Acórdão nº 3208/04.6TBBRR.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 14-04-2011

Data de Julgamento14 Abril 2011
Número Acordão3208/04.6TBBRR.L1-2
Ano2011
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os juízes na 2.ª secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO

APELANTE/RÉ: “A” (Representada inicialmente em juízo juntamente com outro pela ilustre advogada “B”, com escritório em C..., conforme instrumento de procuração de fls.121 dos autos).

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APELADA/AUTORA: “C” (Representada inicialmente em juízo pela ilustre advogada “D”, com escritório no B... , conforme instrumento de procuração de fls.54 dos autos, que renunciou à procuração em 13/01/06 que se tornou efectiva, tendo a Autora passado procuração à ilustre advogada “E” com escritório em S... aos 26/01/06 conforme instrumento de fls. 173);

APELADO/CO-RÉU: “F” (não contestante, representado em juízo, com outros, pela ilustre advogada “B” conforme procuração de 29/01/07 de fls. 451 co-réu, entretanto falecido, tendo-lhe sucedido na acção os filhos “G” e “H”, conforme decisão no Apenso A de 31/05/2010 de fls. 21/22
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Todos com os sinais dos autos.
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A Autora propôs contra os Réus “F” e “A” acção declarativa, sob a forma de processo sumário a que deu o valor de 11.853,23 € e que aos 16/12/04 foi distribuída ao 1.º juízo cível do Tribunal da Comarca do B... e onde pede:
a) Seja declarada a nulidade do registo de aquisição a favor dos Réus;
b) E consequentemente ordenado o cancelamento do registo com a descrição .../...;
c) Sejam os Réus condenados à restituição do imóvel objecto da presente demanda nos termos constantes do art.º 289 do CCiv
d) Sejam os Réus condenados em custas e condigna procuradoria.
Em suma alega:
· A sua tia “I” consagrou-a por testamento sua universal herdeira, deixando-lhe por morte todos os seus bens entre os quais uma parcela de terreno para construção com a área de 690 m2 sito na Rua do ..., em Vale ..., freguesia do B..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... (art.ºs 1 e 2);
· Na posse da escritura de habilitação de herdeiros, a A. registou em seu nome o identificado imóvel, o qual corresponde à descrição 989/010..., tendo sido inscrita a seu favor a respectiva aquisição (art.º 3);
· Depois de um exame ao local, e porque algumas pessoas garantiam que o imóvel pertenceria a outrem, veio a constatar que a parcela de terreno também se encontra registada a favor dos Réus sob o n.º 00.../..., estando na base da aquisição uma escritura pública de justificação aquisitiva por usucapião a favor dos Réus celebrada em 21/01/97, em que os Réus justificaram o direito referindo tê-lo adquirido verbalmente à tia da Autora, no ano de 1989, mais declarando que o lote de terreno não está descrito na conservatória do registo predial (art.ºs 4 a 12);
· Parte dessas declarações são falsas: em Julho de 1964 a tia da Autora, ainda casada em primeiras núpcias com “J” celebrou uma escritura pública de compra e venda com “L” e “M”, tendo por objecto o terreno aqui em causa, referindo-se que os vendedores não estavam definitivamente inscritos como titulares do imóvel e que o lote era a destacar do prédio descrito sob o número ... a fls. 83 v.º do Livro B 1, o que não foi objecto de concretização e deste modo, quando “J” falece corre termos um inventário em que era cabeça-de-casal, face à morte do marido, a tia da Autora, a quem foi adjudicado o identificado imóvel que, na altura, permanecia omisso na Conservatória do Registo Predial; tendo a tia casado em 2.ªs núpcias permaneceu titular do imóvel e em 1969 os Réus celebraram arrendamento com a tia da Autora, em Fevereiro de 1981 os Réus pagaram a última renda tendo o Réu emitido em 15/02/81 uma declaração de compra do imóvel, razão pela qual não eram os Réus possuidores do mesmo desde 1969, por serem arrendatários, sendo certo que a tia da Autora nunca foi notificada da pendência da justificação (art.ºs 13 a 29);
· A cada prédio só pode corresponder uma descrição, a aquisição da Autora está em concordância com o art.º 49 do CRgP que permite uma 1.ª inscrição com base na escritura de habilitação de herdeiros, afastando a necessidade de prévia inscrição a favor do falecido. A inscrição a favor dos Réus fere o princípio do trato sucessivo, pois à data da celebração da escritura de justificação estava inscrito na matriz predial a favor da tia da Autora, tendo os Réus participado às Finanças a existência do lote mencionando serem titulares do mesmo, abrindo novo artigo matricial, o que era essencial à escritura de justificação notarial, nos termos do art.º 92 do CRgN. O justificante ao efectuar as buscas nas Finanças teria de imediato constatado a sua prévia inscrição a favor da tia da Autora, sendo nulo o registo nos termos dos art.ºs 16/c e 17 do CRgP (art.ºs30 a 43);
A Ré “A”, divorciada, veio contestar, impugnando os factos e reconvindo, reconvenção a que deu o mesmo valor da acção e pede:
a) Seja declarado que os Réus são os únicos e exclusivos proprietários do prédio em questão, por o terem adquirido por usucapião, por compra e venda, feita por documento particular à tia da Autora em 15/02/1981, e, portanto, sem o requisito de forma legalmente previsto, mantendo-se o registo e matriz prediais a seu favor, nos precisos termos em que já se encontravam;
b) Seja declarada a nulidade do registo de aquisição a favor da Autora, por sucessão hereditária, pela inscrição G1 – Apresentação 57/010...;
c) Seja ordenado o cancelamento do registo acima referido bem como a extinção da descrição 989/010...;
d) Seja ordenada a anulação da matriz predial urbana n.º ... da freguesia de P... cujo prédio se encontra, indevidamente, na titularidade da tia da Autora, em virtude de estar duplicado com o art.º 613 da mesma freguesia.
Em suma alegou:
· Não tem obrigação de conhecer os factos constantes dos art.ºs1.º, 3 a 5, 1.ª parte, 6, 14 a 22, sendo falso o art.º 2.º da p.i,, sendo verdadeiros os factos constantes da 2.ª parte do art.º 5.º, 7 a 12 da p.i. (art.ºs 1 a 3);
· Em 1969 acordaram verbalmente com a tia da Autora a compra da parcela em causa nos autos e como os Réus não tinham, à data, dinheiro para a aquisição foi acordado que iriam pagando uma mensalidade pela ocupação do mesmo e quando estivessem em condições de concretizar o negócio, pagando ou começando a pagar o preço acordado, dir-lhe-iam a fim de formalizar a venda, e não obstante no documento 9 junto da p.i, se utilizar a expressão de que o Réu marido “trazia de renda” o lote, nunca os Réus se sentiram nem actuaram como inquilinos entre 1969 e 1981, sendo falso os factos de 23 e 24, actuando sempre como se proprietários fossem, de boa fé, de forma pública e pacífica com a intenção de o fazer por forma correspondente ao direito de propriedade que possuem desde 1969 (art.ºs 4 a 14);
· Quando se sentiram em condições de começar a pagar o preço devido e previamente acordado de 60.000$00 deram início ao pagamento da compra e assim, em 15 de Janeiro de 1981 formalizaram o negócio por documento particular, sendo nulo o negócio por preterição de forma legal e, já então, a proprietária explicou aos ora Réus que não podia celebrar a escritura pública de compra e venda do lote porque o prédio não estava registado a seu favor, explicação que os Réus aceitaram tendo pago o preço de 60.000$00 em 24 prestações com o acordo da tia da Autora, tendo, após essa data, como o já fazia antes continuado a amanhar prédio a colher os frutos, fazendo obras tendentes à sua delimitação, à vista de toda a gente sem oposição de quem quer que fosse ininterruptamente e em 1997, auxiliados por advogado, os Réus decidiram registar a seu favor na Conservatória, o lote que já possuíam há longos anos e que há muito que estava pago e que à falta de título bastante interveio na concretização da escritura de justificação e com base nessa escritura registaram, por usucapião em 03/04/1997, a seu favor na Conservatória do Registo Predial competente pela inscrição G1, Ap 09/970... e, só 4 anos mais tarde é que a Autora veio a inscrever o mesmo prédio a seu favor por sucessão hereditária pela inscrição Ap57/0110... dando origem à descrição 989/010... (art.ºs 15 a 37);
Os autos passaram a correr sob a forma de processo ordinário e, por despacho de 29/11/05 foi admitido o pedido reconvencional assim ratificando-se o acto da secretaria; o Réu citado aos 23/05/05 não contestou.
Em Réplica diz a Autora em suma:
· É falso que em 1969 ou em qualquer outra altura tenham comprado o lote de terreno aqui em causa, sendo certo que o contrato de 1969 foi de arrendamento, conforme recibos 1 a 6, não passando a escritura de justificação notarial de uma habilidade dos Réus para se apropriarem do lote sendo falsos os factos 3 a 14 da contestação (art.ºs 1 a 33);
· Os Réus enquanto arrendatários, amanharam o mesmo terreno e colheram os respectivos frutos, nunca os tios da Autora tendo consentido que o fizessem enquanto proprietários (art.ºs 34 a 37);
· Proprietários do referido terreno são os tios da Autora – e hoje a Autora- que mediante escritura compraram esse lote, há mais de 30 anos a “L” e mulher, dando-o de arrendamento, promovendo a sua conservação, pagando os respectivos impostos, colhendo os respectivos frutos, tudo fazendo de modo ininterrupto com conhecimento de vizinhos e de outras pessoas, por forma correspondente ao exercício do seu direito de propriedade e na convicção da respectiva titularidade, pertencendo o prédio à herança de “I”, sendo a Autora a herdeira testamentária dela (art.ºs 38 a 42)
· Os Réus acabaram por desistir do negócio que efectuaram com a tia da Autora em 1981 quando manifestaram, de má fé, a intenção de adquirir esse lote e que como não tinham dinheiro entregariam à tia da Autora letras que ficariam na sua posse, sendo que, das 24 letras, apenas honraram 7, razão pela qual a tia da Autora devolveu aos Réus as restantes 17 letras juntas aos autos e compensou com o dinheiro entregue pelos Réus, no montante de 14.000$00 as rendas atrasadas (art.ºs 43 a 61);
· A acção visa atingir o conteúdo do direito de propriedade afirmado
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