Acórdão nº 3834/18.6T8VFR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 17-11-2021
Data de Julgamento | 17 Novembro 2021 |
Case Outcome | NEGADA |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 3834/18.6T8VFR.P1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
Relatório
AA, intentou contra BB e mulher CC; DD e mulher EE; Banco Comercial Português, S.A., e FF, ação declarativa de condenação com o pedido de:
“a) reconhecer-se o crédito do autor sobre os réus BB e CC no montante de 39.305,62€ (trinta e nove euros e trezentos e cinco euros e sessenta e dois cêntimos) acrescido de juros à taxa legal supletiva de juros comerciais até efectivo e integral pagamento, condenando-se tais réus no seu pagamento ao autor e os demais réus a tal reconhecerem;
b) declarar-se a nulidade por simulação e a impugnação pauliana e assim a ineficácia dos negócios jurídicos referidos supra nos artigos 18.º, 19.º, 20.º e 21.º fazendo-se restituir tais prédios referidos supra nos artigos 16.º e 17.º ao património dos réus BB e CC para que aí possam ser executados pelo aqui credor autor, além de poderem ser executados nos patrimónios dos obrigados à restituição, os réus DD e EE quanto à propriedade e o réu Banco BCP quanto à hipoteca, com a prevalência de penhoras que retroajam os seus efeitos à data do registo dos arrestos em 16.03.2018 pelas 12h50m57s sobre os prédios descrições n.ºs 5751 e 5929 da Freguesia e Concelho .............. de que o autor beneficia, condenando-se todos os réus a tal reconhecerem;
c) Reconhecer-se que o autor beneficia em garantia do pagamento de tal crédito, com preferência (prior in tempore, potior in iure) relativamente a qualquer outro credor designadamente o réu FF e a sua penhora com efeitos à data de 23.05.2018, e com carácter de direito real e assim com sequela, de direito de arresto registado em 16.03.2018 sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial .............. sob o n.º …. da Freguesia e Concelho .............. que após conversão em penhora retroagirá os seus efeitos à primeva data de 16.03.2018 em que o mesmo foi lavrado, condenando-se todos os réus a tal reconhecerem.
d) decretar-se a consequente e nulidade das AP. 2190 de 2014/06/12 e AP. 512 de 2017/12/28 inscritas nas descrições da Conservatória do Registo Predial ..........…. e …. da Freguesia e Concelho ............ e ordenar-se o cancelamento de tais registos (inscrições).
No final da petição o autor que o tribunal procedesse ao registo da ação por entender que lhe incumbia essa obrigação.
Por despacho de 13-11-2018 o tribunal indeferiu o pedido de registo oficioso da ação por entender que “a presente ação está configurada, pelo próprio autor, como de impugnação pauliana.
Embora as ações de impugnação pauliana estejam sujeitas a registo (art.º 3.º, n.º 1, al. a), do CRegPred), não incumbe ao Tribunal determinar oficiosamente esse registo, na medida em que este não é obrigatório por decorrência da exceção estatuída no art.º 8.º-A, n.º 1, al. b), do mesmo Código.
Por conseguinte, indefere-se o requerido registo oficioso promovido pelo Tribunal, sem prejuízo de o registo poder ser efetivado pela parte interessada.”
O autor requereu a reforma desse despacho por entender que “a ação está configurada, além de impugnação pauliana, como de nulidade por simulação” reforma que foi indeferida por despacho de 26-11-2018 onde se deixou expresso que “O primeiro pedido formulado é de impugnação pauliana. A impugnação pauliana tem como efeito jurídico a ineficácia dos actos.
Sem que tenha ainda sido cumprida a citação dos réus, este não é o momento próprio para conhecimento da questão, contudo desde já se adianta, ao abrigo do estatuído no art.º 7.º, do CPC (princípio da cooperação), afigurar-se ser substancialmente incompatível a cumulação, a título principal, daquele pedido com o pedido de nulidade por simulação do mesmo acto, sendo por si só gerador de ineptidão da petição inicial, passível de conhecimento oficioso [art.º 186.os, n.º 2, al. c), do CPC e 196.º, do CPC].
O Tribunal não pode ordenar a prática de actos que, ab initio, já percepciona configurarem actos inúteis (art.º 130.º, do CPC).
Por conseguinte, indefere-se a requerida reforma do despacho.”
Em 3-12-2018 o autor através de requerimento apresentou “petição inicial corrigida retirando os incisos alegados nos arts. 19.º e 20.º da sua p.i. - eventualmente pretendendo também doar tais prédios ao genro e filha os réus DD e EE e eventualmente também de beneficiar o genro e a filha os réus DD e a filha EE -, bem como alterar, ampliando, o pedido constante da al. b) do petitório constante da petição inicial, por se tratar de concretização e desenvolvimento do pedido primitivo, no sentido de dele passar a constar b) declarar-se a nulidade por simulação, ou, quando não assim, subsidiariamente, a impugnação pauliana e assim a ineficácia, dos negócios jurídicos referidos supra nos artigos 18.º, 19.º, 20.º e 21.º fazendo-se restituir tais prédios referidos supra nos artigos 16.º e 17.º ao património dos réus BB e CC para que aí possam ser executados pelo aqui credor autor, além de poderem ser executados nos patrimónios dos obrigados à restituição, os réus DD e EE quanto à propriedade e o réu Banco BCP quanto à hipoteca, com a prevalência de penhoras que retroajam os seus efeitos à data do registo dos arrestos em 16.03.2018 pelas 12h50m57s sobre os prédios descrições nºs 5751 e 5929 da Freguesia e Concelho ...... de que o autor beneficia, condenando-se todos os réus a tal reconhecerem.”
Por despacho de 5-12-2018 o tribunal configurou o requerimento do autor como uma retificação de lapso material, e uma ampliação do pedido e, admitindo-os como incidente mandou aguardar a citação dos réus e o prazo da contestação e depois da citação, notificar os réus, através dos respetivos mandatários, para se pronunciarem, quanto a esse incidente.
Os RR contestaram, pugnando pela improcedência da ação e pronunciaram-se ainda sobre a requerida apresentação de nova petição inicial corrigida e ampliação do pedido, opondo-se à mesma.
Foi então proferido despacho, datado de 27-06-2019, em que se considerou que o autor não explicita qual o lapso em que incorreu nem qualquer fundamento de facto para requerer a retificação do alegado “lapso”, sendo que não há evidência de qualquer erro ou lapso manifesto, ostensivo ou identificável no seu contexto e como tal retificável. E, por outro lado, que seria inaplicável o invocado art.º 465 n.º 2, do Código de Processo Civil porquanto a matéria alegada pelo autor nos pontos 19º e 20º da p.i. não consubstancia qualquer confissão de factos, tendo-se determinado o indeferimento da apresentação da petição inicial “corrigida”.
Quanto à pretendida alteração (por invocada ampliação) do pedido considerou-se que a ampliação pretendida não traduz um desenvolvimento do pedido primitivo, mas materializa um pedido diverso nas suas consequências (pedidos cumulativos são distintos de pedidos subsidiários) tendo sido indeferida com esse fundamento a requerida ampliação.
Desta decisão interpôs o autor recurso que não foi recebido pelo tribunal recorrido, por ter considerado não se enquadrar o despacho recorrido em qualquer das alíneas dos nºs 1 e 2, do art. 644 do CPC não podendo do mesmo ser interposto recurso por apelação autónoma, ficando o mesmo sujeito à previsão do n.º 3, do mesmo normativo, ou seja, “as restantes decisões proferidas pelo Tribunal de 1.ª Instância podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1”.
Tendo o recorrente reclamado nos termos do previsto no art. 643 do CPC, não obteve o provimento.
Em sede de saneamento foi proferida decisão, na qual, salientando-se o diferente regime das ações que visam a impugnação pauliana e das ações em que seja invocada a simulação, e consequentemente a impossibilidade de o autor peticionar cumulativamente, a nulidade da dação em cumprimento por simulação e a simples ineficácia, em relação a si do referido negócio fundada na impugnação pauliana, concluindo-se pela “ … ocorrência da exceção dilatória de nulidade do processo, fundada em ineptidão da petição inicial, por cumulação de pedidos substancialmente incompatíveis, nos termos do disposto no art.º 186.º, n.º 1 e 2, al. c), do Código de Processo Civil” absolvendo-se em consequência, os réus da instância.
O autor interpôs recurso desta decisão e ainda da proferida em 27-06-2019 que indeferiu “a apresentação de petição inicial de alegada correção” e indeferiu “a requerida alteração do segundo pedido formulado pelo autor” e rejeitou a nova petição inicial apresentada em 03-12-2018.
O Tribunal da Relação julgando a apelação acordou em revogar a decisão que não admitiu a apresentação pelo Autor de petição inicial corrigida junta com o requerimento de 03-12-2018, e admitindo a mesma anulou todo o processado posterior, determinando o prosseguimento dos autos com notificação dos réus da nova petição e ulterior tramitação, conforme for de direito.
A ré CC interpôs recurso de revista concluindo que:
1) O Autor instaurou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra a ora Recorrente e contra os também Réus BB DD e EE, Banco Comercial Português, S.A. e FF peticionando, além do mais: “b) declarar-se a nulidade por simulação e a impugnação pauliana e assim a ineficácia dos negócios jurídicos referidos supra nos artigos 18.º, 19.º, 20.º e 21.º” (…)
2) Decorre da Petição Inicial, designadamente do uso da locução “e” que o Autor formulou, no pedido, de forma expressa e a título principal a cumulação do pedido de impugnação pauliana com o pedido de declaração de nulidade por simulação, em cumulação real, facto que também é percetível do articulado da Petição Inicial através de diversas referências a esses dois pedidos (e.g. ou seja, nos artigo 18.º, 19.º, 20.º, 23.º, e 24.º alega factos respeitantes à simulação e nos artigos 25.º, 26.º da Petição Inicial alega factos respeitantes à simulação e a impugnação pauliana.
3) Na sequência da determinação do registo da ação como “ação de impugnação pauliana”, o Autor...
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