Acórdão Nº 394/95 de Tribunal Constitucional, 27-06-1995

Número Acordão394/95
Número do processo460/94
Data27 Junho 1995
Classe processualRecurso
Acórdão 394/95

ACÓRDÃO Nº 394/95

Procº nº 460/94.

2ª Secção.

Relator:- Consº BRAVO SERRA.

I

1. E..., , propôs no Tribunal de comarca de Tomar providência de injunção contra S...., com vista a obter força executiva a uma obrigação pecuniária no montante de Esc. 44.962$00, de que era credora e que decorreu de um contrato de compra e venda entre ambas celebrado, obrigação essa que requerida não teria cumprido.

Tendo a mesma requerida sido notificada nos termos do artº 4º do Decreto-Lei nº 404/93, de 10 de Dezembro, e não tendo ela deduzido oposição, o secretário judicial daquele Tribunal, por despacho de 19 de Maio de 1994, apôs no requerimento solicitador da providência a fórmula "Execute-se".

Em 14 de Julho seguinte, veio a E... instaurar, ainda naquele Tribunal e contra S...., execução para pagamento da quantia correspondente ao dito montante, acrescida de juros vencidos e vincendos.

O Juiz do Tribunal de comarca de Tomar, por despacho de 26 de Setembro de 1994, suportando-se num juízo de "inconstitucionalidade material do Dec Lei nº 404/93 de 10/12, designadamente do seu artº 5º", cuja aplicação recusou, já que, em seu entender, essa norma violaria o nº 1 do artº 205º da Lei Fundamental, liminarmente indeferiu o pedido de execução visto que, na sua óptica, se postaria uma situação de inexistência de título executivo.

Do assim decidido recorreu o Ministério Público para o Tribunal Constitucional.

2. Aqui produziu alegação o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto que, sustentando a procedência do recurso, a concluiu do seguinte modo:-

"1º - A possibilidade, conferida ao se cretário judicial pelo artigo 7º do Decreto- -Lei nº 404/93, de 10 de Dezembro, de recusar o pedido de injunção quando este se não adeque às finalidades tipificadas no artigo 1º constituiu simples decorrência de existir um evidente e ostensivo erro na forma de processo escolhida pelo requerente, e não prolacção de qualquer decisão de mérito, ainda que liminar, sobre a pretensão formulada.

2º - A aposição da fórmula executória, nos casos em que se consumou a notificação por via postal do requerido e em que este não de duziu oposição, nos termos do artigo 5º, em conjugação com os artigos 4º e 6º, nº 2, do mesmo diploma legal, não representa a prolação de qualquer decisão de natureza jurisdicional que traduza composição do eventual litígio que oponha o credor ao devedor, mas tão somente a certificação por aquele funcionário judicial de que, tendo-se consumado a notificação do pedido de injunção ao requerido e não tendo sido deduzida por este oposição, se mostra constituído, nos termos da lei, título executivo extra-judicial.

3º - Não traduzindo a referida aposição da fórmula executória a prática de qualquer acto jurisdicional de composição do litígio, não envolve qualquer preclusão relativamente aos meios de defesa que, em processo executivo, ao executado é lícito opor ao exequente o qual seguirá necessariamente a forma sumária (artigo 465º, nº 2, do Código de Processo Civil), iniciando-se com a citação do executado e comportando a eventual dedução de embargos nos amplos termos consentidos pelo artigo 815º do Código de Processo Civil.

4º - O regime constante do Decreto-Lei nº 404/93 não implica, deste modo, violação do preceituado nos artigos 205º e 206º da Constituição da República Portuguesa, já que não resulta conferida ao secretário judicial qualquer competência para proceder, à revelia do juiz, a uma composição do conflito de interesses privados entre requerente e requerido no procedimento de injunção, esgotando-se a actividade que lhe é consentida na mera certificação de que se mostra criado, nos termos da lei, título executivo extrajudicial.

5º - O mesmo regime em nada ofende o princípio do contraditório, ínsito nos artigos 2º e 20º da Lei Fundamental, já que não preclude ao requerido qualquer direito de defesa: na verdade, se este não foi notificado, ou deduziu oposição, seguem-se os termos do processo declarativo sumaríssimo, que naturalmente são idóneos para assegurar tal direito; a aposição da fórmula executória em nada preclude a dedução de embargos de executado, nos amplos termos permitidos pelo artigo 815º do Código de Processo Civil, já que obviamente a execução a instaurar se não baseia em sentença."

II

1. Com vista a permitir que "o credor de uma prestação" possa obter, por meio de uma "forma célere e simplificada" e de forma desburocratizada, "um título executivo", que actuará como "condição indispensável ao cumprimento coercivo" dessa prestação, caso esse cumprimento coercivo se traduza "no cumprimento de uma obrigação pecuniária", concebeu o legislador, por intermédio do Decreto-Lei nº 404/93, uma providência, que designou de «injunção», mencionando desde logo no seu preâmbulo que era atribuída ao secretário judicial do tribunal "competência para proceder à notificação do requerido e, na ausência de oposição, também para imediata aposição da fórmula executória", advertindo que essa aposição não constituía, "de modo algum, um acto jurisdicional", já que, "indubitavelmente", não deixava de permitir "ao devedor defender-se em futura acção executiva, com a mesma amplitude com que o pode fazer no processo de declaração, nos termos do disposto no artigo 815.º do Código de Processo Civil", sendo que, não obstante se tratar "de uma fase desjurisdicionalizada", nem assim se mostravam "diminuídas as garantias das partes intervenientes no processo", uma vez que o respectivo acautelamento era "efectivamente, assegurado quer pela via da apresentação obrigatória dos autos ao juiz quando se verifique oposição do devedor, quer pelo reconhecimento do direito de reclamação no caso de recusa, por parte do secretário judicial, da aposição da fórmula executória" (entre aspas, as palavras do exórdio do citado diploma).

Nesse decreto-lei definiu-se, no artº 1º, a «injunção» como sendo "a providência destinada a conferir força executiva ao requerimento destinado a obter o cumprimento efectivo de obrigações pecuniárias decorrentes de contrato cujo valor não exceda metade do valor da alçada do tribunal de 1ª instância", consagrando-se que o respectivo pedido "é apresentado na secretaria do tribunal que seria competente para a acção declarativa com o mesmo objecto" (artº 2º, nº 1), devendo ele conter exposição dos "factos que fundamentam" a pretensão, ser acompanhado pelos "documentos comprovativos, se os houver" e concluir "pelo pedido da prestação a efectuar" (artº 3º).

Seguidamente, o diploma estatui, nos seus artigos 4º a 7º, do seguinte modo:-

Artigo 4.º

Notificação da injunção

Recebido o pedido, o secretário judicial do tribunal notifica o requerido, por carta registada com aviso de recepção, remetendo cópia da pretensão e dos documentos juntos, devendo indicar, de forma inteligível, o objecto do pedido e demais elementos úteis à compreensão do mesmo, referindo, ainda, expressamente, o último dia do prazo para a oposição.

Artigo 5º.

Aposição da fórmula executória

Na falta de oposição, ou em caso de desistência da mesma, o secretário judicial apõe a seguinte fórmula executória no requerimento de injunção: «Execute- -se».

Artigo 6º.

Oposição do requerido.

1 - O requerido pode opor-se à pretensão no prazo de sete dias a contar da notificação.

2 - Sendo deduzida oposição, ou frustrando-se a notificação por via postal, o secretário judicial do tribunal apresentará os autos à distribuição, sendo conclusos ao juiz, o qual, se o estado do processo o permitir, designará, desde logo, o dia para julgamento, observando-se a tramitação estabelecida para o processo sumaríssimo.

Artigo 7º.

Recusa da aposição da fórmula executória

e reclamação

A aposição da fórmula executória só poderá ser recusada quando o pedido não se adeque às finalidades constantes do artigo 1º. e nas situações em que à se- cretaria, nos termos da lei do processo, é lícito não receber a petição, cabendo da recusa reclamação para o juiz presi- dente do tribunal ou do respectivo juízo cível.

2. Segundo a decisão ora impugnada, "a actividade destinada a conferir força executiva ao requerimento do credor, nos termos do Dec.Lei supra-citado, insere-se no exercício da função jurisdicional", já que tal actividade "torna certa a existência de uma obrigação, dispensando o credor de recorrer ao processo declaratório", ao que acresce que "o secretário judicial, embora em casos contados, pode recusar a aposição da fórmula executória", o que traduz, "de modo evidente a resolução de uma questão de direito" por parte desse funcionário.

Será que colhe uma argumentação tal como a acolhida no despacho sob censura?

Adianta o Tribunal desde já que não.

3. Teve já este órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade, por várias vezes, oportunidade de se pronunciar sobre a definição do que seja função jurisdicional comparativamente com...

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