Acórdão nº 3736/19.9T8VFX.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 03-11-2021
Data de Julgamento | 03 Novembro 2021 |
Case Outcome | NEGADA A REVISTA |
Classe processual | REVISTA (COMÉRCIO) |
Número Acordão | 3736/19.9T8VFX.L1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
PROC 3736/19.9T8VFX.L1.S1
6ª SECÇÃO
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
I Nos presentes autos de PER em que é Requerente TÂMEGA GROUP, SA, vem o Credor AA, interpor recurso de Revista do Acórdão da Relação de Lisboa que confirmou a decisão de primeiro grau a não homologar o Plano de pagamentos, nos termos do artigo 14º, nº 1 do CIRE, alegando a sua oposição com o decidido pelo Tribunal da Relação de Coimbra no âmbito do Processo n.º 84/14.4TBACB-B.C1, em 21 de Abril de 2015, aresto esse que invocou indicando que o mesmo se encontra publicado na base de dados do IGFEJ, cuja cópia certificada veio a juntar posteriormente após convite para o efeito.
O Recorrente, apresentou as seguintes conclusões:
A. Por sentença veio o Tribunal a quo manter a decisão já anterior recorrida, decidindo que, o crédito do aqui Recorrente será um crédito de natureza subordinado, fundamentando que, “a circunstância de na sentença de habilitação nada ter sido dito sobre a alteração da qualificação do crédito é absolutamente irrelevante. Não se disse nem tinha de se dizer. No referido incidente de habilitação de cessionário apenas está em causa a substituição dos sujeitos da lide, com efeitos meramente processuais. A aferição da qualidade pessoal do sujeito adquirente que determina a qualificação do crédito como comum ou subordinado tem a sede processual própria em momento diferente (…) e ainda que “ (…) o momento processualmente azado para a qualificação dos créditos como comuns ou subordinados, independentemente de o referido crédito não ter sido impugnado, é precisamente aquele em que o juiz do processo exerce o seu poder/dever de controlo oficioso da legalidade, designadamente em sede de apreciação do resultado da votação e do plano (…)”
B. Ora, à semelhança do que foi decidido anteriormente, como devido respeito, decidiu mal o Tribunal a quo relativamente à qualificação do seu crédito, e interpretou mal e erradamente os termos da Lei aqui aplicados, nomeadamente os artigos 48º e 49º do C.I.R.E., isto sem desconsiderara claraviolação dos demais elementares princípios legais e de direito.
C. É facto assente que no âmbito do Processo Especial de Revitalização, a Credora Originária do crédito - Ares Lusitani – STC, S.A., reclamou o valor do seu crédito, tendo o mesmo sido reconhecido e qualificado como crédito comum.
D. Em 15.01.2020, o aqui Recorrente adquiriu o crédito ao Credor Originário, tendo o aqui Recorrente sido habilitado nos autos em substituição daquele Credor, tendo sido proferida sentença no incidente de habilitação de cessionário que julgou que “Pelo exposto, nos termos do disposto no art. 376º, nº 1, b), 2ª parte do CPC, julgo procedente o presente incidente de habilitação e, em consequência, declaro AA habilitado como cessionário dos créditos de Ares Lusitani, Finance Designated Activity Company,(…) para como credora prosseguir o processo principal.”.
E. À data em que o crédito foi adquirido pelo Recorrente, a qualificação do mesmo, quer para os presentes autos quer para qualquer outro efeito é e será sempre comum.
F. Não pode o Tribunal a quo alterar a qualificação do mesmo crédito nos presentes autos, considerando a relação do adquirente com a Devedora, à data da aquisição do crédito, quando está em causa, um crédito que foi constituído em data anterior à entrada dos presentes autos e constituído pela Devedora junto do Credor Originário, sem que esteve tivesse alguma relação especial com a Devedora.
G. A posição defendida e assumida pelo Tribunal a quo no caso em concreto, não tem qualquer aplicabilidade, nem poderá ter qualquer cabimento nos termos do art. 48º e art. 49º, ambos do C.I.R.E., nem tampouco das normas que regulam a figura jurídica cessão de créditos, no contexto da vinculação especial a que se referem os arts. 48º e 49º, do C.I.R.E..
H. Em causa está uma cessão de créditos ao aqui Recorrente, de um crédito que na sua origem é um crédito comum, tal como reclamado e reconhecido no PER.
I. No âmbito do regime da cessão de créditos, o mesmo envolve simplesmente a substituição do Credor Originário por Terceiro, mantendo-se inalterados todos os demais elementos da relação obrigacional, não sendo defensável ou aceitável, a argumentação de que existe uma substituição ou conversão da obrigação originária por uma nova obrigação.
J. A obrigação é exatamente a mesma, verificando-se apenas uma simples modificação subjetiva que consiste na transferência daquela pelo lado ativo.
K. O que releva para qualificação como crédito subordinado é o momento da constituição do crédito e não o momento da cessão, dado que o novo Credor adquire o crédito com as exatas qualidades e condições que ele patenteava no momento da transmissão.
L. Mas neste contexto, a discussão relevante não é a de saber se o Cessionário é uma pessoa especialmente relacionada com o Devedor mas se o Cedente o era, e neste caso é claro e evidente que não!
M. A previsão, na norma reguladora da subordinação, relativa à transmissão do crédito, destina-se, simplesmente, a evitar a fraude à lei, i.e., a impedir que através da transferência do crédito, se obvie à qualificação deste como subordinado, previsão que, no tocante à cessão de créditos, dado que deixa inteiramente intocado, quanto ao seu conteúdo, o crédito transmitido, é de todo desnecessária (artº 48, alínea a) do C.I.R.E.).
N. Assim, é irrelevante aqui discutir-se se o aqui Recorrente, simples Cessionário é ou não pessoa especialmente relacionada com o Devedor – mas sim se o Credor Cedente (Credor Originário) o era, o que não se verifica, pois o Credor originário não era, nem estava relacionado com a Devedora.
O. O facto de agora o Cessionário do crédito ser pessoa especialmente relacionada com o Devedor, não transforma o crédito em subordinado se antes o não era, assim como o facto de o Cessionário não ter qualquer relação com o devedor, não transmuta o crédito em não subordinado, se antes o era.
P. Além do mais, a cessão de créditos exige o acordo do Credor e do Terceiro, mas não do Devedor, o que se compreende dado que, excetuados os casos de não credibilidade do crédito, para o Devedor a cessão é, por regra, indiferente.
Q. Como primeiro requisito, temos a existência de um negócio com eficácia transmissiva do crédito, ou, noutra terminologia, uma fonte da cessão (artº 578 nº 1 do Código Civil)., e nesse negócio apenas são parte o Cedente o Cessionário: o que essencialmente caracteriza a cessão é a transmissão do crédito, sem necessidade de consentimento do Devedor.
R. O que existe no caso é uma transmissão subjetiva da relação – causal – de um sujeito para outro – Credor e Terceiro, sem que a relação originária sofra a mínima alteração.
S. Com este negócio...
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