Acórdão nº 32/16.7SFPRT-H.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 06-12-2023

Judgment Date06 December 2023
Year2023
Acordao Number32/16.7SFPRT-H.P1
CourtCourt of Appeal of Porto (Portugal)
Processo 32/16.7SFPRT-H.P1
Comarca do Porto
Juízo Central Criminal do Porto – Juiz 4



Acordaram, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª secção do Tribunal da Relação do Porto:

I - RELATÓRIO
I.1. Por acórdão proferido em 05.02.2018 foi o arguido AA absolvido da autoria de um crime de evasão, p. e p. pelo artigo 352º, n.º 1 do Código Penal (doravante CP) e condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelos artigos 25.º, alínea a) 21º nº 1 do Dec. Lei nº 15/93 de 22.01, por referência às tabelas I-A, I-B e I-C anexas àquele diploma legal, na pena de pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão efectiva.
*

I.2. Recurso da decisão

O Ministério Público interpôs recurso da decisão, terminando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição integral):
“1 - Por acórdão proferido nos presentes autos em 5 de Fevereiro de 2012 AA pela prática de um crime de tráfico de menor gravidade, previsto e punido pelo 25.°, alínea a) do D.L. n° 15/93, de 22/01, por referência à tabela I-A, I-B e I-C, anexa ao referido diploma legal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão efectiva;
2- Como foi a nossa posição em sede de alegações finais e naquilo que na nossa perspectiva é o constitucional e estatutário dever de observador de critérios de estrita legalidade e objectividade na actuação no sustentar efectivo da acusação no julgamento, não se descortina que se possa afirmar o cometimento de crimes distintos pelos diversos arguidos (tráfico menor gravidade/tráfico/tráfico agravado) quando se dá como provado que "O arguido AA agiu sempre de forma livre e consciente, sabendo quais eram as características, natureza e efeitos dos produtos estupefacientes que detinha e que vendia, sempre com a intenção de obter contrapartida económica. (...) O AA atuou de comum acordo e em conjugação de esforços com os demais indivíduos acima identificados, repartindo entre si as tarefas de guarda, transporte e venda de estupefaciente, bem sabendo que a sua conduta era prevista e punida."
3- Resultando que foi a mesma matéria imputada aquela que veio a ser dada como provada, porque da integração dos factos no direito o Tribunal é sempre soberano e porque na nossa perspectiva um determinado entendimento numa fase anterior ao julgamento não pode implicar outro que afaste a defesa de distinta integração jurídica daquela anteriormente realizada (naquilo que, caso contrário seria um entendimento que violaria princípios constitucionais e estatutários básicos com relação à actividade do Magistrado do Ministério Público na representação em julgamento), consideramos que o tribunal errou na qualificação jurídica daqueles factos;
4- Face àquela matéria de facto dada como provada impunha-se que na aplicação do disposto no artigo 26.° do Código Penal se afirmasse a existência de uma co-autoria entre os diversos arguidos, pois que "atuou de comum acordo e em conjugação de esforços com os demais indivíduos acima identificados, repartindo entre si as tarefas de guarda, transporte e venda de estupefaciente, bem sabendo que a sua conduta era prevista e punida, cabendo àquele arguidos (como ocorrera com aqueles outros) a concreta, pontual e específica função da venda directa aos consumidores do produto estupefaciente guardado pelo arguido BB, transportado pelo arguido CC e vendido também pelo arguido DD;
5- Co-autoria que consideramos apenas verificar-se relativamente ao crime matricial de tráfico previsto e punível pelo artigo 21.° do D.L. n.°15/93, de 22/1 (e já não o agravado) pois que relativamente à agravante ela apenas pode ser ligada aos arguidos BB, DD e CC atentos os factos dados como provados;
6- Assim se não entendendo, perante o conjunto de factos dados como provados relativamente ao aqui arguido AA, sempre seria de afirmar que o mesmo se comportou como cúmplice - artigo 27.° do Código Penal - relativamente à actividade de traficância daqueles outros onde ele, muito embora tenha realizado a acção típica (detenção e venda) não lhe deu causa, não tinha o domínio sobre a detenção e venda e se limitou a facilitar o facto principal, através de auxílio material no final da linha da actividade de tráfico agravado desenvolvido pelos arguidos BB, DD e CC, desprendendo-se do resultado daquela actividade (o produto e os lucros gerados pela venda) e apenas intervindo de forma fugaz e utilizados como instrumentos por aqueles outros conhecedores da sua situação de consumidores;
7- No caso dos autos e tal como ocorre numa miríade de situações por todo o nosso país com relação a todos aqueles que diariamente se deparam com estas situações de tráfico, este arguido consumidor de estupefacientes e de condição financeira miserável, aceita actuar da forma que os autos ilustram naquele contexto e concreto momento para efeito daquele recebimento em espécie que lhes é proporcionado pelos traficantes, sendo que toda a actividade sempre se realizaria, como se realizou, e em que a um toxicodependente detido era substituído pela rede de tráfico por um outro e assim sucessivamente.
8- Na verdade, como vem sendo sublinhado pela melhor jurisprudência a autoria tem de definir-se ao menos como domínio de um dos âmbitos da configuração, decisão ou execução do facto, não sendo relevante o domínio per se, mas apenas enquanto fundamenta uma plena responsabilidade pelo facto e onde a cumplicidade se diferencia da co-autoria pela ausência do domínio do facto;
9- Ora, eram aqueles outros arguidos BB, DD e CC que determinavam as circunstâncias de modo, tempo e lugar em que ocorriam as vendas de cocaína e heroína e depois ficavam com o produto de tais vendas e onde o aqui arguido AA (tal como os restantes arguidos EE, FF, GG, HH e II), surgiu no que contendia com relação vizinal ou então pela situação de toxicodependente à procura de produto para satisfazer o vício e que daquele modo era proporcionado pelos arguidos (de uma forma mais directa pelo arguido CC) e nesse momento chamado à função de venda directa aos restantes consumidores com a promessa de contrapartida de recebimento de produto para o seu próprio consumo;
10- Nestes termos o arguido AA cometeu em co-autoria, ou assim se não entendendo na forma de cumplicidade um crime de tráfico, previsto e punível pelo artigo 21.°, n.°1 do D.L. n.° 15/93 de 22/1 conjuntamente com aqueles outros arguidos.
11- Pelo que em razão do exposto e na integração por nós pugnada considerado o todo explicitado pelo tribunal nos critérios e factores a atender na medida da pena na afirmação da co- autoria pugnamos para que o arguido seja condenado numa pena de prisão situada próxima dos 4 anos de prisão efectiva ou assim se não entendendo, condenado como cúmplice, numa pena situada próximo dos 3 anos de prisão efectiva;
12- A manter-se a qualificação jurídica considerada no acórdão condenatório, temos para nós que a pena aplicada ao arguido AA não dá satisfação às necessidades de punição que o caso requer, mal se compreendendo o que levou o tribunal a fixar pena tão próxima do seu limite mínimo tendo presente a quantidade e qualidade de droga que o mesmo deteve e auxiliou a vender, a inserção naquilo que envolve os sucessivos degraus em que se desdobrava a actividade de tráfico desenvolvida pelos arguidos BB, DD e CC, a forma como continuou a desenvolver a actividade mesmo depois de uma primeira detenção e a existência de antecedentes criminais pela pratica do mesmo tipo de crime;
13- Por isso da necessária função reprovativa do pessoal comportamento delitivo e desmotivadora de eventuais futuras ilícitas (idênticas ou diversas) importa que seja fixada uma pena mais afastada do limite mínimo da moldura penal abstracta correspondente ao crime em causa - 1 a 5 anos de prisão -, e assim no quadro a considerar como factores a atender à medida da pena na pertinente ponderação dos critérios de individualização das penas previstos nos normativos 40.°, n.° 1 e 71.°, n.° 1, do Código Penal, entendemos que as necessidades de punição que o caso requer só ficarão plenamente satisfeitas com a aplicação de uma pena de prisão pelo cometimento do crime de tráfico de menor gravidade entre 2 (dois) e 6 (seis) meses e os 3 (três) anos efectiva (nos exactos moldes determinados no acórdão no comungar do entendimento que não estão reunidos os pressupostos materiais a que alude o artigo 50.° do Código Penal para o arguido poder beneficiar da pena substitutiva em causa);
14- Ao ter realizado aquela qualificação jurídica e ao ter aplicado aquela pena, o douto acórdão violou designadamente disposto nos artigos 21.° e 25.°, do D.L. n.° 15/93, de 22/1, e os artigos 26.°, 27.°, 40.°, n.°s 1 e 2, 71.° e 72.° todos do Código Penal.”
Pugna pela condenação do arguido AA pela prática, em co-autoria, ou se assim não se entender na forma de cumplicidade, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º do D.L. 15/93, de 22.01, em pena de prisão efectiva situada próximo dos 4 anos para o caso da co-autoria e, se assim não se entender, em pena próxima dos 3 anos de prisão efectiva para o caso da cumplicidade.
No caso de manutenção da qualificação jurídica efectuada na decisão recorrida pugna pela alteração da pena aplicada ao arguido AA para uma pena de prisão efectiva compreendida entre os 2 anos e 6 meses e os 3 anos.
*

I.3. Resposta do Recorrido
O arguido AA, na resposta ao recurso, pronunciou-se pela sua improcedência e manutenção da sentença recorrida.
*
1.4. Parecer do Ministério Público
Nesta Relação o Ministério Público emitiu parecer favorável ao provimento do recurso, subscrevendo as razões do recurso do Ministério junto do tribunal recorrido.
*
1.5. Resposta ao parecer
Foi cumprido o estabelecido no artigo 417º, n.º 2 do Código do Processo Penal (doravante CPP), não tendo sido apresentada resposta ao parecer do Ministério Público.
*
I.6. Foram colhidos os vistos e, de seguida, o processo
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT