Acórdão nº 4233-17.2T8STB-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14-07-2021

Data de Julgamento14 Julho 2021
Número Acordão4233-17.2T8STB-C.E1
Ano2021
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
Proc. 4233-17.2T8STB-C.E1

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

I- RELATÓRIO

(…) intentou a presente ação de restituição e separação de bens, a qual seguiu os termos da ação declarativa de condenação, sob a forma comum, nos termos do disposto no artigo 146.º e seguintes do CIRE, após aperfeiçoamento, contra:

1) Insolvente Sociedade Agro-Pecuária da Quinta do (…), Lda.;

2) Massa Insolvente de Sociedade Agro-Pecuária da Quinta do (…), Lda.

3) E demais credores reconhecidos nos autos principais.

Peticionando a separação da massa e restituição do prédio urbano descrito nos artigos 11º, 12º, 13º e 16º do requerimento inicial ao requerente e à sua irmã, procedendo-se ao registo a favor destes da plena propriedade da casa e logradouro objeto do contrato de compra e venda de ações livre e ónus ou encargos.

Alegou em síntese que:

-No âmbito de acordo de venda de ações e cessão de créditos outorgado entre … (pai do requerente); o ora requerente; … (irmã do requerente); Sociedade Agropecuária Quinta do (…), Lda., ora insolvente e (…) – Sociedade de Criação Pecuária, Lda., todos na qualidade de vendedores e do outro (…), Investments B.V., na qualidade de compradora, outorgado em 3 de outubro de 2007 foram transferidas para a sociedade compradora a totalidade das participações sociais que integravam a totalidade do capital social da sociedade insolvente (conhecida ainda como …);

-Essa sociedade era proprietária de vários imóveis que se mantiveram na sua titularidade apesar da mudança de titulares das participações sociais;

-Entre esses imóveis encontrava-se o prédio urbano sito na freguesia da Quinta do (…), com a área total de 8271 m2 descrito na Conservatória do Registo Predial de Palmela sob o n.º (…), o qual é composto por 7 artigos matriciais urbanos, entre eles o artigo matricial urbano n.º (…), sito na Rua (…), Quinta do (…), freguesia da (…), Concelho de Palmela, com o valor patrimonial de € 108.522,50, que era à data do referido contrato, casa de morada de família do pai do requerente e do próprio requerente;

-Em momento algum foi intenção dos referidos transmitirem aquele imóvel, apesar de terem cedido o capital social da … (ora insolvente) à referida (…), Investments B.V., pelo que, fizeram constar do próprio contrato a obrigação de destaque da referida parcela e posterior retransmissão aos vendedores do capital social;

-Mais outorgaram um contrato de comodato relativamente à mesma parcela, com a área total de 1.310 m2: composto por habitação com área de 320 m2, alpendre com 50 m2 e logradouro com 940 m2;

-Contudo, a sociedade insolvente até ao presente não transmitiu a propriedade do imóvel para o pai do requerente (entretanto falecido) nem para o requerente;

-O pai do requerente, (…), residiu no imóvel até à data do seu óbito em 11 de setembro de 2014, e aí residiu e reside o requerente;

-Só recentemente apuraram que não só não havia sido efetuado o destaque, como em 2014 o imóvel havia sido dado em hipoteca como garantia;

-A ora insolvente obrigou-se a transmitir a propriedade de parte do imóvel para o pai do requerente;

-Todas as contra-prestações do contrato mostram-se cumpridas da parte dos vendedores, encontrando-se a insolvente em falta com as suas obrigações.

Foi indeferido liminarmente o pedido de registo a favor do requerente da plena propriedade da CASA e logradouro objeto do contrato de compra e venda de ações, livre de ónus ou encargos, por inadmissibilidade legal.

Citados os credores e a massa insolvente, nos termos do artigo 146.º, n.º 1, do CIRE, veio o credor Caixa de Crédito Agrícola Mútuo deduzir contestação, onde alega em síntese que:

-O autor é parte ilegítima desacompanhado da sua irmã dado que pretende exercer um direito na qualidade de herdeiro de seu pai, assumindo igualmente a sua irmã, essa mesma qualidade;

- A petição inicial é inepta dado que o dever de destacar o terreno ou a existência de uma qualquer promessa não foi assumida pela insolvente, mas por outra sociedade a (…), Investments BV que não é sequer parte na ação;

- Apenas existe o prédio/bem imóvel descrito sob o n.º (…), da freguesia da (…), concelho de Palmela, dado que o artigo matricial apenas serve os seus efeitos e esgota-os na relação jurídica fiscal;

- Sobre tal prédio, que é propriedade da insolvente desde 27 de março de 1973, foi constituída hipoteca a favor da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de (…), CRL, devidamente registada pela Ap. (…), de 30 de dezembro de 2014;

- A sociedade (…), Investments B.V. adquiriu apenas as ações representativas da totalidade do capital da Sociedade (…), SGPS, S.A. que por sua vez é a única sócia da Sociedade Agro-Pecuária da Quinta do (…), Lda., ora insolvente;

- A compradora assumiu a obrigação de após divisão do imóvel identificado no número 1 b) do Anexo XIX, proceder à transmissão da respetiva propriedade a favor de (…);

- O bem imóvel a transmitir não existia, nem existe hoje, dependendo do cumprimento de uma obrigação de meios pela (…), Investments BV;

- A proprietária do imóvel, ora insolvente, não se vinculou quer quanto ao destaque do imóvel quer quanto à venda;

- A existir uma promessa de compra e venda a mesma foi outorgada pela sociedade (…), Investments BV e constitui promessa de venda de bem alheio, cuja sanção é a nulidade;

- Ou poderá configurar-se como promessa de venda de bem futuro, eventualmente incumprida pela (…), Investments BV.

Concluiu pela improcedência dos pedidos deduzidos pelo autor.

A massa insolvente contestou, arguindo a ilegitimidade passiva da massa insolvente, dado que, nos termos do artigo 146.º, n.º 1, do CIRE, a ação deve ser proposta contra a massa insolvente, os credores e o devedor.

Assim a ré é parte ilegítima.

Arguiu ainda a Ilegitimidade processual ativa atendendo a que o autor invoca que lhe assiste a si e a sua irmã, o direito a parte do imóvel apreendido para a massa insolvente, pelo que ao propor a ação sem a presença de todos os outorgantes verifica-se a preterição de litisconsórcio necessário, o que preenche a exceção dilatória de ilegitimidade constante da alínea e) do artigo 577.º do CPC que é do conhecimento oficioso, devendo a ré ser absolvida da instância caso não seja suprida a referida exceção.

Alegou ainda que o imóvel em causa encontra-se apreendido nos autos, e a liquidação vem sendo protelada pelas manobras encetadas pelo autor;

O autor propôs ação que correu termos sob o n.º 1803/18.5T8STB, no Juiz 1 do Juízo Central Cível de Setúbal, a qual foi declarada extinta por deserção;

-Não existe qualquer prédio autónomo relativamente ao imóvel apreendido nos autos;

-Por outro lado, a insolvente não se vinculou a proceder ao destaque do imóvel, dado que o negócio foi celebrado com a (…) e é inoponível à massa insolvente;

-A (…) obrigou-se a transmitir um bem alheio sendo esse negócio nulo;

Por outro lado, o único contrato celebrado entre autor e a ré foi o de comodato, de onde se infere a falta de titularidade do bem por parte do autor;

A ré nunca se obrigou perante o autor, nem é possuidora em nome alheio do imóvel em causa.

Concluiu pela improcedência da ação e deduz pedido reconvencional de condenação do autor na desocupação imediata e definitiva do aludido imóvel.

Foi o autor convidado a deduzir pedido de intervenção principal relativamente aos credores e insolvente na qualidade de réus, sob pena de não o fazendo ser a ré absolvida da instância.

Foi ainda convidado o A. a concretizar quem é o cabeça de casal pela herança de seu pai e concretizar o direito que detém à posse do referido imóvel.

Na sequência veio o A. requerer a intervenção principal provocada de (…), sua irmã, dado terem ambos a qualidade de herdeiros de (…), que reputam de proprietário do imóvel. Tal pedido foi deferido por despacho de 13-07-2020.

A interveniente não deduziu qualquer intervenção nos autos apesar de citada para os mesmos.

Deduziu ainda incidente de intervenção principal provocada relativamente aos credores, Ministério Público, o que foi deferida por despacho de 13-07-2020.

Foi julgada improcedente a exceção de ineptidão da petição inicial deduzida nos autos.

Foi ainda indeferido o pedido reconvencional deduzido.

Foi dispensada a realização de audiência prévia.

Realizou-se audiência final, e na sequência, foi proferida sentença que julgou improcedente a ação, e, em consequência, absolveu a insolvente, a Massa Insolvente de Sociedade Agro-Pecuária da Quinta do (…) e demais credores do pedido deduzido nos autos.

O autor (…), inconformado com o decidido, interpôs recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

A) Deverá ser dado como provado que “A insolvente obrigou-se a destacar o imóvel objeto do contrato de comodato e respetivo aditamento e registar definitivamente a favor de (…) e propriedade do mesmo”.

B) Aditando-se assim um facto nº 27 à matéria dada como prova e eliminando-se o único facto dado como não provado.

Uma vez que,

C) Por um lado, no acordo de Compra e Venda de Acções a compradora (…) promete destacar o imóvel em causa, agindo em nome e em representação da … (ora insolvente) da qual naquele momento passou a ter o domínio total.

D) Por outro lado, porque a insolvente diligenciou e efectuou um pedido de destaque do dito imóvel.

E) E ainda porque outorga o contrato de comodato e, posteriormente, o seu aditamento.

F) Estes escritos e comportamentos, interpretados segundo as regras do artigo 236.º, n.º 1, do Código Civil, na posição de um declaratário normal leva-nos a concluir de que a insolvente se vinculou a proceder ao destaque e registar a propriedade a favor do pai do requerente.

G) Logo, devendo ser aditado o referido facto, mencionado em A), como provado.

H) Ao não o ter feito, a douta sentença violou o disposto no artigo 236.º, n.º 1, do Código Civil.

I) Devendo ser proferido acórdão que condene a Insolvente a proceder ao destaque e ao registo da propriedade a...

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