Acórdão nº 373/10.7GACPV.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 09-03-2011
Data de Julgamento | 09 Março 2011 |
Número Acordão | 373/10.7GACPV.P1 |
Ano | 2011 |
Órgão | Tribunal da Relação do Porto |
Processo nº 373/10.7GACPV.P1
(Tribunal Judicial de Castelo de Paiva)
Em processo sumário o Ministério Público acusou B…, casado, reformado, filho de C… e de D…, nascido a 11/02/1946 em …, Vila Nova de Gaia, com domicílio em Rua … N° ., …, ….-… …, imputando-lhe a prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artº 292º, do Código Penal, conjugado com o disposto no artº 69º/ 1- a), do mesmo diploma legal.
O arguido não apresentou contestação.
Realizado julgamento, o arguido foi absolvido.
«1 - Nos termos do art° 153°, nº 1, do Código da Estrada, o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito.
2 - A exigência de aprovação do aparelho utilizado para a pesquisa de álcool no ar expirado e as regras de controlo metrológico encontram-se na portaria 1556/2007, de 10/12, a qual passou a acolher a Recomendação da OIML R 126, publicada em 1998.
3 - Resulta do referido Decreto-Lei que os instrumentos de medição estão sujeitos a controlo, o qual compreende uma de várias operações: a aprovação de modelo; primeira verificação; verificação periódica; e verificação extraordinária.
4 - Porém, seja qual for a realidade ponderada, envolve necessariamente uma margem de incerteza quanto aos valores finais registados, pelo que se prevê no D.L. de 291/91 de 20/9, «tolerâncias admissíveis» e na portaria 110/91, de 6/02 de «erro máximo admissível, para mais ou para menos, da concentração de álcool etílico», ou EMA.
5 - Assim, os instrumentos que não ultrapassem a margem de tolerância admissível são aprovados e neles aposto o correspondente símbolo atestador de qualidade e fiabilidade, de acordo com o regulamento geral do controlo metrológico, constante da portaria n.º 962/90, de 09/10.
6 - Pelo que, quaisquer deduções que a esta TAS sejam feitas carecem de fundamento legal e mesmo de suporte técnico-científico.
7- O Tribunal "a quo", ao não ter atendido à TAS inscrita no talão constante dos autos e, consequentemente, ao ter dado como provado que o arguido conduzia influenciado por uma taxa de 1,15g/1, incorreu em erro notório na apreciação da prova, nos termos do disposto no artigo 410°, n° 2, al. c) do Código de Processo Penal.
8 - O arguido, embora pudesse ter questionado o resultado do teste, solicitando a realização de contraprova, seja por expiração de ar, seja sanguíneo, não o fez.
9 - Não tinha, pois a Mma. Juiz do Tribunal a quo qualquer fundamento para concluir que o TAS indicado pelo aparelho utilizado na pesquisa de álcool no ar expirado pelo arguido padecia de erro.
10 - É o Tribunal o competente para conhecer da prática da contra-ordenação, atento o disposto no artigo 77°, n.º 1 do RGCC, não devendo os autos serem remetidos ao IMTT para procedimento contra-ordenacional.
Termos em que a sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que condene o arguido pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292° do Código Penal, bem como na sanção acessória prevista no artigo 69° do mesmo diploma legal, uma vez que aquele, se encontrava a conduzir veículo automóvel na via pública com uma TAS de 1,24 g/l, conforme talão Drager junto aos autos».
Conforme resulta do artº 412º/1, do CPP – na redacção dada pelo DL nº 303/2007, de 24/8, aplicável aos autos – a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pelas conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. Deste dispositivo se retira, unanimemente, que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente, definem as questões a decidir em cada caso [1], exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso [2].
As questões colocadas pelo recorrente reconduzem-se à legalidade da dedução da taxa de erro máximo admissível na taxa de álcool no sangue e à legalidade do reenvio ao IMTT da competência para apreciar da contra-ordenação.
Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes os factos:
1.° No dia 22 de Agosto de 2010, pelas 19:48 horas, na EN … em …, …, Castelo de Paiva, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-0N.
2.° Submetido ao exame de pesquisa de álcool no ar expirado, o arguido apresentou uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 1,15 g/l deduzida já a taxa de erro máxima admissível de 1,24 g/l apresentada no exame de pesquisas de álcool no ar expirado.
3.° O arguido sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas e sabia que estava a conduzir um veículo nessas condições, o que quis.
4.° O arguido não tem antecedentes criminais.
5° O arguido é reformado da actividade de vidreiro tendo ainda um pequeno negócio de distribuição de rações, auferindo de rendimentos mensais o montante de € 1.000,00. Vive com a esposa também reformada, que aufere € 300,00 e tem casa própria
6° O arguido tem o 6° ano de escolaridade.
Não se provou que a taxa de álcool no sangue apresentada pelo arguido, quando conduzia o veiculo em causa, fosse de 1,24 gm/litro de sangue, nem que não fosse,
O Tribunal a quo justificou a aquisição probatória nos seguintes termos:
«O Tribunal fundou a sua convicção:
a) No auto de notícia de folhas 3 e no exame junto aos autos a fls. 4, em conjugação com o depoimento de todas as testemunhas inquiridas.
O arguido admitiu ter ingerido bebidas alcoólicas, sabendo que não podia conduzir naquelas circunstâncias.
Manteve uma postura de colaboração para com o tribunal.
Todavia, e compulsados os autos podemos constatar que não foi deduzida a taxa de erro máximo admissível, aplicável aos aparelhos de pesquisa de álcool no sangue através do ar expirado – alcoolímetros – por força da recomendação da Organização Internacional de Metrologia, e na sequência da portaria 748194, de 13.6 ponto 6 al. a) e c) da citada portaria.
Tal taxa de erro situa-se entre os 7,5%, quando o alcoolímetro apresente uma TAS entre 0,92g/I e 2,30 g/I – Norma NFX 20-701.
Ora deduzida tal percentagem à taxa de 1,24 apresentada pelo arguido no alcoolímetro, in casu, temos uma taxa corrigida que se fixa em 1,15 g/, razão porque não se deu como provado que a dita taxa se cifrasse em 1,24gm /I, tal como consta da acusação.
b) Quanto ao demais, a convicção do Tribunal fundou-se no teor do Certificado do Registo Criminal de fls. 10, e nas declarações do arguido quanto à sua situação pessoal e económica na medida em que se mostraram credíveis».
A) Da dedução da taxa de erro máximo admissível à taxa de alcoolemia registada pelo aparelho
O Tribunal a quo decidiu-se pela absolvição do arguido perante o facto de, depois de deduzida a percentagem de erro máximo admissível à taxa de alcoolemia registada pelo aparelho, o taxa encontrada ser inferior ao limite mínimo a partir do qual a condução sob o efeito do álcool constitui crime.
Contra esta interpretação insurge-se o M.P., considerando que há erro notório na apreciação da prova, nos termos do disposto no artº 410º/2-c), do CPP, porquanto o arguido não questionou o resultado do teste mas, mesmo assim, o Tribunal a quo não atendeu à TAS inscrita no talão fornecido pelo alcoolímetro, constante dos autos. Argumenta dizendo que os valores de erro máximo admissível (EMA) são valorados e ponderados no momento do controlo metrológico e respeitam apenas às regras relativas à respectiva aprovação, pelo que não tem suporte legal a dedução feita pelo Tribunal recorrido. No parecer aditam-se os argumentos, emergentes da operância da confissão e da possibilidade de realização de contra-prova.
A questão é velha e tende a eternizar-se. De uma lado defende-se que havendo confissão, integral e sem reservas, quanto ao objecto da acusação, o Tribunal não...
(Tribunal Judicial de Castelo de Paiva)
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Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:***
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I – Relatório:***
Em processo sumário o Ministério Público acusou B…, casado, reformado, filho de C… e de D…, nascido a 11/02/1946 em …, Vila Nova de Gaia, com domicílio em Rua … N° ., …, ….-… …, imputando-lhe a prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artº 292º, do Código Penal, conjugado com o disposto no artº 69º/ 1- a), do mesmo diploma legal.
O arguido não apresentou contestação.
Realizado julgamento, o arguido foi absolvido.
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O Ministério Público, inconformado, recorreu, concluindo as respectivas alegações nos seguintes termos, que se transcrevem:«1 - Nos termos do art° 153°, nº 1, do Código da Estrada, o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito.
2 - A exigência de aprovação do aparelho utilizado para a pesquisa de álcool no ar expirado e as regras de controlo metrológico encontram-se na portaria 1556/2007, de 10/12, a qual passou a acolher a Recomendação da OIML R 126, publicada em 1998.
3 - Resulta do referido Decreto-Lei que os instrumentos de medição estão sujeitos a controlo, o qual compreende uma de várias operações: a aprovação de modelo; primeira verificação; verificação periódica; e verificação extraordinária.
4 - Porém, seja qual for a realidade ponderada, envolve necessariamente uma margem de incerteza quanto aos valores finais registados, pelo que se prevê no D.L. de 291/91 de 20/9, «tolerâncias admissíveis» e na portaria 110/91, de 6/02 de «erro máximo admissível, para mais ou para menos, da concentração de álcool etílico», ou EMA.
5 - Assim, os instrumentos que não ultrapassem a margem de tolerância admissível são aprovados e neles aposto o correspondente símbolo atestador de qualidade e fiabilidade, de acordo com o regulamento geral do controlo metrológico, constante da portaria n.º 962/90, de 09/10.
6 - Pelo que, quaisquer deduções que a esta TAS sejam feitas carecem de fundamento legal e mesmo de suporte técnico-científico.
7- O Tribunal "a quo", ao não ter atendido à TAS inscrita no talão constante dos autos e, consequentemente, ao ter dado como provado que o arguido conduzia influenciado por uma taxa de 1,15g/1, incorreu em erro notório na apreciação da prova, nos termos do disposto no artigo 410°, n° 2, al. c) do Código de Processo Penal.
8 - O arguido, embora pudesse ter questionado o resultado do teste, solicitando a realização de contraprova, seja por expiração de ar, seja sanguíneo, não o fez.
9 - Não tinha, pois a Mma. Juiz do Tribunal a quo qualquer fundamento para concluir que o TAS indicado pelo aparelho utilizado na pesquisa de álcool no ar expirado pelo arguido padecia de erro.
10 - É o Tribunal o competente para conhecer da prática da contra-ordenação, atento o disposto no artigo 77°, n.º 1 do RGCC, não devendo os autos serem remetidos ao IMTT para procedimento contra-ordenacional.
Termos em que a sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que condene o arguido pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292° do Código Penal, bem como na sanção acessória prevista no artigo 69° do mesmo diploma legal, uma vez que aquele, se encontrava a conduzir veículo automóvel na via pública com uma TAS de 1,24 g/l, conforme talão Drager junto aos autos».
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O arguido não contra-alegou e, nesta instância, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu aprofundado parecer, concluindo no sentido da procedência do recurso.
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II- Questões a decidir:***
Conforme resulta do artº 412º/1, do CPP – na redacção dada pelo DL nº 303/2007, de 24/8, aplicável aos autos – a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pelas conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. Deste dispositivo se retira, unanimemente, que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente, definem as questões a decidir em cada caso [1], exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso [2].
As questões colocadas pelo recorrente reconduzem-se à legalidade da dedução da taxa de erro máximo admissível na taxa de álcool no sangue e à legalidade do reenvio ao IMTT da competência para apreciar da contra-ordenação.
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III- Fundamentação de facto:***
Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes os factos:
1.° No dia 22 de Agosto de 2010, pelas 19:48 horas, na EN … em …, …, Castelo de Paiva, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-0N.
2.° Submetido ao exame de pesquisa de álcool no ar expirado, o arguido apresentou uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 1,15 g/l deduzida já a taxa de erro máxima admissível de 1,24 g/l apresentada no exame de pesquisas de álcool no ar expirado.
3.° O arguido sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas e sabia que estava a conduzir um veículo nessas condições, o que quis.
4.° O arguido não tem antecedentes criminais.
5° O arguido é reformado da actividade de vidreiro tendo ainda um pequeno negócio de distribuição de rações, auferindo de rendimentos mensais o montante de € 1.000,00. Vive com a esposa também reformada, que aufere € 300,00 e tem casa própria
6° O arguido tem o 6° ano de escolaridade.
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Factos não provados:Não se provou que a taxa de álcool no sangue apresentada pelo arguido, quando conduzia o veiculo em causa, fosse de 1,24 gm/litro de sangue, nem que não fosse,
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IV- Fundamentação probatória:***
O Tribunal a quo justificou a aquisição probatória nos seguintes termos:
«O Tribunal fundou a sua convicção:
a) No auto de notícia de folhas 3 e no exame junto aos autos a fls. 4, em conjugação com o depoimento de todas as testemunhas inquiridas.
O arguido admitiu ter ingerido bebidas alcoólicas, sabendo que não podia conduzir naquelas circunstâncias.
Manteve uma postura de colaboração para com o tribunal.
Todavia, e compulsados os autos podemos constatar que não foi deduzida a taxa de erro máximo admissível, aplicável aos aparelhos de pesquisa de álcool no sangue através do ar expirado – alcoolímetros – por força da recomendação da Organização Internacional de Metrologia, e na sequência da portaria 748194, de 13.6 ponto 6 al. a) e c) da citada portaria.
Tal taxa de erro situa-se entre os 7,5%, quando o alcoolímetro apresente uma TAS entre 0,92g/I e 2,30 g/I – Norma NFX 20-701.
Ora deduzida tal percentagem à taxa de 1,24 apresentada pelo arguido no alcoolímetro, in casu, temos uma taxa corrigida que se fixa em 1,15 g/, razão porque não se deu como provado que a dita taxa se cifrasse em 1,24gm /I, tal como consta da acusação.
b) Quanto ao demais, a convicção do Tribunal fundou-se no teor do Certificado do Registo Criminal de fls. 10, e nas declarações do arguido quanto à sua situação pessoal e económica na medida em que se mostraram credíveis».
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V- Fundamentos de direito:***
A) Da dedução da taxa de erro máximo admissível à taxa de alcoolemia registada pelo aparelho
O Tribunal a quo decidiu-se pela absolvição do arguido perante o facto de, depois de deduzida a percentagem de erro máximo admissível à taxa de alcoolemia registada pelo aparelho, o taxa encontrada ser inferior ao limite mínimo a partir do qual a condução sob o efeito do álcool constitui crime.
Contra esta interpretação insurge-se o M.P., considerando que há erro notório na apreciação da prova, nos termos do disposto no artº 410º/2-c), do CPP, porquanto o arguido não questionou o resultado do teste mas, mesmo assim, o Tribunal a quo não atendeu à TAS inscrita no talão fornecido pelo alcoolímetro, constante dos autos. Argumenta dizendo que os valores de erro máximo admissível (EMA) são valorados e ponderados no momento do controlo metrológico e respeitam apenas às regras relativas à respectiva aprovação, pelo que não tem suporte legal a dedução feita pelo Tribunal recorrido. No parecer aditam-se os argumentos, emergentes da operância da confissão e da possibilidade de realização de contra-prova.
A questão é velha e tende a eternizar-se. De uma lado defende-se que havendo confissão, integral e sem reservas, quanto ao objecto da acusação, o Tribunal não...
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