Acórdão nº 3259/12.6T8VCT-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28-09-2023

Data de Julgamento28 Setembro 2023
Ano2023
Número Acordão3259/12.6T8VCT-A.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte:
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RELATÓRIO

E... Lda., com sede na ..., ... ..., instaurou execução para pagamento de quantia certa contra AA, residente na Rua ..., ... ..., visando obter a cobrança coerciva da quantia de 3.873,90 euros de capital em dívida, acrescida da quantia de 2.107,61 euros de juros de mora vencidos, a que acrescem os vincendos, dando à execução um documento particular autenticado, outorgado em 18/1/2021, assinado, entre outros, por exequente e executado.
Para tanto alegou, em sede de requerimento executivo, que, por documento particular autenticado por advogado, outorgado em 18/01/2021, foi celebrado um acordo de pagamento em prestações entre diversos outorgantes, em que figuram a aqui exequente e o aqui executado, assinado pel(a)os aí outorgantes, através do qual convencionaram o seguinte: o executado confessou-se devedor à exequente da quantia de 3.873,90 euros, correspondente ao valor em dívida do processo executivo n.º ...6..., que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo Local Cível, Juiz ...; as partes convencionaram que a dita quantia deveria ser paga em 77 prestações, no valor unitário de 52,35 euros, a serem pagas ao dia 18 de cada mês; o pagamento das referidas prestações deveria ser efetuado através de entidade e referência emitidas pelo mandatário da exequente e entregue ao executado.
Acontece que, em 18/04/2021, venceu-se a 4ª prestação, que não foi liquidada, o que determinou o vencimento das restantes prestações.
No âmbito da execução que antecede procedeu-se, em 21/03/2022, à penhora do saldo de uma conta bancária, no montante de 515,10 euros (cfr. auto de penhora junto aos autos de execução a 06/05/2022); em 28/09/2022, à penhora de um prédio urbano composto por fração autónoma designada pela letra ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...53 – ... (cfr. auto de penhora junto aos autos de execução em 06/12/2022); e à parte penhorável do vencimento do executado (cfr. auto de penhora junto aos autos de execução em 06/12/2022).
Citado o executado para pagar, querendo, a quantia exequenda e/ou deduzir oposição à execução e/ou à penhora, deduziu oposição à execução e à penhora.
Em sede de oposição à execução, invocou a exceção dilatória de inexistência de título executivo, alegando que o termo de autenticação do “acordo de assunção e pagamento prestacional” que serve de título executivo à presente execução é nulo, dado não conter a identificação completa das partes quanto aos segundos e terceiros outorgantes no “acordo de assunção e pagamento prestacional”, e quanto ao aí primeiro outorgante (o executado), não só o termo de autenticação não contém a identificação completa deste, como também não contém a qualidade da sua verificação e a verificação dessa qualidade; acresce que também existem dois termos de autenticação distintos para servir de base à autenticação do referido “acordo de assunção e pagamento prestacional”, os quais igualmente pecam por defeito, o que tudo determina a invalidade dos termos de autenticação, na medida em que nenhum deles engloba a identificação e assinatura de todas as partes intervenientes no “acordo de assunção e pagamento prestacional” e tão pouco os referidos termos de autenticação identificam a entidade autenticadora, nem neles se encontra aposta a assinatura dessa entidade, nem a qualidade em que os autenticou, arrastando os mencionados vícios a nulidade dos termos de autenticação e, em decorrência dela, a nulidade do “acordo de assunção e pagamento prestacional”, com a consequente falta de título executivo que serve de base à execução.
Invocou a exceção dilatória de ineptidão do requerimento executivo por falta de alegação de causa de pedir e por ininteligibilidade do pedido, sustentando que o valor em dívida que figura no “acordo de assunção e pagamento prestacional” ascende a 3.680,00 euros, e não à quantia de 3.873,90 euros que vem narrada pela exequente no requerimento executivo; naquele “acordo de assunção e pagamento prestacional” prevê-se que aquela quantia será paga em 70 prestações mensais, no valor de 52,56 euros cada, e não em 77 prestações, no valor de 52,35 euros, conforme vem alegado pelo exequente no requerimento executivo; o valor referido no requerimento executivo a título de cláusula penal não ascende aos 1.936,95 euros narrados no requerimento executivo, mas sim a 1.840,00 euros; finalmente, a exequente reclama juros de mora à taxa comercial quando o executado é uma pessoa singular e aquela não alegou, no requerimento executivo, o fundamento para reclamar juros à taxa comercial.
Impugnou a facticidade alegada pela exequente no requerimento executivo.
Em sede de oposição à penhora, alegou existir excesso de penhora.
Concluiu pedindo que se julgasse a oposição à execução procedente e se determinasse a extinção da execução e, bem assim, se julgasse procedente a oposição à penhora e se ordenasse o imediato levantamento da penhora e o cancelamento do registo do prédio constituído por fração autónoma designada pela letra ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...53 – ..., inscrito na matriz sob o art. ...89º.
Recebidas liminarmente as oposições à execução e à penhora, a exequente contestou, defendendo-se por impugnação.
Concluiu pela improcedência da exceção de falta de título executivo invocada pelo executado, alegando que os atos notarias apenas são nulos nas situações previstas nos arts. 70º e 71º do Código de Notariado, pelo que, entre os vários vícios que vêm invocados pelo executado, apenas a falta de assinatura dos outorgantes ou do notário (no caso, de advogado) seria suscetível de determinar a nulidade do título executivo, o que não é o caso, dado que o termo de autenticação encontra-se devidamente assinado pelos devedores, e no final deste, encontra-se devidamente assinado e carimbado pelo advogado certificante.
Concluiu pela improcedência da exceção dilatória de ineptidão do requerimento executivo suscitada pelo executado, sustentando que o teor do documento dado à execução corresponde integralmente ao que se encontra alegado pela exequente no requerimento executivo, não existindo as divergências apontadas pelo executado; quanto aos juros de mora à taxa supletiva aplicável às relações comerciais, alegou que a obrigação exequenda provém de uma transação comercial, no âmbito do que foram, designadamente, fornecidas bebidas para venda em estabelecimento comercial, sendo, neste conspecto, irrelevante o facto de o executado ser uma pessoa singular, sendo os juros moratórios devidos a calcular à taxa comercial.
Impugnou a existência de excesso de penhora e a facticidade alegada pelo executado a propósito desse pretenso excesso.
Concluiu pedindo que se julgassem as oposições à execução e à penhora improcedentes e se mantivessem todas as penhoras realizadas no âmbito da execução.
Dispensou-se a realização de audiência prévia e proferiu-se despacho saneador, em que se julgou procedente a exceção dilatória de nulidade do requerimento executivo por falta de alegação de causa de pedir e, em consequência, absolveu-se o executado da instância executiva e declarou-se extinta a execução, constando esse despacho da seguinte parte dispositiva:
“Em face do exposto e ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 186.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), 196.º, 278.º, n.º 1, alínea b), 577.º, alínea b), e 578.º, todos do NCPC, julga-se verificada a exceção dilatória de nulidade de todo o processo com fundamento na ineptidão do requerimento executivo por falta de causa de pedir, absolvendo-se o embargante/executado AA da instância executiva e declarando-se, consequentemente, extinta a execução.
Custas pela embargante.
Fixo o valor da causa em 5.981,51 € – cfr. artigos 304.º, n.º 1 e 306.º, n.ºs 1 e 2, ambos do CPC.
Notifique”.

Inconformada com o decidido a exequente interpôs o presente recurso de apelação em que formulou as seguintes conclusões:

I- O presente recurso tem como objeto a matéria de Direito do despacho saneador através do que, em suma, o Tribunal a quo julgou verificada a ineptidão do requerimento executivo, absolveu o Recorrido da instância executiva e declarou extinta a execução, por entender que o título executivo encerra um ato causal (ou corporiza um negócio jurídico unilateral) e que, em face de tal, o Exequente deveria ter alegado, e não o fez, a relação fundamental subjacente, posto que a mesma não consta, segundo considerou o Tribunal a quo, do próprio título executivo.
II- Efetivamente, a simples declaração confessória, não aceite pelo credor, constitui negócio jurídico unilateral, não sendo, por regra, fonte autónoma de obrigações.
III- Sucede que o título executivo nos presentes autos corporiza um acordo de pagamento em prestações celebrado no âmbito de um processo executivo, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 806.º e ss. do CPC, outorgado pela devedora, pelo Embargante (como fiador) e pela Recorrente, em que se encontram, além do mais, estabelecidos o meio de pagamento e as consequências para o incumprimento.
IV- Tal título executivo, integrando, por isso, um acordo de vontades, com obrigações recíprocas e em composição de interesses dos outorgantes, remete, assim, para a figura negocial do contrato, consubstanciando um negócio jurídico bilateral, designadamente nos termos do disposto no artigo 1248.º e ss. do CC.
V- Nada obsta à emissão de uma declaração confessória de uma dívida no âmbito de um contrato, estabelecendo-se, como sucedeu no caso vertente, um esquema de cumprimento, dependente, como se mostra evidente, do acordo de vontades do devedor e do credor.
VI- Acresce que, uma vez que o Recorrido se constituiu fiador da obrigação assumida no documento que constitui título executivo, e posto que a constituição de fiança...

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