Acórdão nº 3620/16.8T8ALM-A.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 05-03-2020

Judgment Date05 March 2020
Acordao Number3620/16.8T8ALM-A.L1-2
Year2020
CourtCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)
Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I. Relatório
Por apenso à execução intentada pela Caixa Económica Montepio Geral, S.A. contra os Executados Dentizimbra – Clínica Dentária de Sesimbra, Ld.ª, JA… e FJ…, com vista ao pagamento da quantia exequenda no valor de € 89.932,61 sendo apresentado como título executivo uma livrança, vêm os 2º e 3º Executados, avalistas, deduzir os presentes embargos, pugnando pela sua procedência e consequente extinção da execução, peticionando desde logo a sua suspensão.
Alegam, em síntese, que o título executivo que constitui a livrança é nulo, não tendo a Exequente invocado a relação causal subjacente à emissão da livrança, sendo que em resultado do art.º 73.º do CPC tinha de ter alegado e juntado o respetivo pacto de preenchimento. Não resulta do título executivo o incumprimento da obrigação pelos Embargantes nem a forma como foi liquidada a dívida e preenchido o título e estando em causa uma livrança que foi entregue em branco é necessária a prévia interpelação dos Executados dos elementos referentes à data de vencimento e quantia a pagar, o que não aconteceu, nem antes nem depois do preenchimento da livrança, não sendo por isso devidos juros de mora antes da citação e não tendo a Exequente convertido a mora em incumprimento definitivo. Invocam ainda o art. 934º do CC relativo ao contrato de compra e venda a prestações como regime aplicável com as necessárias adaptações, para concluir que não há lugar à resolução do contrato. Mais alegam que um dos requisitos da livrança consiste na indicação do lugar em que se deve efetuar o pagamento, art.º 75.º n.º 4 da LULL, o que não se mostra preenchido na livrança apresentada à execução, o que põe em causa a validade do título e suscita dúvidas quanto à competência territorial do tribunal. Os embargantes presumem que a mesma garantia o contrato de locação financeira imobiliária que juntam, admitindo que a sociedade executada não efetuou o pagamento de algumas rendas que se venceram até à entrega efetiva do imóvel, não admitindo que esteja em dívida toda a quantia reclamada, invocando o preenchimento abusivo do título por violação do pacto de preenchimento. Alegam que o contrato teve início em 12.01.2011, tendo a sociedade executada procedido ao pagamento da 1ª renda no valor de € 10.585,00 e posteriormente pagou, pelo menos, todas as rendas e obrigações vencidas até 30.10.2013, ou seja, pagou 34 rendas e demais encargos, tudo conforme extrato bancário que juntam, justificando o incumprimento com a ausência de atividade da sociedade que permitisse proceder ao pagamento pontual das rendas mensais vincendas, do que refere ter sido dado conhecimento ao gerente da Exequente, informando a mesma que pretendia proceder à entrega do imóvel objeto de locação financeira imobiliária e pôr termo ao contrato. Referem que, em data que já não sabem precisar, mas que seguramente ocorreu antes do mês de junho de 2015, a Exequente retomou a posse do imóvel objeto do contrato de locação financeira de forma extrajudicial. Concluem que a Exequente procedeu ao preenchimento abusivo da livrança, inscrevendo na mesma quantia muito superior à que hipoteticamente será devida, violando assim o pacto de preenchimento. Alegam ainda que o contrato de locação financeira celebrado não foi negociado entre as partes, tendo sido as suas condições impostas pela Exequente, não tendo sido facultado aos Executados a prévia apreciação do mesmo, nem prestada qualquer explicação ou informação sobre o teor, conteúdo e alcance das cláusulas ali patentes, sendo abusivas, proibidas e nulas todas as cláusulas contidas no contrato de locação financeira imobiliária nº …-… que estabelecem, a favor da Exequente direitos lesivos dos princípios da boa fé, da confiança, da igualdade, do excesso ou justa medida e da proporcionalidade, como é o caso, das cláusulas terceira, quarta, nº 3, 6, 7 e 8, quinta, sexta, nº 2, 3 e 4, sétima, nº 2, 4, 8 e 12, oitava, nº 2, 3 e 4, nona, décima, nº 1 al. a), nº 3, al. b), c) e d) e nº 4, décima primeira, décima segunda, nº 3, décima terceira, nº 1, 2, 3 e 5, décima quinta, nº 1, 2, al. a), 4, 5 e 7, décima sexta, décima oitava, nº 1 e 2, décima nona, nº 2 e 3, vigésima segunda, nº 2 das cláusulas gerais, e cláusulas terceira, nº 3.1, quarta, nº 4.1, quinta, sexta, oitava, nº 8.1 e décima, nº 10.1, al. a) e nº 10.3 das condições particulares, o que invoca, nos termos do disposto no DL nº 446/85, de 25 de Outubro. Finalmente consideram um abuso de direito, perante um contrato de locação financeira imobiliária cujas rendas globais correspondem à quantia de € 236.003,28 e estando pagas, pelo menos, rendas no montante total de € 52.142,56, permitir que a pretensa dívida ascenda a € 89.932,61 mais referindo que foi ao cortar o seu acesso ao crédito que a Exequente provocou o incumprimento das obrigações assumidas.
Os embargos foram liminarmente admitidos e notificada, veio a Embargada contestar concluindo pela sua improcedência.
Alega que a livrança é um título de crédito que pode servir de base à execução, fundando-se esta na obrigação cambiária, pelo que a Exequente está dispensada de invocar quaisquer outros factos, designadamente os relativos à relação jurídica subjacente, uma vez que o título cambiário vale por si só, não se verificando qualquer nulidade do título executivo, sendo a obrigação em causa certa, líquida e exigível. A falta de indicação do lugar do pagamento não acarreta a ineficácia da livrança em causa pois o art.º 76.º da LULL prevê ainda que “na falta de indicação especial, o lugar onde o escrito foi passado considera-se como sendo o lugar de pagamento”. Aceita que a livrança se refere ao contrato de Locação Financeira identificado, celebrado com todos os Executados tendo, para garantia do bom e pontual cumprimento do referido contrato, a Executada Dentizimbra, Ld.ª subscrito e entregue uma livrança em branco (título executivo), avalizada pelos Embargantes. Mais alega que a 1ª Executada deixou de pagar as prestações a que se encontrava adstrita, tendo entrado em incumprimento em 15 de Setembro de 2012, não se verificando qualquer pagamento das rendas devidas pelo contrato a partir dessa data, sendo que no extracto bancário que junta é possível verificar que o último pagamento da renda no âmbito deste contrato foi realizado em 21/08/2012. Na sequência do incumprimento, foram todos os Executados interpelados, por diversas vezes, para procederem à regularização das quantias em dívidas, sob pena de resolução do contrato e verificando a Embargada que a situação de incumprimento se mantinha, foram todos os Executados interpelados, em 20 de março de 2015, por carta registada com aviso de receção para o domicílio convencionado, para procederem à regularização das quantias em dívida prazo de 8 dias, o que não aconteceu levando a Embargada a resolver o contrato em causa em 25 de Maio de 2015. Os Embargantes sempre tiveram conhecimento da situação de incumprimento, e efetivamente foram interpelados pela Embargada, o que apenas evidencia o carácter dilatório dos presentes Embargos. Aquando da resolução do contrato de locação financeira, a Embargada solicitou ainda o pagamento da quantia de € 84.754,13 valor pela qual foi preenchida a livrança dada como caução. Mais refere que a Executada procedeu à devolução do imóvel em 3 de fevereiro de 2016 não tendo a Embargada continuado a reclamar o pagamento de rendas posteriores à entrega do imóvel locado. Os Executados ficaram ainda obrigados a proceder ao pagamento das rendas vencidas e não pagas à data de resolução e ao pagamento, a título de indemnização por perdas e danos, de uma quantia equivalente ao valor de vinte por cento do valor residual e da soma das rendas que se venceriam, se o contrato tivesse sido cumprido, sendo que à data da resolução do contrato encontravam-se vencidas e não pagas rendas desde 15 de setembro de 2012 num total de € 46.312,46 a que se soma a indemnização contratualmente prevista que ascendia a € 37.952,16, tendo ainda sido considerado o valor devido a título de juros entre a resolução do contrato e o vencimento da livrança em causa, no montante de € 489,51 o que perfaz um total de €84.754,13 encontrando-se a livrança preenchida de acordo com o pacto de preenchimento. Finalmente refere que a obrigação do avalista é autónoma e independente da obrigação do avalizado, pelo que o avalista apenas se poderá defender invocando o pagamento da livrança, e nunca pelas exceções que o seu avalizado pode opor ao portador do título, a menos que a livrança não tenha entrado em circulação, impendendo sobre os Embargantes o ónus de provar o alegado abuso e não tendo estes invocado factos que permitam sequer indiciá-lo, limitando-se a fazer afirmações genéricas. Os embargantes foram interpelados para proceder ao seu pagamento, mas mesmo que assim não fosse a falta de apresentação a pagamento de uma letra ou livrança não acarreta para o portador a perda do seu direito de ação contra o aceitante ou o subscritor, a partir do momento em que o título não sai do círculo das relações imediatas, medindo-se a responsabilidade dos avalistas pela do avalizado. Mais conclui não ser aplicável o regime previsto no art.º 934.º do C.Civil porque não estamos perante uma venda em prestações com reserva de propriedade mas perante um contrato de locação financeira, especialmente previsto e regulado pelo DL n.º 149/95, de 24 de Junho. Finalmente alega que o contrato de locação financeira foi efetivamente negociado com a Executada Dentizimbra, Ld.ª designadamente quanto ao prazo, valor das rendas, taxa de juros e garantias prestadas, pelo que não poderá o mesmo subsumir-se ao regime das cláusulas contratuais gerais, conforme alegado, nem o mesmo aqui aplicado, considerando a qualidade de avalistas dos Embargantes. A admitir-se que a Embargada não cumpriu os seus deveres de
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT