância não é lícito às partes vir, a toda a hora ou em qualquer momento, formular pedidos, deduzir incidentes ou fazer reclamações que modifiquem o que está nos autos – nomeadamente no que toca aos bens que existem e têm de ser partilhados no inventário.
Os Interessados podem reclamar contra a relação de bens, no prazo de 10 dias após terem sido, dela, notificados e essa reclamação pode ainda ser apresentada, posteriormente, com condenação em multa. E com tal cominação podem mesmo os Interessados reclamar contra a relação de bens até ao início da Conferência de Interessados. Mas já não o podem fazer no decurso da Conferência de Interessados nem quando esta diligência se encontra suspensa para avaliação de uma verba, a pedido de um Interessado.
10ª Como o Interessado B. S. não apresentou, até à Conferência de Interessados, qualquer reclamação à relação de bens e nesta Conferência somente pôs em causa o valor atribuído ao bem relacionado como verba nº 6 e, por isso, requereu a sua avaliação, tem de entender-se que, no mais, a relação de bens apresentada pela cabeça de casal se tornou definitiva e esgotado o poder jurisdicional quanto a essa matéria.
11º No requerimento de reclamação à relação de bens o Interessado B. S. tinha que oferecer o rol de testemunhas e requerer os outros meios de prova, e, não o fazendo – como não fez – a reclamação tem de ser indeferida, por falta de prova.
12ª Considerando que o tribunal decidiu não atender à reclamação apresentada pelo Interessado B. S. quanto às verbas nºs 3, 4 e 10 porque as mesmas « resultam dos documentos » que estão nos autos, deveria a M. Juiz a quo ter seguido o mesmo critério em relação às verbas nºs 5 e 17, em homenagem aos princípios da previsibilidade e da segurança jurídica.
13ª Pese embora se tenha decidido, no D. Despacho de 22 de Outubro de 2013, que o valor da verba nº 5 – respeitante aos direitos e obrigações emergentes do contrato promessa de compra e venda celebrado em 21/3/2006 pelo interessado B. S., na qualidade de promitente comprador, com a sociedade por quotas Empresa A Gestão e Comparticipação, Lda na qualidade de promitente vendedora, e relativo a uma moradia situada em Valença - era de 50.000,00€,...

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