Acórdão nº 3550/23.7T8GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06-02-2025

Data de Julgamento06 Fevereiro 2025
Número Acordão3550/23.7T8GMR-A.G1
Ano2025
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães


Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo

Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos;
1.º Adjunto - Fernando Manuel Barroso Cabanelas;
2.º Adjunto - João Peres Coelho.
*
ACÓRDÃO

I - RELATÓRIO
1.1.Decisão impugnada
1.1.1. EMP01... - Unipessoal, Limitada, com sede no Beco ..., ..., ... (aqui Recorrente), deduziu embargos de executado (por apenso aos autos de execução que, com o n.º 3550/23...., correm termos pelo Juízo de Execução de Guimarães, Juiz ..., propostos contra si por EMP02..., S.A., para haver o pagamento coercivo da quantia de € 33.436,87, invocando como título executivo uma livrança), contra EMP02..., S.A., com sede na Rua ..., em Coimbra (aqui Recorrida), pedindo que

· fosse declarada extinta a execução, por procedência da exepção dilatória inominada de falta de integração prévia da respectiva dívida em Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento [1] (sendo, com tal fundamento, absolvida da instância executiva); ou, subsidiariamente, por procedência da excepção peremptória de preenchimento abusivo do titulo executivo (sendo, com tal fundamento, absolvida do pedido executivo).

Alegou para o efeito, em síntese, que, obrigando a lei que todas as instituições de crédito submetam previamente os clientes que se encontrem numa situação de incumprimento a um procedimento extrajudicial de regularização, não agiu a Exequente/Embargada (EMP02..., S.A.) deste modo para consigo (intentando de imediato a presente acção executiva); e, por isso, justificando-se a sua absolvição da instância executiva, por procedência desta excepção dilatória inominada (já que aquela prévia integração em PERSI constitui uma condição objectiva de procedibilidade da posterior execução).
Mais alegou ter subscrito a livrança que se executa nos autos principais no âmbito de um contrato de garantia bancária autónoma celebrado com a Exequente/Embargada (EMP02..., S.A.), por a dita garantia lhe ter sido exigida mercê de um contrato de mútuo celebrado por si com a Banco 1..., S.A. (actuando uma linha de apoio às micro e pequenas empresas, em decorrência da epidemia de COVID-19); e ter sido a dita livrança preenchida abusivamente, já que, tendo sido entregue em branco, nada lhe foi previamente comunicado e explicado quanto a um qualquer, e eventual, pacto de preenchimento (que se encontraria nas condições gerais do contrato de adesão por si assinado).
Por fim, a Executada/Embargante (EMP01... - Unipessoal, Limitada) alegou que o contrato de prestação de garantia bancária autónoma exigia a sua prévia interpelação por carta, antes de qualquer exigência judicial de pagamento; e não ter a Exequente/Embargada (EMP02..., S.A.) procedido à mesma (antes de instaurar a acção executiva de que estes embargos são apenso).

1.1.2. Recebidos liminarmente os embargos, e regularmente notificada a Exequente/Embargada (EMP02..., S.A.), a mesma contestou, pedindo que fossem julgados totalmente improcedentes, por não provados (prosseguindo a execução os seus termos normais).
Alegou para o efeito, em síntese, não cair o seu crédito no âmbito do PERSI, não só por ela própria não ser banco ou instituição de crédito, como ainda por invocar como título executivo uma livrança (e não qualquer contrato de crédito).
Mais alegou ter sido a livrança preenchida de acordo com o previamente acordado nesse sentido no contrato escrito de prestação de garantia bancária autónoma, nas suas Condições Particulares, que a Executada/Embargante (EMP01... - Unipessoal, Limitada) assinou.
Por fim, alegou ter procedido à prévia interpelação desta, por carta dirigida para a morada por ela indicada; e não obstar à validade e eficácia da interpelação assim feita a posterior devolução da dita carta, por motivos exclusivamente imputáveis à Executada/Embargante (EMP01... - Unipessoal, Limitada).

1.1.3. Em sede de audiência prévia foi anunciado às partes que os autos reuniam todos elementos necessários a que se proferisse de imediato uma decisão de mérito; e as mesmas completaram, então, as alegações dos respectivos articulados.

1.1.4. Foi proferido saneador-sentença, certificando tabelarmente a validade e regularidade da instância, fixando o valor da causa em € 33.496,87 e julgando os embargos de executado totalmente improcedentes, lendo-se nomeadamente no mesmo:
«(…)
IV. Decisão:
Pelo exposto, julga-se totalmente improcedentes os embargos de executado e determina-se o prosseguimento da execução.
Custas pela embargante.
Registe e notifique, incluindo ao(à) Sr(ª) SE.
(…)»
*
1.2. Recurso
1.2.1. Fundamentos
Inconformada com esta decisão, a Executada/Embargante (EMP01... - Unipessoal, Limitada) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que fosse revogada a decisão recorrida (sendo substituída por acórdão a julgar procedente a excepção de preenchimento abusivo do título executivo e, desse modo, declarada extinta a instância executiva).

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (reproduzindo-se ipsis verbis as respectivas conclusões, com excepção da concreta grafia utilizada e de manifestos e involuntários erros e/ou gralhas de redacção):

1. Porque o presente Recurso vem da douta Sentença de 12-07-2024, com a referência n.º ...89, a qual julgou improcedente os presentes embargos à execução e, em consequência, determinou o prosseguimento da execução contra a recorrente;

2. Porque a douta Sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito, porquanto o entendimento aí sufragado viola o disposto nos artigos 1.º, 5.º, 6.º e 8.º, todos do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais, constantes do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25-10; e o artigo 10.º, n.º 5, do CPC;

3. Porque os recorrentes invocaram a exceção material de preenchimento abusivo do título, por entenderem que a recorrida não poderia ter procedido ao preenchimento da livrança dada à execução, uma vez que jamais foi comunicada e/ou informada a existência de qualquer um pacto de preenchimento;

4. Porque o Tribunal a quo deveria ter aplicado, in casu, o Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais, uma vez que a cláusula que prevê o pacto de preenchimento no contrato subscrito, trata-se de uma cláusula contratual geral elaborada sem prévia negociação individual, a qual não foi comunicada, pela recorrida, no momento da celebração do Contrato;

5. Porque a consequência legal desta omissão, isto é, que decorre da Lei, pelo incumprimento do dever de comunicação, é a exclusão das cláusulas gerais do contrato, nos termos do artigo 8.º, alínea a), do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais;

6. Porque os deveres de comunicação e informação decorrem, única e exclusivamente, da aplicação do regime jurídico das cláusulas contratuais gerais e não dependem da natureza jurídica dos seus proponentes ou destinatários;

7. Porque não é suficiente, relativamente ao cumprimento dos deveres de comunicação e informação, dar à outra parte um exemplar do contrato, mesmo que esta o assine;

8. Porque a recorrente ser uma empresa não afasta as obrigações impostas, relativamente aos deveres de comunicação e informação, relativamente às cláusulas contratuais gerais, que impendiam sobre a recorrida;

9. Porque a recorrida não poderia ter procedido ao preenchimento da livrança dada à execução;

10. Porque face a ausência de um pacto de preenchimento, o preenchimento da livrança dada à execução é abusivo;

11. Porque face a inexistência de pacto de preenchimento, verifica-se a inexequibilidade do título executivo dado à execução;

12. Porque o Tribunal a quo, subverte, por errada interpretação e aplicação do direito, as regras constantes do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais.
*
1.2.2. Contra-alegações
Não foram apresentadas quaisquer contra-alegações.
*
1.2.3. Processamento ulterior do recurso
O recuso foi admitido pelo Tribunal a quo como «de apelação, com efeito meramente devolutivo e subida nos próprios autos», o que não foi alterado por este Tribunal ad quem.
*
II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR

2.1. Objecto do recurso - EM GERAL
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, nºs. 1 e 2, ambos do CPC), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art.º 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art.º 663.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC).

Não pode igualmente este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida) [2], uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de prévias decisões judiciais (destinando-se, por natureza, à sua reapreciação/reponderação e consequente alteração e/ou revogação, e não a um novo reexame da causa).
*
2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar
Mercê do exposto, e do recurso de apelação interposto pela Executada/Embargante (EMP01... - Unipessoal, Limitada), uma única questão foi submetida à apreciação deste Tribunal ad quem:

· Questão Única - Fez o Tribunal a quo uma erradainterpretação e aplicação do Direito,ao deixar de reconhecer o carácter abusivo do preenchimento da livrança que constitui o título executivo (nomeadamente porque, constando o pacto de preenchimento respectivo de um contrato de adesão e não tendo a Exequente/Embargada comunicado e/ou explicado o seu conteúdo à Executada/Embargante, se ter aquele primeiro excluído deste segundo) ?
*
III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

3.1. Factos Provados
O Tribunal a quo considerou provados os seguintes os factos «com relevância para a decisão a proferir», factos esses que ficaram definitivamente assentes por falta de sindicância de qualquer das partes (aqui apenas reordenados - de forma lógica e cronológica, conforme a realidade histórica que é suposto retratarem [3] -, sem quaisquer expressões...

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