Acórdão nº 3819/19.5T8VIS-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 21-05-2024
Judgment Date | 21 May 2024 |
Acordao Number | 3819/19.5T8VIS-A.C1 |
Year | 2024 |
Court | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na Secção Cível (3.ª Secção), do Tribunal da Relação de Coimbra
Proc.º n.º 3819/19.5T8VIS-A.C1
1- Relatório
1.1.- AA e BB, executados nos autos principais, onde é exequente a Banco 1..., S.A., vieram deduzir oposição à execução, solicitando a sua absolvição do pedido, requerendo, ainda, o chamamento de CC e DD, uma vez que os embargantes pretendem exercer o seu direito de regresso contra os mesmos.
Para sustentar a sua pretensão, alegam, em suma, o seguinte: o exequente diz ser dono e legitimo portador de uma livrança; para que as conclusões da exequente tivessem qualquer valor, necessário era que a livrança integrasse os ativos e passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob Gestão do Banco 2..., SA, o que não vem alegado, e não se aceita; não vem alegada a data da transmissão do crédito e não o aceita; os aqui executados, são avalistas de uma letra cuja finalidade é servir de caução; foi assinada a pedido dos avalisados, antes e para caucionar a celebração de uma escritura de mútuo com hipoteca, que se viria efetivamente a realizar na data de 27/12/2002; celebrada a escritura deixou de ter qualquer sentido ou legitimidade a detenção da livrança, contudo não a restituiu; impugna-se o preenchimento quanto à data de emissão, quanto à importância, quanto à data de vencimento, e quanto à domiciliação, a livrança em causa, uma vez que não tem qualquer correspondência com a realidade; a existência desta livrança não foi sequer referida na reclamação de créditos e na lista de credores no âmbito do processo de insolvência da avalisada CC; impugna o valor aposto na livrança, uma vez que os valores dali constantes, estariam seguramente prescritos, à data em que terá ocorrido tal preenchimento, e à data em que nela consta como data de vencimento; a livrança garantiria um contrato de mútuo onde a restituição se processaria por prestações mensais de capital e juros; tendo-se vencido em data não posterior a 2006, estariam vencidas todas as prestações (como de qualquer forma estariam vencidos todos os juros relativos aos últimos cinco anos); acresce que aquele valor colocado na letra englobaria juros (não obstante prescritos, o que expressamente se invoca) pretende o exequente receber nesta execução juros sobre aqueles juros (o que a lei manifestamente não consente, e é imoral); a pretensa dívida terá tido o seu vencimento em 2006; os executados foram contactados no ano de 2005 pelo Banco, Banco 2..., na altura, para regularizarem a situação de incumprimento em que se encontravam os compradores do imóvel; tendo naquela data, os executados, procedido ao pagamento da quantia que se encontrava em dívida, e como tal regularizado toda a situação de incumprimento perante a instituição bancária; no ano seguinte, foram de novo, os executados confrontados com um incumprimento por partes dos titulares do empréstimo, mas nessa altura, aqueles já não tinham condições, para regularizar a situação; tiveram conhecimento que a hipoteca, que garantia a mesma dívida, foi executada, e que ao credor acabaria por ser adjudicada a casa dos ali executados (os avalizados DD e CC); desde 2006 não tiveram qualquer tipo de contacto com o credor não poderiam retirar desse comportamento do credor, prolongado por uma década, outra convicção que não fosse de que a dívida estaria inteiramente regularizada ou de que o credor nela não tinha interesse; existe abuso de direito, na modalidade de “venire contra factum proprium”; para além da clara violação do princípio da boa fé, é convicção dos executados, que estamos perante uma clara violação do princípio da confiança; torna-se incompreensível que um contrato que se encontra em incumprimento desde o ano de 2006, a livrança agora dada à execução, tenha como data de vencimento o ano de 2018, ou seja, que haja um hiato temporal de mais de 12 anos; estranhamente, a presente execução, apenas foi instaurada contra os avalistas AA e BB; poderá decorrer dos presentes autos que os embargantes tenham que proceder ao pagamento do montante que avalizaram; se tal acontecer, têm o direito de exigir dos subscritores da livrança aquilo que pagaram, ou seja, a lei faculta-lhes a possibilidade de exercerem o direito de regresso; pelo que é seu interesse em que os mesmos sejam demandados na presente ação, cujo chamamento requerem.
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1.2.- Notificada da dedução de oposição por parte dos executados, veio a exequente apresentar contestação, alegando, em suma, o seguinte: por escritura de mútuo com hipoteca, datada de 27.12.2002, o embargado, ainda na veste de Banco 2..., S.A., concedeu a DD e CC, na qualidade de mutuários, a quantia de € 90.864,97; estes confessaram-se devedores, ao Banco, do montante supra descrito acrescido de juros, a ser reembolsado no prazo de 28 (vinte e oito) anos; como forma de garantia do cumprimento, os mutuários constituíram i. Hipoteca sobre o bem imóvel identificado na escritura; ii. Livrança, em branco, subscrita pelos mutuários e avalizada aos subscritores por AA e BB, ora Embargantes – a preencher na hipótese de eventual incumprimento, pelo montante global em dívida ao abrigo do contrato; o Banco foi, então, expressamente autorizado, pelos subscritores e pelos avalistas, a acionar ou descontar a referida livrança, perante o incumprimento das obrigações assumidas, bem como a preencher a livrança com uma data de vencimento posterior ao vencimento de qualquer obrigação garantida, pela quantia devida pela mutuária, ao abrigo do contratualmente estabelecido; todos os subscritores aceitaram o teor do pacto de preenchimento da livrança; os mutuários não procederam ao reembolso da quantia financiada, encontrando-se em incumprimento perante o Banco desde 5.08.2006, do montante de capital de € 83.980,36, acrescido de juros e demais encargos; em 20.06.2007, o Banco intentou ação executiva contra os mutuários; tendo-se procedido à adjudicação do imóvel sobre o qual recaia a hipoteca do Banco, foi a referida execução extinta por inexistência de bens suscetíveis de penhora, em 9.10.2017; em 12.06.2018 a mutuária CC foi declarada insolvente; o Banco não procedeu ao preenchimento imediato da livrança, optando por aguardar pelos termos ulteriores do processo de insolvência; face à manifesta impossibilidade de satisfação do montante em dívida, o Banco por cartas datadas de 9.10.2018, interpelou os prestadores da garantia do aval, para pagamento do montante em dívida, dando-lhes conhecimento do supra referido vencimento antecipado do Contrato e do preenchimento da livrança-caução; sem qualquer resposta ou pagamento; intentou então a presente ação executiva, dando a livrança preenchida pelo montante em dívida ao abrigo do contrato de mútuo celebrado e de acordo com a autorização concedida; dúvidas não restam que a livrança-caução dada à execução teve em vista garantir o cumprimento do contrato de mútuo celebrado por escritura pública e, já não, a celebração da escritura em si, contrariamente ao afirmado pelos Embargantes; o facto de não ter sido invocada no processo de insolvência em nada contende com a sua inexistência; a escritura era suficiente, por si só para justificar o crédito do Banco; o título dado à execução é uma livrança e não o contrato subjacente à sua emissão e preenchimento; a livrança foi dada à execução na qualidade de título de crédito; em matéria de prescrição, a norma aplicável ao título executivo em apreço é o artigo 70.º, da LULL (ex vi do artigo 77.º) e não o invocado artigo 310.º, do Código Civil; o título executivo venceu-se em 2.11.2018, tendo sido intentado a ação executiva em 26.08.2019; o prazo prescricional apenas pode começar a contar a partir do momento em que o direito puder ser exercido (306.º do Código Civil); tendo o Banco interpelado os Embargantes a cumprir o contrato entre eles celebrado, se possa considerar, de modo algum, que o primeiro agiu de forma negligente na cobrança do crédito; o Banco interpelou, por diversas vezes, os Embargantes para a regularização da situação de incumprimento contratual; ainda com a extinção da execuçãocontra os mutuários por inexistência de bens e da insolvência da mutuária, o Banco procedeu ao preenchimento da livrança-caução e acionou, por força da mesma, os prestadores do aval; inexiste comportamento contraditório; o facto de o Embargado não ter procedido ao acionamento imediato dos avalistas nunca poderá ser assimilável a um comportamento desinteressado do credor, na medida em que este apenas teve em vista esgotar todas as possibilidades de ressarcimento direto pelos titulares do contrato de mútuo; o chamamento não se afigura admissível no presente caso.
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1.3. - Foi proferido despacho a indeferir a intervenção provocada requerida nos autos.
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1.4. - Foi dispensada a realização da audiência prévia.
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1.5.- Proferiu-se nos autos despacho saneador, fixando-se o objeto do litígio e os temas de prova.
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1.6. Realizou-se a audiência final, com observância dos legais formalismos.
Após foi proferida sentença onde se decidiu:
a)- julgar procedentes os presentes embargos, julgando demonstrada a prescrição da obrigação e consequente extinção da obrigação cambiária, o que determina a extinção da execução.
b)- Custas a cargo do exequente – artigo 527.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Valor: o já fixado.
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1.7. – Inconformado com tal sentença dela recorreu o embargado - Banco 1... S.A. -, terminando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem:
“1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença de 2 de agosto de 2023 que julgou procedente a oposição à execução, mas que, salvo o devido respeito, a quo não fez correta interpretação dos factos nem adequada aplicação do direito.
2. Em 04/11/2019, os Executados deduziram oposição à execução, invocando, entre outras, a exceção da prescrição da obrigação, o abuso do direito na modalidade do...
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