Acórdão nº 4127/18.4TBVIS.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 17-03-2020

Data de Julgamento17 Março 2020
Número Acordão4127/18.4TBVIS.C1
Ano2020
Órgão Tribunal da Relação de Coimbra

Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A Causa:

Os autores C (…), M (…), , A(…) e F (…) na qualidade de herdeiros e representantes da Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de A (…) instauraram a presente ação comum contra o réu Banco B (…), SA.

Para tanto, alegaram os autores serem os únicos herdeiros de A (…), falecido no dia 7 de maio de 2018, tendo todos aceite a respetiva herança.

Sucede que o falecido A (…) era cliente do B(…) e foi abordado pelo gerente do réu da agência de (…) que lhe propôs uma aplicação igual a um depósito a prazo, com capital garantido pelo próprio banco e rentabilidade assegurada. Tendo anuído em tal aplicação, subscreveu então uma obrigação SLN Rendimento Mais 2004, no valor de € 50.000,00, desconhecendo a natureza de tal produto. Porém, mais tarde, quando reclamou o reembolso do capital, o mesmo foi-lhe negado, o que lhe causou, até à data do óbito, grande preocupação e ansiedade.

Concluíram os autores solicitando a condenação do réu:

- a reconhecer que os autores são herdeiros da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de A (…);

- a restituir à herança o capital de € 50.000,00, acrescido de juros à taxa legal de 4 % desde a data da citação até efetivo e integral pagamento;

Subsidiariamente:

- ser declarada a ineficácia da aquisição da obrigação SLN Rendimentos Mais 2004 por A (…);

- ser o réu condenado a restituir à herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de A (…) o capital de € 50.000,00, acrescido de juros à taxa legal de 4 % desde a data da citação até efetivo e integral pagamento;

Em qualquer das hipóteses, requereram ainda os autores:

- a condenação do réu pagar-lhes a quantia de € 2.000,00 a título de dano não patrimonial.

*

Pessoal e regularmente citado, o réu apresentou contestação, na qual se defendeu por exceção, arguindo a incompetência em razão do território deste tribunal, e ainda a prescrição do direito de que se arrogam os autores, por terem decorrido mais de dois anos sobre a conclusão da operação pelo seu subscritor que, desde esse momento, soube que efetuou um negócio onde investiu o seu dinheiro.

O réu defendeu-se ainda por impugnação, considerando que, à data, a obrigação constituía um produto conservador, com um risco reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente. Assim, o réu considerou ter prestado a informação adequada, além de que agiu de acordo com as instruções e a vontade do subscritor da obrigação que, ao longo do tempo, foi recebendo os juros respetivos, sem qualquer reclamação.

Concluiu o réu considerando que deveriam ser julgadas procedentes as exceções por si arguidas, com as legais consequências ou, caso assim não entenda que a ação deveria ser julgada improcedente, com a sua consequente absolvição do pedido.

*

Exercendo contraditório sobre as exceções arguidas, o autor apresentou o articulado com a referência 30903427, pugnando pela competência territorial do presente tribunal, considerando ainda que o prazo prescricional a ponderar é o previsto no artigo 324°, n° 2, CVM, por o réu ter agido com dolo ou culpa grave.

Concluiu o autor que as exceções deduzidas deveriam ser julgadas improcedentes.

*

Foi dispensada a realização da audiência prévia, e proferido despacho que julgou improcedente a exceção de incompetência em razão do território e relegou a apreciação da prescrição para momento ulterior.

Afirmada a validade e a regularidade da instância, foi enunciado o objeto do litígio, bem como os temas de prova, por despacho que não mereceu reclamação.

*

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento com respeito pelo legal formalismo.

*

A instância mantém-se válida e regular.

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Oportunamente, foi proferida decisão onde se consagrou que:

«Pelo exposto, julgo procedente a presente ação, instaurada pelos autores (…), na qualidade de herdeiros e representantes da Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de A (…), contra o réu Banco B (…), e, em consequência, condeno o réu:

- no pagamento aos autores da quantia (capital) de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, contados desde o dia 21 de setembro de 2018 até efetivo e integral pagamento;

- no pagamento aos autores da quantia de € 2.000,00 (dois mil euros), a título de indemnização de danos não patrimoniais.

Custas pelo réu - cfr. artigo 5270 CPC.

Notifique e registe.

13/10/2019».

*

Banco B (…), Réu nos autos de processo comum à margem referenciados, não se conformando com o teor de Sentença de que foi notificado, veio dela interpor recurso RECURSO DE APELAÇÃO, alegando e concluindo que:

(…)

*

Legal e tempestivamente notificados, para o efeito, (…) autores e apelados nos autos à margem referenciados, vieram apresentar as suas CONTRA-ALEGAÇÕES, por sua vez concluindo que:

(…)

*

II. Os Fundamentos:

Colhidos os Vistos legais, cumpre decidir:

Matéria de Facto assente na 1ª Instância e que consta da sentença recorrida:

5. Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos:

5.1 - No dia 7 de maio de 2018, faleceu, sem testamento ou qualquer disposição de última vontade, na freguesia de (…), concelho de (…), A (…) no estado de casado no regime da comunhão de adquiridos com C (…) (artigos 1°,2°,4° da petição inicial);

5.2 - Do casamento de A (…) com C (…), nasceram três filhos: - M (…) casada no regime da comunhão de adquiridos com P (…); - A (…), casado no regime da comunhão de adquiridos com C (..) e F (…), solteiro (artigo 3° da petição inicial);

5.3 -Todos os herdeiros de A (…)aceitaram a herança aberta por seu óbito, que continua indivisa, da qual é cabeça de casal C (…) (artigos 5°, 6°, 7° da petição inicial);

5.4 - O (…), SA, enquanto sociedade incorporante e o B (…) SA, como sociedade incorporada, procederam à sua fusão mediante transferência do património do Banco B (…) para o B (…) (artigo 8° da petição inicial, artigo 43° da contestação);

5.5 - O B (…) na sequência de tal operação de fusão registada na Conservatória do Registo Comercial tem atualmente a denominação de B (…), SA, mantendo na sua titularidade todos os direitos e obrigações daquele (artigo 9° da contestação);

5.6 – A (…) era cliente do B(…), na sua agência de (...), com a conta à ordem n° (…) onde depositava e movimentava dinheiro, constituía poupanças e efetuava pagamentos (artigo 10° da petição inicial);

5.7 - Após a fusão supra referida a conta de que A (…) era titular no B(…)passou a corresponder no B (…) ao número de identificação bancário (…), NIB que se mantém (artigo 11 ° da petição inicial);

5.8 - No dia 25 de outubro de 2004, A (…) foi abordado pelo gerente do B(…) da agência de (...), que lhe transmitiu existir uma aplicação igual a um depósito a prazo, com capital garantido pelo B(…), com rentabilidade semestral garantida, sem qualquer risco, por estar garantido o reembolso do capital e dos juros (artigos 18°, 19°, 45° da petição inicial);

5.9 - Nessa ocasião, o gerente da agência do B(…) de (...) transmitiu ainda a A (…) que, não obstante tratar-se de uma aplicação a 10 anos, era possível levantar o capital e os juros quando o desejasse, bastando avisar a agência com antecedência de alguns dias, como se de um depósito a prazo se tratasse (artigos 20°, 21 °,46°, 47° da petição inicial);

5.10 - À data, o B(…) era uma instituição que oferecia total confiança ao investidor (artigo 22° da petição inicia);

5.11 - Quando lhe transmitiu tal informação, o funcionário do B(…) não ignorava que A (…) não possuía conhecimentos, formação e qualificação técnicas ou experiência adquirida que lhe permitissem conhecer e diferenciar os diversos tipos de produtos financeiros, avaliar os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem (artigo 23° da petição inicial);

5.12 – A (…), à data da subscrição, tinha 61 anos e idade, dedicava-se, além do mais à pirotecnia, não era uma pessoa letrada e revelava um perfil conservador das suas poupanças, sendo que, até essa data, sempre as aplicara em depósitos a prazo, nunca tendo tido intenção de investir em produtos de risco, o que era do conhecimento do gerente e dos funcionários do réu (artigos 25°, 39°, 52° da petição inicial);

5.13 - O gerente não informou A (…) que estava a realizar uma operação não adequada a seu perfil, que ao adquirir aquela obrigação perdia o controlo sobre o dinheiro investido, que não o podia movimentar, levantar ou gastar até 25 de outubro de 2014, data do termo de maturidade, a não ser que solicitasse o seu resgate antecipado, e que tal aplicação comportava um empréstimo à SLN (artigos 24°, 48°, 49°, 50° da petição inicial)

5.14 - Confiando nessas informações, e dado que confiava nos funcionários do réu, A (…) aceitou então aplicar € 50.000,00, limitando-se a assinar sem qualquer outra explicação o papel comercial de subscrição "SLN Rendimento Mais 2004" em papel timbrado do B (...) cuja cópia consta de fls 18 v destes autos, o que fez convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura com as caraterísticas de um depósito a prazo, de capital garantido juros remuneratórios convencionados, garantido pelo B (...), desconhecendo que estava a subscrever a referida obrigação (artigos 12°, 26°, 27°, 28°, 35°, 52° da petição inicial);

5.15 - Tal papel subscrito por A (…) foi previamente preenchido por funcionário do réu (artigo 29° da petição inicial);

5.16 - O produto "SLN Rendimento Mais 2004" subscrito por A (…)constitui uma obrigação ao portador, sob a forma escritural, com o valor nominal de € 50.000,00, com data de liquidação financeira de 25 de outubro de 2004, com o prazo de emissão a dez anos (artigos 13 0, 51 ° da petição inicial);

5.17 - A remuneração de tal obrigação envolvia o pagamento de juros semestral e postecipadamente (artigo 14° da petição inicial);

5.18 – A (…)...

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