Acórdão nº 3568/20.1T8OAZ-D.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 25-10-2022

Data de Julgamento25 Outubro 2022
Ano2022
Número Acordão3568/20.1T8OAZ-D.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
PROCESSO N.º 3568/20.1T8OAZ-D.P1
Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo de Comércio de Oliveira de Azeméis - Juiz 1

Relator: Fernando Vilares Ferreira
Adjunto: Alberto Taveira
Adjunta: Maria da Luz Seabra

SUMÁRIO:
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ACORDAM os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:

I.
RELATÓRIO
1.
Por apenso ao processo em que foi declarada insolvente “X... - FUTEBOL SDUQ, LDA.”, veio o Exmo. Administrador da Insolvência (AI), no dia 18.01.2021, apresentar a lista de credores, fazendo constar na mesma AA, enquanto titular de um crédito laboral (privilegiado) sobre a massa insolvente, do montante global de 143.297,06€, sujeito a condição suspensiva (dependente do desfecho do processo n.º 358/19.8T8AVR, pendente no Juízo do Trabalho de Aveiro – Juiz 2).
2.
À dita lista de credores foram apresentadas as seguintes impugnações:
- O credor BB (que viu reconhecido um crédito laboral no montante de 4.280,00€) pugnou pelo reconhecimento de um crédito privilegiado no valor total de 6.488,33€ (seis mil, quatrocentos e oitenta e oito euros e trinta e três cêntimos), requerendo ainda a atualização do montante devido a título de juros que declarou ascenderem a 150,64€ (cento e cinquenta euros e sessenta e quatro cêntimos), e que lhe sejam pagos os juros vincendos calculados desde 14/12/2020;
- O credor CC (que viu reconhecido um crédito laboral no montante de 10.000,00€) defendeu que o seu crédito se cifra em 12.991,47€; e
- O credor DD (que viu reconhecido um crédito laboral no montante de 10.000,00€) defendeu que o seu crédito se cifra em 13.688,45€.
3.
O AI não aceitou alterar os créditos que havia reconhecido aos credores CC e DD, explicando a razão pela qual entende não serem devidas as quantias indicadas pelos credores nas suas impugnações.
Os referidos credores, notificados da resposta do AI, aceitaram-na.
Quanto à impugnação deduzida por BB, o AI aceitou alterar o montante reconhecido para € 4.486,50 (quatro mil, quatrocentos e oitenta e seis euros e cinquenta cêntimos).
O credor aceitou que o seu crédito ficasse reconhecido nos termos indicados pelo AI na resposta à sua impugnação.
4.
No dia 12/03/2021, o credor AA veio invocar erro manifesto na lista apresentada pelo AI, alegando que o seu crédito surge reconhecido como “privilegiado (sob condição)”, mas no item “condições suspensivas ou resolutivas” vem referido que tais condições não existem pelo que o seu crédito deve constar da lista como crédito privilegiado.
Veio então o AI esclarecer que o crédito reconhecido a este credor o foi sob condição suspensiva mercê da pendência do processo n.º 358/19.8T8AVR, que corria os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, no Juízo de Trabalho de Aveiro, e onde, após a junção da lista de credores, foi proferida sentença determinando a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.
Por assim ser, o AI analisou o crédito reclamado pelo credor AA concluindo que o mesmo não tem qualquer crédito nestes autos.
O credor, notificado do entendimento do AI veio defender a sua inadmissibilidade, alegando que as razões agora invocadas são profundamente contrariadas pelo que foi decidido no processo que correu termos no TT.
Terminou requerendo que se declare a invalidade da caducidade do contrato de trabalho operada pela insolvente, condenando-a a pagar-lhe as retribuições que seriam devidas desde a comunicação da caducidade do contrato até à data em que este terminaria no seu termo acordado (30.06.2019), ou seja, na importância líquida de 112.000,00 € (o valor remanescente do contrato, multiplicado por 2, por o despedimento se ter verificado quando o trabalhador se encontrava afetado de acidente e/ou doença); b) que a insolvente deve ao reclamante as retribuições vencidas e não pagas no valor líquido de 18.000,00 €; c) que a insolvente tem de pagar ao insolvente o valor líquido de 2.333,33 €, relativo às férias a que o trabalhador tem direito e não gozou pelo trabalho de 2017 e um mês de trabalho de 2018; d) que lhe sejam pagos os juros dessas importâncias calculadas desde que cada uma delas é devida.
5.
Por despacho de 20/04/2021 foram declarados reconhecidos os créditos de todos os credores (com exceção do de AA) pelos montantes e com a natureza indicada pelo AI, quer na lista a que se refere o artigo 129º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, quer nas respostas às impugnações deduzidas.
6.
Ouvido o AI e a devedora quanto ao pedido do credor AA, veio o AI defender que o facto de a instância no TT haver sido extinta por inutilidade superveniente da lide obrigou o AI a fazer um exame crítico do preenchimento dos três requisitos contidos no art. 343.º, al. b) do Código do Trabalho para concluir pela licitude ou ilicitude da caducidade do contrato de trabalho.
E tendo o AI feito tal análise, é seu entendimento que a caducidade do contrato de trabalho do credor operou de forma lícita pelo que não lhe deve ser reconhecido qualquer crédito.
A devedora não se pronunciou.
7.
Por despacho proferido no dia 09/06/2021, após constatação de que na lista que deu origem a este apenso o AI indicou a condição relativa ao crédito do credor AA – Crédito dependente do desfecho do processo n.º 358/19.8T8AVR, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, no Juízo do Trabalho de Aveiro - Juiz 2, declarou-se que a referida lista de credores não padece de qualquer erro manifesto.
No entanto, conhecida que foi a sentença proferida pelo TT e constatando-se que, pese embora a instância tenha sido declarada extinta no que à aqui devedora respeita, os factos relativos ao crédito do credor AA haviam sido amplamente discutidos, ouviram-se credor, AI e devedora quanto à forma pela qual deveria passar a análise do crédito deste credor nos presentes autos, tendo em conta a impossibilidade de se voltar a julgar a causa.
Quer o credor AA, quer o AI, declararam que os factos alegados pelo credor foram discutidos no TT sem qualquer restrição provocada pela declaração de insolvência pelo que aceitaram que este Tribunal não poderia voltar a julgar a mesma causa, devendo, com base nos factos apurados pelo TT, determinar se está (ou não) verificada a condição.
Já a devedora, defendeu que com a declaração de extinção da instância ficou sem possibilidade de recorrer da resposta à base instrutória, pelo que os factos não foram discutidos sem qualquer restrição, inexistindo caso julgado e devendo o crédito do credor AA ser julgado neste Juízo de Comércio.
O credor AA defendeu que a devedora já não pode interferir na decisão da questão porque notificada dos anteriores despachos nada disse, sendo certo que no TT a extinção da instância quanto à devedora somente foi declarada na sentença pelo que a referida sentença é suficiente para que seja decidida a questão controvertida nestes autos.
O AI entendeu que embora o Tribunal de Trabalho não tenha tomado decisão quanto ao reconhecimento do crédito de AA sobre a insolvente (a instância foi extinta por inutilidade superveniente da lide quanto à insolvente), ao analisar a responsabilidade solidária dos administradores da insolvente, analisou a questão em discussão.
Porém, uma vez que a devedora discorda desses factos e nestes autos conserva os seus poderes para intervir no processo, deve este Juízo julgar o crédito.
8.
No dia 06/09/2021 foi proferido despacho pelo qual se determinou que estes autos aguardariam o envio, para apensação, da ação que correu termos no TT de Aveiro, elemento essencial para a decisão da causa, tendo-se ainda consignado que a devedora não interveio, em tempo, nos autos de reclamação de créditos e não impugnou o crédito que o AI reconheceu ao credor AA (sendo certo que atenta a sua posição deveria ter impugnado o crédito no sentido de este Tribunal o considerar como não reconhecido, mas não o fez) pelo que a decisão a proferir passaria pela análise do que constasse do processo que correu termos no TT de Aveiro.
9.
Apensada que foi a estes autos a Ação de Processo Comum n.º 358/19.8T8AVR que correu termos no TT de Aveiro (e que agora corresponde ao apenso I), vieram:
- A devedora defender que o crédito de AA tinha de ser julgado neste Tribunal por inexistir caso julgado;
- O credor AA defender que a este Tribunal cabe, tão só, subsumir os factos dados como provados no TT de Aveiro ao Direito e decidir.
10.
Por despacho de 21/03/2022 determinou-se que os factos que se julgaram no apenso I e que foram dados como provados na sentença ali proferida são os suficientes para a decisão da questão colocada neste apenso de reclamação de créditos, deixando-se o entendimento de que, estando tais autos apensados a esta insolvência, estamos impedidos de volta a julgar a causa.
Ouvidas as partes quanto à necessidade de realização de audiência prévia:
- A devedora nada disse.
- O credor defendeu ser desnecessária a realização da diligência;
- O AI entendeu ter utilidade a discussão da questão em audiência prévia.
11.
Procedeu-se à realização de audiência prévia em sede da qual, após discussão das questões controvertidas, foram consignadas em ata as razões pelas quais se continuou a entender que não pode, de novo, ser julgado o crédito do credor AA, a saber:
1 – A circunstância de a aqui devedora ter participado no julgamento da ação laboral que constitui apenso destes autos, tendo tido a oportunidade de contradizer a prova e de produzir a prova que indicou no articulado de contestação;
2 – Ter sido determinado na sentença proferida no TT que o crédito do aqui credor existe e é devido, só não se tendo condenado a aqui devedora no seu pagamento pois que, entretanto, havia sido declarada insolvente;
3 – Nestes autos, a devedora não ter impugnado o crédito do credor.
4 – Verificar-se a exceção de autoridade de caso julgado.
12.
Finda a discussão, em audiência prévia, das questões atinentes ao crédito de
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