Acórdão nº 320/10.6TBTMR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 23-10-2012
Data de Julgamento | 23 Outubro 2012 |
Case Outcome | NEGADA A REVISTA |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 320/10.6TBTMR.C1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA[1]:
AA, residente na ..., propôs a presente acção declarativa, com processo comum, sob a forma ordinária, contra BB, com domicílio na Rua ..., pedindo que, na sua procedência, este seja condenado a pagar-lhe, a titulo de alimentos, uma quantia mensal de €550,00, alegando, para o efeito, e, em síntese, que o casamento da autora e do réu foi dissolvido, por divórcio por mútuo consentimento, decretado por sentença, transitada em julgado, proferida em 28 de Junho de 2007, tendo ambos, então, acordado que, até à data da partilha, que ocorreu, em 10 de Março de 2009, o réu entregaria à autora a quantia mensal de €550,00, até ao dia 8 de cada mês.
Porém, a autora necessita de alimentos para fazer face às suas despesas normais de subsistência, no valor mensal aproximado de €535,00, uma vez que, tendo deixado de receber a renda de um imóvel de que era senhoria, ficou privada do seu único rendimento, a que acresce que sofre de depressão nervosa e tem a seu cargo um filho, que frequenta a universidade, enquanto que o réu goza de uma situação económica desafogada.
Na contestação, o réu conclui pela improcedência da acção, invocando, designadamente, que tem um rendimento mensal de €1.960,00 e despesas médias, no valor mensal de €1.526,00, suportado ainda as despesas de saúde do filho, no valor de €30,00, por mês, enquanto que, por seu turno, a autora é detentora de imóveis que pode converter em lucros, através da venda ou do arrendamento, não necessitando de alimentos prestados pelo réu.
A sentença julgou a acção, parcialmente, procedente por provada e, em consequência, condenou o réu BB a pagar, a título de alimentos, à autora AA, a prestação mensal de €250,00, até ao dia 10 do mês a que disser respeito, acrescida da quantia de €50,00, por mês, até à amortização das prestações alimentares já vencidas.
Desta sentença, o réu interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado procedente a apelação e, em consequência, revogou a decisão impugnada, julgando a acção improcedente e absolvendo-o do pedido formulado pela autora.
Do acórdão da Relação de Coimbra, a autora interpôs agora recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação, mantendo-se a decisão proferida em 1ª instância, e formulando as seguintes conclusões, que se transcrevem, integralmente:
1ª – Nos presentes autos foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente por provada, condenando o réu a pagar a título de alimentos à autora a prestação mensal de 250,00€ (duzentos e cinquenta euros), prestação a ser paga até ao dia 10 do mês a que disser respeito, acrescida da quantia de cinquenta euros por mês até amortização das prestações alimentares já vencidas;
2ª – O réu não conformando, recorreu da presente sentença para o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra. Na pendência daquele recurso, a autora interpôs a respectiva execução por alimentos que se encontra a decorrer.
3ª - O Venerando Tribunal da Relação de Coimbra decidiu revogar a sentença proferida pelo Tribunal "a quo", com fundamento em que, "nada se apurou quanto à impossibilidade da A. prover ao seu sustento, nomeadamente que esteja impossibilitada de trabalhar ou que não seja possível rentabilizar ou alienar o seu património imobiliário no sentido de obter meios que lhe permitam prover, por si só, ao seu sustento”.
4ª - Com todo o respeito, a recorrente discorda desta decisão, parecendo-nos que o Venerando Tribunal laborou em erro, violando assim o disposto no artigo 2016° do CC, pois que não teve em conta todos os elementos do processo e que conduzem a uma decisão diversa.
5ª - Dos presentes autos e sentença resultam as razões de facto, que o Tribunal a quo se baseou para concluir que a autora não tem condições para prover ao seu sustento, designadamente, mediante o desempenho de uma profissão ou rentabilização do seu património.
6ª - Pois para além dos factos que o Venerando Tribunal se refere,
ficou ainda atestado outros factos, designadamente:
a) Que o inquilino da recorrente referente às lojas (verbas 32 e 33) que lhe ficaram adjudicadas deixou de pagar a renda desde finais de 2009, cuja acção de despejo se encontrava a correr e cfr. documento ora junto aos autos;
b) Que o recorrido se obrigou a vender a moradia que ficou adjudicada pela metade com a autora, sendo que ao valor global de venda do imóvel seria deduzido o passivo/crédito que o réu ficou a pagar e o remanescente dividido por ambos na proporção de metade.
c) Mais, consta da fundamentação da sentença, relativamente à "capacidade de trabalho" da autora que sempre foi doméstica e que "não possui quaisquer qualificações profissionais, nem idade que lhe permitam iniciar uma actividade profissional, acrescido das dificuldades e crise vivida em geral nesta área e pela sociedade".
7ª - A douta sentença conclui expressamente que "a factualidade
provada, forçosamente evidencia a necessidade da A. de receber
alimentos", após ajuizar sobre a insubsistência da autora, designadamente,
que esta tem como despesas mensais valores de cerca de 530 euros, que
não vive nem de forma inadequada, nem desajustada, entendendo o
douto tribunal que este valor atinge quase o limiar da pobreza.
8ª - Sendo certo que, a autora após a partilha, por ora, tem como único
rendimento o Rendimento Mínimo de Inserção.
9ª - Quanto à questão do património imobiliário, a autora também
demonstrou ao Tribunal, quanto às lojas, que o arrendatário entretanto
deixou de pagar a renda (encontrando-se a correr a respectiva acção de
despejo e cfr. documento que foi junto aos autos) e que a outra
metade da casa que a alimentanda possui com o recorrente,
corresponde à actual moradia onde este vive.
10ª - Sendo que, no acordo de partilha, o recorrente se obrigou a
proceder à sua venda, sendo que até lá teria de suportar,
necessariamente, a respectiva prestação bancária (facto igualmente
provado) e que ao valor da venda seria amortizado o valor suportado
pelo réu nas prestações bancárias e o remanescente seria então dividido
entre si.
11ª - O recorrido até à presente data nada diligenciou na venda, por não ser do seu interesse, visto que é nessa "mansão" que se encontra a viver.
12ª - Não podendo deixar de realçar o facto provado, em nosso entender relevante de que, o próprio recorrente no Acordo de Divórcio desde logo reconheceu o Direito a Alimentos à recorrida no valor de 550,00 €, já nessa altura o réu tinha total noção das suas necessidades e dificuldades económicas.
13ª - E, nesta parte cita-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05.11.1997 onde foi decidido: "que os alimentos provisórios fixados na acção de divórcio perduram, enquanto não se encontrarem os definitivos, numa acção própria".
14ª - Ao contrario do que é referido, o Tribunal "a quo" naquela sentença, não decidiu conferir à alimentanda o mesmo nível de vida que tinha à data do casamento, mas somente assegurar, na medida do estritamente indispensável, uma sobrevivência condigna.
15ª - Pelo que é nosso entender que a douta sentença não merece qualquer reparo, é clara quanto aos seus fundamentos, tomou em linha de conta a idade das partes, o estado de saúde, a impossibilidade da autora em arranjar trabalho, os rendimentos e despesas de cada um, fazendo uso e aplicação da lei e de acordo com a orientação jurisprudencial dos tribunais.
16ª - Já, o contrário se verifica relativamente ao acórdão recorrido que, se limita a apreciar parcial e genericamente a pretensão do recorrente, não tendo aferido de toda a factualidade e realidade, incorrendo em erro de julgamento e violando a lei, pois que ignora os restantes elementos factuais relativamente à incapacidade profissional e de rentabilização do património pela autora, contrariando os elementos e factos que foram objecto de análise e julgamento pelo tribunal.
17ª - Resulta claro que toda a vida da autora foi doméstica, não tem
quaisquer qualificações profissionais e que a esta realidade se alia os
factos do conhecimento geral como o elevado desemprego e crise
económica que o país atravessa.
18ª - A sua situação económica é tão débil que até lhe foi,
entretanto, atribuído rendimento mínimo de inserção que o Estado lhe
assegura,
19ª - Que em nosso entender deverá ser o ex-conjuge a suportar, pois para esta situação pessoal da autora contribuiu os anos de casamento em que esta nunca teve qualquer actividade profissional, dedicando-se inteiramente à casa, marido e seus filhos e que está claramente na génese desta obrigação de alimentos.
20ª - Restando ainda dizer que, quanto ao património que a autora recebeu pelo divórcio, foi precisamente o que não gerava rendimento, ao contrário do réu que ficou com a loja chinesa, fonte de rendimento do casal.
21ª - A autora ficou com duas pequenas lojas (que de facto, se trata de uma única loja) que esteve arrendada e que ainda hoje a recorrente aguarda o pagamento das rendas, não obstante o facto de actualmente se tratar de mais uma loja, como muitas daquela rua, que se encontram por arrendar ou vender, atento a crise instalada.
22ª - E, a outra metade da ''mansão" trata-se da casa que o
recorrido habita e que em sede de partilha, ficou na obrigação de
proceder à sua venda, deduzir os encargos e dividir o remanescente com
a autora, o que até à presente data não sucedeu.
23ª - A verdade é que o bem imóvel que sempre gerou rendimento ficou para o recorrido (trata-se da loja chinesa a fls. dos autos), com uma renda mensal de cerca de 1000 € ou mais, a que acresce a sua pensão auferida da Suíça e, que claramente demonstram que o recorrido tem todas as condições para pagar estes alimentos à autora ora recorrente;
24ª - Face a todo o exposto, é nosso entender, que o douto acórdão deverá ser revogado por outro, por padecer de erro de julgamento e violar a lei, pois que não teve em conta factos provados e...
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