Acórdão nº 438/08.5TBVLN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30-05-2018
Data de Julgamento | 30 Maio 2018 |
Número Acordão | 438/08.5TBVLN.G1 |
Ano | 2018 |
Órgão | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo
Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos;
1º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias;
2º Adjunto - António José Saúde Barroca Penha.
*
I - RELATÓRIO1.1. Decisão impugnada
1.1.1. Banco A, S.A. (antes, Banco B, S.A.) (aqui Recorrente), com sede na Avenida da …, em Lisboa, propôs a presente acção executiva, contra Ana e Herdeiros de A. M. (H. R. e C. A.) (aqui Recorridos), residentes em …, Cercal, para haver deles o pagamento coercivo da quantia de € 78.218,27, apresentando como título executivo três escrituras públicas de mútuo, cada um destes garantido pela sua hipoteca, constituída sobre o mesmo prédio urbano.
1.1.2. Regularmente citados, os Executados (Ana e Herdeiros de A. M.) não pagaram a quantia exequenda, nem deduziram oposição à execução.
1.1.3. Deferindo requerimento dos Executados (Ana e Herdeiros de A. M.), determinou-se a avaliação do imóvel hipotecado por um único perito; e, realizada a mesma, foi o valor base de venda fixado em € 120.019,00, e o valor desta fixado em € 102.016,15.
1.1.4. Frustrada a venda do imóvel hipotecado por propostas em carta fechada (por falta de apresentação das mesmas), determinou-se a respectiva venda por negociação particular (encarregando-se a Agente de Execução de proceder a ela).
1.1.5. Veio depois a Exequente (Banco A, S.A.) requerer a adjudicação do imóvel a si própria, pelo valor de € 77.648,85, bem como a dispensa do depósito do preço de aquisição proposto; vieram os Executados (Ana e Herdeiros de A. M.) opor-se a essa sua pretensão (nomeadamente, por aquele valor ser inferior em € 42.310,15 àquele outro que, com trânsito em julgado, lhe fora atribuído em avaliação); e em 22 de Junho de 2017, veio o Tribunal a quo proferir despacho, lendo-se nomeadamente no mesmo:
«(…)
Tendo em conta que o prédio foi avaliado nos autos, nunca poderá ser vendido ou adjudicado por valor inferior ao valor mínimo calculado com base em € 120.019,00 (cfr. Despacho de fls. 350 e artigo 816º, nº 2, do Código de Processo Civil).
Notifique.
(…)»
1.1.6. Aberta conclusão nos autos em 27 de Fevereiro de 2018, informando «que após o despacho de refª 4123349 (fls. 368), datado de 22-06-2017, não foi registado qualquer acto processual nos presentes autos», foi proferido despacho, declarando deserta a instância executiva, lendo-se nomeadamente no mesmo:
«Conforme preceitua o artigo 281, nº 5, do Código de Processo Civil, “no processo de execução, considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses”.
De acordo com o artigo 712º, nº 1 do Código de Processo Civil, “a tramitação dos processos executivos é, em regra, efectuada electronicamente, nos termos do disposto no artigo 132º e das disposições regulamentares em vigor”.
O ónus de impulso processual do processo executivo compete ao exequente, sem prejuízo da competência do agente de execução para a concretização e realização das diligências do processo – cfr. artigo 719º, nº 1, do Código de Processo Civil.
E este é designado pelo exequente de entre os registados em lista oficial – cfr. artigo 720º, nº 1, do Código de Processo Civil.
Prescreve o artigo 14º da Portaria nº 282/2013, de 29 de Agosto, que:
“1 - O agente de execução deve prestar todas as informações previstas na lei preferencialmente por via electrónica, através do sistema informático de suporte à actividade dos agentes de execução.
2 - Quando a parte esteja representada por mandatário judicial, as informações são prestadas por transmissão electrónica de dados, através do sistema informático de suporte à actividade dos agentes de execução, que assegura automaticamente a sua disponibilização no sistema informático de suporte à actividade dos tribunais, e consulta no endereço electrónico http://citius.tribunaisnet.mj.pt.
3 - No caso previsto no número anterior, o dever de informação considera-se cumprido com o registo da informação no sistema informático de suporte à actividade dos tribunais que permita a consulta do acto no histórico electrónico do processo judicial.”
A deserção automática prevista no artigo 281º, nº 5, do Código de Processo Civil, é inspirada pela ideia de presunção de abandono da instância processual pelas pessoas oneradas com o impulso processual e pelo interesse público da não duração indefinida dos processos, em face da constatada, reiterada e prolongada inércia das partes em promover o seu andamento.
A diferença de regime relativamente ao disposto no nº 1, do mesmo artigo (diferença expressamente acentuada pelo legislador com a ressalva do início da norma do nº 1) assenta nas particularidades próprias do processo executivo, designadamente, da sua tramitação e conhecimento.
Com efeito, e conforme resulta dos citados artigos 720º, nº 1, do Código de Processo Civil, e 14º, nº 3, da Portaria nº 282/2013, de 29 de Agosto, não só o exequente designa o agente de execução, como acompanha toda a actividade do agente de execução, considerando-se o dever de informação cumprido com o registo de informação no sistema informático de suporte à actividade dos tribunais.
Por outro lado, o exequente tem, necessariamente, conhecimento do disposto no artigo 281º, nº 5, do Código de Processo Civil.
Assim, o exequente actua negligentemente quando, tendo necessariamente conhecimento da actividade do agente de execução, se conforma com a sua actuação, não impulsionando o processo durante mais de seis meses – prazo suficientemente longo para que este se aperceba do comportamento do agente de execução e possa reagir, pedindo a sua substituição, nos termos do artigo 720º, nº 4, do Código de Processo Civil, ou requerendo diversa diligência.
No nosso caso, os autos estão parados há mais de seis meses.
Em face do exposto, e nos termos do disposto no artigo 281º, nº 5, do Código de Processo Civil, considero a instância executiva deserta.
Notifique.»
*
1.2. Recurso (da Exequente)1.2.1. Fundamentos
Inconformada com esta decisão, a Exequente (Banco A, S.A.) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que o mesmo fosse provido e se revogasse a decisão recorrida.
Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui reproduzidas ipsis verbis):
1. Salvo o devido respeito por melhor opinião, a decisão que julgou a instância deserta, nos termos do disposto no art. 281º, n.º5, do Cód. Processo Civil, não fez correta e exata interpretação e aplicação da lei e do direito.
2. No despacho em apreço considerou-se que os autos se encontram parados há mais de seis meses, por negligência do Banco Recorrente, porquanto, desde o despacho de ref.41233949, datado de 22.06.2017, não foi registado qualquer ato processual nos presentes autos.
3. O referido despacho, de 22.06.2017, foi proferido na sequência do pedido efetuado pela Sra. Agente de Execução ao Meritíssimo Juiz “a quo”, no sentido de este se pronunciar sobre a proposta de aquisição do imóvel penhorado, apresentada pelo Banco Recorrente, em 05.06.2017, no âmbito da venda por negociação particular do mesmo.
4. Pois, tendo-se frustrado a venda por abertura de propostas em carta fechada, conforme se extrai do respectivo auto de 08.03.2017, foi determinada a venda mediante negociação particular e a Sra. Agente de Execução designada como encarregada da venda, sendo esta a fase processual em que o processo se encontrava previamente ao despacho sub judice.
5. Ora, como cristalinamente emerge do disposto no art.281º, n.º5, do Cód. Processo Civil, a deserção da instância nela cominada, para que opere ope legis, depende: i) em primeiro lugar, da verificação de que os autos se encontram efetivamente parados, ou se verifica apenas um incumprimento da obrigação do agente de execução de manter atualizado o registo dos atos por si praticados; ii) em segundo lugar, a haver paragem do processo, que a mesma seja imputável a negligência activa ou omissiva do exequente, em termos de poder concluir-se que a falta de tramitação processual seja imputável a um comportamento da parte dependente da sua vontade.
6. Deste modo, e como é lidimo e pacifico entendimento, na doutrina e jurisprudência, o termo inicial do prazo de seis meses de inércia processual por parte do exequente que determina a deserção da instância executiva, nos termos da citada disposição legal – art.281º, n.º5, do C.P.C. - tem de coincidir com a data da notificação, clara e inequívoca, que lhe seja feita (pelo agente de execução ou pela secretaria) no sentido da prática de um qualquer acto de que dependa a tramitação executiva ou no sentido de o informar que o processo se encontra paralisado por inércia do agente de execução a que importe colocar termo, contrariamente ao que foi considerado na decisão sob censura.
7. Ora, e reportando-nos ao caso em análise, verifica-se que o processo encontrava-se na fase de venda por negociação particular, sendo que a encarregada da venda designada era a Sra. Agente de Execução.
8. E que, por sua vez, o último ato praticado nos autos foi o despacho judicial de indeferimento da proposta de aquisição apresentada pelo Banco Recorrente, datado de 22.06.2017.
9. Deste modo, não emerge dos autos que o Banco Exequente tenha sido notificado no sentido da prática de um qualquer acto que subsequentemente tenha sido omitido e por força do qual a execução não tenha prosseguido os seus termos.
10. Assim, face aos elementos disponíveis nos autos, a falta de informação relativa à prática de qualquer ato nos últimos seis meses, levaria, quando muito, à interpelação da Agente de Execução para que informasse do estado da execução, designadamente no que concerne ao estado da venda por negociação particular, o que também não aconteceu.
11. Daí que,...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO