Acórdão nº 398/07.0TBSXL.L2-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 31-10-2013

Data de Julgamento31 Outubro 2013
Número Acordão398/07.0TBSXL.L2-6
Ano2013
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
ACORDAM DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:

I – RELATÓRIO

1. A…, B… e C…

Demandaram, no dia 2 de Janeiro de 2007, na Comarca do Seixal,

D…, E… e R…, visando a sua condenação solidária no pagamento aos autores da indemnização global de 100.000,00 euros, sendo 25.000,00 euros a título de indemnização pelo dano morte sofrido por G…, 10.000,00 euros relativos a danos não patrimoniais sofridos pela vítima, 25.000,00 euros a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos pela primeira autora, 20.000,00 euros a título de danos não patrimoniais sofridos pela segunda autora e 20.000,00 euros a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos pelo terceiro autor, acrescendo juros legais até efectivo e integral pagamento.

Alegam, para tanto e em síntese, que:

No dia 8 de Janeiro de 2002, pelas 19 horas e 40 minutos, na Avenida X…, ocorreu um acidente de viação em que foi interveniente o veículo ligeiro de passageiros de matrícula JH…, conduzido pelo primeiro réu e propriedade do terceiro réu, e o peão em que ele foi embater violentamente – G… que na ocasião atravessava a referida via.

Desse acidente resultou a morte de G…, de 49 anos de idade, então casado com a primeira autora e pai da segunda e do terceiro autores e que era pessoa robusta e saudável

Os autores sofreram enorme desgosto pelo falecimento do seu marido e pai nas circunstâncias em que ele ocorreu.

A responsabilidade civil decorrente da circulação do veículo supra identificado não se encontrava validamente transferida, à data do acidente, para qualquer seguradora.

2. Contestou a acção o E… invocando a prescrição do direito à indemnização com base na responsabilidade civil extracontratual por terem decorrido mais de três anos entre a data do acidente e a da propositura da acção, tendo o condutor do veículo interveniente no acidente sido absolvido da prática do crime de homicídio pela qual respondeu.

Impugnou ainda a matéria de facto em que assentava a culpa do condutor do veículo interveniente no acidente, imputando o acidente à conduta do peão.

3. Contestou também a acção o primeiro réu, invocando igualmente a prescrição do direito dos autores à indemnização e impugnando os factos articulados pelos autores, ao mesmo tempo que imputando a responsabilidade do acidente ao falecido peão.

O primeiro réu deduziu pedido reconvencional pedindo a condenação dos autores no pagamento da quantia global de 6.100,00 euros por danos não patrimoniais por ele sofridos em função do abalo psicológico que lhe causou o acidente e por danos patrimoniais relativos à impossibilidade de trabalhar durante seis meses.

4. Os autores apresentaram articulado de resposta, pugnando pelo indeferimento da excepção de prescrição e do pedido reconvencional.

5. Teve lugar uma audiência preliminar.

Foi admitido o pedido reconvencional e relegado o conhecimento da invocada excepção para a decisão final.

Foi seleccionada a matéria de facto assente e organizada a base instrutória (fls 309 e seguintes).

Teve lugar a audiência de julgamento.

Foi proferida douta sentença (fls 482 e seguintes) que absolveu o terceiro réu C… do pedido e condenou solidariamente os réus D… e E… no pagamento aos autores da quantia de 100.000,00 euros acrescida dos juros de mora vincendos desde a data da sentença e os absolveu do demais peticionado, tendo também absolvido os autores do pedido reconvencional formulado pelo primeiro réu.

6. Inconformados, o E… (fls 593) e o réu D… (fls 533) interpuseram recursos admitidos como de apelação com efeito devolutivo.

Por deliberação deste Tribunal da Relação de Lisboa de 1 de Março de 2012 foi anulado o julgamento para ampliação da matéria de facto, mantendo-se a decisão sobre a matéria de facto não afectada pela ampliação ordenada (fls 698 e seguintes).

Ampliada a matéria de facto (fls 754) sobre ela se produziu prova em nova audiência de julgamento.

Foi depois proferida nova sentença (fls 805 e seguintes) que absolveu e condenou, nos termos anteriormente decididos e já descritos.

8. Mais uma vez inconformados interpuseram recurso da sentença o E… e o réu D….

Os recursos foram admitidos como de apelação com efeito devolutivo.

9. São do seguinte teor as conclusões das alegações do réu D…:

«1.ª Houve obscuridade e ambiguidade de critério quanto à valoração da prova produzida em audiência de julgamento e a matéria de facto dada como provada na douta sentença;

2.ª Entende o ora apelante, que a sentença é nula nos termos do artigo 668.°, n.° 1, d) e e), do CPC.

3.ª Salvo o devido respeito, pela douta decisão proferida, verifica-se a existência de erro na apreciação da matéria factual que possibilita a modificação das respostas dadas aos quesitos.

4.ª Salvo o devido respeito pela douta decisão proferida sabre a matéria de facto, no nosso entendimento, a mesma sofre de obscuridade, visto que há respostas ambíguas ou pouco claras.

5.ª No nosso entendimento a Meritíssimo Juiz do tribunal recorrido não fundamenta a sua decisão tendo em conta que o sinistrado também, e da mesma forma, poderia visualizar o veículo automóvel do aqui recorrente, como alegado, pais não teve o cuidado que lhe era exigível.

6.ª A Meritíssima juiz do tribunal de 1.ª instância avaliou excessivamente o depoimento da testemunha G…, uma vez que a mesma referiu ter ficado em estado de choque quando viu o embate que vitimou o seu amigo e colega de trabalho, não tendo ficado em condições de se aproximar deste, razão pela qual, se ausentou de imediato, Sendo certo, que tal circunstância, é susceptível de perturbar a percepção do que presenciou.

7.ª O agente da PSP que registou o croqui inicial, testemunhou em audiência de julgamento que havia vários rastos de travagem, não podendo a Meritíssima juiz a quo considerar, sem qualquer margem de dúvida que a testemunha G… sabia com toda a certeza qual o rasto de travagem que correspondia ao do acidente, ainda por cima no dia seguinte, quando todos os elementos do acidente já lá não estavam (carro, vitima etc.).

8.ª Salvaguardando sempre o devido respeito pela Meritíssima Juiz a quo, a fundamentação da decisão da matéria de facto é, no nosso entendimento, lacónica, sucinta, vaga e inconclusiva, não sendo possível através das regras da lógica e da experiência, aferir da razoabilidade da convicção sobre o julgamento da matéria de facto.

9.ª Salvo o devido respeito não chegaram a ser enunciados os motivos ou as razões substanciais porque os meios de prova referidos relevaram ou obtiveram credibilidade no espírito do Meritíssimo Juiz a quo.

10.ª Quanto aos factos não provados, a Meritíssima Juiz a quo não esclareceu quais os meios de prova que não permitiram formar a sua convicção quanto à sua ocorrência, ou convencer quanto a uma diferente perspectiva da realidade.

11.ª Assim, entendemos que os limites mínimos exigidos pela lei para a fundamentação não foram observados, nos termos do art. 653.°, n.° 2, do CPC.

12.ª Pelo que, nos termos do art. 712°, n° 5, do CPC, aqui e ora se requer seja determinado que o douto Tribunal a quo fundamente em conformidade, com as exigências previstas no art. 653.°, n.° 2, do CPC, as respostas aos artigos da base instrutória julgados provados, parcialmente provados e não provados.

13.ª Não se vislumbra a razão porque a Meritíssima juiz do tribunal recorrido aceita como correspondendo à realidade o croquis do acidente elaborado com a testemunha, G…, e não aceita o croquis inicialmente apresentado por H…, agente da P.S.P.

14.ª Mesmo com as dúvidas expressas pela Meritíssima Juiz na douta sentença, não deixou de condenar o ora apelante, pelo que existe obscuridade e ambiguidade de critério quanto à valoração da prova produzida em audiência de julgamento e a matéria de facto dada como provada na douta sentença, tendo em conta essas mesmas dúvidas e incertezas.

15.ª Tem igualmente em consideração factos que nunca foram alegados por nenhuma das partes como o facto do condutor da viatura automóvel, aqui recorrente, circular ou não na sua mão de trânsito, ter ou não as luzes dos médios acesas.

16.ª A Meritíssima juiz de 1.ª instância deu mais credibilidade ao depoimento da testemunha, G…, que era amiga do sinistrado, do que à testemunha H…, completamente isenta, sem qualquer interesse ou emoção envolvida, do agente da PSP.

17.ª Assim como igualmente deveria aceitar como provados os factos constantes da sentença de absolvição e a sua fundamentação de facto e de direito, posteriormente confirmada pelo Acórdão da Relação de 26/09/2006, no processo que correu termos no 1.° Juízo Criminal sob o 21/02.9PASXL, em que foi arguido D…, pelos mesmos acontecimentos, como documentos juntos aos autos, não obstante os mesmos se terem dados como reproduzidos para todos os efeitos legais na contestação.

18.ª Certo é que, a já referida sentença do processo criminal, transitada em julgado e confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, refere que “era impossível para o peão não ter visto (o arguido). Mas era mais difícil ao condutor do veículo aperceber-se que estava alguém a atravessar a estrada, uma vez que o peão sai de uma área ajardinada com algumas esparsas árvores, especialmente em passo acelerado (…) Há também que considerar que a taxa de alcoolemia que a vítima apresentava lhe diminuía o tempo de reacção, o desinibia, alterando assim a sua percepção de tempo e de espaço, o que também poderá ter contribuído para o acidente”.

19.ª A Merítissima juiz ad quo não valorizou o fato da vítima estar etilizada, e esse fato ter contribuído para o acidente, como na modesta opinião do apelante, o deveria ter feito.

20.ª Existe obscuridade e ambiguidade de critério quanto à valoração da prova produzida em audiência de julgamento e a matéria de facto dada como provada na douta sentença.

21.ª Salvo o devido respeito, pela douta decisão proferida, verifica-se a existência de erro na apreciação da matéria factual que possibilita a...

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