Acórdão nº 3963/20.6T8CBR.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 09-04-2024

Data de Julgamento09 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão3963/20.6T8CBR.C1
Órgão Tribunal da Relação de Coimbra

2.ª Secção – Cível

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório

Em autos de inventário para partilha do património comum dos ex-cônjuges (após divórcio) AA (requerente e atual cabeça de casal) e BB (requerido), ambos com os sinais dos autos, iniciados em cartório notarial, mas remetidos, no modo legalmente admitido, ao Juízo de Família e Moneres de Coimbra ([1]), tendo aquela Cabeça de Casal apresentado a respetiva relação de bens ([2]), composta por bens móveis e um imóvel,

veio depois a ter lugar a conferência de interessados, importando essencialmente a sessão de 05/01/2023 (fls. 257 e segs. do processo físico), de cuja ata consta o seguinte:

«Iniciada a presente conferência, pelos interessados foi declarado que ambos se encontram de acordo quanto à divisão dos bens móveis, pela seguinte forma:

- - - Verba nº. 1 - O saldo existente nas contas bancárias, fica adjudicado a ambos os interessados em partes iguais;

- - - Verba nº. 2 - Veículo automóvel marca Peugeot, com a matrícula ..-..-GC, é adjudicado à cabeça de casal AA, pelo valor da avaliação €: 500,00;

- - - Verba nº. 3 - Veículo automóvel marca Nissan, com a matrícula ..-..-MF, é adjudicado ao interessado BB, pelo valor da avaliação, €: 2.000,00;

- - - Verba nº. 4 - Quota social de 2.500,00 euros, na firma “P..., Lda”, NIPC ...18, com capital social de 7.500,00 euros e sede em ..., freguesia ..., concelho .... É adjudicada ao interessado BB, pelo valor da avaliação €: 8.605,13;

- - - Verba nº. 5 - alíneas:

a) - Arca de madeira Wengue (panga-panga), é adjudicada à cabeça de casal AA, pelo valor já acordado €: 100,00;

b) - 4 vasos decorativos, são adjudicados à cabeça de casal AA, pelo valor já acordado €: 50,00;

c) - Mobília de um quarto, composta por uma cama de casal, uma cómoda, um espelho e duas mesinhas de cabeceira, é adjudicado à cabeça de casal AA, pelo valor já acordado €: 500,00;

d) - Credência em madeira, com espelho, é adjudicada à cabeça de casal AA, pelo valor já acordado €: 100,00;

e) - Arca em tons azulados, móvel de televisão e móvel de telefone, é adjudicada à cabeça de casal AA, pelo valor já acordado €: 100,00;

f) - Conjunto de tapetes de quarto, são adjudicados à cabeça de casal AA, pelo valor já acordado €: 50,00;

g) - incorporada na verba nº. 6;

h) - Mobília de sala, composta por um sofá de três lugares e uma lareira com recuperador de calor, é adjudicado à cabeça de casal AA, pelo valor já acordado €: 500,00;

i) - Mobília de um quarto, composta por uma cama de casal, duas mesinhas de cabeceira, uma cadeira e um armário com quatro portas e espelho embutido, é adjudicado à cabeça de casal AA, pelo valor já acordado €: 500,00;

j) - incorporada na verba nº. 6;

k) - incorporada na verba nº. 6;

l) - Móvel de televisão, televisão antiga e cadeira, é adjudicada à cabeça de casal AA, pelo valor já acordado €: 100,00;

m) - Mobília de um quarto, composta por uma mesa de canto, uma boneca de porcelana, um berço, uma cama de casal, duas mesinhas de cabeceira, uma cómoda e um espelho, é adjudicado à cabeça de casal AA, pelo valor já acordado €: 500,00;

n) - incorporada na verba nº. 6;

o) - 40 Quadros e outros objectos decorativos pendurados nas paredes, são adjudicados à cabeça de casal AA, pelo valor já acordado €: 100,00.

- - - Nesta altura, pelos interessados foi declarado que não pretendem ficar com a verba nº. 6 - "prédio urbano, composto de r/c com uma cozinha, uma casa de banho, uma despensa e uma garagem; 1º andar com quatro divisões, duas casas de banho e uma despensa; sótão amplo para arrumos e logradouro, sita no loteamento ..., Lugar ... e inscrito na matriz predial urbana com o n.º ...71 na União de Freguesias ..., não descrito na Conservatória do Registo predial, e com o valor patrimonial de € 125.971,65", tendo ambos acordado que vão diligenciar pela venda extrajudicial do imóvel, pelo valor mínimo de €: 200.000,00, requerendo para tal, a suspensão da instância pelo período de 6 meses.

- - - Seguidamente, A Mmª. Juiz proferiu o seguinte:

D E S P A C H O

Face ao acordado pelas partes e a fim dos mesmos providenciarem pela venda do imóvel em causa, suspende-se a presente conferência, mas pelo período de 3 meses - nº. 4 do artº. 272º. do CPC ---.

Notifique.».

A Cabeça de Casal veio, na sequência, indicar ter encontrado terceiro interessado na aquisição do prédio urbano (verba n.º 6), pelo valor de € 175.000,00, valor esse que aquela afirmou aceitar, aceitação também declarada pelo interessado BB.

Todavia, a Cabeça de Casal, por requerimento datado de 26/05/2023 (Ref. 45685252, a fls. 267 e segs. do processo físico), veio significar que «a escritura pública só será celebrada após o douto Tribunal efectuar a forma à partilha, para se apurar quais os valores que a Cabeça de Casal é credora a título de tornas, sobre o Interessado» e, bem assim, que «só após obter esse valor é que a Cabeça de Casal aceita celebrar a escritura pública, sendo que só outorgará tal acto mediante a entrega, pelo comprador, de metade que lhe cabe na venda, bem como do montante das tornas devidas pelo Interessado, a serem-lhe subtraídas à metade que lhe caberia, caso não existissem tornas a haver.». E logo reforçou que «Estas são as condições da Cabeça de Casal para a realização da escritura».

Na sequência, foi proferido despacho (datado de 30/05/2023, a fls. 270 do processo físico) com o seguinte teor relevante:

«Ref. 8096072 e 8099255: Resolvidas as questões suscetíveis de influir na partilha e na determinação dos bens a partilhar - artigos 547º e 1110º e ss. do Código de Processo Civil - determino o seguinte:

Atendendo à manifesta simplicidade da forma à partilha, procedo à adequação processual, e determino que se proceda à partilha da seguinte forma:

Ao valor dos bens relacionados subtrai-se o valor do passivo que venha a ser aprovado ou reconhecido. O resultado obtido divide-se em duas partes iguais, adjudicando-se a cada um dos interessados, conforme acordado em ata de conferência de interessados, que se homologa.

Notifique.

**

Quanto ao demais, considerando que falta partilhar a verba nº 6, estando os interessados de acordo em relação à venda do mesmo, e existindo já comprador interessado, aguardem os autos a realização da escritura pública.

Prazo: 30 dias.» (destaques aditados).

Por requerimento datado de 23/06/2023 (Ref. 45938124, a fls. 271 e segs. do processo físico), veio a Cabeça de Casal juntar “cópia da escritura de compra e venda da casa de habitação constante da verba 6” (fls. 273 e segs. do processo físico), da qual resulta a venda do imóvel, pelo preço de € 130.000,00, e de todo o recheio do mesmo (cfr. verba n.º 5), incluindo “mobiliário, eletrodomésticos e aquecimento central”, por € 45.000,00 [num total, pois, de € 175.000,00].

Montantes esses então “integralmente pagos”, “que já receberam” os outorgantes vendedores (os aqui interessados), mediante um total de quatro cheques (dois referentes ao preço do imóvel, de € 65.000,00, cada um, e dois referentes aos bens móveis/recheio, de € 22.500,00, cada um), de que, por isso, “prestam a respectiva quitação”.

Seguidamente, datada de 27/06/2023, foi proferida decisão ([3]) com o seguinte conteúdo:

«Ref. 8166505: A transação realizada em conferência de interessados – ref. 90186128 – é válida quanto ao seu objeto e pela qualidade dos respetivos intervenientes.

O cabeça de casal dos presentes autos de inventário facultativo vem informar que procederam à partilha do único bem comum do casal que faltava partilhar, juntando escritura de compra e venda realizada no dia 21 de junho de 2023.

Assim, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 293º, nº 2, 294º, 299º, e 300ºdo C.P.C., homologo-a por sentença, condenando o requerente destes autos de inventário para separação de meações e cabeça de casal, AA e o requerido BB, a observá-la nos seus precisos termos.

Custas em partes iguais, atendendo-se ao apoio judiciário de que goza a requerida.

O valor corresponde à soma do valor dos bens a partilhar (artigo 302.º, n.º 3, do Código de Processo Civil).

Registe e notifique.».

A Cabeça de Casal, perante esta decisão, veio “reclamar e arguir a respectiva Nulidade”, aduzindo os seguintes motivos ([4]):

«1

Resulta dos Autos que não foi elaborado mapa da partilha, apesar de a Cabeça de Casal ter tornas a haver, que calcula no valor de 3.727,56 Euros.

2

A Cabeça de Casal ainda tentou que aquando da escritura de compra e venda da casa de habitação fosse resolvida essa questão com o interessado, porém este recusou-se a pagar-lhe as tornas que tem a haver da partilha dos bens móveis, e por isso o valor da alienação do imóvel foi dividido em partes iguais, ficando assim pendente a questão das tornas.

4

Pelo que, Salvo Melhor Opinião, não podia ter sido proferido o Douto despacho que antecede, e daqui vir reclamar e arguir a respectiva nulidade, sem prejuízo do recurso de apelação que poderá vir a ter de intentar dentro do prazo legal, nos termos do disposto no artigo 1123, nº 2, al. c) do CPC.

5

Pois considera a Cabeça de Casal que há manifesto lapso, ao não ser elaborado o mapa da partilha para apuramento das tornas, nos termos do disposto no artigo 1120º do C.P.C., tal como ao não ser notificada para os termos do disposto no artigo 1121º do C.P.C..

6

Pelo que vem requerer que seja dado sem efeito o Douto despacho/sentença que antecede, por haver lapso manifesto, e que seja ordenada a elaboração do mapa da partilha, dando cumprimento ao disposto no artigo 1120º e 1121º, ambos do Código do Processo Civil, dando-se assim provimento à presente reclamação e arguição de nulidade do Douto despacho proferido em 27-06-2023.».

E, inconformada, veio interpor o presente recurso, pedindo que lhe fosse fixado efeito suspensivo, com motivação e conclusões, tudo para concluir pela revogação da decisão recorrida.

É do seguinte teor o seu acervo conclusivo:

«I

A Recorrente...

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