Acórdão nº 320/22.3GAMLD.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 03-07-2024

Judgment Date03 July 2024
Acordao Number320/22.3GAMLD.P1
Year2024
CourtCourt of Appeal of Porto (Portugal)
Proc. nº 320/22.3GAMLD.P1
Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo de Competência Genérica de Mealhada





Relator Paulo Costa
Adjuntos Lígia Figueiredo
Donas Botto

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório

No âmbito do Processo Singular no processo identificado em epígrafe, a correr termos no Juízo supraidentificado, foi decidido (transcrição):
«A) Condenar a arguida AA na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e meio), pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal;

B) Condenar a arguida AA na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de qualquer categoria pelo período de 5 (cinco) meses, nos termos do disposto no artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, devendo a arguida entregar a respectiva carta/licença de condução, no prazo de 10 dias, após o trânsito em julgado da sentença, na secretaria deste tribunal ou em qualquer posto policial;

C) Condenar a arguida AA no pagamento das custas criminais do processo, sendo a taxa de justiça devida de 4 UC (quatro unidades de conta), nos termos do disposto nos artigos 513.º e 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal e 8.º, n.º 9, e tabela III, do Regulamento das Custas Processuais.


*

Após trânsito:

- remeta boletins à Direcção dos Serviços de Identificação Criminal – artigo 6.º, alínea a), da Lei n.º 37/2015, de 5 de Maio;

- comunique a presente decisão ao IMTT e à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária – artigo 500.º do Código de Processo Penal.


*

Fica advertida a arguida de que, no prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença, deve proceder à entrega dos títulos de condução de que seja titular, neste tribunal ou em qualquer posto policial, nos termos dos artigos 69.º, n.º 3, do Código Penal e 500.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, a fim de cumprir a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor em que foi condenada, sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência, sendo ainda advertida de que se conduzir no período em causa incorrerá na prática do crime de violação de imposições, proibições ou interdições.

*
Adverte-se ainda a arguida de que a medida de coacção Termo de Identidade e Residência prestado nestes autos e, consequentemente, os deveres daí decorrentes só se extinguem com a extinção da pena – artigo 214.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Pena.»

*

Despacho interlocutório sobre a aplicação da Lei da amnistia.
“(…)

Compulsados os autos, desde logo se constata que os factos integradores do ilícito penal praticado nestes autos ocorreram a 13.08.2022, sendo que a arguida nasceu a ../../1998, pelo que, à data dos factos, tinha menos de 30 anos, estando, pois, abrangida pelo regime em causa.

Sucede, porém, que o crime pelo qual a arguida vem acusada não beneficia do perdão de penas nem da amnistia previstos na Lei supra referida, por se encontrar expressamente excepcionado, em face do disposto no artigo 7.º, n.º 1, alínea d), ii), que prevê que não beneficiam do perdão de penas e da amnistia os condenados por “Crimes de condução perigosa de veículo rodoviário e de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, previstos nos artigos 291.º e 292.º do Código Penal”.

Em face do exposto, sem necessidade de ulteriores considerações, concordando-se com a promoção que antecede, nada cumpre, nesta sede, determinar, devendo os autos manter-se a aguardar a audiência de julgamento agendada nos autos.

Notifique.”

Inconformada a arguida interpôs recurso da decisão sobre a aplicabilidade da lei da amnistia.

Concluindo:

“CONCLUSÕES

1) A Arguida recorre do despacho datado de 12.09.2023, que determinou a não aplicação da Amnistia prevista nos art.º 2.º e 6.º da Lei 34-A/2023, de 02.08, porquanto o Tribunal a quo, interpretou erradamente o direito, integrando a factualidade sub judice, na cláusula de excepção prevista no art.º 7.º, n.º 1, al. d), ii) do mesmo diploma;

2) No entendimento do tribunal a quo, o facto de a Recorrente vir acusada do tipo de ilícito de condução em estado de embriaguez, permite integrar: “Não beneficiam do perdão e da amnistia previstos na presente lei:”, al. d) “No âmbito dos crimes contra a vida em sociedade, os condenados por:”, iii) “crimes de condução perigosa de veículo rodoviário e de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, previstos nos artigos 291.º e 292.º do Código Penal.”;

3) A Recorrente revela a violação de princípios basilares do Direito Penal, Processual Penal e Constitucional, nomeadamente, mas sem prejuízo de outros:

princípio da legalidade, no seu corolário da tipicidade e, princípio do tratamento mais favorável ao Arguido, bem como dos normativos art.º 1.º, 2.º, n.º 1, art.º 4.º da Lei n.º 38-A/2023 de 02.08, conjugado com o disposto art.º 1 e 2.º, n.º 4, e 127.º do Código Penal e 29.º, n.º 4, 32.º, n.º 1 e 2 CRP.

4) Nos artigo 2.º, n.º 1, da referida Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, estabelece- se que “Estão abrangidas pela presente lei as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023, por pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto, nos termos definidos nos artigos 3.º e 4.º”.

5) A arguida, nasceu a ../../1998, à data da prática dos factos constantes da acusação (13.08.2022); a Arguida tinha 23 anos de idade;

6) Dispõe no artigo 4.º da aludida Lei, que “São amnistiadas as infrações penais cuja pena aplicável não seja superior a 1 ano de prisão ou a 120 dias de multa.”

7) A Recorrente vem acusada, pela prática de um crime de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.º 292.º, n.º 1 do Código Penal “(…) com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, (…)”.

8) Prescreve art. 7.º, sob epigrafe Exceções designadamente, no seu n.º 1 “Não beneficiam do perdão e da amnistia previstos na presente lei:”, al. d) “(…), os condenados por:”, ii) “crimes (…) de condução de veículo em estado de embriaguez (…), previstos nos artigos 291.º e 292.º do Código Penal.”

9) Atendendo-se à literalidade da norma, é requisito essencial para o funcionamento da cláusula de exceção a existência ou verificação da qualidade de condenado.

10) À data, os presentes autos, não se encontram conclusos, não é conhecida sentença, não foi dado início à audiência de discussão e julgamento e do Registo Criminal da Arguida, a fls…, tirado em 2022.08.15, “NADA CONSTA ACERCA DA PESSOA ACIMA IDENTIFICADA (NO CONVICTIONS)”

11) O mesmo significa que, a Recorrente, não reveste a qualidade de “condenada”, a qualquer título, quer por referência ao tipo de ilícito em apreciação ou outro.

12) Desta feita verifica-se, erro na interpretação do Direito, designadamente, do teor do art.º 7.º da Lei n.º 38-A/2023, devendo ser outra a interpretação preferível.

13) Não se encontrando a Arguida condenada pela prática de crime de condução de veículo em estado de embriaguez, entende-se excluída a integração da al. ii) do n.º 1 do art.º 7.º, devendo operar o disposto no art.º 1.º, 2.º, n.º 1, art.º 4.º da Lei n.º 38-A/2023 de 02.08, conjugado com o normativo 127.º do Código Penal e em consequência, determinar-se a Amnistia e declarar-se extinto o presente procedimento criminal.

Termos em que,

E nos melhores de direito, sempre com o Mui Douto Suprimento de V. Exas., deve a Relação, dar provimento ao presente recurso, substituindo a douta decisão recorrida, por outra que determine a AMNISTIA e consequente extinção do procedimento criminal, fazendo deste modo a acostumada, inteira e sã, JUSTIÇA!”

Inconformada, ainda, a arguida interpôs recurso principal.

Apresenta em apoio da sua posição as seguintes conclusões da sua motivação (transcrição):
« CONCLUSÕES:
1. Decorrida a audiência de julgamento veio a Mm.ª Juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo de Competência Genérica da Mealhada a condenar a arguida AA pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. p. pelo art. 292.º do Código Penal.
2. A Recorrente por não concordar com a mesma dela interpôs recurso porquanto padece de (0) erro de escrita (Talão apresenta TAS de 1.57g/l, após dedução erro +/-0,08, a TAS seria 1,44g/L) (i) insuficiência da prova para a decisão da matéria de facto; (ii) errónea apreciação da prova produzida em sede de audiência de julgamento; (iii) errada interpretação da prova produzida em sede de audiência de julgamento; (iv) violação do princípio in dúbio pro reo; (v) errada aplicação do direito aos factos; (vi) e (xiii) erro na conta de custas – excesso tabela III, art.º 8.º, n.º 9 RCP
3. Como questões prévias a Recorrente dá como reproduzido o teor do recurso apresentado em separado, pugnando pela interpretação do direito nos termos ali exarados de que deve beneficiar da Amnistia e portanto, sem mais, ser declarado extinto o procedimento criminal;
4. A Mm.ª Juiz do Tribunal a quo, por despacho (Ref.ª 128938992), entendeu não poder a arguida beneficiar da amnistia prevista na Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, porquanto, muito embora esteja abrangida pelo limite etário imposto pelo artigo 2.º, n.º 1 do referido diploma, o crime em apreço está expressamente excecionado em face do disposto no artigo 7.º.
5. Ora, não pode a arguida, ora recorrente, discordar mais desta interpretação que, salvo o devido respeito, está errada. O artigo 7.º, n.º 1 d) ii) da Lei 38-A/2023, de 2 de agosto, não exclui do âmbito de aplicação da amnistia e do perdão o crime de condução de veículo em estado de embriaguez – dado estarem as condições previstas no artigo 4.º verificadas -; exclui, sim, a aplicação da amnistia e do perdão a quem haja...

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