Acórdão nº 3144/12.2TBPRD-C.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 13-06-2018

Data de Julgamento13 Junho 2018
Número Acordão3144/12.2TBPRD-C.P1
Ano2018
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. Nº 3144/12.2TBPRD-C.P1
Apelação 1ª

Relator: Inês Moura
1º Adjunto: Francisca Mota Vieira
2º Adjunto: Paulo Dias da Silva
Sumário: (art.º 663.º n.º 7 do C.P.C.)
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Acordam na 3ª secção do Tribunal da Relação do Porto
I. Relatório
No âmbito do presente processo de insolvência foi declarada insolvente a sociedade B…, Ld.ª por sentença proferida a 13/11/2012.
Por apenso aos autos de insolvência, veio o credor Banco C…, S.A.” requerer a qualificação da insolvência da devedora como culposa, com afectação do seu gerente D…, em virtude da sua actuação dolosa que dispôs dos bens da B… em proveito pessoal e/ou de terceiros, agravando a situação de insolvência da sociedade, como decorre da presunção inilidível estabelecida na alínea d), do n.º 2, do art. 186.º do CIRE.
Alega, em síntese, que a sociedade insolvente, representada pelo gerente D…, celebrou por escrituras públicas, seis contratos-promessa de compra e venda, com eficácia real, de 7 fracções autónomas do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Ovar sob o n.º 4011, que se encontra hipotecado a favor do C…, negócios esses melhor descritos no art.º 2.º do requerimento inicial apresentado nos autos, e celebrados menos de 30 dias antes do início do processo de insolvência; em cada uma das referidas escrituras, as partes declararam que o preço das fracções prometidas vender se encontrava integralmente pago e que, nas datas referidas nessas escrituras, o gerente da B… teria entregue as chaves das respectivas habitações, operando assim a tradição material dos imóveis em causa; além disso, em todas os mencionados contratos-promessa foi estipulado que a escritura de compra e venda dos imóveis, livres de ónus e encargos, teria de ser marcada pela B… e realizada impreterivelmente até 31/12/2012, sob pena dos promitentes-compradores terem direito à devolução do sinal em dobro. Tais contratos-promessa, outorgados nas vésperas da declaração de insolvência da B…, foram negócios simulados, nos quais as declarações dos outorgantes nas escrituras não têm qualquer correspondência na vontade real das partes, visando enganar os credores da sociedade ora insolvente, não passando de um estratagema fraudulento, concertado entre o gerente da sociedade insolvente e os promitentes-compradores, visando impossibilitar o C… e os demais credores de satisfazerem os seus créditos através do produto da venda das mencionadas fracções. Os promitentes-compradores não entregaram à sociedade insolvente qualquer quantia a título de sinal ou pagamento antecipado do preço dos contratos de compra e venda prometidos e não receberam as chaves das fracções dos imóveis hipotecados, não tendo existido qualquer tradição dos mesmos. As escrituras acima indicadas visaram, de forma fraudulenta, a constituição de direito de retenção a favor dos créditos dos promitentes-compradores, em prejuízo do C… e dos demais credores comuns, atendendo a que o direito de retenção prevalece sobre a hipoteca, ainda que registada anteriormente.
O Administrador da Insolvência procedeu à junção de parecer concluindo pela qualificação da insolvência como fortuita, sustentando que os contratos promessa em causa têm natureza meramente obrigacional, destinando-se as vendas das fracções do seu património a saldar as dívidas da insolvente perante os credores, para além de entender que tais negócios não foram celebrados com dolo ou culpa grave.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido de se qualificar a insolvência como fortuita, aderindo ao parecer do Sr. Administrador da Insolvência.
Por despacho de fls. 336, decidiu o Tribunal não usar da faculdade prevista no art.º 188.º n.º 5 do CIRE e determinou a citação do Requerido D….
O Requerido veio deduzir oposição à qualificação da insolvência como culposa, alegando que a situação de insolvência não foi criada ou agravada em consequência da sua actuação, mas em consequência do mercado, que os negócios celebrados pela devedora com os promitentes compradores identificados em 10º e 11º da oposição são aqueles que estão descritos na petição inicial do apenso E (impugnação da resolução dos contratos em beneficio da massa insolvente) e que actuou sempre convicto de que defendia eficazmente os interesses da sociedade devedora, sem prejudicar outrem, designadamente os bancos credores. Admite a factualidade descrita em 1 a 4 do requerimento inicial apresentado pelo credor C…, S.A., mas nega que tais contratos promessa tenham sido celebrados com simulação. Conclui que a sua conduta não integra qualquer uma das previsões dos n.ºs 2 e 3 do art.º 186.º do CIRE, devendo a insolvência ser qualificada como fortuita.
Foi dispensada a realização de audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador, que declarou válida a instância, identificou o objecto do litígio e os Temas da Prova e admitiu os meios de prova apresentados.
Foi determinado, por não oposição das partes, que os presentes autos aguardassem a decisão a proferir na acção de impugnação da resolução dos contratos promessa de compra e venda relativos às fracções autónomas também em discussão neste processo e que constitui apenso E, com fundamento no facto de a questão que se coloca nos presentes autos quanto a tais contratos-promessa, colocar-se igualmente naquela acção de impugnação.
Foi proferida decisão no apenso E, já transitada em julgado.
Por se entender estar o Tribunal habilitado a proferir decisão, face à sentença proferida no apenso E, dispensou-se a produção de ulterior prova, com prolação imediata de sentença, o que não mereceu oposição das partes.
Foi proferida sentença que qualificou como culposa a insolvência de “B…, Lda.” e decidiu em consequência:
a) Declarar afetado pela qualificação culposa da insolvência o requerido D…, fixando-se o grau de culpa como moderado;
b) Decretar a inibição do Requerido D… para administrar patrimónios de terceiros, por um período de 3 (três) anos;
c) Decretar a inibição do Requerido D… para o exercício do comércio e para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa, por um período de 3 (três) anos;
d) Determinar a perda, pelo requerido D…, de qualquer crédito eventualmente reclamado pelo mesmo sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente;
e) Condenar o Requerido D… no pagamento de indemnização a favor dos credores, indemnização esta correspondente ao valor dos créditos não satisfeitos, reclamados e reconhecidos pelo Senhor Administrador da Insolvência aos mesmos, no âmbito do apenso de reclamação de créditos, até às forças do respectivo património e com o limite de €10.000,00.”
É com esta decisão que o Requerido não se conforma e dela vem interpor recurso, pedindo a sua revogação e substituição por outra que declare a insolvência como fortuita, apresentando para o efeito as seguintes conclusões, que se reproduzem:
1ª- O recurso é interposto da sentença proferida nos autos a fls., a qual decidiu (i) qualificar a insolvência como culposa, declarando afetado o aqui recorrente, e ainda (ii) decretar as inibições das alíneas b) e c) da decisão, e a perda de créditos da alínea d), para além da condenação da alínea e) também da parte decisória;
2ª- Ao conferir-se às situações ou factos-índices elencados nas alienas a) a i) do nº2 do artigo 186º do C.I.R.E. a natureza de presunções legais, na vertente inilidível, é fundamento de violação do direito fundamental do recorrente ao processo equitativo consagrado no nº4 do artigo 20º da C.R.P.;
3ª- Para que a insolvência possa ser qualificada como culposa é necessário que a atuação do devedor tenha sido causa da situação de insolvência ou do seu agravamento, uma vez que o devedor pode ter atuado dolosamente, mas em nada ter contribuído para a criação ou agravamento da insolvência;
4ª- Como resulta da douta decisão em apreço, é apontada ao gerente da devedora, nestes autos, que foi sempre quem representou a devedora nos contratos promessa em apreço, uma omissão da diligência média que um homem normal adota na sua conduta, ou seja, uma culpa leve ou moderada;
5ª- A culpa da entidade coletiva é a culpa de quem a representou no ato que integra a fattispecie, razão pela qual, sendo leve ou moderada a culpa do gerente autor dos atos, também leve ou moderada é a culpa da devedora, o que é causa de não verificação do pressuposto dolo ou culpa grave para a qualificação da insolvência como culposa;
6ª- A insolvente devedora dedica-se, profissional e empresarialmente, à venda de imóveis próprios, do que fazia atividade única e com o intuito do lucro, como se vê do objeto social, e as frações em apreço tinham como destino normal económico a venda, constituindo, pois, o designado património instável ou volátil, pelo que que as promessas de venda em causa inseriram-se no âmbito da utilização, uso e fruição normal do património da insolvente, consubstanciando atos de administração e não de disposição.
7ª- Não vem indiciado que a eventual diminuição da garantia patrimonial dos credores da insolvente seja correlativa de igual diminuição provinda o ato de disposição do património deste em favor do devedor ou de terceiro.
8ª- É que, para os fins em presença, só há que falar em proveito quando o ato de disposição se traduz na outorga de um beneficio sem uma justa ou legitima correspondência prestacional, pois que se existe correspondência prestacional do terceiro, não há proveito deste, mas sim o recebimento do que lhe compete, justa e legitimamente, receber;
9ª- Ao invés, a matéria de facto provada, evidencia que todos
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