Acórdão nº 31662/16.6T8LSB-D.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 06-03-2024

Data de Julgamento06 Março 2024
Case OutcomeREVISTA IMPROCEDENTE. RECURSO SUBORDINADO PROCEDENTE.
Classe processualREVISTA (COMÉRCIO)
Número Acordão31662/16.6T8LSB-D.L1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça








Processo n.31662/16.6T8LSB-D.L1.S1


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I. RELATÓRIO


1. IMPACTMELODY, Ldª, pessoa coletiva com sede no ..., propôs ação de processo comum contra a Massa Insolvente de ANIMACORPUS - GESTÃO DE SPAS E HEALTH CLUBS UNIPESSOAL, Ldª (representada pelo Administrador da Insolvência), nos termos do art. 125.º do CIRE, peticionando que fosse dada sem efeito a resolução em benefício da Massa Insolvente operada pelo administrador da insolvência.


Alegou, em síntese, que os negócios celebrados entre as partes não foram prejudiciais para os credores, nem a autora atuou de má fé, pois, apesar de ter tido conhecimento prévio da situação deficitária da exploração do hotel, não tinha conhecimento da situação de insolvência da contraente.


2. A ré contestou a ação, alegando que a celebração dos contratos em causa causou prejuízo ao património da insolvente, pela diminuição do seu valor. Alegou que o contrato é prejudicial porque a renda é variável e o seu pagamento está na total discricionariedade da autora, que até ao momento nada pagou. Alegou ainda que os prejuízos resultam dos encargos assumidos pela insolvente com a celebração do contrato, na medida em que ficou estabelecido que as cedentes entregariam à cessionária 50% do rendimento das unidades/andares de utilização independente que não fazem parte do objeto da exploração e suportariam ainda outros encargos com água, eletricidade e seguros, assim como os encargos com os trabalhadores no termo do contrato de cessão. E alegou que a autora tinha conhecimento da crise que as cedentes enfrentavam à data da outorga dos contratos.


3. Delimitado o objeto do litígio como consistindo no apuramento da validade da resolução dos negócios de cessão de exploração e de arrendamento identificados na carta enviada pelo Administrador de Insolvência à autora (a fls. 33 a 39 dos autos), a primeira instância proferiu a seguinte decisão:


«o Tribuna julga procedente a presente ação e, em consequência, declara inválida e ineficaz a resolução em benefício da massa insolvente operada pelo Sr. Administrador de Insolvência referente ao contrato de cessão de exploração e respetivo aditamento celebrados entre a sociedade autora e a insolvente, em 24.06.2015 e em 11.02.2016, respetivamente


4. Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação, tendo o TRL decidido:


«julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência:


- Revogar parcialmente a decisão recorrida, a qual se substitui por outra a declarar válida e eficaz a resolução impugnada no que respeita ao aditamento/arrendamento celebrado em 11/02/2016;


- Manter o decidido quanto ao contrato de cessão de exploração celebrado em 24/06/2015, embora com diversa fundamentação


5. Continuando inconformada a ré [Massa Insolvente da Animacorpos] interpôs recurso de revista. Nas suas alegações, formulou as seguintes conclusões:


«A. Primeiramente se refira que o acórdão recorrido não se pronuncia quanto a duas questões suscitadas no recurso de apelação.


B. Uma das questões suscitadas e alegadas pela Recorrente nos seus articulados, mormente na oposição à impugnação, versa sobre a verificação do requisito da má-fé nos termos do artigo 120.º, n.º 4 do CIRE, ou seja, com recurso à presunção iuris tantum prevista nesse normativo legal.


C. Ora, por mero lapso, certamente, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa refere, na página 44, “não se tendo demonstrado qualquer relação especial entre a impugnante e a insolvente, não estamos perante um caso no qual a má fé se possa presumir” – sucede que, tal não é verdade porque a aqui Recorrente alegou e demonstrou a relação especial (indireta) entre a impugnante e a insolvente, nomeadamente nos itens 104.º a 120.º da oposição.


D. Como decorre do acórdão recorrido, a sentença não se pronunciou quanto a esta questão pelo facto de ter entendido que o ato não era prejudicial, porém, enferma em omissão de pronúncia o acórdão recorrido que, só por mero lapso, não verificou a demonstração da relação especial entre a impugnante e a insolvente para efeitos de presunção do requisito de má-fé.


E. Concomitantemente, no recurso de apelação alegou a Apelante a titulo subsidiário que o contrato de cessão de exploração sempre seria objeto de resolução incondicional nos termos do artigo 121.º, n.º 1, al. b) do CIRE, por se tratar de um ato materialmente gratuito.


F. A omissão de pronúncia é um vício gerador de nulidade da decisão judicial que ocorre quando o tribunal não se pronuncia sobre questões com relevância para a decisão de mérito e é referida ao concreto objeto que é submetido à cognição do tribunal, correspondendo aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir (ou seja, às concretas controvérsias centrais a dirimir).


G. A omissão de pronúncia é uma das causas de nulidade de sentença.


H. Desta forma, encontra-se configurada uma nulidade de sentença prevista na alínea d) do nº1 do art. 615º do CPC - omissão de pronúncia, nulidade que pelo presente se alega e pretende ver reconhecida com as demais consequências legais.


DAS MOTIVAÇÕES,


I. O acórdão recorrido decidiu o seguinte sentido:


Perante o exposto, acordam os Juízes da Secção do Comércio deste Tribunal da Relação em julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência:


- Revogar parcialmente a decisão recorrida, a qual se substitui por outra a declarar válida e eficaz a resolução impugnada no que respeita ao aditamento/arrendamento celebrado em 11/02/2016;


- Manter o decidido quanto ao contrato de cessão de exploração celebrado em 24/06/2015, embora com diversa fundamentação.


J. O presente recurso terá como objeto apenas a parte do acórdão que manteve o decidido na primeira instância.


K. A questão controvertida insere-se na resolução condicional em beneficio da massa insolvente dos atos prejudiciais a esta, nos termos do artigo 120.º do CIRE, na qual o Tribunal da Relação manteve o decido no sentido de ser considerada válida a impugnação efetuada pela Recorrida quanto à resolução em beneficio da Massa Insolvente operada pelo Exmo. Sr. Administrador de Insolvência.


L. O Tribunal da Relação entendeu, efetivamente, que o ato em questão era um ato prejudicial para a Massa Insolvente, porém concluiu pela não verificação do requisito da má-fé nos termos e para os efeitos do artigo 120.º, n.º 5 do CIRE.


M. No entendimento da Recorrente incorre em erro tal entendimento, por dois motivos: i. o Tribunal da Relação de Lisboa deveria ter tido em consideração a presunção de má-fé prevista no n.º 4 do artigo 120.ºdo CIRE, pois verificam-se todos os pressupostos – o que afastou liminarmente; ii. ainda que não fosse presumível a má-fé (como entendeu a relação), sempre se verificaria a mesma por força do disposto no artigo 120.º, n.º 5 do CIRE.


-Da presunção do requisito da má-fé (120.º, n.º 4 CIRE):


N. O acórdão não analisa sequer a intervenção de pessoa especialmente relacionada, referindo “não se tendo demonstrado qualquer relação especial entre a impugnante e a insolvente”, mas não apreciando concretamente a situação – ou seja, afasta liminarmente esta questão sem qualquer justificação válida para o efeito.


O. Porém, a aqui Recorrente, efetivamente, alegou e demonstrou (documentalmente) em sede de oposição à impugnação apresentada a aqui Recorrente discorreu sobre a verificação do requisito do artigo 120.º, n.º 4 por referência a existência de pessoa especialmente relacionada – cfr. itens 104.º a 120.º da oposição.


P. De facto, o negócio em questão teve como participante/aproveitador pessoa especialmente relacionada com a insolvente, relação esta que existia já à data.


Q. Isto porque, à data da outorga do aditamento ao contrato de cessão de exploração, 11-02-2016, quem vinculava as sociedades insolventes T... e ANIMACORPUS eram os seus administradores, AA e BB, tal como se pode constatar do teor do próprio aditamento e certidão permanente das empresas constantes da contestação.


R. A recorrida propôs-se explorar o hotel da propriedade da insolvente T... sob a alçada da marca G...


S. Ora, CC é o Administrador da cessionária, aqui Recorrida e também o CEO do grupo F... que é detentora da marca G... em Portugal, com pelo menos 4 (quatro) unidades em funcionamento: G..., T.... ... ......... e G... e Janeiro 2016 G... ... e G....


T. BB é nada mais nada menos do que a diretora de Marketing, Comunicação e Vendas na F...


U. Ou seja, uma das administradoras da sociedade insolvente era, concomitantemente, diretora de marketing comunicação e vendas do grupo F...


V. E esta F..., como se aferiu, é a proprietária da marca sob a qual são explorados os serviços de hotel e spa nos imóveis em referência.


W. É, inequívoco, que terá de existir um contrato que permite e legitime a Recorrida a explorar os estabelecimentos comerciais sob a marca propriedade do grupo F...


X. É, inequívoco, que a diretora do departamento de vendas do grupo F... sabia que a Recorrida ia explorar o hotel/spa sob a marca G... nas instalações propriedade da sociedade aqui insolvente e da T... – pois esta diretora era administradora das duas sociedades.


Y. Pelo que, é inequívoco que estamos perante a celebração de um contrato com pessoas especialmente relacionadas – insolvente (com administradora a Sra. BB); recorrida (que tem licença/autorização para utilização da marca G... na exploração do hotel); e F... (proprietária da marca G... e cuja uma das pessoas de topo dos quadros da sociedade é a Sra. BB).


Z. Nenhum destes circunstancialismos foi apreciado pelo Tribunal da Relação (nem pela primeira instância que se ficou pela prejudicialidade do ato) – embora alegados e comprovados.


AA. O n.º 4 do artigo 120.º consagra já uma presunção iuris tantum (cfr. artigo 350.º, n.º 2 do CCivil), sendo que os requisitos aí contemplados (referente ao período temporal e ao...

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