Acórdão nº 36/20.5BEPDL de Tribunal Central Administrativo Sul, 30-09-2020

Data de Julgamento30 Setembro 2020
Número Acordão36/20.5BEPDL
Ano2020
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

A... - INDÚSTRIA E ENGENHARIA, LDA, deduziu junto do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Ponta Delgada, reclamação contra o ato de indeferimento tácito que se formou sobre o requerimento de anulação da venda de imóvel, efetuada pelo Serviço de Finanças de Velas no âmbito do processo de execução fiscal n.º 2...

O TAF de Ponta Delgada, por decisão de 17 de junho de 2020, julgou extinta a ação, por intempestividade do pedido de anulação de venda.

Inconformada, A... - INDÚSTRIA E ENGENHARIA, LDA., veio recorrer contra a referida sentença, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

· "Intempestividade do pedido de anulação de venda"

1. Olhando à matéria de facto dada por provada na sentença recorrida, verifica-se que o Tribunal a quo não deu como provado que a Recorrente teve conhecimento da efetivação da venda ou do facto que serve de fundamento à anulação da venda em 28/10/2019.

2. Porém, e ainda assim, na fundamentação da decisão, o Tribunal a quo entendeu que a Recorrente tinha 15 dias a contar daquele momento (28/10/2019) para invocar a nulidade da venda, decidindo, a final, pela extemporaneidade do pedido de anulação deduzido pela Recorrente em 10/01/2020.

3. Ora, aqui reside a primeira nulidade da sentença recorrida: não pode o Tribunal a quo julgar extemporâneo o pedido da Recorrente, sem ter dado por provado que esta teve conhecimento da efetivação da venda ou do facto que serve de fundamento à anulação da venda, em 28/10/2019.

4. Conforme se alegou e provou em sede de petição inicial e de resposta à exceção da caducidade, a Recorrente só tomou conhecimento do facto que serviu de fundamento à anulação da venda (falta de notificação após penhora) no momento da receção da certidão emitida pela AT, ocorrida em 03/01/2020 (facto 33 da matéria provada).

5. Não existe no processo de execução fiscal, nem foi carreado para os presentes autos qualquer comunicação da AT para a Recorrente, comunicando-lhe a efetivação da venda. Assim, a Fazenda Pública não alegou nem provou que, entre 28/10/2019 (data da venda) e 10/01/2020 (data da PI), a aqui Recorrente tivesse sido notificada da venda.

6. Consequentemente, e bem, o Tribunal a quo não deu por provado que a Recorrente tomou conhecimento da venda em 28/10/2019.

7. O que o Tribunal a quo afirmou na sentença foi coisa bem diferente: "posto que chegou ao efetivo conhecimento do gerente que a venda iria ter lugar no dia 28 de outubro de 2019, à luz do disposto no artigo n.° 1 do artigo 41.°, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, deve considerar-se que a reclamante foi notificada da data da venda".

8. A venda iria ter lugar em 28/10/2019 (indicativo condicional). Trata-se de um mero agendamento/marcação/calendarização. O que queremos dizer é que o Tribunal a quo, em nenhum momento da sentença recorrida, deu por provado que a Recorrente tomou conhecimento da efetivação da venda, em 28/10/2019.

9. Se não deu isso por provado e, por outro lado, levou à matéria de facto provada que a Recorrente recebeu a certidão do processo em que foi realizada a venda do imóvel dos autos em 03/01/2020 (facto 33), significa que a Recorrente só nesse momento teve conhecimento da venda e do facto que serviu de fundamento à anulação da venda.

10. O gerente da Recorrente, quanto muito (sem prescindir), soube que o fim do prazo para as licitações eletrónicas era às 16:30 horas do dia 28/10/2020. Ora, isto não é o mesmo que saber que ocorreu, de facto, a venda.

11. A comunicação realizada ao gerente da Recorrente (sem prescindir) apenas informou do agendamento/marcação/calendarização do leilão eletrónico, mas não informou do seu desfecho. E a lei é clara: o prazo de 15 dias para requerer a anulação da venda conta-se da venda ou do conhecimento do facto que serve de fundamento à anulação. Isto é, não se conta da data de fim do leilão eletrónico.

12. A nulidade só foi conhecida da Recorrente muito depois daquela comunicação, mais precisamente, no dia 03/01/2020, quando teve acesso ao teor do processo n.° 27... e se deu conta de que a venda tinha mesmo sido realizada e que, além da notificação após penhora realizada no processo n.° 278..., nenhuma outra existiu.

13. Tivesse a AT comunicado à Recorrente o resultado do leilão eletrónico, e o seu culminar com uma venda, e à Recorrente já teria sido possível arguir a anulação da venda, nos 15 dias imediatamente seguintes, se, entretanto, não tivesse ocorrido a notificação após penhora.

14. Por outro lado, e sempre salvo o devido respeito, não tem cabimento na letra da lei a interpretação que o Tribunal a quo faz do n.° 2 do artigo 257.° do CPPT.

15. Primeiro: a norma supra citada diz "O prazo contar-se-á da data da venda ou da que o requerente tome conhecimento do facto que servir de fundamento à anulação, competindo-lhe provar a data desse conhecimento (...)". Isto é, o legislador usou a palavra "ou" e não a palavra "e", o que significa que são alternativas e não cumulativas.

16. Porém, a interpretação (errada) que o Tribunal a quo faz da norma é no sentido (inadmissível) da cumulação: a Recorrente sabia da data venda e sabia do fundamento da anulação (sem prescindir), antes de se ter realizado a própria venda(?!).

17. Conforme acima se disse, o gerente da Recorrente, quanto muito (sem prescindir) soube da data de início e de fim do leilão eletrónico, não soube da data da venda.

18. Segundo: a Recorrente também não soube do facto que serve de fundamento à anulação da venda antes da venda, até porque isso nem sequer é possível!

19. É que até à data da concretização da venda, a AT ainda podia remeter à Recorrente a notificação após penhora.

20. Além de que, o Tribunal a quo situa o conhecimento da Recorrente sobre o fundamento que serve de base à anulação da venda em momento anterior à venda, o que é impossível. O conhecimento do facto que serve de base à anulação de uma venda necessariamente tem que ocorrer depois da venda se concretizar.

21. O legislador, quando afirma que os 15 dias se contam da venda ou do conhecimento do facto que serve fundamento de anulação da venda, quis que este último momento, necessariamente ocorresse posteriormente à venda.

22. E note-se que, havendo leilão eletrónico, não está ninguém (executado ou proponentes) presente em qualquer ato presencial, como acontece com a abertura de propostas em carta fechada. Pelo que, teria que ter existido uma comunicação à Recorrente do desfecho do leilão eletrónico, e que o mesmo culminou com uma venda, para que, aí sim, a Recorrente pudesse suscitar a anulação da venda. 

23. Veja-se o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, de 08-01-2018, proferido no âmbito do proc. n.° 80/12.6TBMAI-C.P1.

24. Em conclusão, nesta parte, verificando-se que o Tribunal a quo não deu como provado que i) a Recorrente teve conhecimento da efetivação da venda (mas sim, sem prescindir, das datas de início e de fim do leilão eletrónico) e ii) teve conhecimento do facto que serve de fundamento à anulação da venda em 28/10/2019, não podia decidir, como decidiu, pela extemporaneidade do pedido de anulação da venda apresentado ao abrigo do disposto no artigo 257.°, n.° 2 do CPPT, em 10/01/2020.

25. Andou mal o Tribunal a quo, merecendo a sentença recorrida a censura que a Recorrente aqui lhe aponta, de nulidade, e que determina a sua revogação, por este Tribunal Central Administrativo.

Subsidiariamente,

26. Ainda que se entenda que não existe uma nulidade da sentença (sem prescindir), existe um erro de julgamento digno de censura, que justifica a revogação da sentença proferida por outra que julgue o pedido de anulação da venda tempestivo.

"Falta de citação" ou "nulidade da citação"

27. O Tribunal a quo chamou à colação os regimes da falta de citação e da nulidade da citação para concluir que, o que houve nos autos foi uma nulidade de citação e não a (supostamente) arguida pela Recorrente "falta de citação". Conclui, por fim, que a "falta de citação" deveria ter sido suscitada pela Recorrente no prazo que dispunha para a oposição à execução.

28. Porém, a Recorrente não alegou na PI qualquer falta de citacão. até porque não está em causa a citação, mas sim a falta de notificação após penhora, enquadrável no artigo 195.° do CPC.

29. Ora, aqui reside a segunda nulidade da sentença recorrida: pronúncia sobre questões que não deva conhecer.

30. E mesmo a falta de notificação após penhora foi suscitada pelo facto de a mesma não ter simplesmente existido para o processo em que foi realizada a venda do prédio dos autos, isto é, para o proc. n.° 27.... A Recorrente não alegou que não foi citada para o processo em que foi realizada a venda, isto é, para o proc. n.° 27....

31. O Tribunal a quo faz uma enorme confusão entre o fundamento de anulação alegado pela Recorrente (falta de notificação após penhora), por via da reclamação judicial, e o fundamento de oposição à execução não alegado pela Recorrente (da nulidade da citação).

32. Só o primeiro está em discussão nos presentes autos. Nunca se alegou que a Recorrente não foi citada para o proc. n.° 27..., nem nunca se alegou que a Recorrente não foi notificada após penhora no âmbito do proc. n.° 278....

33. O que se alegou foi que a Recorrente não foi notificada após penhora, para efeitos de oposição à penhora - que lhe permitiria obstaculizar a venda para o processo em que veio a mesma a realizar-se: proc. n.° 27....

34. Pelo que, não se compreende porque diz o Tribunal a quo decide pela "intempestividade do pedido de anulação de venda e do pedido de declaração de nulidade da citação". A Recorrente não pediu a declaração de nulidade da citação!

35. O Tribunal a quo fala também que "não se vislumbra qualquer irregularidade pelo facto de os ofícios não...

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