Acórdão nº 42/14.9TBALJ.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16-11-2017

Data de Julgamento16 Novembro 2017
Número Acordão42/14.9TBALJ.G1
Ano2017
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

Recorrente: C. F..
Recorrida: T. B..
*

T. B., casada, residente na Travessa …, Alijó, instaurou a presente ação declarativa de condenação, com processo na forma comum, contra C. F., advogada, residente na Rua …, Alijó, e Companhia de Seguros X, S.A., com sede na Avenida … Lisboa, pedindo a condenação destas a pagar-lhe a quantia de 27.850,00 euros, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora desde a citação até integral e efetivo pagamento.
Para tanto alega, em síntese que por via da atuação negligente da 1ª Ré, que lhe foi nomeada patrona oficiosa com vista a instaurar uma ação de responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos emergente de acidente de viação e que, no exercício desse patrocínio, instaurou essa ação, não obteve ganho de causa, causando-lhe, como consequência direta e necessária dessa atuação negligente, danos patrimoniais e não patrimoniais, cuja indemnização reclama.
Mais alega que essa responsabilidade da 1ª Ré se encontrava transferida para a 2ª Ré por contrato de seguro.

A 2ª Ré contestou, aceitando a existência do contrato de seguro, mas excecionou, invocando a não cobertura pela garantia conferida por esse contrato, nos termos do disposto no art. 3º das condições especiais e no art. 10º das condições gerais da apólice, caso se prove que a 1ª Ré tinha conhecimento prévio dos factos que lhe são imputados e de que os mesmos podiam dar origem a uma reclamação e a possível responsabilização decorrente do exercício da sua profissão de advogada;
Impugnou parte dos factos alegados pela Autora.
Excecionou sustentando que caso se conclua pela perda total do veículo, que a Autora recebeu pelo menos 2.000,00 euros pelos salvados desse veículo;
Alega que ao pretender obter o valor dos salvados e ao pretender obter das Rés montantes aos quais sabe não ter direito, a Autora litiga de má-fé.
Conclui pedindo que por via da procedência da exceção invocada, se absolva aquela do pedido e, subsidiariamente, que se julgue a ação totalmente improcedente por não provada e se absolva ambas as Rés do pedido e se condene a Autora como litigante de má fé em multa e em indemnização, nunca inferior a 5.000,00 euros, a atribuir a uma Instituição de Solidariedade Social.

A 1ª Ré contestou impugnando a matéria alegada pela Autora, concluindo pela improcedência da ação, com todas as consequências legais.

A 1ª Ré requereu a intervenção principal provocada de W, Ltd, sustentando que no ano de 2002, contratou uma apólice individual de reforço junto da corretora de seguros Y Portugal, mediante o qual foi eliminada a franquia de 5.000,00 euros, contrato de seguro esse que foi celebrado com a requerida e que é titulado pela apólice n.º 201220….
Este incidente foi indeferido por despacho de fls. 145 a 147.

Convidou-se a Autora a aperfeiçoar a petição inicial, o que a mesma acatou.

Dispensou-se a realização de audiência prévia, fixou-se o valor da ação, proferiu-se despacho saneador, o objeto do litígio e os temas da prova, não tendo havido reclamações.

Realizada audiência final, foi proferida sentença julgando a ação parcialmente procedente, constando da sentença recorrida a seguinte parte decisória:
“Em face de tudo quanto supra se expendeu julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condeno a ré:

a) C. F. no pagamento à autora T. B. da quantia de 5000€ (cinco mil euros), acrescidos de juros de mora deste a citação até efectivo e integral pagamento
b) COMPANHIA DE SEGUROS X, S.A., no pagamento à autora T. B. da quantia de 6500€ (seis mil e quinhentos euros), acrescidos de juros de mora deste a citação até efectivo e integral pagamento.
*
Custas a cargo da autora e das rés na proporção do decaimento (cf. art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC)”.

Inconformada com o assim sentenciado, a 1ª Ré, C. F., veio apelar, tendo apresentado as seguintes conclusões de recurso:

A – Na douta sentença recorrida o Senhor Juiz não apreciou nem teve em consideração documentos essenciais do processo 70/06.8TBALJ (processo este que a Ré, na sua contestação, deu por integralmente reproduzido (art.2º), indicando-o como meio de prova e requerendo a sua apensação aos autos) designadamente:

a) A petição inicial e o requerimento probatório apresentado pela aí Autora (fls.2-8 a e 82) por onde se verifica que as três primeiras testemunhas indicadas eram a apresentar;
b) O acórdão da Relação do Porto de 10.05.2010 (fls.328 a 333) que determinou a reformulação da Base Instrutória com vista a “ aferir com mais rigor e precisão a extensão e os limites da responsabilidade da Ré na forma como exercia e exerceu o dever de vigilância que sobre ela impendia, enquanto dona e detentora do cão em causa” – fls. 333 . c) A Base Instrutória reformulada (fls.334 a 335)
d) A acta da audiência de julgamento de 16.03.2011 (fls.403) que confirma que só nessa data, no início da diligência, foi proferido um despacho, na ausência da Ré/Recorrente, através do qual as partes foram que o julgamento incidiria sobre toda a matéria vertida na base instrutória e não apenas sobre aquela que resultou da reformulação operada pelo despacho de fls. 358 -359.
e) A sentença (fls. 417 a 427), em que se deram como provados os factos aditados à BI na sequência da ordenada reformulação pelo Tribunal da Relação do Porto e que demonstram que, à data do acidente, a aí Ré não exercia um poder de facto de vigilância sobre o cão (cfr. fls 420 e 421 FACTOS PROVADOS: 1- A ré, M. C., vive numa quinta situada no Lugar de …, composta por casa de habitação e por uma área de terreno adjacente, toda ela vedada por muros de blocos de cimento e gradeamento em ferro 2 - A ré teve consigo, na quinta aludida em 1, um cão de raça “boxer”, de nome N.”, com pêlo castanho escuro e branco, no qual foi implantado um chip de identificação, até Maio de 2004, altura em que o referido animal despareceu 3 - O referido cão terá fugido de casa da ré numa altura em que os portões de entrada da quinta se encontravam abertos 4- Da quinta, propriedade da ré, ao nó de acesso ao IP 4 mais próximo distam 2km 5 -Logo que constataram a falta do cão referido em 2, supra, a ré, seu marido, seus filhos e netos encetaram diligências no sentido de o encontrarem 6-Deslocando-se às localidades vizinhas do …, …, …, …, …, …, … e …, sitas no Concelho de Alijó 7 - E às localidades de … e …, sitas no Concelho limítrofe de Murça 8 - E contactaram pessoas 9- Procuraram-no em montes, prédios e demais locais 10 - E no IP 4 também efectuaram vários percursos 11- O referido em 6 a 10 prolongou-se por alguns dias.12 - A R. e familiares nunca encontraram o cão 13 - Desde Maio de 2004, nunca mais a R. e seus familiares souberam do paradeiro do cão ou dele tiveram quaisquer notícias.
B - Mesmo salvaguardando o princípio da livre apreciação da prova, o Senhor Juiz não fez qualquer apreciação dos depoimentos das testemunhas da Ré, omitindo totalmente a apreciação do depoimento prestado na audiência de julgamento pela testemunha, Dr. A. V..
C - Através do depoimento da testemunha: i) Foram corroborados os factos que se encontram documentalmente provados e não constam dos factos provados, nomeadamente o referido em 1 d) destas conclusões ii) Revelada toda a actuação da Ré, sua Colega, ao longo do processo, relatando em que moldes ocorreu o atraso à audiência de julgamento, a razão do atraso e o pedido de desculpas que apresentou iii) Ficou confirmado que a Ré, sua Colega, não foi notificada do despacho do Senhor Juiz que ordenou que o julgamento incidiria sobre toda a matéria vertida na base instrutória e não apenas sobre aquela que resultou da reformulação iv) Demonstrado como é que a acção nunca poderia ter ganho de causa mesmo que as testemunhas indicadas no requerimento probatório tivessem prestado depoimento.
D – A conduta da Ré (que chegou atrasada à audiência de julgamento) não foi causa da improcedência da acção no proc. 70/06.8TBAL, uma vez que aí Ré logrou provar que não tinha o dever de vigilância de facto sobre o cão nem se servia do mesmo no seu próprio interesse o que levaria, sempre, à improcedência do pedido.
E - Foi legítima a convicção da Ré de que julgamento no proc. 70/06.8TBALJ apenas se repetiria para a matéria constante dos quesitos reformulados e que permaneceria intocada a matéria de facto respeitante à dinâmica do acidente a que já tinham prestado depoimento as testemunhas – art. 712 nº4 do CPC revogado e art. do NCPC
F – O atraso da Ré, consubstanciado na sua chegada ao Tribunal 15/20minutos após o início da audiência de julgamento quando já estava a ser inquirida uma testemunha, - e de que foi apresentadas desculpas ao Senhor Juiz - não configura, smo, conduta indesculpável merecedora de censura deontológica. Inexiste, assim, facto ilícito culposo bem como nexo de causalidade adequada entre o atraso da Ré e o prejuízo que a Autora alega ter sofrido.
G – A presunção da culpa prevista no art. 799 nº 1 do CC não dispensa o lesado, quer da prova do dano, quer do nexo de causalidade entre a culpa e o dano, o que in casu, não aconteceu.
H - Foi dado como não provado na douta sentença recorrida que “ tivesse sido a actuação da Ré que tenha impedido a Autora de conseguir o ressarcimento dos danos que lhe foram causados pelo acidente de viação em que seu filho se viu envolvido – (cf. 1) dos factos não provados), o que necessariamente, teria que levar à improcedência da acção. Existe assim contradição com a decisão proferida.
I - A perda de chance, passível de indemnização, é aquela em que fica demonstrada uma real possibilidade de êxito que se frustrou e que necessariamente tem que ser provada pelo pretenso lesado – art.342 nº 1 do CC.
J – No caso concreto, e face à matéria da BI que foi reformulada no processo 70/06.8TBALJ (e que a aí Ré, proprietária do cão, logrou...

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