Acórdão nº 381/16.4YLPRT.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 10-10-2019

Data de Julgamento10 Outubro 2019
Número Acordão381/16.4YLPRT.L1-2
Ano2019
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

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1. Relatório:
Nos presentes autos de acção especial de despejo que CJ… e EB… (entretanto falecida, tendo sido habilitados os seus herdeiros IL… e JA…) intentaram contra MS… e FA…, todos identificados nos autos, foi proferida sentença a:
“a) declarar validamente resolvido o contrato celebrado entre as partes;
b) condenar os réus a pagar aos autores a importância de 10.936,80€, relativa aos montantes das rendas em dívida até 30/1/2016, acrescidas das rendas vencidas e vincendas desde aquela data, no montante de 750,00€ cada, até efectivo despejo, bem como os juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal desde o momento em que os réus se constituíram em mora perante os autores;
-Julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido reconvencional deduzido pela ré MS… e, consequentemente (…):
a) condenar os autores a pagar à ré ré MS… a importância de 8.395,00€, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a data da interposição da oposição até efectivo pagamento;
b) reconhecer que à Requerida MS… assiste o direito de retenção relativamente ao imóvel até integral e efectivo pagamento da importância referida na al. anterior, após o que deverá entregar o locado aos autores;
-Julgar improcedentes os seguintes pedidos reconvencionais:
a) o acordo sobre o destino da casa de morada da família ser declarado nulo, nos termos dos artigos 84º do RAU e 294º e 280º do Código Civil;
b) o acordo sobre o destino da casa de morada da família ser anulado, por erro sobre o objecto jurídico, nos termos dos artigos 251º e 247º do Código Civil;
c) reconhecer-se, quer num caso quer noutro, que o acordo sobre o destino da casa de morada da família não pode ser oposto pelos Requerentes à Requerida;
d) ser reconhecido abusivo o exercício dos direitos de resolução do contrato de arrendamento, de pagamento das rendas e de despejo da Requerida pelos Requerentes, declarando-se impedido esse exercício;
e) ser compensado, no montante no qual a Requerida possa vir a ser condenada a pagar aos Requerentes, o montante de 8.395,00€ correspondente ao crédito detido pela Requerida sobre os Requerentes;
f) julgar inconstitucional, nos termos do artigo 204º da CRP, o artigo 10º, nº 2, da Portaria nº 9/2013, por violação do disposto nos artigos 2º, 3º, nº 3, 18º, 20º, nº 1, e 266º, nº 2, da CRP (…)”.
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Não se conformando com a decisão, dela apelaram os AA. e os RR.
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A R. MS… interpôs recurso de apelação concluindo:
“Quanto à matéria de facto, em primeiro lugar,
1. Tendo em conta o teor do contrato de arrendamento, os factos provados 3 e 17 a 21 e os artigos 371º e 376º do Código Civil, o facto provado 1 deve ter a seguinte redacção: 1 - Por contrato de 18 de Maio de 1972, com início em 01/07/1972, e pela renda mensal de 3.000 $00, o requerente marido, na qualidade de administrador dos bens comuns do casal, deu de arrendamento à requerida MS…, para habitação dos requeridos, então casados um com o outro, o rés-do-chão e garagem do prédio sito na Rua …, Lote …, actual nº …, na Costa da Caparica, inscrito sob o artº … na matriz predial urbana da freguesia de Costa da Caparica, actual artº … da mesma freguesia (…).
2. Tendo em conta: (i) Os factos provados 6 a 21, 27 e 35 a 39; (ii) As declarações de parte do A. CS… (no ficheiro áudio 20170905143915_17850577_2871158, passagens 7:00 a 7:47, 8:10 a 8:22, 19:26 a 19:45, 1:05:00 a 1:05:40), nas quais disse, essencialmente, que soube há dois ou três anos, quando o processo agora se levantou (…), que o Requerido não vive no locado, correspondendo esse lapso de tempo, pelo menos, ao momento em que o A. enviou aos Requeridos as comunicações de transição para o NRAU, no ano de 2014, as quais eram entregues à Recorrente mas devolvidas quando remetidas ao Requerido (factos provados 4 a 16), e que os seus filhos e netos frequentarem permanentemente os pisos superiores do prédio do locado nas férias de Verão; (iii) As declarações de parte da A. IC… (no ficheiro áudio 20170905143915_17850577_2871158, passagens 1:43:25 a 1:44:20 e 1:44:48 a 1:45:35), nas quais disse, essencialmente, que pelo menos desde 2006 vai todos os anos passar férias de Verão nos andares de cima do locado e que o irmão tem feito o mesmo em Agosto desde sempre, e que nele não vê o Requerido FT… há 3, 4, 5 anos, período que ultrapassa a altura em que o A. CS… enviou aos Requeridos as comunicações de transição para o NRAU, no ano de 2014; O que torna no seu conjunto inverosímil que os AA., passando todos os anos férias nos andares de cima do locado, não se dessem desde logo conta que o Requerido FT…, que eles conhecem, e seu alegado arrendatário, já não vivia no locado pelo menos em 2014; (iv) Os depoimentos das testemunhas FP… e LB…, amigos dos AA., que, frequentando frequentemente as fracções dos Autores por cima do locado, nunca nele viram os Requeridos (no ficheiro áudio20170905143915_17850577_2871158, passagens 6:08 a 7:32 e 49:44 a 51:15); (v) O depoimento da testemunha FG…, empreiteiro do A., que disse (no ficheiro áudio 20170905143915_17850577_2871158) que foi ao locado diversas vezes (passagem 13:32 a 14:04), que conhece os Requeridos há 13 ou 14 anos, mas que a partir de certa altura, voltando ao locado, nos últimos 10 ou 12 anos, só lá vê a Requerente, não o Requerido (passagem 20:11 a 23:04, 26:22 a 28:03) e que disse ao Autor CS… que o Requerido já não vivia no locado: eu por vezes é que lhe dizia, portanto, que não via lá o senhor F… (passagem 45:25 a 46:36), concluindo-se, portanto, que o Autor CS… sabia disso; (vi) O depoimento da testemunha PT… (filho dos Requeridos), que confirmou (no ficheiro áudio 20170905143915_17850577_2871158) que os senhorios sempre se comportaram perante a Requerida como se esta fosse a única arrendatária, até 2014, aquando do envio das comunicações aos Requeridos para transição para o NRAU (passagem 58:09 a 1:00:13), e que disse que numa conversa tida com o Autor CS… em Março de 2016 no locado, aquando da vistoria promovida pela CM de Almada (e cujo relatório foi junto a fls., confirmando a presença do senhorio), o Autor CS… lhe disse que sim, que sabia que a Requerida vivia no locado sozinha há uma série de anos, embora a casa fosse muito grande e a renda baixa, depois da testemunha PT… o confrontar com o facto de ele saber, tal como toda a sua família (filhos, netos, primos) e vizinhos, que o Requerido não vive no locado há vários anos, sendo o litígio entre as partes motivado verdadeiramente pelo valor da renda (passagem 1:00:57 a 1:07:13, especialmente 1:05:04 a 1:06:40); (vii) O depoimento da testemunha RB…, que (no ficheiro áudio 20170905143915_17850577_2871158) confirmou ter presenciado a conversa tida entre o A. CS… e PT…, aquando da vistoria promovida pela CM de Almada, dizendo que, de facto, o Autor CS… disse a PT… que sabe que o Requerido não vive no locado há uma série de anos, tendo usado até a mesma expressão para descrever o lapso temporal em causa – uma série de anos – que PT…, e que a contenda existente entre as partes se prenda verdadeiramente com o valor da renda, que era baixa (passagem 1:46:00 a 1:52:33, especialmente 1:50:10 a 1:51:14); Pelo que, não sendo crível que um senhorio normal não sabia se os seus arrendatários vivem no locado, sobretudo quando ele vai aos andares de cima e os seus filhos neles passam sempre as férias de Verão e, aparentemente, até a vizinhança sabe que assim é, os testemunhos de FG…, PT… e RB… são decisivos, porque são coerentes neste ponto: foi dito ao A. CS… e por ele reconhecido, perante os três, que sabia que o Requerido FT… não vive no locado há sua série de anos. Ou seja, RB… e PT… confirmaram que o A. CS… lhes disse que sabia que o Requerido FT… já não vivia no locado há uma série de anos e FG… disse que disse ao A. CS… que o Requerido FT… já não vivia no locado (ele que ia várias vezes ao longo dos últimos 10 anos), o que, conjugado com as declarações do próprio A. CS… (que sabe que o Requerido FT… não vive no locado há dois ou três anos), da A. IC… (que não vê o Requerido FT… no locado há 3, 4, 5 anos, pese embora passe sempre as suas férias de Verão, nos últimos 10 anos, nos andares de cima) e das testemunhas FP… e LB… (que disseram que nunca viram o Requerido no locado ao longo destes anos), e com os factos provados 6 a 21, 27 e 35 a 39, é impossível acreditar que, pelo menos em 2014, os AA. já não soubessem que o Requerido FT… já não vivia, nessa altura, no locado; (viii) E, ainda, certidão de notificação da notificação judicial avulsa junta pelos AA. como doc. 13 da PI, onde o oficial de justiça, aquando da citação do Requerido no locado, dá conta, em 30.10.2015, que não o pode fazer porque a Requerente lhe diz que ele ali não vive há cerca de 10 anos, facto que veio a ser provado em Tribunal mas que foi ignorado pelos AA., já que, ainda assim, em 10.12.2015, remeteram nova comunicação ao Requerido para o locado, com o objectivo de resolveram o contrato de arrendamento, sem poderem contudo desconhecer, de todo, que o Requerido não vivia no locado nesse momento, sendo esse desconhecimento também impossível quando fica claro que a Recorrente sempre respondeu aos AA., ao invés do Requerido, e que era com ela e não com este que os AA. tratavam de todos os assuntos do arrendamento, especialmente o pagamento da renda – factos provados 20 e 21 – e cuja falta deu origem à resolução;
3. E conjugando assim a prova testemunhal com a documental e as declarações das partes, ao abrigo dos artigos 5º do CPC e 396º do Código Civil, os factos não dados por provados 47, 48 e 49, correspondentes aos artigos 40º, 43º, 44º, 46º e 51º da oposição da Recorrente, deveriam ter sido dados por provados (o 49 no limite, como presunção judicial, nos termos do artigo 351º do Código Civil), nos seguintes termos:
47-Os Requerentes, antes de enviarem aos Requeridos as
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