Acórdão nº 3415/16.9T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21-02-2019

Data de Julgamento21 Fevereiro 2019
Número Acordão3415/16.9T8VCT.G1
Ano2019
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório

Domingos (…) veio propor contra (…) – Companhia de Seguros, S.A., acção declarativa de condenação, peticionando que a Ré seja condenada a pagar-lhe (i) a quantia global líquida de € 354.420,19, acrescida de juros de mora vincendos, contados à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação, até efectivo pagamento e (ii) e a quantia que corresponder à indemnização ilíquida que vier a ser fixada em decisão ulterior ou liquidada em incidente de liquidação, por força dos factos enunciados nos artigos 279º a 318º da petição inicial.

Regularmente citada, contestou a Ré, impugnando todos os factos alegados, do artigo 8º ao artigo 319º da petição inicial.

Em sede de audiência prévia, foi proferido despacho saneador, definiu-se o objecto do processo e procedeu-se à selecção dos temas de prova.

Foi realizado o exame médico-legal na pessoa do Autor e junto aos autos o correspondente relatório pericial.

Procedeu-se a julgamento, tendo a Ré, no início desta, confessado os factos relativos à dinâmica do acidente os quais se encontram descritos nos artigos 1º a 96º e 116º e 117º da petição inicial.

A final foi proferida sentença com o seguinte teor decisório:

“Em face do exposto, julgo a acção proposta por Domingos (…) contra (…) – Companhia de Seguros, S.A., parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente condeno a Ré a pagar ao Autor a quantia global líquida de € 108.099,35, acrescida de juros contados desde data da citação sobre a quantia de € 53.099,35, e desde a data da prolação da presente decisão sobre a quantia de € 55.000,00, à taxa legal de 4%, até integral e efectivo pagamento, e, ainda, a quantia cuja fixação se remete para decisão ulterior, nos termos do disposto no artigo 564º, nº 2, do Código Civil, e que corresponder às despesas que o Autora comprovar que teve com (i) medicamentos analgésicos para atenuar ou debelar as dores nos membros superiores e inferiores, (ii) com consultas de estomatologia, exames auxiliares de diagnóstico, e próteses dentárias para substituição das actuais e (iii) com consultas de ortopedia, exames auxiliares de diagnóstico, para avaliação da necessidade de remoção do material de osteossíntese e, caso seja necessária a remoção, com as respectivas cirurgias.

Absolvo a Ré do restante peticionado. “

O A. não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

a. O Autor tinha 54 (cinquenta e quatro) anos de idade aquando da ocorrência do acidente.
b. Além das lesões e sequelas sofridas – de considerável gravidade e que são as que resultam descritas no ponto hhh) da decisão de facto - o Autor sofreu:
- um Período de Défice Funcional Temporário Total de 60 dias;
- um Período de Défice Funcional Temporário Parcial de 278 dias;
c. um Défice Funcional Permanente de Integridade Físico-Psíquica de 16 pontos;
- um Quantum Doloris de grau 5, de 1 até 7;
- Um Dano Estético permanente fixável no grau 3 numa escala de 1 a 7;
d. O Autor ficou absolutamente impossibilitado de continuar a exercer as actividades descritas no facto provado aaaa). (facto provado ffff)),
e. Passando a ter de desenvolver a sua actividade profissional de forma extremamente condicionada e limitada, nas circunstâncias de facto descritas em gggg), hhhh), iiii) e jjjj).
f. Pela factualidade dada como provada, e a título de perda da capacidade de ganho, impunha fixar-se valor mais elevado do que os €50.000,00 efectivamente arbitrados, em valor não inferior a € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros).

Além disso:

g. Provou-se que o Autor esteve pelo menos 15 (quinze) dias internado em unidade hospitalar, três intervenções cirúrgicas com anestesia geral, suportou gesso no braço e perna durante três meses, canadianas durante 9 meses, submeteu-se a múltiplas sessões de fisioterapia, esteve cerca de três meses imobilizado em casa,
h. Sofreu dores intensíssimas, sobretudo no ombro e calcanhares, braço e pernas, que ainda hoje se fazem sentir,
i. Ficou como limitação na abertura da boca, dificultando a mastigação, de forma permanente,
j. Passou a sofrer de marcha claudicante, perceptível a terceiros como desconchavada e desequilibrada,
k. Entre o demais resultante da factualidade demonstrada nos autos.
l. Como tal, também se afigura insuficiente a indemnização fixada em primeira instância para a compensação dos danos não patrimoniais sofridos - € 55.000,00 - a qual, pela sua extensão e gravidade, conforme resulta dos factos provados, deve ser também alterada e fixada em valor não inferior a € 75.000,00.
m. Decidindo de modo diverso, fez a sentença recorrida má aplicação do direito aos factos provados e violou, além de outras, as normas dos artigos 496º., nº. 1, 562º. e 564º., nºs. 1 e 2, do Código Civil.
n. Quanto ao restante que não posto em crise nas presentes alegações de recurso, deve manter-se o doutamente decidido pelo Tribunal de Primeira Instância.

Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e proferindo-se, em sua substituição, Douto Acórdão, que esteja em conformidade com as conclusões supra-formuladas.

A R. Companhia de Seguros veio interpor recurso subordinado, tendo formulado as seguintes conclusões:

o A. conformou-se com o relatório pericial junto aos autos e deste relatório na parte das queixas verbalizadas pelo sinistrado consta o seguinte que nos “atos da vida diária: dificuldade na marcha” e na “vida profissional ou de formação: exerce a profissão”.
. – e que “neste caso, as sequelas são compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares”.
. - Solicitados esclarecimentos pelo A., a Srª perita diz com clareza que “o examinado tem limitações por que foi avaliado, mas que não o impossibilitam de subir e descer escadas, não necessita de bengala, pode praticar actividades lúdicas de acordo com as suas sequelas.”
. - E, em resposta à matéria do artigo 263º da petição inicial, nomeadamente se o A. “não consegue permanecer de pé, por períodos prolongados de tempo, não consegue fazer força, esforço e movimentar os membros superiores e o membro inferior direito, como o fazia antes…” responde: - “consegue
. - E em resposta ao art. 265º da petição inicial onde era questionada sobre se “…a autora passou a sofrer de total e definitiva possibilidade de desempenhar a sua referida profissão de Assistente Operacional/cantoneiro de limpeza” … diz: “Não”.
. - O A. conformou-se com os esclarecimentos prestados pela Srª perita não mais tendo a reclamar ao relatório perícia.
. - Por essa razão, não há qualquer justificação para o que tribunal “a quo” valorizar um relatório junto aos autos pelo A., a seu pedido, em detrimento do relatório pericial elaborado pelo perito forense que se apresenta com mais credibilidade e idoneidade.
. - Além disso, tem sido entendimento do tribunal que as perícias médico-legais têm de ser realizadas nos termos do disposto no art. 467º, nº 3 do CPC e, por essa razão, ter sido indeferida a perícia colegial pelas partes, não faz sentido que, conformando-se as partes com o seu resultado, o tribunal o não venha a aceitar.
. - Por outro lado, as testemunhas ouvidas apenas referiram que o A. não conseguia efectuar o trabalho noturno, que era o trabalho de recolha do lixo no camião.
10ª. - Mas o referido trabalho não era frequente, como aliás se pode confirmar pelo subsídio do A. de trabalho noturno através da análise dos recibos de vencimento do A. e o facto de o A. se queixar para ser colocado em tarefas menos exigentes não significa que as não possa executar.
11ª. – pelo que a matéria das zzzz), fffff) e jjjjj) deveria ser considerada não provada.
12ª. – tendo em conta que o A. tem um Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 16 pontos, compatível com o exercício da actividade profissional habitual, mas implica esforços suplementares, que nasceu no dia 29 de Abril de 1959; que auferia mensalmente e em média o valor líquido de € 705,25;
13ª. - Não deveria ter sido atribuída ao A. quantia superior a 10.000,00 euros.
14ª. – pois o A. é funcionário público e não irá exercer a sua actividade para além da idade legal de reforma e não tem, como não teve, quaisquer perdas salariais (com excepção do subsídio de trabalho noturno) e sempre lhe foi pago, por inteiro, o respectivo vencimento.
15ª.. Além disso mesmo que se entenda que as queixas apresentadas pelo A. aos serviços municipalizados, que o colocaram em serviços físicos menos exigentes, demonstra que o A. não tem qualquer perda patrimonial nem necessita de fazer qualquer esforço físico adicional para obter os seus rendimentos.
16ª. pois, a continuar a exercer a sua actividade habitual o A. teria de fazer um esforço acrescido para desempenhar cabalmente as suas funções e, mudando-lhe as tarefas mais fáceis e que pode executar sem qualquer esforço – auferindo o mesmo vencimento – não representa esse esforço e, como tal, não lhe deveria ser considerada qualquer perda patrimonial.
17ª. - E também por essa razão não lhe pode ser atribuída qualquer quantia, que além do mais, seria injustificada e representaria um enriquecimento do A, ilegítimo.
18ª. - o montante arbitrado na sentença recorrida a título de dano moral mostra-se excessivo e desajustado, se tivermos em conta não apenas os factos dados como provados, mas também a orientação que vem sendo seguida pela nossa recente Jurisprudência em casos semelhantes ao que está aqui em análise.
19ª. - Tal montante, deverá fixar-se sempre em valor próximo dos 30.000,00€ – considerando, sobretudo, concreto caso dos autos, quantia essa que já traduz de forma muito expressiva a gravidade das lesões da recorrida e que não ofende os valores usualmente arbitrados em situações de gravidade...

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